segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Conto: O Reencontro

Por Pedro Ferreira Nunes

Paulo estava sentado no ponto de ônibus esperando o veiculo para seguir até a capital. Fumando um palheiro e observando a belíssima serra na sua frente. - Precisava arrumar algumas coisas na capital que era impossível de serem realizadas na pequena cidade em que morava.

Desde que voltara para sua terra natal pensava em encontra-la, aquela que fora a sua amada, o seu grande amor. No entanto após tanto tempo ali já havia perdido a esperança de reencontra-la. Perguntou alguns amigos se por acaso sabiam alguma noticia dela, no entanto ninguém sabia. As coisas por ali não haviam mudado tanto, mas muita gente da sua geração havia ido embora dali tal como ele o fizera. Assim Paulo ficava pensando o que será que havia acontecido com sua amada.

- Será que ela continua casada com aquele cara? Será que teve filhos? Em que cidade esta morando, em que estado?

Paulo conheceu-a no colégio. Ambos tinham apenas 14 anos. Paulo ainda não namorava, ela já estava noiva e logo se casou. Desde que há viu pela primeira vez ele se apaixonou por ela, já ela gostava de outro. Com o tempo eles se aproximaram e ela que vivia um momento de crise no seu casamento começou a se aproximar de Paulo e também se apaixonou por ele.

A cada dia a paixão dos dois só aumentava, no entanto ela continuava casada. Paulo a amava com todas as suas forças, mas não tinha coragem de toma-la em seus braços e rouba-la do seu marido. Paulo era um covarde. – Amava-a muito, mas não tinha coragem de se declarar.

Ela o amava, Paulo bem sabia. Todos que os viam juntos falavam que eles estavam tendo um caso. O boato se espalhou e o marido dela proibiu-a dela se aproximar dele. Percebeu que estava perdendo sua mulher para aquele menino e se ele não tomasse uma atitude a perderia de vez.

A duras penas Paulo teve que se afastar de sua amada isso lhe doeu muito no coração. Ele bem sabia que se tivesse coragem ela largaria o seu marido e ficaria com ele, mas ele não tinha força para rouba-la.

De repente o ônibus surge na estrada. Paulo levanta e dá com a mão para que o automóvel pare. Quando Paulo entra não pode acreditar em quem ele está vendo na sua frente sentada sozinha em uma poltrona. Sim era ela. Continuava linda como sempre. Mas estava com a cara de poucos amigos. Si quer olhou para Paulo e quando fez, o fez com certa indiferença.

Paulo não pode deixar de se sentir desapontado. Esperou tanto por aquele momento, imaginou tanto como seria. Fez tantos planos. Mas as coisas já não era como antes, como pode passar por sua cabeça que ela continuava gostando dele e que agora depois de tantos anos ele teria a chance de viver o amor que não puderam viver na juventude.

Chegou a pensar em sentar ao lado dela. Puxar conversa com ela. Saber como ela estava o que tinha feito em todos esses anos que não se viam. Mas o olhar de poucos amigos dela o afugentou. Paulo pensava: - Tudo bem que ela não o amasse mais, mas esse olhar dela de ódio o machucava por dentro. Aquela raiva que transparecia no seu olhar seria dele?

Paulo teve medo de cumprimenta-la e sentar junto dela, imaginou que ela seria áspera com ele e não suportaria mais essa decepção. Eles que se amaram tanto outrora estavam ali, mas si quer se cumprimentaram.

O ônibus entra na capital. Ela se levanta e caminha para porta. Para diante de Paulo abre um grande sorriso e diz:

- Olá Paulo quanto tempo? Tudo bom contigo?

Paulo não pode deixar de se sentir surpreso e responde-a:

- Oi menina tudo bem?! Onde você esta morando?

- Continuo morando lá e estou trabalhando aqui na capital.

Paulo pensou na ultima vez que viu ela. Encontraram-se na rua, ele a cumprimentou, tomou coragem e falou com ela.

- Menina casa comigo?

Ela olhou para ele e sorriu. Agora ali diante dela ele pensava nessa proposta que fizera a ela há tantos anos atrás. O ônibus estava chegando ao ponto em que ela iria descer. Paulo toma coragem e quando o ônibus para ele pergunta:

- Você pensou na proposta que eu ti fiz?

- Que proposta?

- Aquela proposta meu.

- Não me lembro. Qual?

- Casa comigo? 

Ela abriu um grande sorriso e não lhe respondeu. O ônibus seguiu e ele teve a certeza que a historia deles ainda não havia acabado. Ele a amava e ela ainda o amava.

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Cronica: Lendas da minha infância

Por Pedro Ferreira Nunes

Nasci e cresci no interior, no cerrado, nas margens do rio Tocantins. Tive uma infância povoada de lendas, de causos e contos populares contados pelas pessoas mais velhas, historias que nos metiam muito medo.

Não podíamos tomar banho no rio Tocantins por que havia o Boto e a Pirarara que comiam gente, além da sucuri e do nego d´agua. Si andávamos no cerrado era perigoso encontrarmos com o lobo guará, a onça pintada entre outros animais ferozes.

Já à noite tínhamos medo de fantasmas, da aparição de luzes misteriosas, de som de passos em grotas, de fogos que surgiam do nada. Tudo isso fazia com que não saíssemos sós de casa, sempre que saiamos era no mínimo em dupla. Até mesmo pegar um balde de água na cacimba.

Ouvíamos historias de pessoas que morriam afogadas no rio Tocantins. – Que eram engolidos pela boiuna (grande cobra d’água). De pescadores que desapareciam e eram devorados por animais encantados que viviam nas profundezas das águas do Tocantins. Esses animais encantados eram pessoas que haviam morrido no rio e que não eram batizadas e que seus corpos nunca haviam sido encontrados.

Também ouvíamos historias sobre crianças que desapareciam no cerrado, que eram roubados dos braços das próprias mães por lobos guarás ferozes.

A semana santa era o período mais macabro, pois geralmente era o período em que pessoas se transformavam em animais ferozes. Havia uma lenda que dizia que quando há incesto na família, essas pessoas se transformavam em porcos selvagens ou lobisomem, e essas transformações só chegavam ao fim se essas pessoas fossem cortadas por alguma lamina. Dia de lua cheia ninguém colocava o pé para fora de casa.

Sempre ouvíamos essas historias que aconteciam ao nosso redor. Foi lá na serra, aconteceu com fulano de tal. Nunca presenciamos nenhuma dessas aparições, mas não ousávamos duvidar que de fato elas acontecessem.

Hoje refletindo sobre todas essas historias que povoaram a nossa infância, vejo que era uma forma dos nossos pais nos protegerem. Para que não saíssemos sozinhos. Pois de fato era muito perigoso tomar banho no rio Tocantins, no córrego Lajeado, sobretudo em período de cheia, não por causa de animais ferozes, mas sim pela fúria da água.

É claro que às vezes os nossos avós e nossos pais exageravam na dose e o medo nos paralisava tanto que quando precisava não conseguíamos fazer o que nos pediam. No entanto quando íamos crescendo a vontade de ganhar o mundo e conhecer novas pessoas, viver novas experiências era maior do que qualquer medo que podíamos ter.

E assim a chácara onde morávamos que parecia ser tão grande (mas era tão pequena) ficava ainda menor. Então tínhamos que partir dali em busca de novos ares, novas cores, novos sabores e novos amores. Essas lendas que povoaram a minha infância ficaram no passado, hoje as coisas estão tão mudadas. O lugar onde cresci foi destruído, abandonado, muito das pessoas que me contavam essas historias morreram, mas elas estão aqui na minha lembrança e no meu coração tal como essas historias que já mais serão esquecidas.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Poema: Pedra dos Amadores II

    Por Pedro Ferreira Nunes   


É noite em Lajeado
Maria Lucia olhando pro céu
Lembra de tempos passados.

É noite em Lajeado
Dona Nelita na outra rua
Pensa no seu amado.

É noite em Lajeado
A criançada na rua
Correndo pra todo lado.

É noite em Lajeado
A mocinha apaixonada
Espera por seu namorado.

É noite em Lajeado
Um poeta solitário
Escreve versos apaixonado.

É noite em Lajeado
Na pedra dos amadores
Correndo dos homens fardados.

É noite em Lajeado
Na rua Paulino Marques
Seu Enoque sempre será lembrado.

É noite em Lajeado
Maria a vida passa de pressa
Mas o que é bom fica guardado.

Assista ao vídeo:Veja o video clicando aqui

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Mais um triste episódio do caos na saúde do Tocantins

 “Se você é capaz de se indignar contra uma injustiça cometida contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo, então somos companheiros.” 
                                                                                             Ernesto ‘Che’ Guevara

Por Pedro Ferreira Nunes

Que a saúde pública no Tocantins esta na UTI não é novidade, se fosse só por aqui o problema seria fácil de ser resolvido. Que a saúde privada, sobretudo dos planos de saúde não é lá essas coisas também não é nenhuma novidade. Por tanto nem pagando você tem a garantia de que terá acesso a um tratamento de qualidade.

Pobre Graciliano sentiu isto na pele com um grave problema no olho, sendo obrigado por tanto fazer uma cirurgia, pois se não correria o risco de perder totalmente a visão. Diante de um quadro em que não podia esperar por um milagre de ser operado pelo SUS, assim decidiu procurar uma clinica particular com a esperança de que poderia ter um atendimento decente (já que estava pagando). Pois em um país onde a saúde é tratada como mercadoria, isto é, quem paga tem. Era um direito seu já que estava pagando.

O local escolhido por Graciliano Carreiro e sua família foi a Clínica de Olhos Yano (localizada na 401 Sul, Av. LO 11, Conj 02, Lote 02. Palmas – TO) Onde fez a cirurgia com a Drª Susan Erika que havia lhe dado o diagnostico a cerca da necessidade da cirurgia pois se não realizasse a tal cirurgia Graciliano Carreiro perderia a visão por completo, e ainda afirmou ao paciente que com a cirurgia ela garantia que ele teria mais de 90% de chance de voltar a enxergar normalmente.

Diante disto Graciliano e sua família fizeram um grande esforço para juntar o dinheiro pedido pela médica (Cerca de R$3.500) para fazer a cirurgia temendo a perda da visão, inclusive sendo obrigado a se desfazer de alguns bens materiais para poder levantar todo o dinheiro, pois diante do diagnostico da Drª Susan Erika do risco de perder totalmente sua visão valia apena qualquer sacrifício. No entanto o resultado da cirurgia não foi o garantido pela médica, já logo após a cirurgia o paciente foi levado às pressas até um posto de saúde da capital, passando mal. Graciliano Carreiro perdeu totalmente a visão do olho operado, como também passou a sentir uma dor (que ele antes não sentia) no tal olho.

Com isso o paciente retornou varias vezes na clinica em consulta com a Drª Susan Erika com o objetivo de ver o que teria acontecido de errado. Pois é obvio que houve um erro já que a cirurgia na qual a medica dava mais de 90% de garantia não havia dado o resultado esperado e garantido por ela.

Na ultima consulta a Drª Susan Erika recebeu o paciente Graciliano e seus acompanhantes na clinica Yano sem lhes dar qualquer atenção, ao contrario, os mesmos foram recebidos de forma ríspida. Sem qualquer exame a médica mais uma vez falou da necessidade do paciente fazer outra cirurgia (agora no valor de R$ 7 mil), pois se não Graciliano perderá a visão por completo. Agora me respondam que confiança o paciente pode ter em tal médico ou em uma instituição que prometeu e não cumpriu anteriormente?

Indignados os familiares de Graciliano foram até a Clinica de Olhos Yano para ouvir as explicações da Doutora que desta vez recebeu a todos com uma postura amigável dando-lhes as devidas explicações – de que não havia ocorrido nenhum erro por parte dela, o que havia ocorrido é que a retina do paciente tinha descolado, pois o mesmo tinha vomitado muito após a cirurgia causando pressão sobre o olho operado.

‘A Drª Susan Erika tem razão’. Toda cirurgia tem risco, ela havia garantido apenas 90%, 10% podia dar errado e deu. Mas é claro um familiar de Graciliano assinou um termo de responsabilidade, dessa forma a clinica se resguardava de qualquer problema jurídico futuro.

Que importa para clinica se Graciliano Carreiro era um paciente de alto risco, idoso, com problema de pressão. Importante era convencê-lo fazer a cirurgia e receber o dinheiro pelo serviço. Se o serviço prestado não havia sido 100% garantido, problema de Graciliano que já havia pagado. Á clinica havia feito tudo de forma legal.

Pobre Graciliano mesmo pagando, não teve o serviço de qualidade que esperava. Foi ludibriado, maltratado, sentiu-se humilhado, mas o que poderia fazer? A lei os protege não é velho Graciliano? A lei sempre os protege.

Resta a Graciliano ficar com o prejuízo, assim como tantos outros, tantos outros casos que não vem átona. A nós que nos indignamos ‘diante de uma injustiça cometida contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo’ só nos resta denunciar para que outras vozes se levantem contra estes mercadores da saúde do povo. Por fim terminamos fazendo um chamado para que fortaleçamos as trincheiras da luta por uma saúde pública, gratuita e de qualidade.

Pedro Ferreira Nunes – é poeta, escritor, educador popular e bacharel em Serviço Social.