quarta-feira, 15 de maio de 2024

Transporte Urbano de Palmas e a luta por Tarifa Zero

Esses dias voltando do Lajeado para Palmas tive que pegar um coletivo até a casa onde estou ficando no Aureny I. Assim que cheguei no ponto já me certifiquei de pegar o dinheiro da passagem. Só então quando o ônibus chegou é que me lembrei que aos finais de semana (e feriados) o transporte público é gratuito. Fiquei pensando comigo o quanto isso não é importante para quem mora na periferia e depende do transporte público. O transporte coletivo gratuito possibilita a essas pessoas terem acesso a equipamentos culturais que estão centralizados como cinemas. Ou visitar parentes e amigos que moram no outro extremo da cidade.

Me lembrei disso após a declaração do Carlos Amastha, pré-candidato a prefeito de Palmas, criticando o modelo de gestão atual do transporte público a cargo do executivo municipal. E defendendo o modelo de concessão. Ou seja, se caso for eleito, Carlos Amastha certamente irá rever o modelo atual. Passando para iniciativa privada a gestão do transporte público da capital. O discurso certamente será em torno da promessa de melhoria dos serviços.

Não sou um usuário frequente do transporte público da capital. De modo que não posso dizer se o serviço atual é de qualidade e atende as necessidades dos usuários. Mas posso afirmar que não é tão inferior em relação ao anterior (que utilizei quase diariamente nos tempos da graduação na UFT). E com planejamento e investimento pode melhorar.

Diante disso vejo como um retrocesso qualquer proposta de retorno ao modelo anterior. Devemos sim lutar para que o modelo atual seja melhorado. Inclusive ampliando a gratuidade para mais usuários, como por exemplo aqueles que estão desempregados e muitas vezes não tem condições de se deslocar em busca de serviços. O que não é possível num modelo de gestão dominado pelas empresas que visam exclusivamente o lucro.

De acordo com Santini (2019) “a adoção da tarifa zero está entre as soluções mais interessantes para cidades, com potencial para melhorar o trânsito, o bem-estar e a qualidade de vida não só de quem usa as redes abertas, mas de toda a população.” Essa compreensão é fundamental para que a população compreenda que defender um serviço de transporte coletivo urbano de qualidade é tarefa de todos os cidadãos independente se é ou não usuário desse serviço. Pois políticas como essa afetam a vida de todos.

Santini (2019), explica que “além da fonte de recursos, o formato das políticas de passe livre também variam. Elas podem ser universais ou parciais, considerando que a tarifa zero pode ser adotada para atender apenas parte do público, funcionar somente em parte da rede ou estar limitada a determinados horários”. 

Ainda estamos distantes para que a tarifa zero se torne uma política universal. Enquanto isso, não podemos deixar de reivindicar tarifas zeros parciais como a adotada pela Prefeitura de Palmas. E em outras partes do Brasil voltadas para determinados públicos como os idosos.

Sobre isso, Santini (2019) destaca que “essa é uma conquista considerável que deve ser valorizada. Garantir mobilidade para essa faixa etária é uma forma de incentivar quem não está mais no mercado de trabalho a sair de casa e seguir ativo.” Ele também salienta que há “outras políticas de passe livre parcial – como as que atendem estudantes, portadores de necessidades especiais, pessoas  de baixa renda e integrantes de determinadas categorias profissionais, como carteiros, policiais e bombeiros, entre outras. Ou ainda, como já indicado, as que incluem dias e horários específicos ou áreas limitadas.” Santini (2019) destaca que “as regras variam de região para região e, normalmente, os benefícios são conquistas relacionadas à pressão social”.

É nesse sentido que caminhamos para o encerramento dessas linhas. Chamando atenção para a necessidade da pressão social para que essa conquista da população palmense não seja perdida. Outro fator é usar esse como um dos critérios na hora de escolher em quem votar nas eleições municipais. As empresas certamente terão os seus representantes nessas eleições, pois certamente eles têm interesse em voltar a controlar o serviço. Tanto que tentaram sabotar o início da implantação  do modelo atual.

Enfim, concluímos com os questionamentos do Santini (2019), Transporte é um direito ou um serviço a ser oferecido? Queremos cidades que privilegiem o ganho coletivo ou cidades pensadas para tentar maximizar a liberdade individual acima de tudo, com prioridade de investimentos para o transporte individual motorizado?

Por Pedro Ferreira Nunes - Especialista em Filosofia e Direitos Humanos e Professor da Rede Estadual da Educação do Tocantins.

sexta-feira, 10 de maio de 2024

Os afetos que circulam entre os muros das escolas

Imaginem a cena. O professor começa a dar sua aula tranquilamente quando um estudante questiona sobre as notas que obteve no bimestre. O professor pergunta onde ele conseguira aquela informação já que as notas ainda não haviam sido divulgadas oficialmente. Mas nem espera pela resposta, logo deduz que tinham sido vazadas pelas duas representantes dos estudantes que tinham participado do conselho de classe. Outros estudantes também começam a questionar a postura dos professores durante o conselho de classe, sobretudo o modo como se referiam a alguns alunos, chegando-o a chamar um deles de limitado. Acuado o professor começa a questionar a postura das representantes dos estudantes no conselho, ao ponto de lhes compararem a vagabundas. A partir daí a discussão sai de controle e um estudante acaba tendo uma reação mais extremada e atinge fisicamente uma colega. Esse estudante que já vinha sendo bastante visado pelos professores devido a uma série de atos de indisciplina acaba sendo expulso da escola.

A cena descrita é do filme francês “entre les murs” (que no Brasil recebeu o título de “Entre os muros da escola”) de 2008, dirigido por Laurent Cantet. Baseado num livro (com o mesmo título) de autoria de François Bégadeau, que relata a experiência de um jovem Professor de Francês numa escola na periferia de Paris (França) marcada por muitos conflitos entre professores e estudantes. 

O caminho tomado pela direção escolar para superar ou apaziguar os conflitos é o autoritarismo. A questão é que num ambiente autoritário como aponta Freire (1987) não há diálogo, e onde não há diálogo a tendência é os indivíduos construírem muros em torno de si. O filme mostra muito bem essa realidade. E a cena que destacamos no início ainda mais ao mostrar um afeto que circula num ambiente marcado pelo autoritarismo e pela falta de diálogo, esse afeto é o ódio.

De acordo com Espinoza (2014, p. 44) “o ódio é uma tristeza concomitante à ideia de uma causa externa”. Trata-se, portanto, de um afeto que limita ou diminui a nossa potência de agir. Isto é, quando agimos dominado por esse afeto, não agimos racionalmente. Acabamos cometendo uma violência, seja verbal como no caso do Professor ao chamar as estudantes de vagabundas, ou como no caso do estudante que feriu uma colega fisicamente, ainda que de forma não intencional. Ou pior, quando analisamos acontecimentos trágicos como o massacre numa escola pública de Suzano (São Paulo) em março de 2019.

Numa perspectiva aristotélica diríamos que o problema tanto por parte dos professores como dos estudantes dessa escola é a falta de moderação dos afetos. Quando não há essa moderação ao invés de agirem de forma virtuosa, agem pelo vicio, ou da falta ou do excesso. De acordo com Aristóteles (1991, p. 36) a virtude é “uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consiste numa mediania [...] um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria”. Nosso filósofo diria que expulsar o estudante não seria a solução. É uma tentativa equivocada de resolver o problema sem atacar as causas reais desse problema. Além de ser uma atitude que busca mobilizar um outro afeto no ambiente escolar, o medo. Dando a seguinte mensagem: - Ou você se enquadra ou nós lhes expulsamos.

Pedro Ferreira Nunes. In. OS AFETOS QUE CIRCULAM ENTRE OS MUROS DA ESCOLA: A Importância da Ética para Promoção dos Direitos Humanos, 2021. Trecho do artigo apresentado como requisito para conclusão da Especialização em Filosofia e Direitos Humanos. 

domingo, 5 de maio de 2024

Poema: Confissões de Malthus

Eu acreditei ser um Santo, 
mas sucumbi diante 
da primeira tentação.
Ai de mim, Ai de mim
Não tenho mais salvação.
 
Deus sabe o quanto sofri,
Deus sabe o quanto resisti.
Mas eu cai
Eu cai.

E cairia mil vezes 
diante daquele olhar,
Aquela boca,
Ah, aquela boca.
Como não querer beijar. 

Uma chama acendeu,
dentro do meu coração. 
Já não sou o mesmo,
não tenho mais salvação.

Desse amor,
não consigo escapar.
Como desejo essa mulher,
não sei explicar. 

Meu erro foi acreditar 
que eu era um Santo. 
Sou um pobre mortal,
que ama tanto.

Amo tanto essa mulher,
que só de pensar.
Meu corpo fica em chama,
não consigo me controlar.

Eu acreditei ser um Santo, 
mas sucumbi diante 
da primeira tentação.
Ai de mim, Ai de mim.
Não tenho mais salvação. 

Pedro Ferreira Nunes – Um rapaz latino americano que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in roll.