segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Fazenda Liberdade

Fazenda Liberdade

- Olá, tudo bom?! Vocês sabem quem quer ir trabalhar no roçado em uma fazenda na região de Miranorte? A gente paga bem e damos toda estrutura para quem for.

Miro não era morador daquela cidade, mas já tinha sido visto outras vezes por ali como também em outras pequenas cidades do interior do Tocantins, sempre procurando trabalhadores para trabalhar em fazendas do seu patrão – um dos maiores latifundiários do país, mas que ninguém se quer sabia o nome, só sabiam que era um político de renome nacional.

Miro sabia que não era difícil encontrar gente para trabalhar nos latifúndios de seu patrão por ali. Já que não era fácil arranjar trabalho nas pequenas cidades do interior, há não ser nas fazendas. E por tanto se não quisessem morrer de fome os trabalhadores tinham que migrarem para os grandes centros do país ou então submeter-se a dura labuta nas grandes fazendas.

Ele sabia até onde encontrar os trabalhadores – era só ir até o bar pioneiro no centro da cidade, próximo ao pé de pequi na praça cinco de maio que lá estaria um monte deles tomando cachaça e jogando sinuca, pois na falta do que fazer era assim que eles passavam o tempo.

João e Raimundinho que estavam ali logo se interessaram pela proposta. Não estava sendo fácil a vida para eles em Lajeado, não tinha trabalho e por tanto estavam com extrema dificuldade para manter suas famílias. Eles conheciam como era o duro trabalho no roçado, mas se não tinha alternativa era preciso agarrar o que viesse.

- Quanto tempo é de trabalho? E a diária?

- Bom, trabalho lá é para uns três meses. Masa gente trás vocês de quinze a quinze dias para visitar suas famílias. A diária é de 50 reais.

- E então Raimundinho, cê topa? Eu topo.

- Se você vai, eu também vou.

- Tá certo, a gente vai então.

- Ótimo. Vocês não sabem mais de uns três para ir com a gente não?

- A gente vai ver, ai ti falamos.

- João, eu acho que o Lazão, o Neguim e o Zezim topam.

- É mesmo.

- Vocês sabem onde eles estão para eu ir falar com eles?

- Sim, vamos lá. Disse João.

Tudo combinado agora era se despedir das mulheres, dos filhos, dos amigos e seguir rumo à fazenda liberdade na região de Miranorte do Tocantins. Doía-lhes no peito ter que abandonar seus familiares para ir trabalhar tão longe, mas carregavam nas mochilas a esperança de retornarem em breve para junto deles com grana para pagar o mercado e o aluguel que já estava alguns meses atrasados. Além do mais, Miranorte não era assim tão longe de Lajeado.

A caminhonete seguia estrada adentro pela zona rural de Miranorte, já estavam algumas horas viajando e nada de chegarem ao tão aguardado destino. Cada vez que iam se adentrando rumo à fazenda liberdade, eles percebem que estavam cada vez mais distante de qualquer civilização. Na carroceria da caminhonete João, Raimundinho, Lazão, Neguim e Zezim olhavam-se já demostrando preocupação – pois logo perceberam que ficariam num lugar bastante isolado, bem distante da cidade e de qualquer povoado sendo impossível, portanto se deslocar dali há não ser de carro.

Eles já eram acostumados trabalhar na roça, porém sempre trabalhavam em fazendas no entorno da cidade onde moravam e que pertenciam a pessoas que moravam ali. Agora pela primeira vez eles se deslocavam para trabalhar em um lugar tão distante em terras de pessoas que eles se quer conheciam. Mas estava feito. Eles haviam aceitado o convite e já estavam quase chegando à fazenda. Agora era trabalhar e rezar para que tudo desse certo.

João sentia uma forte angustia no peito, estava arrependido de ter aceitado o convite para trabalhar ali, mas agora não havia volta era preciso encarar o trabalho duro e dar forças para seus outros companheiros que o tinham como um exemplo de homem forte e destemido.

Era quase noite quando enfim a caminhonete chegou na sede da fazenda. Todos cansados perguntaram:

- Chegamos?

- Na fazenda a gente já chegou faz horas. Mas é aqui que iram passar a noite. Aqui é a sede da fazenda, onde mora a gerencia e os patrões ficam quando vem aqui.

Os amigos se olharam pensando o tamanho que era aquele latifúndio sendo que eles andavam há varias horas dentro dele de carro.

- A gente vai ficar onde Miro?

- Vocês ficaram em um alojamento mais próximo de onde irão trabalhar. Por tanto tomem um banho, comam bem e depois vão dormir que amanhã 05h da manhã nós levaremos vocês de carro até o local do trabalho.

Bem cedinho todos já estavam de pé pronto para irem para o roçado.

- Bom, vocês ficaram aqui nesse alojamento. Vocês se viram para fazer a comida de vocês. Se precisarem de alguma coisa fala comigo ou com o Chicão que nós damos um jeito, é claro que depois descontaremos dos salários de vocês.

O alojamento era um barracão de palha sem nenhuma estrutura no meio de uma mata isolada bem distante da casa sede da fazenda.

João, Raimundinho, Lazão, Neguim e Zezim não gostaram do que viram.

- Mas Miro, não foi isso que a gente combinou!

- Bom, vocês não vieram passear aqui não, vocês vieram foi trabalhar. E cuidem logo se não vocês não recebem não.

Subiu um ódio por dentro de João, uma vontade de avançar em Miro e lhe dar uma cossa, mas percebeu que além de Miro, o tal Chicão e outros dois peões estavam armados.

Raimundinho percebendo a raiva de João, procurou acalma-lo:

- Tá certo, a gente veio aqui para trabalhar. Então vamos lá.

- Estão vendo esta mata ai? É para derrubar toda por que iremos fazer pasto pra gado.

E segurando no cabo da arma falou:

- Ninguém sai daqui enquanto não acabar o serviço viu?!

Em seguida saiu acompanhado de Chicão, mas deixou dois peões armados vigiando os amigos no roçado.

- Para que essa gente armada nos vigiando? Nós não somos bandidos! Falou Zezim indignado.

- Deixa pra lá que nós só vamos trabalhar quinze dias aqui e não voltaremos mais. Comentou Raimundinho.

- E você acha mesmo que ele vai cumprir a promessa de nos levar em casa de quinze em quinze dias? Ele não cumpriu as outras promessas, também não irá cumprir essas. Vão forçar a gente a trabalhar até terminar o roçado e Deus sabe o que eles faram com a gente, se ainda deixaram voltarmos pra casa. Respondeu João incrédulo.

- Vira essa boca pra lá camarada. Tá amarrado em nome de Jesus.

- A gente tem que arrumar um jeito de fugir daqui se a coisa continuar desse jeito.

- Como faremos isso. Você não viu a distancia que nós estamos de Miranorte? Além do mais por que você acha que esses caras estão armados nos vigiando?

- Deixem de conversa e vão trabalha cambada. Gritou de longe os jagunços armados.


- Vamos trabalhar, o que não nos faltará é tempo para gente pensar o que fazer para sair dessa enrascada. De uma coisa eu sei, minha mãe não me criou para eu ser escravo de ninguém. A gente dará um jeito de sair daqui. Disse João.

* Do livro 'A morte do Socialismo' de Pedro Ferreira Nunes.

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