É
possível falar em construção de uma inteligência coletiva nos
marcos de uma sociedade capitalista? É a essa tarefa que nos chama
Pierre Levy na sua comunicação “Internet e desenvolvimento
humano”. Enquanto futuros professores não têm como não olhar
essa questão a partir do contexto educacional. Logo surge a seguinte
questão: Como pensar o processo de ensino/aprendizagem com o
objetivo de construir uma inteligência coletiva? É possível tal
tarefa? É o que buscaremos refletir nesse breve artigo.
Quem
é Pierre Levy?
Pierre
Levy nasceu na Tunísia, mas se radicou na França, onde se gradou em
História pela Universidade de Sorborne, em Paris. Depois se
especializou em Sociologia com pesquisa na área de cibernética e da
inteligência artificial. Migrou para o Canadá onde se tornou
filósofo da informação. Autor de diversas obras, entre elas: A
Máquina Universo – Criação, Cognição e Cultura Informática; A
Árvore de Conhecimento; e As Tecnologias da Inteligência: O Futuro
do Pensamento na Era da Informática. Pierre Levy tornou-se titular
da cadeira de pesquisa em inteligência coletiva, da Universidade de
Ottawa, Canadá. Também se tornou membro da Sociedade Real do Canadá
(Academia Canadense de Ciências e Humanidades).
Internet
e desenvolvimento humano
Em
“internet e desenvolvimento humano” Levy chama atenção para a
importância das novas tecnologias no desenvolvimento humano. Ele
destaca o fato do que a internet tem propiciado novas reflexões a
cerca da inteligência coletiva. O que não ocorre apenas no campo
científico, mas também nos negócios e na politica. De acordo com
Levy (2010) “há cada vez mais pessoas que se organizam por
intermédio da internet visando à cooperação intelectual”. O que
é positivo segundo ele, sobretudo pelo fato de que a internet é um
instrumento que potencializa as relações sociais, logo o
desenvolvimento humano. Dai a necessidade de se garantir o acesso
democrático a esse meio, o que ainda não ocorre, porém é preciso
compreender que se trata de um processo histórico. Pierre Levy
destaca a importância das novas tecnologias no processo de
construção da inteligência, aliás, ele salienta que as novas
técnicas propiciam a transformação da inteligência. A respeito da
inteligência coletiva o autor ressalta:
A
inteligência coletiva não é um tema puramente cognitivo. Só pode
existir desenvolvimento da inteligência coletiva se houver o que eu
chamo de cooperação competitiva ou competição cooperativa... é
por que existe essa possibilidade de competição que existe a
cooperação. (Levy, 2005)
Podemos
afirmar, portanto, que para o autor não é possível o
desenvolvimento de uma inteligência coletiva num contexto que não
aja competição e cooperação. O que soa um tanto contraditório.
Mas o fato é que para Levy, elas não estão em campos opostos.
Competição e cooperação necessitam uma da outra para o
desenvolvimento dessa inteligência coletiva.
Já
outro ponto importante que Pierre Levy aponta no caminho para
construção de uma inteligência coletiva é a cerca das três
etapas da evolução. Isso mesmo, para Levy existe ciclos de
evolução. E a internet tem propiciado um novo ciclo. Mas todo esse
processo de evolução não seria possível se não fossemos seres
possuidores de linguagem, características que nos diferencia dos
outros animais. De acordo com Levy (2005) “é porque vivemos no
universo da linguagem, que conseguimos formar uma inteligência
coletiva de um tipo mais poderoso do que aquela das espécies
animais, que somos o que somos”.
Pierre
Levy também fala sobre o “triangulo da significação”. Aonde
ele dá ênfase à questão da ideia e do signo. Seguindo essa linha
ele falará sobre a “Ecologia das ideias” onde ele apontará os
pólos da significação que propiciam a construção da inteligência
coletiva, em seguida ele apresenta o conceito de “Economia de
reprodução”, que segundo ele é o que propicia o desenvolvimento
das ideias. Por fim falará do “Capital de inteligência coletiva”.
Nessa linha é importante ressaltar o que ele diz:
Além
das ideias que são produzidas pela população existe também as
competências que dizem respeito a essas ideias que a população
produz, o ecossistema que ela nutre. Esses dois aspectos, as ideias
originais e as competências reais e vivas forma o capital
intelectual, que é alimentado pelo capital social, pelo cultural e
pelo técnico que, por sua vez são alimentados por ele. (Levy, 2005)
Pierre
Levy conclui afirmando a necessidade de se lutar por uma ciência da
inteligência coletiva. Para ele tal empreitada não se trata de uma
utopia e nem é algo que se dará através de uma revolução –
através de uma ruptura violenta. Mas ao contrário, é algo que se
dará de forma gradual, através de uma transformação gradual da
consciência e, por conseguinte da sociedade. Ele chama atenção
para o fato de que o exemplo é um fator primordial nesse processo,
logo cada um deve fazer sua parte no caminho da transformação e
construção da inteligência coletiva.
Como
pensar o processo de ensino/aprendizagem com o objetivo de construir
uma inteligência coletiva? É possível tal tarefa?
Não
há como negar que ás novas tecnologias tem permitido enormes
avanços em diversos campos da sociedade – transformações que em
outros tempos eram impensáveis. Diante dessa realidade são
necessárias novas reflexões a cerca desse contexto que se abre.
Sobretudo pelo fato que tais mudanças impactam tanto a vida social,
cultural, como econômica da sociedade. No entanto é preciso tomar
cuidado para que não caiamos em extremismos, achar que esse é o
caminho para resolver todas as contradições existentes na
sociedade, especialmente no campo educacional.
Pierre
Levy chama atenção para o fato de que a utilização da internet
tem possibilitado o desenvolvimento da cooperação intelectual. Bem
como para o fato que todo esse ganho tem se expandido para além da
esfera cientifica, possibilitando por tanto o desenvolvimento humano.
Não por coincidência é justamente esse o titulo da sua comunicação
– Internet e desenvolvimento humano, que em síntese, resume muito
bem a tese que ele defende, isto é, que a utilização da internet,
óbvio numa perspectiva coletiva, possibilita o desenvolvimento
humano.
É
inegável o potencial da internet, no entanto será possível tal
empreitada numa sociedade que parece caminhar cada vez mais para uma
cultura da individualização? É um ponto a se refletir. A priori
não tenho o mesmo otimismo que o autor transmite na sua fala.
Sobretudo por que nos marcos da sociedade capitalista a internet terá
sempre como ultimo fim, ainda que exista exceções, o lucro de
alguns poucos. Outro ponto importante a se destacar é a concepção
de evolução do autor. A esse respeito cabe a seguinte questão:
Será se de fato estamos evoluindo ou utilizando novas ferramentas
para reforçar velhas práticas? Diante dessa questão não tem como
não pensar no “Estado Islâmico” e no avanço do fascismo.
Trazendo
para o âmbito educacional: Se a internet permite o desenvolvimento
humano tal como defende Levy, obviamente ela também permite o
desenvolvimento educacional. Sendo assim não podemos abrir mão
dessa ferramenta no processo de ensino/aprendizagem. Mas como fazer o
uso dessa ferramenta numa perspectiva de construção de uma
inteligência coletiva? Pierry Levy acredita num processo de
transformação gradual dentro do sistema.
A
esse respeito também sou um tanto pessimista. Não acredito na
construção de uma inteligência coletiva nos marcos do sistema
capitalista, pelo menos não aos moldes que defende Levy. Ora, tal
fato não ocorrerá numa sociedade que funciona na lógica de
apropriação privada do conhecimento. E mesmo com todo o avanço que
a internet e, por conseguinte as novas tecnologias tem nos propiciado
isso não tem se alterado. Pelo contrário, o que vemos em evidencia
é o que bem aponta Vasquez (1984):
O
culto ao dinheiro e a tendência a acumular maiores lucros
constituem o terreno propício para que nas relações entre os
indivíduos floresçam o espírito de posse, o egoísmo, a
hipocrisia, o cinismo e o individualismo exacerbado. Cada um confia
em suas próprias forças, desconfia dos demais, e busca seu próprio
bem-estar, ainda que tenha de passar por cima do bem-estar dos
outros. A sociedade se converte assim num campo de batalha no qual se
trava uma guerra de todos contra todos.
Concluimos,
portanto afirmando que não dá para descartar o uso das novas
tecnologias no processo de ensino/aprendizagem. Mas é preciso tomar
cuidado para não cairmos numa armadilha e nos tornarmos reféns de
uma lógica mercadologica que tem se aprofundado na educação. Se é
fato que as novas tecnologias torna o conhecimento mais acessivel e o
ensino mais flexivel e, por conseguinte, mais compartilhavel, o torna
também mais descartavel. Bem como o professor acaba sendo
substituivel ou tendo o seu trabalho precarizado. Logo a
democratização do ensino e a construção de uma inteligencia
coletiva ficam apenas no discurso, já que na prática se caminha no
sentido contrário.
Pedro Ferreira Nunes - É Educador Popular, cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente cursa Filosofia na Universidade Federal do Tocantins.
Referências
Bibliográficas
Levy,
Pierre. Internet e Desenvolvimento Humano. Cad. Psicopedag. V.5 n. 9
São Paulo: 2005.
Santana,
Ana Lucia. Pierre Levy. Disponível em: infoescola.com. Acesso em: 17
de Setembro de 2017.
Vásquez,
Adolfo Sánchez. Ética. - 4º ed. Barcelona: Editorial critica,
1984.
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