terça-feira, 9 de maio de 2017

Filosofia e Cinema: Problemas Filosoficos em Dolls: A Esfera Pública e a Esfera Privada e a Questão Ética e Moral.


Por Pedro Ferreira Nunes
Em Dolls, Takeshi Kitano nos apresenta uma estória violenta e poética ao mesmo tempo – estória de alguns personagens que ao romper com ás tradições da sociedade japonesa acabam tendo um destino trágico. No embate entre manter a tradição ou subverte-la, entre cumprir o dever com a coletividade ou satisfazer sentimentos individuais percebemos uma discussão entre ética e moral. Nessa linha salientamos o pensamento de Adolfo Sanchez Vasquez a cerca dessa questão. Para este autor as questões éticas não dizem respeito apenas a nós, mas também a outras pessoas. Já a moral são atos e formas de comportamento dos homens em face de determinados problemas. (Vasquez, 1984). Logo nosso objetivo nesse breve artigo é abordar a questão ética e moral á partir da perspectiva de Adolfo Sanchez Vasquez no filme Dolls de Takeshi Kitano. Antes faremos uma breve abordagem a cerca da questão da coletividade versus individualidade, relacionando tal temática com a influência do pensamento de Confúcio na sociedade japonesa. E ainda nessa linha faremos uma relação do problema a cerca da coletividade versus individualidade com a questão da esfera pública e da esfera privada a partir do pensamento de Hanna Arendt. E por fim abordaremos a violência apresentada em Dolls – uma violência que não é explicita, mas que não deixa de ser impactante. Aliás, o impacto da violência em Dolls esta no fato de que ela não é explicita.
Dolls e a questão da coletividade versus individualidade
O problema a cerca do dever com a coletividade versus a individualidade – de manter a tradição ou subvertê-la é uma das questões centrais que percebemos nas estórias dos personagens de Dolls. Por exemplo, quando Matsumoto decide abandonar o casamento no ultimo momento com a filha do Chefe para resgatar sua antiga noiva que tentara o suicídio após o termino da relação. Já Nukui abandona o seu dever no trabalho para se aproximar do seu ídolo. E Hiro ao romper com as regras rígidas da máfia ao se relacionar em público com sua amada. Em todas essas estórias percebemos o rompimento com o dever com um coletivo para satisfação de desejos individuais. E nesse embate entre deveres coletivos e sentimentos individuais percebemos a influência da filosofia confucionista que ainda hoje tem forte presença na cultura japonesa.
Segundo Ferreira (2008) “a manutenção desse pensamento se dá não apenas num estabelecimento de uma relação hierárquica dentro da sociedade, mas principalmente na força de um pensamento que valoriza o sentimento comunitário, o pertencimento a um grupo, que pode ser a família, a turma, a empresa, acima das individualidades. As relações hierárquicas vão se estabelecer muitas vezes dentro desse sentimento de grupo”. Logo quando os personagens de Dolls rompem com essa logica acabam sendo punidos – todos acabam tendo um destino trágico por romperem com a tradição, com o dever, com a coletividade. E tais decisões acabam desencadeando uma cadeia de violência. Que, aliás, é uma característica desse filme.


A violência em Dolls ou a beleza da dor
Em Dolls, Takeshi Kitano nos apresenta uma perspectiva diferente da violência. Não aquela violência de uns contra os outros que geralmente vemos no cinema, mas sim uma violência contra si mesmo – uma espécie de autopunição, de autodestruição. É o que percebemos, por exemplo, na estória do fã (Nukui) que cega os próprios olhos para se aproximar do seu ídolo – e como consequência acaba morrendo atropelado. Ou do casal de mendigos acorrentados (Sawako e Matsumoto) que caminham para o precipício. Ou do chefão da máfia (Hiro) que por tentar reviver um antigo romance do passado acaba sendo assassinado por não cumprir as regras que seu cargo de chefe da máfia exige. Também podemos afirmar que a violência que mais chama atenção em Dolls não é a violência explicita, mas sim aquela que está em pequenos gestos como, por exemplo, quando o fã pega o estilete para furar os olhos – não precisamos vê-lo furando os olhos para sentir a dor, ou quando o mesmo é atropelado e vemos apenas o vermelho do seu sangue – não precisamos ver o seu corpo ensanguentado para sentir a dor. Já no caso do chefão da máfia a violência não esta quando ele leva os tiros, mas nos segundos antes quando ele olha para os seus capangas que o esperam no carro e percebe que será morto pelas costas. E no caso do casal de mendigos acorrentados é o momento em que ele pega a corda e fica analisando-a, pensando no que irá fazer. Ali percebemos o ponto extremo a que eles chegaram e que os levará para o abismo.
Segundo Ferreira (2012) “em Dolls destaca-se uma violência que não é física, mas sim uma violência dos sentimentos, presente nas relações entre os personagens, na impossibilidade de realização desses relacionamentos”. Porém toda essa violência nos é apresentada de uma forma poética, de uma forma bela. E a beleza tal como a violência esta nas ações e nos gestos. Ações que os levam a romper com os “status cos”, com o pensamento hegemônico, com o “tu deves” – ações que são “gritos de liberdade preso na garganta”. (Garatos Podres, 1993). Ainda nessa linha sobre a forma poética como a violência é apresentada em Dolls é importante destacar a contribuição de Ariano Suassuna ao analisar o pensamento de Aristóteles sobre as categorias de beleza, em especial o sublime e o trágico. Para Suassuna (2008) o Sublime é aparentado com o Trágico, por que ambos despertam o terror e a piedade. A distinção entre os dois se encontra no fato de que enquanto o Trágico é despertado por uma ação, o Sublime se dá pelo pensamento. Logo podemos afirmar que o Sublime está ligado mais as artes literárias, como por exemplo, a poesia épica e a filosofia. Já a tragédia esta mais ligada ao Teatro. E é justamente no Teatro Bunraku que Takeshi Kitano vai se inspirar para contar as estórias trágicas e violentas de seus personagens no filme Dolls.

Dolls e a questão da esfera pública e da esfera privada
Para Arendt (2011) a esfera pública é aquilo que é comum a todos. Logo “a esfera pública, enquanto mundo comum reúne-nos na companhia uns dos outros e, contudo evita que colidamos uns com os outros”. (Arendt, 2011). Percebemos ai a questão do dever – o dever é fundamental para que não colidamos uns com os outros. A coletividade também contribui para que não caminhemos para o isolamento radical. E a partir dai para um processo de negação da pluralidade que pode levar os homens a se tornarem seres privados. Privados no sentido de não conseguir dialogar com o outro. Podemos perceber tal fato em Dolls, sobretudo na estória de Matsumoto e Sawako que caminham para um completo isolamento.
Por outro lado Arendt (2011) também ressalta o risco de se perder a privacidade. Das pessoas não terem direito a viver seus sentimentos para atender o coletivo. Nessa linha a esfera privada acaba se tornando um refugio para o homem diante do mundo comum. Sendo que quando se vive apenas em público acabaríamos tendo uma vida superficial. É justamente disso que os personagens de Dolls buscam fugir – de uma vida superficial. Pois se aceitasse se casar com a filha do chefe Matsumoto não estaria fazendo o que gostaria mais sim a vontade dos seus pais. Logo o que resultaria de uma união forçada era uma vida superficial. Da mesma forma Nukui e Hiro.
Segundo Arendt (2011) “não é de forma alguma verdadeiro que somente o necessário o fútil e o vergonhoso tenham o seu lugar adequado na esfera privada. O significado mais elementar das duas esferas indica que há coisas que devem ser ocultadas e outras que necessitam ser expostas em público para que possam adquirir alguma forma de existência”. A partir dessa reflexão percebemos como é fundamental garantir a existência tanto de uma esfera pública como de uma esfera privada. Á perca de uma dessas ou das duas é perigoso. Nesse sentido podemos concluir que se Matsumoto, Nukui e Hiro optassem por atender aos deveres coletivos, ao invés de sucumbir aos sentimentos individuais, não teriam um destino menos trágico. Pois abrir mão da nossa individualidade de viver o que sentimos para assumir o papel que a sociedade nos impõe não deixa de ser uma violência, uma tragédia. Logo é preciso buscar um meio termo – onde o público e o privado coexistam. Porém em uma sociedade tradicional e hierárquica isso não é uma tarefa fácil. Dai que a saída do auto sacrifício parece ser uma perspectiva mais honrosa. E foi justamente esse o caminho trilhado por Matsumoto e Sawako – o casal de mendigos acorrentados, pelo jovem Nukui – o fã que cegou os olhos, e por Hiro – o chefe da máfia.


Dolls e a questão ética e moral
O problema central em Dolls é a cerca do dilema entre manter a tradição ou subverte-la, em cumprir os deveres com o coletivo ou realizar seus desejos individuais. Nas estórias que se entrelaçam os personagens decidem romper com o coletivo para viver seus desejos individuais. Eles decidem se isolar na esfera privada e se afastarem completamente da esfera pública. E tal decisão acaba os levando para um final trágico. Por outro lado, se eles houvessem optado em seguir um caminho oposto, isto é, se cumprissem os deveres exigidos pelo coletivo, teriam tido um destino menos trágico? Como afirmamos anteriormente, acreditamos que não. E do ponto de vista da ética e da moral como podemos ver essa questão central que nos apresenta Takeshi Kitano em seu Dolls? Antes propriamente de abordar essa questão nos cabe aqui brevemente diferenciar a ética de moral.
Nessa linha ressaltamos que a ética é generalista, logo seus princípios devem ser universais. Ela se torna, portanto de caráter mais teórico do que prático. Logo o que se faz concretamente está mais ligado à questão moral do que ética. Sendo assim, a ética esta ligada a teoria enquanto a moral a prática. Diante disso fica claro que em Dolls as ações dos personagens são de ordem moral e não éticas.
É possível falar em comportamento moral somente quando o sujeito que assim se comporta é responsável pelos seus atos, mas isto, por sua vez, envolve o pressuposto de que pôde fazer o que queria fazer, ou seja, de que pôde escolher entre duas ou mais alternativas, e agir de acordo com a decisão tomada. O problema da liberdade da vontade, por isso, é inseparável do da respon­sabilidade. (Vasquéz, 1984)
Matsomoto, Sawako, Nukui e Hiro agiram moralmente pelo fato de que todos eram responsaveis pelos seus proprios atos, tinham mais de uma opção, e quando decidiram por tal opção seguiram até as ultimas consequências. Logo ao exercerem a liberdade de escolha, tiveram que arracar com as responsabilidades adivindas de suas decisões. Mas esse comportamento moral baseado na individualidade choca com a moralidade hegemonica. Isto é, com a moralidade da comunidade. E isso percebemos claramente em Dolls, um conflito entre morais distintas. Tal fato é uma caracteristica de uma sociedade fundamentada na divisão de classes, concepções diferentes de morais, e, por conseguinte uma disputa entre estas. Assim Vasquéz (1984) vai afirmar que a moral tende a se diversificar de acordo com os interesses antagonicos. E isso contribuie para que se tenha um progresso moral. Claro que numa sociedade tradicionalista e hierarquica como é a japonesa esse progresso moral é um tanto mais lento como em outros países – onde existe uma maior disputa de classes e, por conseguinte de morais. É justamente nesse interim que entra a ética.
Segundo Vasquéz (1984) “A ética parte do fato da existência da história da moral, isto é, toma como ponto de partida à diversidade de morais no tempo, com seus respectivos valores, princípios e normas. Como teoria, não se identifica com os princípios e normas de nenhuma moral em particular e tampouco pode adotar uma atitude indi­ferente ou eclética diante delas. Juntamente com a explicação de suas diferenças, deve investigar o princípio que permita com­preendê-las no seu movimento e no seu desenvolvimento”.
Nessa linha podemos fazer uma leitura de Dolls como uma obra que aborda a questão ética – o filme de Takeshi Kitano não busca determinar ou criar uma nova moral, mais sim analisar a história da moral no Japão e como ela se consolidou. Uma moral hegemônica baseada num dever com o coletivo, com a hierarquia e a tradição. Mas sem esconder os conflitos morais que existe no país. Assim Kitano contribui com seu filme não apenas para que compreendamos a moral ou as morais japonesa, mas também o seu desenvolvimento.

Conclusão
Partindo da concepção de que a Filosofia possui problemas, sendo que segundo Porto (2002) a unidade dinâmica interna desses problemas é o que está na base da multiplicidade e da mudança de temas e opiniões. E ainda que o caminho para entendermos um autor é ver a sua filosofia como resposta “ao” problema que ele se coloca. Assim buscamos analisar e compreender o filme Dolls do cineasta Japones Takeshi Kitano a partir dos problemas filosoficos que ele nos apresenta, isto é, a questão da esfera pública e da esfera privada e a questão da ética e da moral. E para compreender essas questões buscamos as reflexões dos filosofos Aldofo Sánches Vasquéz e de Hanna Arendt. O que nos levou a concluir que a ética e a moral é um tema central discutido em Dolls.


Referências bibliográficas
ARENDT, H. A Condição humana. 10º ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2011.
FERREIRA, GUSTAVO HERINQUE LIMA. Dolls: O teatro Bunraku no cinema de Takeshi Kitano. UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. AVANCA | CINEMA 2012.
GAROTOS PODRES. Aos fuzilados da CSN. CD canções para ninar. Vol. 01 – São Paulo: Independente, 1993.
PORTO, MARIO ARIEL GONZALEZ. A filosofia a partir de seus problemas. São Paulo: Ed. Loyola, 2002.
SUASSUNA, ARIANO. Iniciação á Estética. – 9º edição – Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.
VÁSQUEZ, ADOLFO SÁNCHEZ. Ética. - 4º ed. Barcelona: Editorial critica, 1984.

quarta-feira, 3 de maio de 2017

Notas de um dia histórico: Estudantes, Professores e Técnicos Administrativos da Universidade Federal do Tocantins participam da maior Greve Geral da História do Brasil.

*Por Pedro Ferreira Nunes
Era pouco mais das 05h30 da manhã quando chegamos ao campus Palmas da Universidade Federal do Tocantins para nos somarmos aos técnicos administrativos e professores do Comitê Reage UFT que ali estavam para fazer um piquete e mobilizar a comunidade acadêmica a aderir à greve geral. Não perdemos tempo e logo abrimos nossas faixas que davam o recado: GREVE GERAL! FORA TEMER: EM DEFESA DOS NOSSOS DIREITOS. SERVIDORES DA UFT NA LUTA! UFT NA LUTA E NAS RUAS: CONTRA AS REFORMAS DO GOVERNO TEMER! UFT NA GREVE GERAL: EM DEFESA DOS DIREITOS DOS SERVIDORES PÚBLICOS! Com megafone em punho anunciávamos – 28 de Abril é Greve no Brasil. E assim, aos poucos mais e mais pessoas foram se incorporando ao movimento que também recebia a solidariedade dos motoristas que por ali passavam seguindo rumo a BR – 153.

Os primeiros raios do sol da manhã chegaram trazendo consigo os primeiros ônibus. Logo pensamos, é agora que começará os questionamentos e as tentativas de furarem o piquete. Mas para nossa felicidade á maiorias dos ônibus que chegavam estavam completamente vazios. Apenas um ou outro estudante desavisado que não criou problema algum. Isso nos mostrou o quanto havia sido bem sucedido o trabalho de mobilização para greve geral realizado pelo comitê Reage UFT – um trabalho que começou ainda no início de abril e que realizou reuniões, assembleias e discussões com toda a comunidade acadêmica no sentido de convencê-la da importância de aderir a greve geral. E como fruto desse trabalho árduo não houve nenhuma resistência por parte de professores, estudantes, técnicos administrativos ou dos terceirizados no sentido de furar a greve geral na UFT.

O único problema que tivemos foi com dois servidores da Unitins que tentaram furar o piquete, já que para chegar ao campus Graciosa da Unitins é preciso passar pelo portão da UFT. Estes servidores chegaram a nos ameaçar. Mas logo foram convencidos do contrário. A maioria dos estudantes que chegavam nos ônibus eram da Unitins também. Mas em nenhum momento tentaram forçar a entrada, pelo contrário disseram que só estavam ali por que a direção da Unitins e seus professores haviam lhes obrigados a irem utilizando-se claramente da “prova” como instrumento de coerção.

O gozado é que esse professor que obrigou os seus estudantes a irem para aula e não participar da greve, pois se não perderiam a prova e levariam bomba, nos acusou de obrigar as pessoas a aderir ao movimento grevista. Ora, qual a moral de um sujeito desses que fazendo uso de sua autoridade tentou obrigar seus estudantes a boicotar o movimento grevista? Foi à mesma atitude de patrões que ameaçaram cortar o ponto de seus funcionários e dos governos de plantão que se utilizando das forças policiais reprimiu os manifestantes Brasil afora. No entanto não conseguiram impedir que a greve geral fosse realizada com êxito. Mas esse episódio também deve nos servir de lição para que na próxima façamos um trabalho de base na Unitins tal como fizemos na UFT e no IFTO.
Marcha Unificada das Centrais Sindicais e Movimentos Sociais na JK
O Sol estava alto, enquanto isso mais pessoas se somavam ao piquete na entrada do campus Palmas. As noticias que nos chegavam de outras partes eram animadoras – São Paulo e outros grandes centros estão parados. O interior do Tocantins também em luta – Porto Nacional, Araguaína, Gurupi, Tocantinópolis, Divinópolis, Miracema. Na avenida JK em frente ao Colégio São Francisco milhares de manifestantes se concentravam para marcha unificada.
Com o nosso primeiro objetivo cumprido ali no portão da UFT era o momento de se somar aos outros trabalhadores e organizações sociais na marcha unificada. E assim fizemos, saímos em comboio pelas ruas de Palmas até o local da concentração. Ao longo do caminho não pude deixar de notar o estacionamento do shopping vazio – o que nos trouxe grande felicidade. Vazio também estava o comercio na avenida JK e os ônibus que circulavam com um ou outro desavisado.
Era por volta das 09h da manhã quando a marcha partiu cortando á avenida JK em sentido ao palácio Araguaia. Eram milhares de trabalhadores de diversas categorias – com faixas, bandeiras e cartazes – professores, servidores gerais, trabalhadores sem teto, trabalhadores sem terra e a juventude. Aliás, era a juventude com seu fervor e entusiasmo – cantando, dançando, e gritando palavras de ordem que seguia na linha de frente. Estudantes, Professores e Técnicos Administrativos da UFT vinham em seguida com grande entusiasmo. Entusiasmo que ia aumentando com a incorporação cada vez maior de estudantes, professores e técnicos administrativos que haviam ido direto para a marcha. O que fez com que o bloco coordenado pelo comitê Reage UFT fosse um dos mais destacados na manifestação.

Enquanto a marcha seguia triunfante, um helicóptero da policia militar a mando do governador Marcelo Miranda (PMDB) nos provocava ameaçadoramente com agentes fortemente armados. Os policiais que acompanhavam do chão tentavam impedir que tomássemos toda a pista. Mas não tiveram êxito, as provocações por parte do aparelho repressivo só aumentou a nossa disposição. E assim a marcha seguiu. Seguiu firme até chegar ao seu destino final. E ali encerramos com um grande ato onde as diversas organizações presentes falaram contra as reformas do governo Temer, pediram por sua saída e conclamaram por eleições gerais já.
Algo que gostaríamos de destacar foi de fato o caráter unitário da manifestação em Palmas. Algo que eu particularmente ainda não havia visto. Centrais sindicais e movimentos sociais deixando de lado suas diferenças para marchar conjuntamente numa luta comum – sem brigas, sem disputa de ego para ver quem dirigia o movimento. CUT, UGT, Força Sindical, CTB, CSP-Conlutas, NCST. Além dos sindicatos, dos movimentos sociais, e da juventude trabalhadora. Me dei conta dessa unidade quando num dado momento uma camarada passou por mim com uma camisa da CUT, um chapéu da UGT e uma bandeira da CTB na mão.
Breve balanço
O principal objetivo de uma greve geral não é apenas colocar milhares de trabalhadores nas ruas. Mas sim atingir o bolso do capitalista, parar economicamente o país, e incomodar governos e patrões. E esse objetivo a greve do dia 28 de Abril alcançou inquestionavelmente. Ora, a mesma impressa que tenta desqualificar o movimento noticia que houve locais em que a queda das vendas no comercio chegou a 70%. Outro veiculo de comunicação aponta uma estimativa de perca de 5 bilhões de faturamento em todo o Brasil. As imagens do comercio com portas fechadas, ruas vazias e ônibus e metrôs parados falam por si só e é muito mais significativo do que milhares de pessoas com uma camisa da seleção brasileira de futebol num domingo a tarde caminhando como gado obedecendo a elite oligárquica que comanda o país.

Ao contrário de alguns camaradas, não me causa nenhuma indignação à cobertura da imprensa brasileira a cerca da greve geral. Muito pelo contrário, isso é um ótimo sintoma. Senti fortemente os ares de junho de 2013 quando as manifestações que começaram a crescer a cada dia obrigou a grande imprensa e os governos de plantão a mudar o discurso. Ora não é nenhuma surpresa a tentativa por parte do governo e da imprensa de desqualificar o movimento legitimo dos trabalhadores e, por conseguinte criminaliza-lo. Novamente vemos o discurso que tenta dividir os “bons manifestantes e os maus manifestantes”, como também uma linha de dar ênfase maior nos confrontos violentos. Tudo isso é um sintoma forte do abalo causado pela greve geral.
Ora, “dizei-me anêmicos e anões” desde quando se faz movimento grevista para agradar o patronato e o governo? Se faz greve justamente para incomodar. E o fato é que incomodamos, incomodamos e muito. E isso sim é democracia, como afirma o professor José Paulo Netto “quem quer democracia conversando do palácio com luva de pelica, na verdade nem quer conversar e nem quer democracia”.
Por fim é preciso destacar uma diferença da greve geral com as manifestações de junho de 2013. Agora temos uma direção política e esse fato abre uma grande perspectiva para o próximo período, logo não tenho duvida que uma próxima greve geral, á qual não devemos ter receio e nem devemos perder tempo em começar a articular, será muito maior e mais histórica do que essa greve. Sigamos sem vacilar nessa luta, hasta la victoria siempre!

*Coordenador do Centro Acadêmico de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins, Membro do Comitê Reage UFT e militante do Coletivo José Porfírio.

E a crise governador?

Desde que assumiu o governo do Estado pela terceira vez Marcelo Miranda (PMDB) vem afirmando que o Tocantins passa por uma grande crise econômica. Foi em nome dessa crise que aprovou um ajuste fiscal aumentando impostos sobre a população tocantinense, especialmente o ICMS. Foi em nome dessa crise que realizou uma reforma administrativa acabando com algumas secretarias e fundindo outras, com destaque para secretaria de Cultura. Foi em nome da crise que passou a pagar os servidores quase na metade do mês. E em nome da crise parcelou o pagamento da data-base. A lista não é pequena, portanto paremos por aqui. Vamos ao que interessa, isto é, mostrar aquilo que sempre afirmamos, de que a crise tão propalada pelo governo Marcelo Miranda não passa de um engodo.
Ora se o Estado do Tocantins esta em crise como é que o governador cria novas secretarias de governo onerando assim os cofres públicos? Quer dizer então que acabou a crise? Não, a crise não acabou. E não acabou por que simplesmente nunca existiu. A própria declaração do governo dizendo que os impactos financeiros com a criação dessas novas secretarias será mínimo mostra bem. “... as estruturas dessas pastas já existiam e a maioria dos cargos vai ser apenas realocado”. Ora, portanto na prática quer dizer que a então reforma administrativa de 2016 foi apenas para criar uma cortina de fumaça para que o governo Marcelo Miranda aumentasse impostos e deixasse de pagar corretamente os direitos dos servidores estaduais? Enquanto discursava para população de que estava cortando na própria carne, na verdade estava apenas maquiando a realidade.
Por outro lado a declaração de que os impactos financeiros nos cofres do Estado serão mínimos tem uma contradição, pois ao mesmo tempo que afirma que irá aproveitar uma estrutura já existente que havia sido apenas realocada, também afirma que criará cargos de secretário, subsecretários e algumas gerencias. Ora são justamente os cargos que tem os maiores impactos na folha de pagamento, já que estes servidores ganharam salários bem superiores aos demais. Deve ter sido por isso que ao mesmo tempo em que criou as novas secretarias anunciou um corte no orçamento na casa dos 63 milhões. Pois afinal das contas, alguém tem que pagar a conta com a criação dessas novas secretarias e esses novos cargos comissionados.
Diante de tudo isso uma coisa esta clara, não existe crise, a crise é uma falácia do governo para tirar direitos dos trabalhadores. Outra questão é que não podemos ficar calados, devemos denunciar amplamente – a recriação da Secretaria de Articulação Politica, da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano. E a criação da Secretaria Extraordinária de Assuntos Comunitários – onde nomeou um ex-deputado para o cargo. Atende a um único proposito – comprar apoio político para as próximas eleições ao governo do Estado – na qual Marcelo Miranda pretende concorrer à reeleição.

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

In memória dos camponeses tombados pelas balas genocidas do latifúndio.


Camaradas camponeses
In memória dos camponeses tombados pelas balas genocidas do latifúndio.
 
Camaradas camponeses
que nas mãos trazes o calo da enxada
que cultiva a terra abençoada
para produzir alimento pra nação.


Camaradas camponeses
que há anos resiste nas margens das rodovias
em baixo de barracas de lona
sonhando com um pedaço de chão.


Camaradas camponeses
sai governo e entra governo
a reforma agrária continua no papel
e tu na mesma situação.


Camaradas camponeses
continuam sendo violentados
milhões são assassinados
nos mais distantes rincões.


Camaradas camponeses
a justiça aqui é só para os ricos
não nos iludamos por tanto.
façamos justiça sim
- Mas com nossas próprias mãos.


Pedro Ferreira Nunes
Casa da Maria Lúcia. Lajeado – TO. Lua Minguante. Outono de 2017.

“Sobre a Origem e a Natureza dos Afetos” – Terceira parte do livro – Ética Demostrada em Ordem Geométrica, de Baruch Spinoza.


Sonia Rosa Neiva e Pedro F. Nunes 
Estudantes de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins. 

Qual a origem e a natureza dos afetos? Antes precisamos saber – O que são afetos? E a natureza? O que é a natureza? O que são o desejo (cupiditas), a alegria (laetitiae), a tristeza (tristia)? Como podemos amar e odiar? Aliás, o que é o amor? Existe o livre arbítrio? Trazemos conosco a alegria e a tristeza? Mente e Corpo são substâncias distintas? Somos por natureza – invejosos e propensos ao ódio e a inveja? Eis os problemas que o filosofo holandês de origem judaica Baruch Spinoza se propõem a refletir na sua obra clássica “Ética demostrada em ordem geométrica” mais especificamente, na terceira parte – “Sobre a origem e natureza dos afetos”.
Spinoza busca a partir de uma perspectiva racionalista explicar os afetos e ações do homem. Ele nos dirá que tal fato é possível pela existência de leis e regras universais da natureza. Logo é preciso tratar da questão dos afetos de forma racional, sendo assim não há método melhor do que o geométrico. Para tanto Spinoza afirma que é preciso que ações e apetites (appetitus) sejam vistos como linhas, planos e corpos. Partindo dai Spinoza definirá o que é afeto – são afecções do corpo que aumentam ou diminuem, ajuda ou limita a potência de agir do corpo. Que pode ser por causa adequada ou por causa inadequada. Dependendo da causa agimos por ação ou por paixão. Para Spinoza, mente e corpo não são substâncias distintas, pelo contrário, ele se coloca duramente contra a concepção dualista de Descartes – da separação entre espirito e matéria. Para Spinoza, mente e corpo são unos, modos da mesma substância. Aliás, para este autor existe apenas uma substância que é Deus – que também pode ser chamado de natureza (Deus sive natura). Logo quando agimos por causa adequada, agimos de acordo com a natureza. Já quando agimos por causa inadequada padecemos. Para este autor existem três afetos primários que são o desejo (cupiditas), a alegria (laetitiae) e a tristeza (tristia) a partir daí advém o amor, o ódio, a esperança, o medo e etc. O contato entre estes afetos geram outros afetos. E pelo fato do corpo humano ser constituído de muitos indivíduos de natureza diversa somos afetados de diversos modos. Nessa linha Spinoza diz que nos esforçamos por promover o que nos conduz a alegria e nos esforçamos por afastar ou destruir ao que conduz a tristeza.
Spinoza ressalta a natureza invejosa do homem que o torna propenso ao ódio e a inveja. Propensão que é afirmada pela educação familiar. E que tem sido levado ao extremo na sociedade capitalista em todos os sentidos. Mas não tiremos conclusões precipitadas de que se trata de uma concepção determinista. Spinoza busca sempre ressaltar a diversidade de afetos, de objetos e de desejos. Logo a conclusão que podemos tirar é que há uma multiplicidade de possibilidades resultante dos conflitos que é o que caracteriza a realidade.
Spinoza subverteu o pensamento dominante de sua época, não abriu mão de defender o que acreditava, mesmo que isso resultasse em perseguição, sobretudo do campo religioso. Foi acusado de heresia e até mesmo de ateísmo. Mas sobreviveu, e seu pensamento influenciou grandes nomes como Karl Marx, Nietzsche e Freud, e continua influenciando diversos pensadores que a cada dia descobre uma nova potência na filosofia de Baruch Spinoza. Nessa obra especifica é importante olharmos para questão ética e moral. Para Spinoza não existe moral ou imoral, não existe bem ou mal, o que existe são corpos e suas potências (conactus) que ao entrarem em contato diminui ou aumenta, ajuda ou limita a potência de agir. Logo a realidade se torna um jogo de forças que busca afirmar o ser através da potência. 

Referência bibliográfica
 
SPINOZA, Baruch. Ética Demostrada em Ordem Geométrica - Terceira Parte “Sobre a Origem e a Natureza dos Afetos”. Tradução: Roberto Brandão. Disponível em minhateca.com.br. Acesso em: 25 de Março de 2017. 


*Resumo para apresentação no Seminário da disciplina de Fundamentos de Ética, do 5° período do Curso de Filosofia.

terça-feira, 18 de abril de 2017

Todo Apoio a Greve Geral do Dia 28 de Abril

Levanta-te, povo trabalhador!
A mãe, Gorki.

Desde que Michel Temer (PMDB) assumiu a presidência do Brasil após a queda de Dilma Rousseff (PT) que o Coletivo José Porfírio vem fazendo um chamado à greve geral como alternativa para derrubarmos o atual governo como também suas reformas que retiram direitos dos trabalhadores e beneficiam o grande capital. Nesse sentido saudamos a iniciativa das organizações da classe trabalhadora que enfim conseguiram sentar na mesma mesa e unitariamente organizar a greve geral do dia 28 de Abril. Tal iniciativa acontece num momento decisivo onde avançam no congresso nacional projetos de leis que pulverizam os direitos dos trabalhadores conquistados historicamente. Em especial a reforma da previdência.

O avanço das investigações da lava jato nos mostra que o atual governo bem como o congresso nacional não tem nenhuma condição ética e moral de realizar as mudanças quem vem sendo imposta ao conjunto da população. Por tanto mais do que nunca é preciso afirmar as palavras de ordem – Não à reforma da previdência! Não a reforma trabalhista! Fora Temer! Fora todos eles! Por eleições gerais já! Os trabalhadores não podem pagar a conta por aqueles que saquearam os cofres públicos. Logo não podemos recuar um milímetro na disposição de derrubar o atual governo e suas reformas aviltantes.

Nesse sentido a Greve Geral do dia 28 de Abril tem que ser um marco histórico de retomada do protagonismo dos trabalhadores brasileiros da cidade e do campo que foi perdido nos últimos 16 anos. No entanto isso só acontecerá se de fato tivermos uma greve geral, e não apenas a paralização de alguns setores. Uma greve que de fato seja capaz de parar completamente a maquina capitalista – de norte a sul. No campo e na cidade. Nessa linha a classe trabalhadora argentina tem muito a nos ensinar através da greve geral realizada no dia 06 de abril naquele país.

Ora, devemos nos questionar – qual o legado deixaremos para as futuras gerações? Dizia Lênin – há décadas que nada acontece e há semanas em que décadas acontecem. Este é o momento de fazermos acontecer, pois se não ficaremos para história como a geração que não teve a capacidade de resistir para garantir os direitos que tantos camaradas derramaram o sangue para conseguir e nos deixar de legado, legado que devemos levar adiante.

Nós do Coletivo José Porfírio que sempre defendemos e estamos diretamente ajudando a construir a greve geral fazemos um chamado a todas e todos os trabalhadores – operários, camponeses pobres, estudantes – a marcharem unitariamente no dia 28 de abril dando um recado claro a esse governo – seus dias estão contados! Não aceitaremos nenhum direito a menos!

Pedro Ferreira Nunes
Coletivo José Porfírio

                                                              Lajeado-TO. Lua Cheia – Outono de 2017.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

A questão educacional no filme “Nenhum a menos”.


Numa perspectiva libertadora da educação o educando não apenas aprende como também ensina, assim como o educador não apenas ensina como também aprende. E nesse processo dialógico tanto o educando como o educador se transforma como também transformam o meio em que vivem. No filme chinês “Nenhum a menos” do cineasta Zhang Yimou vemos esse processo.
O filme “Nenhum a menos” conta a história de uma adolescente de 13 anos – Wei Minzhi – que sem nenhuma formação docente, assume uma turma de crianças num pequeno vilarejo pelo fato do único professor local ter sido obrigado a viajar para cuidar de sua mãe que esta doente. O professor promete que se a jovem não perder nenhum aluno, quando ele retornar lhe pagará seu salário e mais uma gratificação. Percebemos, portanto, que no inicio da história o único interesse da garota é com o dinheiro que irá receber. Tanto é assim que o seu objetivo é não perder nenhum educando, pois um a menos significa ter seu salário reduzido.
Seu grande objetivo passa a ser então manter as crianças na sala de aula independentemente se estão estudando ou não, se então aprendendo ou não. Mas a convivência com os educandos vai transformando a professora, aliás, logo a jovem professora percebe que tem muito mais a aprender do que a ensinar seus pequenos educandos.
O momento no filme em que essa transformação fica mais evidente é quando um educando abandona a escola para ir para cidade grande trabalhar para ajudar sua mãe que esta doente e vive em situação de miséria. Wei que já havia perdido uma educanda que fora selecionada para estudar numa escola de formação de atletas profissionais, agora perde um segundo. Vendo seus interesses contrariados á professora decide ir atrás desse educando até a cidade grande para traze-lo de volta. Neste momento Wei ainda tem em mente apenas o seu próprio interesse. Mas é no processo de descobrir o que fazer para trazer o educando de volta que ela começa sua transformação e, por conseguinte a transformação dos seus educandos.
Wei percebe que tem muito mais a aprender do que ensinar com os educandos. E essa mudança de postura da professora, faz com que os educandos mudem também – se tornem mais participativos e propositivos. É ai que percebemos a transformação tanto da educadora como dos seus educandos. Processo de transformação que só se completa quando ela realiza a viagem, fazendo enormes sacrifícios, para trazer de volta o educando que estava perdido na cidade grande. Quando retornam para casa, tanto ela como ele já não são mais os mesmos.
É inquestionável o papel transformador da educação. Não qualquer educação. Mas uma educação que tem como perspectiva a emancipação do sujeito. Onde educador e educando aprendem e ensinam mutuamente. Logo é preciso que o educador não tenha uma postura conservadora e autoritária, o estudante por sua vez não pode aceitar pacificamente conteúdos que muitas vezes não condiz com sua realidade. Quanto mais se trabalha questões da realidade concreta do estudante relacionando com as teorias cientificas, melhor se dá o aprendizado. Por fim, é preciso ter em mente o ensinamento do grande educador Paulo Freire – ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo. É justamente isso que ocorre no filme “Nenhum a menos”.
  
Pedro Ferreira Nunes é Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio.