segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Contos interioranos

Kátia treck treck

Por Pedro Ferreira Nunes

- E ai Kátia quer dá um pega?! Vai lá.

- Eita João, você sabe que o Zé não gosta que você fuma maconha aqui, por causa dos meninos pequeno.

- Eu sei, mais ele tá para o trabalho e não vai chegar agora. Vai meu dá um pega. Só um peguinha.

- Hum eu não. Isso vai me deixar doida. Mais do que eu já sou. E o Zé não deve demorar muito não.

Kátia era discípula da esbornia. Gostava de tomar cachaça como poucos. Quanto mais, melhor. Dificilmente encontrava alguém que disputava com ela na cachaça. No entanto esse era o seu único vicio, além de um porronca (fumo de palha), mas outro tipo de entorpecentes não usava, sobretudo a tal da maconha que era comum por ali.

Ela não era contra, ao contrario, tinha muito amigos que gostavam da erva. Ouvia varias historias a cerca do efeito da maria joana, no entanto nunca havia visto nenhum comportamento condenável por parte dos seus amigos que fumavam maconha. Mesmo assim ela nunca sentiu vontade de dar um ‘tapinha’ num baseado. Porém naquele dia diante da insistência de João, Kátia sentiu-se tentada a experimentar.

- Só um tapinha meu. É de boa.

- Então tá.

- Puxa, prende e solta viu.

Kátia fez como João havia lhe orientado. Deu uns pega no baseado e ficou de boa. Pensou consigo:

- Isso não é o veneno que todo mundo fala não. Eu tô de boa. Tô de booooooa.

Mas de repente. Algo estranho começou a acontecer. Kátia virou a cabeça para o lado e escutou treck, virou para o outro treck.

- Meu Deus. Que diabos é isso? O que esta acontecendo comigo?

Todas as vezes que Kátia movimentava a cabeça ouvia um barulho no seu pescoço – treck, treck. Ela começou a desesperar.

- João, João você tá ouvindo, olha esse barulho no meu pescoço.

Kátia mexia o pescoço para que João ouvisse o barulho. Para ela todos podiam ouvir o Treck, treck. João percebeu que era a ‘viagem’ da erva e começou a sorrir da amiga. Kátia cada vez mais desesperada imaginava:

- Será que vou viver a vida inteira com esse barulho? Treck, treck.

Ao ver o desespero de Kátia que só aumentava João orientou-a a tomar um copo de leite para cortar o efeito da erva. Após tomar o copo de leite em alguns minutos aliviada Kátia percebeu que o treck, treck havia desaparecido.
Desse dia em diante Kátia que nunca sentiu-se atraída pela erva sagrada dos rastas. Nunca mais iria colocar um baseado na boca. Já pensou se o treck, treck voltasse?

- Não, isso não é para mim. Prefiro cachaça mesmo.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Poema: A Lua e o Sol


           Lá no céu eu vi a lua,     
      lá no céu eu vi o sol.
Não existe sol sem lua,
não existe lua sem sol.

Assim sou eu e você,
assim somos nós dois.
A gente se completa
como feijão com arroz.

Sem você eu não existo,
você existe sem mim?
Sem mim você existe?
eu não existo assim.

Assim como o sol não existe sem a lua,
eu não existo sem você.
Vê se deixa de besteira
e passe aqui pra me ver.

Do livro 'Minha poesia', por Pedro Ferreira Nunes

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

In mémoria do Poeta Manoel de Barros

A morte do Poeta

Por Pedro Ferreira Nunes

Hoje à tarde andando pelo cerrado

Encantado observava os pássaros em revoada.

De repente o tempo fechou

O céu escurecei

E assim do nada choveu.

E como choveu.

Mais tarde descobri

Que era a natureza do Lajeado
Chorando a morte do poeta Manoel de Barros.


Lajeado – TO. 13 de Novembro de 2014.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Cronica: Minutos que parecem horas, horas que parecem minutos.


Por Pedro Ferreira Nunes

Tem momentos das nossas vidas que sentimos que o tempo passa tão depressa, sobretudo quando estas são horas prazerosas – é como se o tempo voasse. Por exemplo, quando estamos ao lado da pessoa amada ou em um momento de diversão com nossos amigos.

Mas também a momentos de angustias onde as horas passam como se fossem minutos – por exemplo, quando o nosso time de futebol esta perdendo o jogo, ou quando precisamos chegar a um determinado lugar em certo horário e estamos atrasados, e foi uma experiência dessas que me fez querer escrever este artigo.

Estes dias precisei fazer uma prova de um concurso público em Palmas. Era um domingo e estava no Lajeado, para tanto precisava me deslocar 53 km ainda por cima dependendo de transporte público. Como sei que não é fácil conseguir um transporte em um dia de domingo para qualquer lugar do nosso estado, como também que não há muita solidariedade por parte dos motoristas que cortam nossas rodovias, decidi ir bem cedo para que não corresse qualquer risco de perder a prova.

No entanto ao chegar ao ponto de ônibus o tempo foi passando e nada do tão esperado transporte surgir na curva do Morro do Segredo. Cada minuto ali parecia uma eternidade, sobretudo por que eu não havia levado relógio ou celular e por tanto acabei perdendo a noção das horas. O ônibus não vinha e a certeza de que perderia a prova já era real. Comecei a sentir um grande ódio por perder todo o tempo que perdi estudando conteúdos insignificantes ou a grana da inscrição que daria para mim tomar muita cerveja.

Quase em total desespero pensei em me jogar no meio da rodovia, quem sabe um caminhoneiro não pararia para me dar uma carona ou qualquer outra alma caridosa. Mas não tive tanta coragem assim. Continuava na minha espera pelo ônibus que não vinha. Lembrava-me da máxima que diz – quando mais queremos uma coisa, mais ela demora de vir. Assim procurava pensar em outras coisas, cantarolar uns rocks, mas não tinha jeito.

Por tanto era melhor rezar para o tempo parar, olhava para o céu tentando decifrar que horas seriam. Mas infelizmente não herdei o dom do meu avô Chô que tem a capacidade de saber as horas apenas olhando para o sol.

Quando o meu desespero já estava no limite chegou uma menina que também iria pegar o ônibus para Palmas. Animei-me, sobretudo quando perguntei-a que horas eram.

- São 12h35.

- O que? 14h35? Por um momento achei que tudo havia se acabado. Como eu havia passado tantas horas ali? Eu achava que o tempo havia passado de pressa, mas o tempo havia passado mais de pressa do que eu imaginava.

- Não. São 12h35.



Que alivio. Afinal não havia muito tempo que eu estava ali, mesmo que o ônibus demorasse mais de uma hora ainda eu conseguiria chegar a tempo de fazer a prova. O alivio maior foi quando ela falou – é de agora em diante que os ônibus começam a passar e de fato dez minutos depois da chegada dela ali – o ônibus que esperei tão desesperadamente surgiu enfim na curva do Morro do Segredo. – Que minutos foram aqueles, pareciam horas.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Encontro da juventude do movimento popular tocantinense

“Lutam melhor, os que têm belos sonhos.”
Ernesto Che Guevara

Por Pedro Ferreira Nunes

Mistica de abertura
Era uma sexta-feira (31 de outubro de 2014), havia chovido o dia todo, o clima estava bom, ao contrario do calor excessivo que é comum por essas bandas. Que lugar lindo – a imensa cordilheira de serras a leste, a oeste o rio Tocantins, e em volta o nosso riquíssimo cerrado. Tantas árvores, tantos frutos e o canto dos pássaros então!Foi assim que vários jovens dos quatro cantos do estado do Tocantins – Bico do papagaio, sudeste, norte e centro chegaram a Fazenda da Esperança em Lajeado do Tocantins para participar do encontro da juventude do movimento popular tocantinense organizado pela Rede de Educação Cidadã.

Que felicidade é reencontrar vários rostos conhecidos, camaradas conhecidos em outras jornadas – abraços, beijos e muito bate papo. O bom também é conhecer novos rostos, camaradas que em três dias farão parte de nossas vidas por toda a eternidade. Quando encontramos com pessoas que compartilham dos mesmos ideais que nós, é como se conhecêssemos essa pessoa desde sempre. A empatia é instantânea, o carinho e o amor que sentimos um pelo outro também.

Mas o que estes jovens que vieram de tão longe como, por exemplo, Taguatinga, Porto Alegre, Nova Olinda, Jalapão estão fazendo ali? O que querem? O que procuram? O que os movem? O objetivo desses jovens não a diversão, fazer turismo, conhecer as belezas naturais do local, não. O objetivo desses jovens sem terra, indígenas, quilombolas, estudantes, do campo e da cidade é discutir o preconceito, a exclusão e a luta da juventude por igualdade social.

A juventude do movimento popular tocantinense não tem tido motivos para festejar, a conjuntura não esta fácil. Os governos de plantão não defendem as bandeiras da juventude.
- Não basta falar dos jovens, é preciso falar com os jovens!

- Precisamos nos organizar e nos formar para enfrentar os ataques aos direitos da classe trabalhadora!

Trabalho em grupo
Os desafios são muitos, mas o entusiasmo e o fervor revolucionário dessa juventude mostra que ela esta a altura dos desafios colocados.

- Precisamos fortalecer e trazer mais gente para nossas fileiras!

E assim segue o nosso encontro com muito debate, reflexões e questionamentos da conjuntura regional e nacional bem como os desafios para juventude no próximo período.

- Kátia Abreu no Tocantins, Ronaldo Caiado em Goiás, José Serra em São Paulo, Tarso Jereissati no Ceará, Bolsonaro no Rio. Não nos iludamos temos um congresso mais conservador o que vai ao contrario do interesse da juventude que é rebelde por genética.

O nosso encontro continua com um debate enriquecedor, mas também com muita musica, dança e poesia. A troca de experiência com os internos da Fazenda da Esperança nos dá total convicção que a questão das drogas deve ser tratada como uma questão de saúde pública e não de policia.

Momento de lazer
Nos intervalos contemplamos as belezas do local, tomar um banho no rio Tocantins, andar pelo cerrado. Até mesmo jogar futebol com o clássico entre “Os com camisas X descamisados”. Ou então jogar vôlei. A noite tem Sarau com a juventude mostrando todo o seu talento com muita musica, dança e poesia – Súcia e Hip hop, Forró e Rock, o que não falta é diversidade, aliás, essa é a nossa identidade.

- Por que ainda existe tanto preconceito? Racismo, machismo, homofobia? Por que não respeitar a diversidade do nosso povo que é tão rica?

A juventude precisa ser ouvida, lutemos para que tenhamos nossos direitos garantidos. Direito a educação de qualidade, a saúde, a cultura, ao esporte. Direito de poder se expressar, de vestir-se como quiser, de ouvir o que quiser. Assim conclamamos por políticas públicas que garanta os direitos dos jovens.

Por fim chegamos ao ultimo dia do nosso encontro. É hora de avaliar a caminhada, no que avançamos. O que é preciso fazer para que avancemos ainda mais. Pela animação de todos e a disposição de luta é fato que o encontro foi um sucesso. Só pelo fato de juntar quase 50 jovens das quatro regiões do Tocantins, de diversos movimentos populares para discutir sobre a conjuntura nacional e regional, sobre os desafios da juventude tocantinense no enfrentamento do preconceito e da exclusão bem como na busca pela igualdade social foi mesmo um grande sucesso. Mas é obvio que sempre podemos avançar ainda mais.


Chega o momento de nos despedimos dos velhos amigos e dos novos que fazemos. Então


jogamos nossas mochilas nas costas e pegamos a estrada para nossas casas. Mal nos separamos e não podemos deixar de sentir saudades de seres incríveis – Do bom embate, das reflexões, dos questionamentos, da boa convivência. Mas nos anima o fato de saber que um dia nos encontraremos nas trincheiras da luta de classes do nosso maiúsculo Tocantins. 

Fazenda da Esperança. Lajeado-TO, 02 de Novembro de 2014.