terça-feira, 19 de setembro de 2017

Pierre Levy e a construção de uma inteligência coletiva: É possível pensar um processo de ensino/aprendizagem com o objetivo de construir essa inteligência coletiva?


É possível falar em construção de uma inteligência coletiva nos marcos de uma sociedade capitalista? É a essa tarefa que nos chama Pierre Levy na sua comunicação “Internet e desenvolvimento humano”. Enquanto futuros professores não têm como não olhar essa questão a partir do contexto educacional. Logo surge a seguinte questão: Como pensar o processo de ensino/aprendizagem com o objetivo de construir uma inteligência coletiva? É possível tal tarefa? É o que buscaremos refletir nesse breve artigo.
Quem é Pierre Levy?
Pierre Levy nasceu na Tunísia, mas se radicou na França, onde se gradou em História pela Universidade de Sorborne, em Paris. Depois se especializou em Sociologia com pesquisa na área de cibernética e da inteligência artificial. Migrou para o Canadá onde se tornou filósofo da informação. Autor de diversas obras, entre elas: A Máquina Universo – Criação, Cognição e Cultura Informática; A Árvore de Conhecimento; e As Tecnologias da Inteligência: O Futuro do Pensamento na Era da Informática. Pierre Levy tornou-se titular da cadeira de pesquisa em inteligência coletiva, da Universidade de Ottawa, Canadá. Também se tornou membro da Sociedade Real do Canadá (Academia Canadense de Ciências e Humanidades).
Internet e desenvolvimento humano
Em “internet e desenvolvimento humano” Levy chama atenção para a importância das novas tecnologias no desenvolvimento humano. Ele destaca o fato do que a internet tem propiciado novas reflexões a cerca da inteligência coletiva. O que não ocorre apenas no campo científico, mas também nos negócios e na politica. De acordo com Levy (2010) “há cada vez mais pessoas que se organizam por intermédio da internet visando à cooperação intelectual”. O que é positivo segundo ele, sobretudo pelo fato de que a internet é um instrumento que potencializa as relações sociais, logo o desenvolvimento humano. Dai a necessidade de se garantir o acesso democrático a esse meio, o que ainda não ocorre, porém é preciso compreender que se trata de um processo histórico. Pierre Levy destaca a importância das novas tecnologias no processo de construção da inteligência, aliás, ele salienta que as novas técnicas propiciam a transformação da inteligência. A respeito da inteligência coletiva o autor ressalta:
A inteligência coletiva não é um tema puramente cognitivo. Só pode existir desenvolvimento da inteligência coletiva se houver o que eu chamo de cooperação competitiva ou competição cooperativa... é por que existe essa possibilidade de competição que existe a cooperação. (Levy, 2005)
Podemos afirmar, portanto, que para o autor não é possível o desenvolvimento de uma inteligência coletiva num contexto que não aja competição e cooperação. O que soa um tanto contraditório. Mas o fato é que para Levy, elas não estão em campos opostos. Competição e cooperação necessitam uma da outra para o desenvolvimento dessa inteligência coletiva.
Já outro ponto importante que Pierre Levy aponta no caminho para construção de uma inteligência coletiva é a cerca das três etapas da evolução. Isso mesmo, para Levy existe ciclos de evolução. E a internet tem propiciado um novo ciclo. Mas todo esse processo de evolução não seria possível se não fossemos seres possuidores de linguagem, características que nos diferencia dos outros animais. De acordo com Levy (2005) “é porque vivemos no universo da linguagem, que conseguimos formar uma inteligência coletiva de um tipo mais poderoso do que aquela das espécies animais, que somos o que somos”.
Pierre Levy também fala sobre o “triangulo da significação”. Aonde ele dá ênfase à questão da ideia e do signo. Seguindo essa linha ele falará sobre a “Ecologia das ideias” onde ele apontará os pólos da significação que propiciam a construção da inteligência coletiva, em seguida ele apresenta o conceito de “Economia de reprodução”, que segundo ele é o que propicia o desenvolvimento das ideias. Por fim falará do “Capital de inteligência coletiva”. Nessa linha é importante ressaltar o que ele diz:
Além das ideias que são produzidas pela população existe também as competências que dizem respeito a essas ideias que a população produz, o ecossistema que ela nutre. Esses dois aspectos, as ideias originais e as competências reais e vivas forma o capital intelectual, que é alimentado pelo capital social, pelo cultural e pelo técnico que, por sua vez são alimentados por ele. (Levy, 2005)
Pierre Levy conclui afirmando a necessidade de se lutar por uma ciência da inteligência coletiva. Para ele tal empreitada não se trata de uma utopia e nem é algo que se dará através de uma revolução – através de uma ruptura violenta. Mas ao contrário, é algo que se dará de forma gradual, através de uma transformação gradual da consciência e, por conseguinte da sociedade. Ele chama atenção para o fato de que o exemplo é um fator primordial nesse processo, logo cada um deve fazer sua parte no caminho da transformação e construção da inteligência coletiva.
Como pensar o processo de ensino/aprendizagem com o objetivo de construir uma inteligência coletiva? É possível tal tarefa?
Não há como negar que ás novas tecnologias tem permitido enormes avanços em diversos campos da sociedade – transformações que em outros tempos eram impensáveis. Diante dessa realidade são necessárias novas reflexões a cerca desse contexto que se abre. Sobretudo pelo fato que tais mudanças impactam tanto a vida social, cultural, como econômica da sociedade. No entanto é preciso tomar cuidado para que não caiamos em extremismos, achar que esse é o caminho para resolver todas as contradições existentes na sociedade, especialmente no campo educacional.
Pierre Levy chama atenção para o fato de que a utilização da internet tem possibilitado o desenvolvimento da cooperação intelectual. Bem como para o fato que todo esse ganho tem se expandido para além da esfera cientifica, possibilitando por tanto o desenvolvimento humano. Não por coincidência é justamente esse o titulo da sua comunicação – Internet e desenvolvimento humano, que em síntese, resume muito bem a tese que ele defende, isto é, que a utilização da internet, óbvio numa perspectiva coletiva, possibilita o desenvolvimento humano.
É inegável o potencial da internet, no entanto será possível tal empreitada numa sociedade que parece caminhar cada vez mais para uma cultura da individualização? É um ponto a se refletir. A priori não tenho o mesmo otimismo que o autor transmite na sua fala. Sobretudo por que nos marcos da sociedade capitalista a internet terá sempre como ultimo fim, ainda que exista exceções, o lucro de alguns poucos. Outro ponto importante a se destacar é a concepção de evolução do autor. A esse respeito cabe a seguinte questão: Será se de fato estamos evoluindo ou utilizando novas ferramentas para reforçar velhas práticas? Diante dessa questão não tem como não pensar no “Estado Islâmico” e no avanço do fascismo.
Trazendo para o âmbito educacional: Se a internet permite o desenvolvimento humano tal como defende Levy, obviamente ela também permite o desenvolvimento educacional. Sendo assim não podemos abrir mão dessa ferramenta no processo de ensino/aprendizagem. Mas como fazer o uso dessa ferramenta numa perspectiva de construção de uma inteligência coletiva? Pierry Levy acredita num processo de transformação gradual dentro do sistema.
A esse respeito também sou um tanto pessimista. Não acredito na construção de uma inteligência coletiva nos marcos do sistema capitalista, pelo menos não aos moldes que defende Levy. Ora, tal fato não ocorrerá numa sociedade que funciona na lógica de apropriação privada do conhecimento. E mesmo com todo o avanço que a internet e, por conseguinte as novas tecnologias tem nos propiciado isso não tem se alterado. Pelo contrário, o que vemos em evidencia é o que bem aponta Vasquez (1984):
O culto ao dinheiro e a tendência a acumu­lar maiores lucros constituem o terreno propício para que nas relações entre os indivíduos floresçam o espírito de posse, o egoísmo, a hipocrisia, o cinismo e o individualismo exacerbado. Cada um confia em suas próprias forças, desconfia dos demais, e busca seu próprio bem-estar, ainda que tenha de passar por cima do bem-estar dos outros. A sociedade se converte assim num campo de batalha no qual se trava uma guerra de todos contra todos.
Concluimos, portanto afirmando que não dá para descartar o uso das novas tecnologias no processo de ensino/aprendizagem. Mas é preciso tomar cuidado para não cairmos numa armadilha e nos tornarmos reféns de uma lógica mercadologica que tem se aprofundado na educação. Se é fato que as novas tecnologias torna o conhecimento mais acessivel e o ensino mais flexivel e, por conseguinte, mais compartilhavel, o torna também mais descartavel. Bem como o professor acaba sendo substituivel ou tendo o seu trabalho precarizado. Logo a democratização do ensino e a construção de uma inteligencia coletiva ficam apenas no discurso, já que na prática se caminha no sentido contrário.

Pedro Ferreira Nunes - É Educador Popular, cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente cursa Filosofia na Universidade Federal do Tocantins.

Referências Bibliográficas
Levy, Pierre. Internet e Desenvolvimento Humano. Cad. Psicopedag. V.5 n. 9 São Paulo: 2005.
Santana, Ana Lucia. Pierre Levy. Disponível em: infoescola.com. Acesso em: 17 de Setembro de 2017.
Vásquez, Adolfo Sánchez. Ética. - 4º ed. Barcelona: Editorial critica, 1984.

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