segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Um poema pessimista ou Como diria Schopenhauer

Pessimista

Nada que esteja ruim
que não possa piorar.
Não há Deus que nos acuda
não adianta rezar.

Nada que esteja ruim
que não possa piorar.
Encher a cara de cachaça
Não irá ti ajudar.

Nada que esteja ruim
que não possa piorar.
Não adianta se esconder
Eles irão ti achar.

Nada que esteja ruim
que não possa piorar.
Com esse bando de fascista
não tem como conversar.

Nada que esteja ruim
que não possa piorar.
Não se iluda camarada
o pior ainda virá.

Pedro Ferreira Nunes
Casa da Maria Lúcia. Lajeado-TO. Lua Cheia, Inverno de 2019.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Lajeado: Análise do resultado da eleição suplementar e perspectiva para 2020.

No último texto que escrevi sobre a conjuntura política em Lajeado, onde pontuei que dificilmente o resultado da eleição suplementar seria outro se não a vitória de Júnior Bandeira e José Edival  (PSB/MDB). Concluía chamando atenção para o quanto esse resultado afetaria as eleições regulares em outubro de 2020. Agora concluído o pleito suplementar podemos refletir melhor sobre esse ponto e a partir dos números revelados pelas urnas projetar alguns cenários possíveis. Eis portanto o que pretendemos fazer nas linhas a seguir.

A afirmação de que dificilmente Júnior Bandeira e José Edival não seriam eleitos na eleição suplementar não foi fruto de um exercício de adivinhação ou previsão astrológica. Mas de uma análise da realidade lajeadense onde se percebia claramente um descontentamento da população com a gestão Tércio Neto marcada pela falta de planejamento e retrocessos em diversas áreas, sobretudo, a educacional, cultural, assistência social, infraestrutura e segurança. 

Somado a isso, Júnior Bandeira e José Edival tiveram maior capacidade em fazer alianças e atrair apoios. Já Tércio sem a máquina pública na mão, não conseguiu manter seu grupo político coeso e viu vários aliados rumar para apoiar seu principal adversário. Restou portanto aos poucos que permaneceram fiéis ao prefeito cassado (com sua desistência de disputar a eleição suplementar) apoiar Toninho da Brilho (PSL) – uma figura oportunista que caiu de paraquedas na política lajeadense pretendendo surfar na onda bolsonarista – tendo no currículo a passagem por diferentes partidos e já tendo sido candidato outras vezes em diferentes municípios.

Durante a campanha percebia-se por parte da população um forte anseio por mudanças. E nesse pleito quem representava a mudança era a dupla Júnior Bandeira e José Edival – ainda que uma mudança para algo que a população já conhece pois afinal de contas Júnior Bandeira esteve por 8 anos (2000 á 2008) á frente da prefeitura municipal de Lajeado. Diante disso pode-se afirmar que a população preferiu apostar em alguém já conhecido do que se arriscar numa incognita. Se essa decisão foi acertada ou não a população terá já em outubro de 2020 a oportunidade de retifica-la.

Vitória de Júnior Bandeira e José Edival

Diante de todo o contexto (ressaltado acima) que se deu a eleição suplementar era bastante previsível que a vitória seria da coligação encabeçada por Júnior Bandeira e José Edival. Inclusive, era previsível que seria por uma margem de diferença significativa. Ainda mais com a desistência do então candidato Tércio Neto (PSD). E isso se confirmou quando as urnas foram abertas e se revelou que Júnior Bandeira e José Edival conquistaram 77,08% (1.779 votos) do eleitorado que compareceu para votar. Para se ter uma idéia do tamanho dessa vitória, se somassemos os votos obtidos por Toninho da Brilho (PSL) 396, mais os brancos 42, os nulos 91 e as abstenções 732, chegaríamos a 1.261. E  mesmo assim não se alcançaria o número de votos obtidos por Bandeira e Edival. Trata-se por tanto de uma vitória inquestionável com a maioria absoluta do eleitorado lajeadense.

Pode ter sido maior

Talvez esse número de abstenção (732) não seja real. É em grande medida reflexo de uma prática condenável que é a transferência de títulos de eleitores de pessoas de outros municípios para votar num determinado candidato de um determinado município. A operação “Colheita” da Polícia Federal revelou que isso ocorreu nas eleições de 2016 em Lajeado. Isso ficou tão evidente que o número de eleitores era maior que o número de habitantes segundo o IBGE. Essa distorção ao que parece não foi corrigida. De modo que o número real de eleitores em Lajeado está mais próximo dos 2.308 que compareceram na eleição suplementar do que dos 3.040 registrados no TRE. O que também pode ter contribuido para esse número expressivo de abstenções foi o fato de não ter havido uma disputa mais acirrada entre os candidatos – havia um sentimento de que a eleição já estava decida a favor do Júnior Bandeira e José Edival e portanto um voto a menos ou a mais não adiantaria. Há também aqueles que estão descrentes com a política e preferem se manter alheios a esses processos. Mas de qualquer forma se as abstenções tivesse sido menor, assim como os votos nulos e brancos, o resultado final não seria diferente. De modo que esses fatores mostram que a vitória do Junior Bandeira e do José Edival foi muito maior do que mostra os números revelados pelas urnas.

Isso não significa que Júnior Bandeira e José Edival sejam imbatíveis

De forma alguma. Em política não existe esse negócio de imbatível. Até por que esses números poderiam ser muito diferente se a oposição tivesse sido um pouco mais inteligente e apostado num nome mais expressivo – conhecido da população e com uma história mais ligada á Lajeado. Ao invés disso, com a desistência do ex-prefeito Tércio Neto, acabaram apostando numa figura inespressivel na política lajeadense, que ainda assim conseguiu quase 400 votos. Com um nome mais competitivo, com uma história em Lajeado, poderiam ter obtido uma votação mais expressiva. Mas nem tudo está perdido, esses 396 votos são poucos, mas é uma base a partir da qual se pode partir para consolidar um grupo oposicionista – um grupo com capacidade de atrair mais gente e fazer frente ao grupo no poder. É importante salientar que em outubro estarão em disputa,  além do cargo de prefeito e vice, as noves vagas na Câmara de Vereadores. De modo que a oposição precisará de uma chapa majoritária competitiva se quiser, se não vencer o pleito, pelo menos eleger um número considerável de Vereadores. Se repetir o mesmo desempenho da eleição suplementar o resultado na eleição de Veradores será decepcionante.

Construção de uma candidatura oposicionista forte

A oposição se quiser fazer frente ao atual grupo político no poder terá a missão de se unificar em torno de uma única candidatura. Pois quanto mais dividida for, em duas ou mais candidaturas, mais fragmentará seus votos e menos chance terá de sair com a vitória. Essa candidatura pode ser do próprio Toninho da Brilho (PSL) que apesar da derrota na eleição suplementar conseguiu se apresentar para população lajeadense e por tanto já não é um completo desconhecido. Ou então do ex-prefeito Tércio Neto (PSD) que ao desistir da disputa na eleição suplementar apontou para intenção de participar das eleições de outubro de 2020. Ou teriam outro nome com capacidade maior de se apresentar a população lajeadense e crescer como alternativa junto ao eleitorado? Quem sabe da Leidiane Mota (PSD) que por enquanto é a única da oposição que está ocupando uma cadeira na Câmara de Veradores?! Independente do nome que será escolhido, o principal desafio da oposição será construir uma única candidatura alternativa com capacidade de atrair os dissidentes do grupo no poder, que poderão surgir a medida que seus interesses forem sendo contrariados, e se apresentar como uma alternativa real ao eleitorado.

O desafio da situação

Ao contrário da oposição,  os nomes para disputa de prefeito e vice-prefeito pela situação estão praticamente definidos (Júnior Bandeira (PSB) e José Edival (MDB) – prefeito e vice respectivamente) sobretudo após a vitória na eleição suplementar. Agora o que lhes restam é  fazer uma boa gestão nesses meses que antecedem ao pleito eleitoral – serão 9 meses e alguns dias em que não se poderá errar. Precisaram também manter as alianças construídas na eleição suplementar – o apoio de 8 dos noves vereadores atuais e de lideranças políticas como Márcia Reis, Leônidas Correia entre outros. E isso não será fácil, pois quando se faz um leque muito grande de alianças, sobretudo em torno de projetos pessoais, a tendência de haver rupturas não são poucas. E a história politica de Lajeado está cheia desses exemplos – de pessoas que estavam num determinado lado e de repente mudaram. Júnior Bandeira e José Edival conseguiram unir diferentes figuras que estavam em campos opostos num mesmo palanque. Mas a pergunta que fica é: conseguiram manter essa união? Isso dependerá de três elementos: Primeiro, atender os acordos firmados; Segundo, fazer uma boa gestão; Terceiro, manter a oposição desarticulada – garantir os acordos firmados mantém um ambiente favorável para uma boa gestão e também evita o fortalecimento da oposição. Se os acordos não são mantidos quem ganha é a oposição e o ambiente para governar passa a não ser tão favorável assim. Tércio Neto durante o seu governo deu uma aula de incompetência nesse sentido – e o maior exemplo foi sua relação conflituosa com o legislativo municipal.  Já Júnior Bandeira é um político mais experimentado e sabe o quanto foi difícil retornar a prefeitura de Lajeado devido aos erros que cometeu nas suas gestões anteriores. E repetir esses erros novamente será fatal para suas pretensões políticas futuras.

A disputa pelas 9 vagas na Câmara de Vereadores

Dependendo de como a oposição, mas sobretudo a situação conseguir enfrentar os seus desafios, a disputa mais acirrada em outubro de 2020 será pelas 9 cadeiras no legislativo lajeadense. Os que lá já estão buscarão serem reconduzidos para mais quatro anos. Alguns que lá já estiveram tentaram voltar. E outros tantos tentarão ser eleitos pela primeira vez. De modo que será muito candidato para pouca cadeira, o que fará com que aja uma grande disputa entre esses. Nessa disputa as famílias tradicionais saem na frente e em seguida vem aqueles que tem capacidade econômica para investir na candidatura (empresários sobretudo). Com isso o espaço para renovação fica bastante reduzido – ainda que aja um descontentamento com o atual parlamento,  assim como havia com o anterior. No final das contas a população acaba pendendo para nomes tradicionais da política lajeadense ou apadrinhados políticos desses. Óbvio, nunca é tarde para quebrar esse ciclo. Nos resta portanto esperar para ver se surgiram candidaturas com essa capacidade de fazê-lo.

Apoio de líderes estaduais

Eis ai outro fator que poderá contribuir para uma polarização maior nas eleições municipais em Lajeado. Esse apoio é estratégico sobretudo para quem pretende ser candidato em 2022 á governador, senador e deputado federal ou estadual. Para esses é importante ter um grupo forte como base de apoio para conseguirem o maior número de votos possível. E geralmente o grupo mais forte é quem está com a prefeitura na mão e tem a maioria das cadeiras no parlamento municipal. Já para os grupos locais o apoio dos lideres estaduais injeta um animo maior em suas campanhas. De modo que é vantagem tanto para os grupos locais como para os lideres estaduais. E sendo importante para ambos, esses apoios com certeza virão. E a magnitude desses apoios dependeram das articulações que seram feitas.

Conclusão

Lajeado passa a ter na sua curta história uma eleição suplementar – o que não é motivo de orgulho, pois uma eleição suplementar significa que o jogo democrático no município não ocorreu como deveria – houve desvios, corrupção de agentes públicos que levou a cassação e a inelegibilidade desses. Isso é por tanto uma mancha na história politica do município. Mas que pode contribuir para que o que ocorreu não venha ocorrer novamente pois quem está no poder pensará duas vezes antes de cometer algum ilícito que pode levar a sua cassação. O TRE, apesar da demora, tem demonstrado uma tendência mais rigorosa em punir quem utiliza a máquina pública para se manter no poder a qualquer custo.

Com a eleição suplementar a população teve a oportunidade de ir as urnas para definir quem administrará o munícipio até o final de 2020. E a maioria absoluta do eleitorado lajeadense optou por votar numa figura conhecida da política local – o advogado Júnior Bandeira que comandou a cidade entre 2000 e 2008. A não ser que aconteça algum imprevisto, Bandeira será o candidato natural á reeleição em outubro de 2020, para um mandato de quatro anos. Já a oposição terá a difícil tarefa de catar os cacos que sobraram e se reconstruir para apresentar uma candidatura alternativa ao candidato da situação.

Para o bom andamento do jogo democrático esperamos que aja sim uma oposição em Lajeado, não só nas disputas eleitorais mais no dia a dia fiscalizando e apontando os limites da situação. Ter uma oposição é importante para baixar a bola do grupo no poder – que tende a se acomodar se não for cobrado. Óbvio, essa cobrança deve partir de toda a população. Mas a oposição tem a missão de liderar esse processo. Por tanto é importante para cidade ter uma oposição, não uma oposição qualquer, mas uma oposição programática que aponte para possibilidade de um novo modelo de sociedade baseado no bem comum – essa oposição com certeza não será representada por Tércio Neto, Toninho da Brilho, Leidiane, Adão Tavares ou Manoel das Neves.

Em outubro de 2020 os lajeadenses também irão escolher seus novos representantes no parlamento municipal, podendo também optar por manter os que lá já estão – que buscarem a reeleição. E essa será provavelmente a disputa mais acirrada nesse pleito eleitoral (não faltaram candidatos querendo usufruir da “vida boa de parlamentar” – muitas benesses e pouco trabalho). Alguns como os vereadores Emival Parente e Edilson Mascarenhas já estão lá há vários mandatos. Outros as mudanças é só nos nomes, já os sobrenomes parecem ter cadeira vitalícia que vai passando de geração em geração. É importante haver renovação para que não aja acomodação do parlamento. Se essa renovação ocorrerá ou não dependerá da população.

Sim, a população. Não poderíamos concluir de outra forma se não falando da importância da população para definição do rumo que Lajeado irá tomar – o rumo de uma cidade que desenvolve seus potenciais para dar condições digna de vida para todas e todos que aqui vivem – protegendo seu patrimônio natural e promovendo justiça social? Ou uma cidade que aprofunda as desigualdades privilegiando uma minoria abastada? No “discurso sobre a origem da desigualdade” o filósofo Jean-Jacques Rousseau diz que “os cidadãos só se deixam oprimir na medida em que são arrastados por uma cega ambição”, o que faz com que abram mão de suas liberdades. Se não agissem assim nem o político mais hábil conseguiria sujeita-los. Diante disso podemos dizer que o rumo que Lajeado seguirá,  dependerá da postura dos seus cidadãos – se será a postura de indivíduos que não abre mão da sua liberdade ou de indivíduos submissos.

Por Pedro Ferreira Nunes –  Educador e Escritor Popular. Cursou a faculdade de Serviço Social e Licenciou-se em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. Autor entre outros de “Breve história de Lajeado do Tocantins” e “Estudo sobre o agronegócio tocantinense e seus efeitos econômicos e sociais”.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Como Raul dizia!


“...quem não tem visão bate a cara contra o muro”.
Raul Seixas

Já se vão 30 anos que Raul embarcou com o moço do disco voador  rumo a outras estrelas. E nessa data especial não poderia deixar de escrever algumas palavras sobre o nosso maluco beleza. Ainda mais no contexto político que vivemos onde a obra do Ralzito se converte numa espécie de manual de resistência contra o autoritarismo. Destaquemos por tanto alguns pontos desse manual.

1- Não ao discurso moralista;

O discurso moralista é aquele que tenta nos impor determinados valores de como devemos agir – valores que diminuem a nossa potência de agir pois são forjados em afetos como o medo e o ressentimento. Contra qualquer tipo de imposição Raul canta a “sociedade alternativa” onde o princípio da noção ação é o nosso querer (“se eu quero e você quer”) e não o que determina quem quer que seja, inclusive Deus. Raul, aliás, diz que “não existe Deus se não o homem”. Por tanto não dê ouvidos aqueles que usam Deus como álibi para lhe aprisionar.

2- Não ao ódio, viva o amor;

E “o amor só dura em liberdade” como cantou Raul em “a maçã”. Poderíamos dizer portanto que sem liberdade não há amor e sem amor não há liberdade – liberdade para amarmos quem e quantos quisermos. Seja homem, seja mulher, gays,  lésbicas, travestis, transgeneros e etc... Aliás o gênero não devia importar como importa tanto para os fundamentalistas cristãos – estes os propagadores do ódio – o que devia importar é se há amor ou não nas relações. Havendo amor não há espaço para o certo e o errado.

3- Não a discriminação; 

Em “meu amigo Pedro” nosso maluco beleza canta “...não me critique como eu sou. Cada um de nós é um universo, Pedro. Onde você vai eu também vou”. Vivemos numa sociedade em que alguns se acham no direito de dizer quem é de bem e quem não é – quem merece viver ou não. Uma sociedade em que alguns se acham superiores aos demais devido a cor da pele, devido ao seu lugar de origem e por ai vai. Raul nos chama a respeitar as diferenças e ressalta que no final das contas teremos o mesmo destino.

4- Se queres respeito, respeite;

Raul nos ensina que o respeito é uma via de mão dupla. Por isso ele cantou em “sapato 36” o verso “você só vai ter o respeito que quer na realidade, quando conseguir respeitar a minha vontade”. O que consiste em dizer que para termos respeito devemos dar respeito, pois se não damos respeito não recebemos respeito. E quando não há respeito parte-se para o autoritarismo como via de se impor. E no terreno do autoritarismo prevalece o medo como elemento de dominação. E onde há dominação não há liberdade. E para Raul não devemos abrir mão da liberdade.

5- Não ao antiintelectualismo;

“Já tá tudo armado, o jogo dos caçadores canibais” é uma das frases da canção “Metrô linha 743” onde o Raul nos alerta para a perseguição  à aqueles que pensam – para o antiintelectualismo. Os regimes autoritários não gosta de pessoas que pensam, mas que se submetem aos interesses de quem está no poder. Portanto é preciso estar atento para não cair nas mãos do exército de seguidores á serviço desse tipo de regime. Mas renunciar a pensar já mais. 

6- Não a autoridade militar;

Na canção “Mamãe eu não queria” uma das frases mais emblematicas é: “não quero bater continência nem pra sargento, cabo ou capitão”. Aqui temos uma repulsa á autoridade militar. Raul nos ensina que não devemos nos submeter a quem quer que seja. Sobretudo a estes senhores que se acham o dono da verdade e acreditam poder controlar o que pensamos e o que fazemos. Em tempos onde grupos pedem o retorno da ditadura militar e que temos um capitão reformado do exército na presidência da República (que defende o legado desse regime) o recado do Raul, nessa canção especificamente, é fundamental. 

7- Resistir, lutar e vencer;

As coisas mudaram camaradas, mas para tanto precisamos resistir e lutar, pois é através da nossa resistência e luta que venceremos o autoritarismo e o fundamentalismo. Para tanto precisamos aprender que somos mais forte que qualquer regime que limita a nossa potência de agir. Esse é mais um dos ensinamentos do nosso maluco beleza que cantou em “rockxe” – “você é forte, faz o que deseja e quer. Mas se assusta com o que eu faço, isso eu já posso ver. E foi com isso justamente que eu vi. Maravilhoso, eu aprendi que eu sou mais forte que você...”. Sim, nós somos mais forte que eles, mas infelizmente nos falta consciência dessa força, ou pior, temos consciência da nossa força, mas por medo ou covardia, deixamos que nos domine. Raul nos instiga agir na contramão do que nos impõem. 

8- Se não pode com eles....;

Um dito popular diz: - junte-se a eles. Não para o Raul – para o nosso maluco beleza devemos ser a mosca na sopa deles. Devemos incomoda-los, fazer com que não tenham um sono tranquilo, que não tenham uma vida fácil. Que saibam que mesmo nos matando, outros tantos viram no nosso lugar para continuar incomodando. Por tanto sejamos a mosca que perturba 24h os propagadores do discurso do ódio  (autoritários e fundamentalistas).

Concluimos dizendo que nunca foi tão necessário celebrarmos a memória do nosso maluco beleza – um provocador nato, um filósofo verdadeiro. Nunca foi tão necessário gritarmos aquele bordão conhecido nos bares de Norte a Sul desse país: - Toca Raul!!!

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. 

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

A Fazenda Primavera e a Contrareforma Agrária do Governo Bolsonaro

“Quem diz não estar de lado nenhum, mas do lado do Brasil, não está dizendo a verdade: o Brasil não tem lado no conflito agrário, por que é impossível realizar uma reforma que atenda ao mesmo tempo quem quer a concentração e quem quer a desconcentração da propriedade rural”.
Plínio de Arruda Sampaio 

Quem minimamente conhece a luta por reforma agrária no Brasil sabe que essa é uma bandeira marcada por muito suor e sangue – não são poucos os exemplos daqueles que tombaram na luta contra o latifúndio e pela democratização da terra nesse país. Mas a luta continua exigindo enormes sacrifícios daqueles que resistem em barracas de lonas nas margens das rodovias dessa imensa nação. 

Se nos governos comandados pelo PT (Lula/Dilma) não tivemos grandes avanços no campo da reforma agrária. Não há nenhuma ilusão que no governo Bolsonaro seja diferente, pelo contrário. Se antes, mesmo com toda morosidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) conseguia-se a desapropriação de algumas áreas e a implantação de projetos de assentamentos de famílias sem terra. Agora o órgão vem sendo utilizado não mais com o objetivo de promover a política de reforma agrária no país, mas para barrá-la. Se tornando portanto um instrumento da Contrareforma Agrária do Governo Bolsonaro. 

É o que percebemos ao analisar o processo de desapropriação da Fazenda Primavera (Vera Cruz) no município de Carmolândia (TO). Onde o próprio INCRA, isso mesmo, o INCRA entrou na justiça para barrar o processo de desapropriação da área – com a justificativa de que não tem disponibilidade orçamentária para tanto. Ora, o proprietário da área entrar na justiça para barrar o processo não é novidade, mas o INCRA que deveria promover a política de assentamentos em áreas que não estão cumprindo sua função social, é inaceitável. É o Estado se negando a cumprir o seu dever constitucional.

É evidente que não é por questões orçamentárias, mas ideológica que o Governo Bolsonaro através do INCRA vem se recusando a cumprir o seu papel. A ideia do governo é enfraquecer mais ainda os já fragilizados movimentos de luta pela terra. Mas nessa guerra ideológica quem paga a conta são as famílias de sem terra que vivem na miséria e sonham com um pedacinho de chão para poder produzir alimentos para sua subsistência e para nação. Pois afinal de contas quem é que abastece majoritariamente a mesa do brasileiro se não a pequena agricultura?!

No caso da Fazenda Primavera (no município de Carmolândia) o Ministério Público Federal questionou a alegação do INCRA e afirmou que o requerimento do órgão demonstra uma “nítida omissão no seu dever de promover a devida reforma agrária”. E que isso trás enormes consequências para as famílias que estão numa situação de vulnerabilidade social. O Ministério Público também ressalta que “A paralisação do processo de reforma agrária nesta etapa, após o dispêndio de recursos para a sua efetivação,  pode também consistir em ato de improbidade administrativa”. 

Nessa etapa os técnicos já deram parecer de que a área não está cumprindo a sua função social. De modo que como define a Constituição Federal no seu artigo 184: a União tem o dever de “desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária... mediante prévia e justa indenização”. Eis aí um ponto importante que é preciso deixar claro. Pois já ouvi algumas vezes o seguinte argumento: - Sou a favor da reforma agrária, desde que o dono da área desapropriada seja indenizado e as famílias que forem assentadas de fato utilizem a terra para produzir. Ora, não existe nenhuma lei que permite a desaproprição de áreas sem a indenização do proprietário. E se algumas famílias depois de assentadas vendem a área ou transformam em outra coisa (área de lazer, por exemplo), a falha é do INCRA que não fiscaliza.

Por tanto, isso não pode servir de justificativa para que o governo não execute a politica de reforma agrária estabelecida pela constituição federal de 1988 – que na sua essência nem dá para chamar de reforma agrária de fato – pois uma reforma agrária que não muda a configuração agrária do país, caracterizada pela grande concentração de terra, não é reforma agrária. Pelo menos não uma reforma agrária que rompa com a estrutura agrária do país, mas que nas palavras de Plínio de Arruda Sampaio  (2009) busca sobretudo “humanizar o capitalismo agrícola e a preservar o meio ambiente”.

O caso da Fazenda Primavera não é um caso isolado (O que corrobora com a nossa tese de que se trata de uma politica de contrareforma agrária em curso no país) como mostra levantamento do grupo de trabalho da reforma agrária do Ministério Público Federal (MPF) que apontou vários casos nesse sentido. Tanto que foi necessário fazer uma recomendação ao INCRA para que revogue ou deixe de publicar resoluções que trata da desistência de desapropriação de áreas para implantação de projetos de assentamentos, cancelamento de títulos de dívida agrária ou arquivamento de processos administrativos que trata sobre essas questões. 

No entanto não há que se ter nenhuma ilusão de que tal recomendação será acatada por esse governo hostil as causas populares, especialmente as causas dos povos do campo – indígenas, quilombolas e camponese pobres. Sobretudo por que como alertou Plínio de Arruda Sampaio  (2009), “é impossível realizar uma reforma que atenda ao mesmo tempo quem quer a concentração e quem quer a desconcentração da propriedade rural”. Não há nenhuma dúvida que o Governo Bolsonaro quer a concentração – se possível ainda maior do que temos hoje avançando sobre territórios já conquistados pelos povos tradicionais. E nós que defendemos a desconcentração o que faremos para barrar essa Contrareforma agrária?

Acerca dessa questão, Plínio de Arruda Sampaio nos dá um norte: “Em uma sociedade anestesiada, incapaz de sensibilizar-se por argumentos racionais, que se move unicamente pressionadas por gestos ostensivos”. Ações radicais como ocupações são necessárias e se justificam como “forma de chamar atenção para o descaso criminoso do governo com a população rural”. 

Plínio disse isso no auge do segundo mandato do governo Lula, imagine agora num governo extremamente hostil a luta do movimento dos trabalhadores sem terra, como é o caso do governo Bolsonaro. Resta saber se as organizações camponesas de luta pela desconcentração da propriedade rural  estão a altura dessa tarefa histórica. 

Nós que apoiamos incondicionalmente a luta por reforma agrária nesse país. Não poderíamos deixar de nos solidarizar com as famílias que estão na luta pela desapropriação da Fazenda Primavera e por conseguinte a instalação do projeto de assentamento. Acreditamos que esse é um dos caminhos para combater a extrema pobreza que assola mais de 100 mil pessoas no Tocantins – e 13,5 milhões em todo o Brasil. Por isso continuamos empunhando a bandeira por uma verdadeira reforma agrária já. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular, licenciado em Filosofia pela UFT e Militante do Coletivo José Porfírio.

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Michel Foucault: Vigiar e punir.

“As luzes que descobriram as liberdades inventaram também as disciplinas”.
Michel Foucault 

Vigiar e Punir é uma das principais obras do filósofo francês Michel Foucault. Publicada pela primeira vez em 1975 o livro chama atenção para o papel do encarceramento (a lógica do cárcere) na sociedade capitalista. E para o problema que é – quando essa lógica se espalha para o corpo social. Uma questão ainda mais preocupante na atualidade, sobretudo agora com todo o aparato tecnológico que nos cerca (Câmara de segurança, Smartfones e redes sociais).

Foucault é fiel ao seu entendimento de que a filosofia é uma maneira de refletir, de pensar criticamente o pensamento. Para tanto a história se torna um elemento importante nesse processo de reflexão. A partir desse entendimento ele apresenta a obra dividida em quatro partes: A primeira trata do SUPLÍCIO, a segunda da PUNIÇÃO, a terceira da DISCIPLINA e a quarta da PRISÃO. E ainda divide a primeira parte em dois capítulos: 1- O corpo dos condenados e a 2- Ostentação dos suplícios. A segunda parte também é dividida em dois capítulos: 1- Punição generalizada e 2- A mitigação das penas. Já a terceira parte é dividida em três capítulos: 1- Os corpos dóceis, 2- Os recursos para o bom adestramento e o 3- Panoptismo. E a quarta parte também se divide em três capítulos: 1- Instituições completas e austeras, 3- Ilegalidade e delinquência, e o 3- Carcerário. 

Microfísica do Poder, Corpo e Panóptico.

Esses três conceitos são os pontos chaves para se compreender a reflexão sobre a lógica do cárcere na sociedade capitalista. Em relação ao primeiro, microfísica do poder, Foucault ressalta que o poder não existe como propriedade, o que existe são relações de poder. Desse modo seus efeitos de dominação não significa uma apropriação, “mas a disposições, a manobras, a táticas, a técnicas, a funcionamentos” sobre o corpo – que é o objeto do poder – tanto quando a punição era através do suplício  (período medieval) como quando passou ser a alma (modernidade). Já a ideia do panóptico é de um “espaço fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos, onde os indivíduos estão inseridos num lugar fixo, onde os menores movimentos são controlados, onde todos os acontecimentos são registrados”.

Do suplício á prisão 

Como a sociedade chegou ao modelo de punição atual, representado sobretudo pelo sistema penitenciário? Para responder essa questão Foucault faz uma retomada histórica para mostrar como passamos do suplício para as prisões modernas. De acordo com suas palavras “em algumas dezenas de anos, desapareceu o corpo supliciado, esquartejado, amputado, marcado simbolicamente no rosto ou no membro, exposto vivo ou morto, dado como espetáculo”. A partir daí “a punição vai se tornando, pois, a parte mais velada do processo penal, provocando várias consequências: deixa o campo da percepção quase diária e entra no da consciência abstrata; sua eficácia é atribuída à sua fatalidade não a sua intensidade visível; a certeza de ser punido é que deve desviar o homem do crime e não mais o abominável teatro”.

Essa mudança de perspetiva no campo da punição não foi obra de uma evolução natural da sociedade, mas de uma revolução profunda que marca a passagem do período medievo para modernidade – a queda da monarquia e a ascensão da burguesia. Esta para dominar precisa revolucionar – precisa mostrar que é diferente (melhor) que a antiga classe dominante. Apesar de se mostrar com um rosto mais humanista, defendendo as liberdades individuais, não cessa o domínio sobre o corpo. O que muda é a forma desse domínio já que o corpo precisa ser moldado de acordo com os interesses da nova classe hegemônica. 

O capitalismo precisa de outro tipo de corpo que atenda aos interesses do novo modo de produção – precisa de indivíduos dóceis que produzem, que consomam. Sem resistir, sem existir. E como formar esse novo indivíduo? Através da disciplina – da docialização dos corpos em instituições como escolas, universidades, forças armadas, fábricas – através de recursos como exames avaliativos. Um ponto importante a se ressaltar é que em todos esses espaços prevalece a perspetiva panóptica. 

Quando todo esse aparato disciplinar fracassa é então que entra em cena os presídios como o último recurso para formar indivíduos dóceis e úteis “a sociedade”. Para tanto é criado toda uma arquitetura voltada para esse fim, inclusive com a formação de um corpo de especialistas voltados para atuar nesse contexto. No entanto a realidade nos presídios é bem diferente do que está nas leis de execução penal. O infrator que deveria ser recuperado e resocializado é tratado como delinquente pelo sistema penitenciário, e tende a sair pior do que entrou. No final das contas para Foucault, a passagem do suplício para prisão, significou apenas uma passagem de uma arte de punir para outra.

Para alguma conclusão 

Uma questão importante que nosso filósofo levanta é que a lógica de vigiar e punir existente no cárcere tende a se espalhar pelo corpo social, e isso se dá através de uma estratégia de poder que para se manter precisa produzir indivíduos doceis e úteis, e quando isso falha não pensa duas vezes antes de puni-los. Isso tudo se dá sobretudo num ambiente em que todo mundo vigia todo mundo. O que para nós, especialmente com todo o aparato tecnológico que faz parte do nosso cotidiano, torna esse regime de vigilância generalizada e punitiva ainda mais possível. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. 

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Minha poesia no anuário de poetas e escritores do Tocantins 2019

Alguns poemas de minha autoria foram selecionados para compor a coletânea “anuário de poetas e escritores do Tocantins” edição 2019. São quatro ao todo – dois inéditos (Canto à Natividade e Velório) e dois já publicados nas minhas redes sociais (Pescador e Ipês à florescer). São poemas singelos, que espero, possam afetar aqueles que os lerem.

A literatura sempre fez parte da minha vida, mesmo antes da alfabetização (através dos causos e contos populares que meus avós me contavam). Depois descobri os livros e me apaixonei, sobretudo pela poesia (por culpa dos poetas Gonçalves Dias e Manoel Bandeira). E de leitor passei a me aventurar na escrita – escrevendo coisas de minha própria inspiração. Nunca tive a pretensão de ser escritor e por muito tempo recusei o título de poeta. Eu escrevia e contínuo a escrever por uma necessidade pessoal. 

Nesses anos todos com uma produção significativa tanto na prosa como na poesia, ouso dizer que sim, sou poeta e escritor. E fazer parte dessa importante coletânea da literatura tocantinense, assim como os números significativos de acesso dos meus textos na internet, não deixa de ser um reconhecimento da importância do meu fazer literário. 

Para um escritor, creio eu, não há reconhecimento maior do que saber que os seus textos estão sendo lido e que estão afetando quem os lê a ponto de inspira-los a também escrever ou se expressar através de outras linguagens artísticas, como o audiovisual. E isso vem acontecendo comigo – o que me deixa por demais envaidecido. Sobretudo por que não faço nenhuma conceção ao status quos e ao mercado. E os meus poemas que estão no anuário de poetas e escritores do Tocantins é uma mostra nesse sentido.

Pescador

Se não me engano é um poema de 2013. E a inspiração veio a partir de ouvir o relato de alguns pescadores do Lajeado sobre a escassez e até mesmo o desaparecimento de algumas espécies de peixes após a construção da Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães no Rio Tocantins. É um poema no qual busco denunciar a destruição dos rios pelo hidronegócio e uma homenagem aos pescadores que dependem do rio para sobreviverem – pobres pescadores que são transformados em vilões, enquanto o hidro e agronegócio que devasta o meio ambiente são tidos como sinônimos de progresso.

Canto à Natividade

Fruto da minha visita a Natividade (acho que em 2017) juntamente com a turma dos Cursos de Filosofia e Teatro da Universidade Federal do Tocantins. Sempre quis conhecer o berço histórico do nosso querido Estado. E quando realizei esse desejo não me decepcionei – o lugar é mais encantador do que imaginei. E como lembrança desse momento inesquecível fiz esse poema para homenagear a cidade como também algumas das suas figuras históricas – como Dona Romana que tive a oportunidade de conhecer pessoalmente.

Ipês à florescer 

Era agosto, o ano não me recordo. Sei que estava voltando de Palmas para o Lajeado. Peguei uma Van e como de costume sentei no lado da janela para vim observando a paisagem. De repente notei algo que nunca havia notado – a florada do Ipê. Não uma, duas ou três árvore. Mas dezenas, centenas, talvez milhares – que dava um contraste bonito com o cinza da serra após tantos dias sem chuva. Aquela paisagem bela me afetou de alegria e senti o desejo de compartilhar aquele sentimento com mais pessoas. Me veio então o nome da minha sobrinha Sophia e os versos começaram a surgir.

Velório 

Também já não me recordo quando escrevi esse poema – o fato é que não sou muito de datar meus textos. Mas a circunstância e o que me inspirou a escreve-los não me esqueço. Sei que estava acontecendo um velório em frente a minha casa e me lembro que apesar de não conhecer o morto aquilo me afetou como também como a todos ali. Isso me fez refletir sobre como nós evitamos pensar na morte, pois estamos tão apegados a vida que nos esquecemos ou tentamos esquecer que um dia iremos morrer. E quando acontece uma morte próximo de nós, somos de certa forma obrigados a refletir sobre nossa finitude.

O anuário foi lançado  (pela Editora Veloso) no dia 08 de Novembro de 2019, na cidade de Gurupi – no Centro Cultural Mauro Cunha. E pode ser adquirido pelo site da Editora (www.editoraveloso.com.br). Além dos meus poemas tem textos em prosa e versos de vários autores de diferentes regiões do Tocantins. Por tanto vale a pena a aquisição e a leitura do mesmo – que nas palavras do editor Eliosmar Veloso – é o melhor anuário já produzido, dos que já foram publicados até então. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador, Poeta e Escritor Popular. 

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

Eleição suplementar em Lajeado

Os candidatos

Junior Bandeira
 Como era esperado o advogado e ex-prefeito Júnior Bandeira  (PSB) confirmou sua candidatura para disputar a eleição suplementar para os cargos de prefeito e vice-prefeito que se realizará em 1° de Dezembro. José Edival  (MDB) que havia declarado a intenção de disputar o cargo de prefeito (cargo que ocupa interinamente), recuou e será candidato a vice 
Tércio Neto
 na chapa com Júnior Bandeira. Já Tércio Neto (que ao ter o mandato cassado não foi declarado inelegível) também confirmou sua candidatura na disputa pelo PSD. Disputa que também contará com a candidatura de Antônio Alves – o Toninho da
Toninho da Brilho
Brilho (PSL?), recém chegado em Lajeado, já foi candidato a deputado estadual  (por diferentes partidos) em 2014 e 2018. E também foi candidato a prefeito em Rio dos Bois em 2016, ficando em terceiro lugar com um pouco mais de 70 votos.


Segundo round entre Tércio x Bandeira

No primeiro round Tércio saiu vitorioso, mas foi uma vitória amarga já que contou com uma ajudinha extra que não deveria ter tido – por isso teve o mandato cassado. Agora vejamos como ele sairá sem o apoio da ex-prefeita Márcia Reis e a força da máquina pública. Já a situação do Bandeira é oposta – a derrota de 2016 virou vitória com a decisão do TRE. Além disso ele conseguiu o apoio de José Edival, da ex-prefeita Márcia Reis,  do ex-prefeito Leônidas Corrêa e outras importantes lideranças políticas do município. 

Quem era oposição virou situação e quem era situação virou oposição 

Eis uma situação singular que temos em Lajeado. O grupo político que há um pouco mais de um mês comandava a máquina, inclusive numa trajetória de fortalecimento com a vinda de lideranças políticas dispostas a apoiar a candidatura a reeleição de Tércio em outubro de 2020. Foi jogado na oposição e perdeu vários aliados. E aqueles que estavam na oposição agora é que estão dando as cartas na prefeitura e na Câmara de Vereadores. Aliás, na Câmara de Vereadores a oposição já vinha incomodando bastante. Tanto que no início do ano o prefeito e seus Secretários manobraram para jogar a população contra os vereadores de oposição que estavam resistindo em aprovar um projeto do executivo que liberava a contratação de pessoal para o serviço público. Além disso o grupo político do então prefeito nunca engolira a derrota na eleição para presidente do legislativo Municipal.

Um teste de popularidade

Um ponto importante é que ao se candidatar nesse pleito, Tércio nos dá a oportunidade de vê qual a avaliação que a população faz dos seus 2 anos e 10 meses de gestão. Não é segredo para ninguém  que a minha avaliação não é nem um pouco positiva (vê artigo: uma reflexão sobre os dois anos da gestão Tércio Neto (PSD) á frente da prefeitura municipal de Lajeado). Mas uma coisa é minha avaliação e outra é a avaliação de toda população. E como saberemos da avaliação de toda a população? A partir da votação que ele obtiver – se for uma votação expressiva é sinal que a população aprovou sua gestão. Se não, é o contrário. 

Mais um sinal de uma péssima gestão 

A candidatura de Tércio Neto é mais uma prova de que sua gestão foi um fracasso. Como assim? Se houvesse sido uma gestão exitosa não faltariam nomes no seu grupo político em condições melhores para assumir a disputa num momento claro de desgaste do nome do prefeito cassado. Talvez da vereadora Leidiane Mota (PSD). Mas essa se quer tem garantido a reeleição para o legislativo municipal (é bom lembrar que ela deixou a presidência da Câmara, após decisão da justiça, sob uma série de acusações,  entre elas “possível recebimento indevido de valores”), imagine ser prefeita. Poderia ser alguém do seu secretariado. O problema é que não teve nenhum que se destacasse a frente de sua respectiva pasta – o que mostra que não fizeram um bom serviço. Desse modo ao se candidatar Tércio não demonstra força, mas que não há alternativa melhor no seu grupo político. 

Mais um sinal de péssima gestão II

Tércio Neto é tão incompetente politicamente que não foi capaz nesses quase três anos de gestão formar um grupo político coeso. A cada dia que passa ele está mais isolado e sozinho, pois um número significativo daqueles que faziam parte do seu grupo, já abandonaram o barco e estão com Júnior Bandeira. Pode-se até questionar a ética desses que estavam num determinado grupo e agora estão em outro. Mas o fato é que isso é reflexo da incompetência política do prefeito cassado em não escolher bem seus aliados. Por outro lado ele não tem muita moral para cobrar fidelidade desse pessoal que mudou de lado, até por que depois de eleito ele virou as costas para principal figura que bancou sua eleição (Márcia Reis), ainda que de forma questionável. 

Favorito

Diante de tudo isso não há como negar, Júnior Bandeira é amplamente favorito para disputa. E ousaria dizer que com uma margem de diferença significativa em relação ao segundo colocado. Mas uma boa dose de prudência é sempre necessária, pois como nos ensina uma velha máxima futebolística – “o jogo só acaba quando termina”. De modo que não é recomendável cantar vitória antes da hora e nem levar “flores para cova do inimigo”. Mas, confesso que esperava uma polarização maior nessas eleições suplementares, sobretudo após a decisão do TRE que tencionou mais ainda a relação entre Tércio Neto e Júnior Bandeira. Mas por enquanto isso não vem ocorrendo, pois a candidatura Júnior Bandeira (PSB) e José Edival (MDB) estão se impondo como um rolo compressor. Conseguiram fazer boas articulações e como consequência fortes alianças – isso somado  ao descontentamento da população com a gestão Tércio Neto e a insignificante candidatura oportunista do Toninho da Brilho – não aponta outro desfecho se não a vitória de Junior Bandeira e José Edival. 

Outubro de 2020

É inegável que a disputa nessa eleição suplementar está ocorrendo com um olho nas eleições regulares em outubro de 2020. Mas até lá muita coisa pode ocorrer. De modo que qualquer coisa que falemos a esse respeito não passa de mera especulação. E nesse campo da especulação uma pergunta que surge é se teremos duas ou mais candidaturas competitivas na disputa. Isso dependerá da capacidade de uma força oposicionista que concerteza surgirá para fazer frente ao candidato eleito na eleição suplementar, que provavelmente buscará se reeleger.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. 

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Boi de piranha ou Sobre a proposta de extinção dos municípios com uma população menor que 5 mil habitantes.

Assim que tomei conhecimento da proposta do governo Bolsonaro de extinguir municípios com uma população menor que 5 mil habitantes (com uma arrecadação própria menor que 10% de sua receita total) respondi instantaneamente que a mesma não seria aprovada – Não por que será ruim para população desses pequenos municípios, mas por que por um lado, prefeitos e vereadores não irão querer perder suas benesses, e por outro deputados e governadores não irão querer perder seus feudos eleitorais. 

Depois, ao descobrir, o contexto em que a proposta foi apresentada (num pacote com outras medidas denominado de “Plano Mais Brasil”), tive mais certeza  ainda. Aliás acrescentaria que a ideia do governo não é aprovar mesmo essa proposta, mas utiliza-lá para fazer barganha e desviar o foco das questões principais do pacote de reforma econômica. E pelo menos nesse primeiro momento conseguiu. No Tocantins esse foi o ponto mais repercutido pela mídia e entre os parlamentares que representam o Estado no Congresso Nacional. 

A nível nacional não foi diferente – o Jornal Nacional deu destaque para proposta inclusive mostrando o exemplo de um município no interior do Estado de Mato Grosso onde a prefeitura está fechando as portas por falta de recursos (uma mostra da sua neutralidade jornalística). Um entrevistado (defensor do projeto) que não me recordo o nome, afirmou que a proposta segue o modelo de outros países e citou nominalmente a França. Óbvio, ele se esqueceu de um detalhe, a diferença territorial significativa entre um país e outro – enquanto a França tem 643.801 Km2, o Brasil possui 8.511.000 Km2. E o tamanho da população – enquanto a França têm uma população estimada em 66 milhões e 362 mil habitantes, o Brasil ultrapassou a marca de 210 milhões  de habitantes (fontes: IBGE e RFI).

Paulo Guedes foi mais honesto, confessou que esse ponto não se trata de uma questão econômica, mas política. “Seguramente não foi um economista do nosso grupo que lançou isso lá. Normalmente, é sempre uma liderança política que chega lá e fala: ‘Está acontecendo isso aqui’. E são lideranças políticas experientes, e eles têm lá os combates deles. Nós vamos assistir isso ai” (Fonte: G1). Nada mais esclarecedor, não?! Essa declaração deixa ainda mais evidente se tratar de uma estratégia para desviar o foco dos pontos mais importantes do pacote que é mais redução de direitos da classe trabalhadora. 

Como assim mais redução de direitos da classe trabalhadora? Vejamos: Congelamento do reajuste do salário mínimo; Desvinculação e diminuição dos gastos com Saúde e Educação; Desvinculação do Benefício de Prestação Continuada  (BPC) do Salário Mínimo; Redução dos salários dos servidores, com redução da jornada de trabalho quando os gastos do orçamento ultrapassarem 95% e Privatizações dos bens públicos. Ou você tem alguma dúvida de quem é que vai pagar essa conta se essas medidas forem efetivadas?

Ivan Valente  (líder do PSOL na Câmara dos deputados) percebeu bem a estratégia do governo – “Essa proposta de extinção dos municípios foi colocada como moeda de troca. O governo vai barganhar com ela. Vai dizer que foi bonzinho em retirar o bode da sala” (Fonte: El país). Eu prefiro o termo boi de piranha – Uma expressão popular usada para designar uma situação onde se abre mão de algo por outro mais importante. 

O importante é aprovar o plano “Mais Brasil” assim como se aprovou a reforma da previdência. Mesmo que para tanto tenha que se abrir mão ou modificar alguns pontos da proposta, assim como foi feito com a reforma previdenciária. Nesse sentido cabe a reflexão do filósofo Vladimir Safatle de que “temos um governo que fala, a todo momento, está operando uma revolução no país. Por isso ele mobiliza a lógica do “governo contra o estado”. E digamos que o plano “Mais Brasil” segue essa lógica. 

Numa espécie de recuo (o que não é novidade por parte desse governo) Bolsonaro já declarou que será a população dessas localidades que decidiram sobre essa questão. E são elas mesmas que tem que decidir (por meio de plebiscito como estabelece a Constituição Federal de 1988), não o Governo ou o Congresso Nacional. De modo que essa proposta de cima para baixo nem deveria ter sido apresentada. Mas foi por que é preciso alimentar o discurso do “governo contra o estado” e servir como boi de Piranha para retirada de mais direitos dos trabalhadores. 

Mas enfim, na prática é uma proposta que já nasceu derrotada. Cumpre tão somente o papel de boi de piranha que será sacrificado no momento oportuno. Por isso será perca de tempo focar o debate em torno desse ponto. Espero que as forças progressistas não caíam nessa armadilha. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. 

sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Marx e os “Ventos da Liberdade”

No interior da Irlanda um grupo de jovens é fortemente reprimido pelo famigerado – Black and tan - esquadrão inglês formado para reprimir o movimento de independência daquele país. Tal repressão culminará na morte de um jovem e mudará a trajetória de vida de outro.

É assim que se inicia o filme “Ventos da liberdade” do cineasta Ken Loach. Uma verdadeira obra prima do cinema que se sagrou vencedora da Palma de Ouro do Festival de Cannes, no ano de 2006. Em 127 minutos Loach nos apresenta o drama do povo irlandês na luta pela independência do seu país da Inglaterra. Tal como muitos países o fizeram mundo afora. Sobretudo após o abalo mundial causado pela revolução bolchevique em 1917 na Rússia. 

Damien (Cillian Murphy) estava se preparando para deixar o interior da Irlanda e seguir para Londres onde pretendia seguir carreira na medicina. Mas a morte brutal de um amigo pelos ingleses o fez mudar os planos. Ele, então, não só decide abandonar o projeto de cursar medicina na capital  Inglesa, como também decide engrossar as fileiras da luta armada nacionalista. 

Era a segunda década do século XX – inegavelmente um século marcado por lutas por independência em todas as partes do globo (entre elas a Revolução Russa, Chinesa e Cubana). E uma dessas lutas teve como cenário a Irlanda onde se formou uma frente ampla (IRA) composta de diversas tendências políticas em torno da bandeira por independência. E uma das tendências mais forte nesse movimento era dos socialistas e comunistas, mas também havia tendências nacionalistas.

Antes da ação, Demien mais outros jovens seguem para um treinamento. E é ali que eles percebem que estão entrando num lugar onde não há retorno – um lugar onde não há espaço para vacilações. Pois essas são pagas com a própria vida. Eles aprendem isso da forma mais dura possível ao ter que punir com a morte um companheiro que traiu o movimento.

Treinamento finalizado eles partem para o enfrentamento. E a partir desse enfrentamento (numa guerra de guerrilha) onde conseguem importantes vitórias. Começa-se um debate de cunho mais político-ideológico acerca dos rumos que o país deverá seguir após conseguir sua independência. Nesses embates as divergências entre os grupos que compõem a frente de resistência ficam bastante explicitos e acaba cuminando numa divisão do movimento entre os que defendiam um acordo com a Inglaterra (acordo que passava pelo abandono da luta armada). E os que defendiam a continuidade da luta armada numa perspectiva ainda mais radical defendendo o socialismo como único horizonte possível para garantir verdadeiramente a independência da Irlanda e não uma independência tutelada como defendiam os partidários do acordo com a Inglaterra.

Damien no início não tinha a intenção de participar da resistência armada, se o fez, num primeiro momento foi mais por uma questão pessoal do que por patriotismo. Já seu irmão mais velho era totalmente envolvido, inclusive ocupando posições de comando. Mas ao longo da luta isso foi se modificando sobretudo a partir da aproximação de Damien das ideias socialistas. O que ficou mais evidente no momento da ruptura interna do movimento pela independência da Irlanda. Damien acompanhou os que defendiam a continuidade da luta armada e a construção da Irlanda socialista, já o seu irmão defendeu um acordo com a Inglaterra. 

A partir daí eles passam a atuar em campos opostos, a partir daí – os que lutavam na mesma trincheira passam a lutar entre si. E como consequência disso Demien é preso. Na prisão tentam convencê-lo a abandonar a luta armada e a aceitar o acordo com a Inglaterra. Mas ele não dobra e cita James Connely para justificar sua posição: “Se retirarem o exército britânico amanhã e hastearem a bandeira verde no castelo de Dublin, a não ser que organizem uma república socialista, todos os seus esforços terão sido em vão e a Inglaterra ainda os governará por meio dos donos de terra, dos capitalistas e das instituições comerciais”.

Connely e Damien estavam correto, e não só em relação a Irlanda. Hoje essa dominação de uma país pelo outro não se dá mais através das forças armadas mas por meio “dos donos de terra, dos capitalistas e das instituições comerciais”. Em suma, mudou-se os instrumentos de opressão e dominação, não o fato de que uma determinada classe continua oprimido e dominando outra. 

Marx na sua obra “Miséria da filosofia” dizia que “uma classe oprimida é a condição vital de toda sociedade fundada no antagonismo entre classes” como é o caso da sociedade burguesa. Por tanto só é possível a libertação da classe oprimida se se criar uma nova sociedade. Não adianta reformas, melhorias aqui e ali – não será isso que colocará fim a opressão e por conseguinte a dominação. 

Bem, essa  tarefa continua atual sobretudo num contexto onde muitos acreditam poder acabar com a opressão humanizando o capitalismo  através de reformas. Que acreditem nessa ilusão não é problema. O problema é tentar justificar tal posição usando o nome do velho Marx. O filme Ventos da Liberdade é um ótimo material de estímulo para que refltamos acerca dessa e outra questões necessárias para o fortalecimento da luta anticapitalista mundo afora.

Pedro Ferreira Nunes – É Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. 

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Sobre a diferença entre o Ensino Superior EAD e o Ensino Superior Presencial

Há uma discussão muito grande sobre a falta de qualidade do ensino a distância sobretudo se comparado ao ensino presencial. Apesar das críticas o Ensino Superior EAD tem se expandido pois sem dúvidas é mais acessível que o Ensino Superior Presencial – não só do ponto de vista econômico mas também no seu alcance, ao chegar em localidades onde não há faculdades.

Mas ser mais acessível basta? E como fica a qualidade dos profissionais que estamos formando? Num contexto onde a educação se tornou mercadoria a questão da qualidade parece ter ficado em segundo plano – o importante é lucrar. Mas isso só no Ensino EAD? O Ensino Presencial também não está voltado para a lógica de mercado? Eu tive a oportunidade de estudar nos dois sistemas de ensino e pude perceber algumas diferenças significativas.

Entre essas diferenças diria que a principal não consiste no fato de que no ensino EAD tem uma aula presencial por semana ao invés de todos os dias – com um professor virtual ao invés de um presencial. Para mim não é quantidade de encontro que define a qualidade do ensino. Até por que uma boa aula vale mais do que dez aula ruim. Se aproveitado bem (inclusive tendo consciência que o estudo não se resume a aula), se aprofundar nas dicas de leituras, fazer os exercícios e participar dos fóruns de discussão, não há tanto prejuízo assim. Pois o fato do aluno estar todo dia na sala de aula não quer dizer que ele está ali de fato. 

Durante a minha graduação presencial, não foi rara as vezes que vi colegas mais preocupados com a lista de presença do que com o que o professor estava falando. Alguns aliás, não faziam a menor cerimônia em colocar um fone de ouvido e ficar vendo vídeos ou jogando na Internet com seus smartphones. 

Também não diria que a diferença é a quantidade menor de conteúdo que se estuda. Pois quantidade menor ou maior de conteúdo não significa mais qualidade. Pelo contrário,  leva a um processo onde o professor finge que ensina e o aluno finge que aprende. Tanto Rousseau como Paulo Freire ao refletirem sobre educação chamaram atenção para essa questão que revela o caráter autoritário nas relações pedagógicas entre professor e aluno. “Citamos uns 40 livros e mandamos o aluno ler uns 200 capítulos, além dos 40 livros” (Freire, 2012, p. 30). E o aluno o que faz? Não faz. Pois além do que esse professor manda fazer tem as leituras e as tarefas de outras disciplinas.

Diria também que os professores do Ensino Superior EAD não são menos preparados e qualificados que os professores do Ensino Superior Presencial. Ou que as atividades bem como as avaliações sejam inferiores. Diante disso ousaria afirmar  que do ponto de vista do ensino não há uma disparidade significativa entre um e outro sistema. Agora o que cabe perguntar é se uma formação de qualidade se resume apenas ao ensino. 

Creio que não. E é ai que o Ensino Superior Presencial se diferencia da EAD, ao ir além do ensino, oferecendo também a pesquisa e a extensão. O ensino, a pesquisa e a extensão são considerados os pilares da Universidade. Eles são independentes entre si, mas devem funcionar de forma interligada, por tanto, indissociáveis como estabelece a constituição federal de 1988. A pesquisa e a extensão contribuí para se aprofundar o conhecimento acerca dos conteúdos ensinados. Daí a importância da presença delas nos processos de formação sobretudo por que propiciam a dimensão prática da profissão e o seu papel social na sociedade.

Com isso não há dúvida, o profissional formado no sistema presencial de ensino tem as condições para ter uma formação mais completa e por conseguinte ser um profissional mais completo – mas só estará pronto completamente na prática profissional – que quase sempre é diferente da formação. 

Pesquisa e extensão não existe no EAD – onde há uma ênfase no ensino. Aliás, sejamos honestos, essa realidade não é exclusiva do Ensino EAD. Pois boa parte das instituições superiores de ensino (por questões de economicidade) não tem pesquisa e extensão – sendo uma prática quase exclusiva das instituições públicas de ensino.


Como disse, tive a oportunidade de passar pelos dois sistemas de ensino: o EAD e o Presencial. E a grande diferença para mim foi sem dúvida a questão da pesquisa e a extensão que não tive no Ensino EAD.  Mas não diria que por isso não tive uma boa formação no ensino á distância – talvez por que procurei fazer pesquisa e extensão de forma autônoma nos movimentos sociais. No entanto não se compara com uma formação numa instituição presencial (preferencialmente pública) que tenha de forma articulada o Ensino, a Pesquisa e a Extensão. 

Diante disso é preferível (apesar dos retrocessos que vem ocorrendo) batalhar para ingressar numa instituição pública de ensino em cursos na modalidade presencial. Mas sabemos bem, nem sempre é questão de opção mas do que é possível. E o que é possível para parcela significativa da população é o Ensino EAD – esse no entanto não precisa ser sinônimo de qualificação ruim – para tanto dependerá de você buscar alternativas para complementar os gargalos que irá se deparar no trajeto da sua formação. 

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular. Cursou a faculdade de Serviço Social pela Unopar e Licenciou-se em Filosofia pela UFT. 

quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Breves comentários sobre a situação política em Lajeado

É, camaradas. Apesar da demora excessiva em tomar uma decisão por demais óbvia. Enfim o Tribunal Regional Eleitoral do Tocantins (TRE-TO) cassou o mandato do prefeito Tércio Neto (PSD), do seu vice Gilberto Borges (PSC), do Vereador Adão Tavares (Podemos), além de vários suplentes de Vereador. Agora o município passará por uma eleição suplementar para um mandato tampão de pouco mais de 1 ano. Diante desse novo contexto político, cabe uns breves comentários.

Não deixará saudades

Essa é a verdade. Em quase três anos de gestão a população não tem muito o que lamentar a saída de Tércio Neto. Falta de planejamento e de políticas públicas voltadas para o bem comum será o seu legado. Na área da educação, assistência social, segurança e cultura tivemos inclusive retrocessos. Além da conclusão da praia do segredo, o gestor não deixa nenhuma outra grande obra relevante. Diante disso não temos nenhuma dúvida em afirmar que Tércio e seu vice não deixaram saudades. Há não ser para aqueles que sobreviviam pendurados no seu saco.

Não deixará saudades II

Outro que também não deixará saudades é o vereador Adão Tavares – Uma espécie de Romero Jucá lajeadense. Se somado todos os seus mandatos ele chegará há uns 20 anos de vereança – sempre ao lado de quem está com a caneta na mão – o que define muito bem a sua perspectiva ética. Nesses anos todos como parlamentar não deixa de legado nenhum projeto relevante para sociedade lajeadense. Pelo contrário, quando pôde votou contra os interesses do município como no caso do ICMS da UHE Luiz Eduardo Magalhães.

Não deixará saudades III

Ainda em relação ao vereador Adão Tavares – melhor do que ter tido o mandato cassado foi ter se tornado inelegível. O que garante que não teremos sua presença medíocre na próxima legislatura. Assim também como outras figuras não menos medíocres como o Ananias Pereira, Manuel das Neves entre outros que também estão inelegíveis.

Nova configuração no parlamento

A decisão do TRE-TO não mexeu apenas com o executivo municipal, mas também com o legislativo. A casa que antes era comandada por José Edival passa agora a ter Walber Pajeú (DC) na presidência. Além disso passa a contar com dois novos membros. José Parente (PROS) que assumiu a vaga deixada por Adão Tavares e Helys Dayana (MDB) que ocupará a vaga do José Edival que assumiu a prefeitura de forma provisória.

Nem nos seus melhores sonhos

José Edival (MDB) imaginária se tornar da noite para o dia prefeito de Lajeado. Ainda mais sabendo como se elegeu Vereador e se tornou Presidente da Câmara de Vereadores. Elegeu-se vereador mesmo não obtendo uma grande votação pessoal. Beneficiou-se dos votos da legenda. Já a sua chegada a presidência do legislativo Municipal se deu graças a uma boa articulação da oposição ao prefeito Tércio Neto – José Edival conseguiu com votos dos vereadores da oposição derrotar o candidato do prefeito, Adão Tavares.

No lugar certo, na hora certa

Se em 2016, José Edival, tivesse optado por se candidatar a vereador numa das coligações comandada pelos candidatos mais forte no pleito eleitoral (Tércio Neto ou Júnior Bandeira) não teria sido eleito. Com os votos que teve seria no máximo suplente. Mas como optou por uma terceira via – uma decisão que se mostrou acertada – conseguiu a eleição. Outro ponto é que se ele tivesse aceitado ficar na base do prefeito Tércio Neto e não se articulado com os vereadores da oposição também não seria hoje o presidente do legislativo Municipal encarregado de assumir provisoriamente a prefeitura com a cassação do prefeito e seu vice. O que nos leva por tanto a afirmar que ele estava no lugar certo, na hora certa.

Efeito Carlesse

É natural que agora José Edival vislumbre algo maior. Por que se contentar com um mandato provisório se ele pode ser eleito na eleição suplementar e a partir daí pavimentar sua eleição no pleito regular em outubro de 2020? Inspiração de que isso é possível não falta. E não precisa ir muito longe, é só analisar a trajetória de Mauro Carlesse para se tornar governador. E não tenho dúvida que ao se colocar como pré-candidato tanto na eleição suplementar como na regular, José Edival se inspirou em Carlesse e tentará repetir seu feito em âmbito Municipal.

Mas...

Sempre tem um “mas” né?! Eleição municipal não é eleição estadual. Parece uma questão óbvia, mas não é tão óbvia assim. Até por que o que não falta são exemplos de políticos que não compreendem essa diferença e acabam trocando os pés pelas mãos e são derrotados – Amastha é um bom exemplo no pleito estadual passado. Por tanto não se pode iludir achando que porque num determinado contexto algo deu certo, isso se repetirá.

Mas... II

Tem o peso da máquina pública – um fator que não pode ser desconsiderado em nenhuma disputa, seja ela a nível municipal, estadual ou federal. Quem está com a caneta na mão larga em vantagem. Ainda mais numa cidade onde 90% depende quase que exclusivamente do serviço público. O que não significa no entanto que quem está no poder seja automaticamente eleito, se fosse assim nem precisaria gastar tempo e recursos com eleição. A capacidade de articular e fazer alianças é o que define o vencedor ou vencedora no final.

Os demais candidatos

O disse me disse dá conta de muitos nomes que pretendem ser candidatos. Mas entre pretender e ser há uma distância considerável. No entanto é certo que um nome não ficará fora da disputa – esse nome é do advogado e ex-prefeito Júnior Bandeira – que no final das contas é o responsável pelo processo que levou a cassação do prefeito Tércio Neto e dos demais. A decisão do TRE-TO foi uma espécie de reconhecimento de que Bandeira seria (se não tivesse compra de apoio político através da doação de área pública) o candidato eleito em 2016 no Lajeado.

Mas...

Junior Bandeira também não terá vida fácil, pois no mesmo momento que o Tribunal Regional Eleitoral estava analisando os embargos de declaração do prefeito Tércio Neto e demais acusados. Segundo o portal de noticias Poder Tocantinense, a Câmara de Veradores de Lajeado em sessão extraordinária voltava a analisar as contas da sua gestão que já haviam sido reprovadas uma vez, mas por decisão judicial acabou sendo suspensa. A tendência é que dessa vez,  segundo o portal de notícias citado acima, as contas sejam rejeitadas novamente. O que pode prejudicar os planos do Bandeira em voltar a ser prefeito do município.

De duas uma

Ao convocar uma sessão extraordinária para discutir as contas da gestão Júnior Bandeira no mesmo dia que o TRE-TO estava reunido para definir o futuro político do Lajeado. A Câmara de Vereadores demonstrou uma espécie de revanchismo contra o ex-gestor (responsável pela cassação do prefeito Tércio e companhia) ou mostrou temer Júnior Bandeira como adversário no pleito eleitoral, e por tanto querem tira-ló do páreo.

Mas...

Como já comentamos. A Câmara de Vereadores tem uma nova configuração – com um novo presidente e dois novos parlamentares. E saber para onde pendera essa nova configuração ainda é muito cedo. Isso dependerá da capacidade de articulação que José Edival, Júnior Bandeira e outras lideranças políticas locais sejam capazes de fazer.

E quanto a nós, el Pueblo

Ficamos aguardando a cena dos próximos capítulos. Com uma quase certeza de que nada ou pouca coisa mudará. E não mudará por culpa do próximo gestor, seja ele ou ela quem quer que seja, mas por nossa responsabilidade como cidadãos, que por troca de migalhas, abrimos mãos dos nossos direitos. E como consequência todos nós pagamos um preço alto vivendo numa cidade rica mas que está num triste estado de abandono.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins.

sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Cólera e a questão ambiental: 30 anos do álbum “Verde, não devaste!”

“Minha vida, sua vida, nossas vidas, dependem do verde...”.
Cólera 

O ano era 1989, uma das bandas pioneiras do punk rock brasileiro lançava um álbum de estúdio que agora 30 anos depois faz mais sentido do que nunca. Não, não estou falando do “Brasil” dos Ratos de Porão. Mas do “Verde, não devaste!” da Cólera – um álbum que pode ser definido como um manifesto em defesa do meio ambiente.

A banda Cólera então formada pelo trio – Redson Pozzi (guitarra e vocal), Val Pinheiro (contrabaixo), e Pierre Pozzi (bateria). Sempre teve como uma das suas bandeiras a defesa do meio ambiente. Mas nesse álbum eles colocam essa questão ainda mais em evidência como podemos ver pela escolha do título que dá nome ao álbum, pela arte da capa que sintetiza bem o alerta da banda sobre as consequência de destruírmos a mãe natureza e pelas 14 faixas onde eles destilam sua fúria contra um modelo de desenvolvimento movido pela destruição ambiental.

Já na abertura temos o Redson declamando um texto sublime – Da última árvore para o último animal: “você viu armas feitas com pedaços de nossos corpos. Você viu sua pele irmã  a preço promocional na vitrine. Eles não viram nada além do lucro. Eles usam sua pele sentados sobre nossos pedaços. Eles tem projetos milionários para exterminar todos nós...”. Seguido da instrumental “Bombeiros”. Na sequência mais outro petardo – Minha nação: “Minha nação tem riquezas, minha nação é gentil, mas tão imensa miséria. E a invasão, estão roubando o Brasil...”. Nada muito diferente do Brasil de hoje não é mesmo?! Talvez um pouco pior com Bolsonaro e a sua trupe no comando da nação – o que torna ainda mais real o alerta da próxima faixa –  Meia noite: “quando você nem imaginar. Vai acordar, ligar seu rádio. Aquela música não vai mais tocar, seu presidente irá falar: - apertamos o botão. Foi a meia noite...”. Ai já era, não há mais nada a fazer. Depois de aniquilados não temos como nos rebelar.

A faixa em seguida é uma espécie de antídoto para que isso não ocorra. Trata-se da canção Parasita, que tem um riff de guitarra poderoso dando ainda mais força para o verso – “...não seja um parasita! Um sangue sunga de uma vida!”. E o que fazer para não ser um parasita? Ter um ideal e lutar por ele, ainda que se tenha consciência dos ônus de se defender determinados ideais. Sobretudo aqueles que vão contra os interesses da classe dominante.

Em seguida vem outro ponto alto do álbum. Trata-se da faixa Presídio zoo – uma contundente crítica a violência contra os animais – onde se destaca os versos: “Animais não fazem guerras, animais não destroem selvas. Animais não constroem bombas, animais não poluem o ar. Animais não pertencem a ninguém, animais não matam por prazer...”. A faixa seguinte Don’t West it também segue essa linha como podemos conferir na frase inicial: “animais não são nosso para satisfazer nossos prazeres violentos”. A canção segue e o Redson não mede palavras para críticar aqueles que poluem o meio ambiente e maltratam os animais: “Fodam-se todos que destroem as florestas, o oceano e o ar. Fodam-se todas as experiências com a vida animal, deixem-os viverem suas vidas!...”. 

A faixa seguinte é a canção Viva a nossa geração – “não esqueça da dor, não esqueça da fome, não esqueça de protestar, protestar, protestar...”. E mais do que nunca precisamos protestar, protestar, protestar contra esse estado de coisas que nos explora, nos criminaliza e nos escraviza (tal como a banda Cólera tem feito nos seus 40 anos de existência, assim também como bandas como Ratos de Porão, Inocentes e Garotos Podres).

Em seguida temos um dos clássicos da banda – Verde – que inicia com o verso: “Onde haviam riachos limpos, hoje só vemos extrume humano. O chão que era coberto de folhas secas, está encoberto pelo concreto”. E eles continuam: “quem quer que mate a toa, quem queima e corta, florestas e reservas, só pensa em lucrar, mas isso é roubar”. E para fechar temos o refrão: “Minha vida, sua vida, nossas vidas, dependem do verde. Minha vida, sua vida, nossas vidas, dependem do verde e dependem do verdejar...”. Os versos em seguida não são menos belos, o que faz de “verde” uma das letras mais belas da música brasileira.

Em seguida vem a utópica EA EO – que fala de um lugar onde não existe raças, nem muros, nem fronteiras, não tem governantes, ninguém serve a exército, onde o tempo não importa, espaço nunca falta, todos se respeitam, dinheiro não usa. E eles nos diz: “Comece a pensar, sua vida vai mudar”. Um filósofo que nos ajuda a pensar em um lugar assim é o Rousseau que defendia a necessidade de nos reconectarmos com a natureza – pois no Estado de Natureza o homem é verdadeiramente livre, ao contrário do Estado Civil que o degenera. 

Se em EA EO eles falam de um lugar utópico, na faixa seguinte – Em setembro – eles voltam a realidade: “tentam enquadrar o mundo no código penal, nasce o terrorismo, em setembro. Cabeças decepada, mulheres metralhadas, meninas depravados em setembro... vai nascer, vai perder, vai morrer, apodrecer...”. E pensar que anos depois da gravação dessa música o mês de Setembro ficaria marcado como o mês em que ocorreu o maior atentando terrorista da história (o ataque as torres gêmeas em Nova York.

A faixa seguinte é Cólera onde eles defendem a necessidade de reação contra quem nos ofende ou tente nos aprisonar: “Não, não queremos tropa, chega de comandar nossas vidas...”. Em seguida temos Repressão Policial – “repressão policial, repressão policial, vitimado e humilhado você toma até geral. É porrada na cabeça, é repressão policial...”. E para completar a trinca temos a Teatrinho: “é o teatrinho, parece divertir, e somos a platéia todinha a sorrir. Mas tem algo por trás mexendo o cordão. E cada marionete é... Oh! Oh! É o babacão!!!

Teatrinho é mais uma letra desse álbum que merece ser enfatizada. Ela trata de um tema caro ao movimento punk que é a questão da alienação, ou melhor, a necessidade de superarmos a alienação para que não nos tornemos marionetes na mão de lideres demagogos. A Cólera nos alerta: “Até por um instante, ficamos na ilusão. Por que acreditamos naquele babacão. Não há mal em sonhar, mas temos que acordar, parar com o teatrinho...”. Não, eles não estão falando do Bolsonaro e seus bolsominions, mas serve como uma luva.

Fechando o álbum temos Solidarie-nos: “Seja sempre você mesmo, não tente imitar. Julgue a sua consciência, seja livre já. Cante bravo, não desiste fácil não. Somos muitos, num só ideal...”. Se na abertura tivemos o alerta de um futuro não tão distante, se continuarmos devastando o meio ambiente tal como estamos fazendo. Em solidarie-nos a mensagem é de que podemos mudar aquele quadro apresentado. Claro, desde que estejamos dispostos a se agitar, se informar, sair as ruas e protestar. “Tentar de novo se falhar, ou se vencer comemorar...”. Bem, em relação a questão ambiental podemos dizer que isso vem ocorrendo.

Aliás, a questão ambiental nunca teve tão em evidência a nível mundial quanto nesse ano de 2019. Os efeitos do clima que a cada ano se fazem sentir de forma mais contudente tem obrigado uma parcela da população cada vez maior a se conscientizar e se mobilizar contra as mudanças climáticas. Por outro lado governos reacionários incentivam com seus discursos de ódio a destruição ambiental em defesa dos interesses do capital. O que torna ainda mais necessário nos rebelar contra esse modelo de desenvolvimento e não apenas nos contentar com mudanças corretivas que não rompem com a lógica do capital.

E nesse contexto se torna ainda mais significativo celebrarmos os 30 anos do lançamento do álbum Verde, não devaste! Um álbum clássico do punk Rock brasileiro e uma obra importante para trabalharmos nos processos de formação e conscientização, sobretudo com a juventude, que tem sido a vanguarda na luta em defesa do meio ambiente.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins.