A temática acima nos foi proposta para ser trabalhada numa formação continuada dos professores no início das atividades pedagógicas do segundo semestre de 2025, no Colégio Esportivo Cívico-Militar Santa Rita de Cássia. De acordo com o documento o objetivo seria: Envolver os professores das diferentes áreas do conhecimento na análise das habilidades em defasagem identificadas em Língua Portuguesa e Matemática, com base nos dados das plataformas CAEd e Soluções Moderna para construir estratégias interdisciplinares que contribuam para o avanço da proficiência dos estudantes.
Toda essa mobilização tem como finalidade aumentar o índice do desenvolvimento da educação básica (IDEB) do Tocantins. Medido a partir dos dados do fluxo (aprovação e evasão) mais o desempenho numa prova objetiva (Prova Brasil) a partir de habilidades desenvolvidas nos componentes curriculares de Língua Portuguesa e Matemática, nos anos/séries finais do Ensino Fundamental e Médio. Há todo um investimento por parte do Governo em material, plataformas, formação continuada e promessa de gratificação para as escolas que conseguirem aumentar o seu índice. Ou seja, todo o foco dos sistemas de ensino acaba voltando para este fim. É nesse contexto que compreendemos a cobrança para que as demais áreas se somem no processo de recomposição das aprendizagens.
Não é de agora que se fala em déficit de aprendizagem na educação básica. Sobretudo se levarmos em consideração o desempenho dos estudantes em provas externas (internamente não é diferente). Mas foi a partir dos impactos provocados pela pandemia provocada pelo vírus SARS-CO-VID (COVID-19) que se passou a dar mais ênfase na recomposição da aprendizagem. Por exemplo, a Secretaria de Estado da Educação passou a disponibilizar anualmente uma matriz de recomposição da aprendizagem, onde encontramos as habilidades, com sugestões de objetos de conhecimento e sequências didáticas para serem trabalhadas em sala de aula. No ano corrente, a matriz traz como novidade as habilidades das áreas relacionadas com os descritores de Língua Portuguesa e Matemática.
A nossa fala inicial na formação partiu da compreensão de que ainda que tenhamos ressalvas quanto até que ponto essas avaliações de fato expressam a qualidade do ensino-aprendizado na educação básica. Não podemos negar que é a partir dele que o Governo norteia suas ações. Por tanto boicotar esse processo não me parece uma estratégia inteligente. Por outro lado, não podemos fazer do processo de ensino-aprendizado na escola pública um espaço voltado a preparar o estudante para ter um bom desempenho nessas avaliações. Até porque, de acordo com a legislação educacional, o objetivo da educação básica é formar para o trabalho e o exercício da cidadania.
Outro fato que não podemos negar é que se o estudante e a estudante não conseguem desenvolver habilidades básicas de leitura, interpretação, escrita e raciocínio lógico. Dificilmente ele, ou ela, conseguirá aprofundar em áreas mais complexas como filosofia e ciências, tanto as ditas sociais como da natureza (Geografia, História, Sociologia, Biologia, Física e Química). Ou ainda em outras linguagens como a artística. Por isso, na medida que observamos esse déficit em sala de aula podemos desenvolver ações para mitigá-lo.
Dito isso, o nosso passo seguinte, focando nas turmas de 9° Ano de Ensino Fundamental e 3ª Série do Ensino Médio, foi conhecer e analisar as habilidades em que os estudantes tiveram pior desempenho. A opção por analisar o desempenho dessas turmas especificamente foi porque serão elas que farão o exame (SAEB) que comporá o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica do Colégio Esportivo Cívico-Militar Santa Rita de Cássia. Optamos também por fazer essa análise a partir dos dados fornecidos pela plataforma de Avaliação e Monitoramento da Educação do Tocantins (CAED/SAETO).
Em Língua Portuguesa, no 9° Ano do Ensino Fundamental, as três habilidades com menor desempenho foram: H10 – Distinguir fato de opinião (33%); H13 - Reconhecer a presença de valores sociais e éticos (39%); e a H14 - Reconhecer o efeito de sentido decorrente da exploração de recursos morfossintáticos (30%). Em resumo, podemos dizer que essas três habilidades se relacionam com a leitura de diferentes tipos de textos e sua interpretação. Já em Matemática a situação é um tanto pior. Por exemplo, em relação à habilidade H5 (Utilizar o princípio multiplicativo de contagem na resolução de problema) o desempenho foi de 5%. Em relação a H19 (Calcular o resultado de uma multiplicação ou divisão de números naturais) o desempenho foi de 6%. Já em relação a H18 (Calcular o resultado de uma adição ou subtração de números naturais) o desempenho foi de 14%. Em resumo, podemos dizer que falta ao estudante a apropriação e aplicação das quatro operações básicas (adição, subtração, multiplicação e divisão).
Quando vamos para a 3ª série do ensino médio temos uma melhora em Língua Portuguesa. Nenhum estudante teve um desempenho em qualquer habilidade menor que 40%. As habilidades com menor desempenho foram: H9 - Reconhecer o sentido das relações lógico-discursivas em um texto (46%); H1 - Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros (56%); e a H15- Reconhecer o efeito de sentido decorrente da exploração de recursos morfossintáticos (56%). Em resumo, são habilidades que também se referem a leitura e interpretação. Em Matemática há uma melhora em relação ao Ensino Fundamental. No entanto, em comparação com Língua Portuguesa está bem abaixo. Foram 8 habilidades com desempenho de 40% para baixo. Com destaque para: H13 –Corresponder a representação algébrica e gráfica de uma função polinomial de 2º grau (12%); H14 - Reconhecer a representação algébrica de uma função polinomial de 2º grau a partir dos dados apresentados em uma tabela (20%); e a H4 - Utilizar probabilidade na resolução de problema (24%). Em resumo, utilizar o raciocínio lógico.
Analisando esses resultados ficamos nos questionando o que impede o desenvolvimento dessas habilidades que, a priori, não são nenhum bicho de sete cabeças. Será que de fato o exame a partir do qual temos esses índices expressam de fato o conhecimento dos estudantes? Será que pelo fato de não valer nota o estudante ou a estudante não se dedicam como deveriam na resolução das questões? Certamente existe esse fator. Mas o fato que quando analisamos o desempenho dos estudantes nas provas internas, valendo nota para progressão de ano/série, o resultado não é diferente. Ou seja, de fato esse déficit existe.
Diante disso, como podemos contribuir, a partir da nossa área ou componente curricular, na recomposição dessa aprendizagem? Cada um deve se esforçar para chegar a uma resposta. Pois acredito que esse caminho é mais rico do que esperar uma receita de um ser iluminado que venha dizer como fazer o nosso trabalho em sala de aula. óbvio que podemos buscar sugestões que contribuam para que desenvolvamos o nosso próprio caminho. E é nesse sentido que compartilho algumas ideias.
Primeiro, defendo que, o ponto fundamental não é qual objeto de conhecimento devo trabalhar. Mas como vou trabalhar determinado objeto para que o estudante desenvolva certas habilidades. Óbvio que se partirmos de objetos de conhecimento
relacionados à realidade/interesses do estudante há a possibilidade de uma maior engajamento por parte dele.
Segundo, em Arte, desenvolver exercícios de leitura de imagens e reprodução de
pinturas clássicas. Em Educação Física exercícios para o desenvolvimento do raciocínio lógico a partir de jogos de tabuleiro. Em Língua Inglesa leitura de texto em Inglês com foco na tese e no argumento. Em Filosofia exercícios de leitura e escrita a partir da perspectiva filosófica. Em Geografia exercícios de elaboração de mapas mentais e representações gráficas. Em História exercícios que explorem diferentes narrativas sobre um mesmo fato (explorar recursos como textos e audiovisual). Em Sociologia exercício de leitura de textos sociológicos com debate em seguida. No Itinerários formativos: Eletivas: Explorar dinâmicas que fortaleça a formação geral básica fazendo uso de textos, audiovisuais e jogos. Estudo Orientado: Exercícios com análise de questões do Enem, Prova Brasil e Vestibulares. Projeto de Vida: Exercício de Escrita Criativa e confecção de tirinhas. Protagonismo: Discussão sobre valores a partir da leitura de obras literárias.
Para aprofundar um pouco mais acerca dessas sugestões vou trazer o exemplo de uma atividade que geralmente desenvolvo nas minhas aulas de filosofia. Escolho um trecho de um texto filosófico, exponho no quadro escrito de pincel (e falado). Peço para que eles anotem. E em seguida passo um exercício onde eles devem responder no formato de uma dissertação algumas questões: O que diz/defende o filósofo ou filósofa? Qual a diferença dessa perspectiva filosófica para outras? Você concorda com essa visão?Justifique. Esse simples exercício vai exigir do estudante capacidade de leitura, não uma leitura qualquer já que geralmente esses textos trazem conceitos que não são utilizados no dia a dia. O que significa que esse estudante ou essa estudante precisará compreender determinados conceitos para poder compreender o que está sendo enunciado. O segundo passo é relacionar com outras ideias. E por fim exercitar o seu pensamento de forma escrita, se posicionando fundamentadamente sobre determinada ideia. Geralmente a maioria não conseguem entregar aquilo que gostaríamos, mas para nós o exercício em si já é um avanço. Pois quando o estudante se dispõe a pensar sistematicamente certamente há um ganho. Ainda que ele não perceba isso objetivamente.
Mas enfim, eis o que buscamos fazer na formação que fomos convidados a dar para os professores do Colégio Esportivo Cívico-Militar Santa Rita de Cássia, a respeito de como as demais áreas e componentes curriculares podem contribuir para recomposição da aprendizagem a partir dos dados fornecidos pelo Sistema de Avaliação do Estado do Tocantins (SAETO).
Pedro Ferreira Nunes - Professor da Educação Básica na Rede Pública Estadual da Educação do Tocantins.
Das barrancas do Rio Tocantins
Filosofia, Política, Educação, Cultura e Literatura.
segunda-feira, 25 de agosto de 2025
Contribuições das demais áreas do conhecimento na recomposição das aprendizagens
quarta-feira, 20 de agosto de 2025
Filosofia e Literatura
Nas linhas a seguir poderá ser conferido os textos produzidos pelos estudantes acerca de algumas obras indicadas pelo projeto ou de problemas filosóficos presentes nessas obras tais como a vida, dor, prazer e o conhecimento.
O projeto funcionava a partir da seguinte dinâmica- uma obra literária era analisada filosoficamente na sala de aula. Posteriormente, nas 2ª séries, o estudante deveria lê-la e produzir um texto sobre essa obra. Já nas 1ª séries o objeto era os problemas filosóficos.
As produções dos estudantes da 2ª série são sobretudo das obras: Os miseráveis, do Victor Hugo. E O canto da carpideira, da Lita Maria. No entanto, ao longo do projeto outras obras foram analisadas, indicadas para leitura e cobradas em questões de provas internas, em diálogo com o projeto Vamos Ler! (área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas). Entre elas destacamos: A mão e a luva, do Machado de Assis. E O cortiço, do Aluísio Azevedo.
Já os textos dos estudantes da 1ª série tiveram como foco os problemas filosóficos das obras literárias indicadas pelo projeto vamos ler!
Acreditamos que ambos os projetos contribuíram para fomentar a leitura bem como o pensamento crítico e criativo. Fundamentais na construção de um projeto de vida que tenha como norte tanto a formação para o trabalho como para o exercício da cidadania.
Para que a leitura se torne um hábito sabemos que a mesma deve ser estimulada desde a infância, sobretudo pela família. E a partir daí a escola entra ampliando as possibilidades de leitura. Nessa linha é importante o que salienta Zacarias e Passos (2017) ao defender que “a escola deve oferecer uma diversidade de leitura para que o aluno desenvolva suas competências e habilidades e o seu letramento social. Por isso, ela deve proporcionar, não apenas uma variação de gêneros para serem lidos, mas uma variedade de textos em geral.”
Foi isso que buscamos fazer, não sem resistência. Pois estamos inseridos numa cultura em que quem tem o hábito da leitura é uma exceção. E vem piorando nos últimos anos, segundo apontamento da 6ª edição da pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil"- onde mais da metade dos brasileiros declaram não ter lido um livro, seja impresso ou digital, nos últimos três meses anteriores ao levantamento. Nesse contexto, projetos como esse acabam se tornando uma trincheira de resistência, ao estimular a leitura e mostrar sua importância.
Confira a revista com a produção dos estudantes acessando o link:https://drive.google.com/file/d/1-nOE7eUg6MRI1Gj-aWNL7QBP-YmfKwG4/view?usp=sharing
Pedro Ferreira Nunes - Professor da Educação Básica na Rede Pública Estadual da Educação do Tocantins.
sexta-feira, 15 de agosto de 2025
O filme o lado bom da vida e os bons encontros, segundo Baruch Espinosa
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Cena do filme O lado bom da vida |
A narrativa começa com Pat Solitano Jr (Bradley Cooper) retornando para casa dos pais - Pat Solano e Dolores (interpretado por Robert De Niro e Jacki Weaver) após uma temporada numa instituição psiquiátrica. Ainda que desconfiados da recuperação do filho, o acolhem. Mas não demoram para perceber que Pat Jr. não está nada bem. De modo que insistem que tome os remédios e não deixe de ir às sessões de terapia. Além de ter sempre por perto a vigilância da polícia. Mas Pat Jr. recusa aceitar que não está bem. E se toma os remédios e vai a terapia é unicamente para não ser mandado de volta para instituição psiquiátrica e a prisão. Mas hora e outra não consegue se controlar e deixa evidente um comportamento agressivo. O motivo de tudo isso - sua obsessão por Nikki (Brea Bee) - sua ex-mulher. Aliás, a traição desta com um colega de trabalho foi o que causou a explosão de violência que o levou para prisão e para o tratamento psiquiátrico. No entanto, ele não vê a hora de retomar o casamento com a ex-esposa. É nesse processo de tentar voltar a rotina e mostrar para Nikki que é outra pessoa que terá o encontro, ou reencontro que mudará sua vida. É num jantar promovido pelo amigo Ronnie (John Ortiz). No qual também comparece Tiffany Maxwell (Jennifer Lawrence), cunhada de Ronnie e ainda num processo de superação do luto pela morte do marido. Nesse encontro percebemos imediatamente uma conexão entre eles. Ainda que essa conexão seja a busca por encontrar um sentido para vida. Ela percebe isso imediatamente, ele, obcecado por Nikki, demorará mais.
Como falamos de início, a obsessão nos impede de ver a realidade - de entender que esta é mutável. Aquilo que acreditávamos ser para sempre. Como diz a bela letra de uma canção do Legião Urbana, composta pelo Renato Russo, “sempre acaba”. Do ponto de vista dos afetos, Espinosa diria que eles se transformam. O que antes era alegria, pode se tornar tristeza. O que antes era amor, pode virar ódio. No entanto, ao não querer encarar a realidade nos iludimos com a possibilidade de voltar ao que era antes.
Um aspecto marcante do filme são as relações familiares. Tanto a família de Pat Jr. como de Tiffany sofrem junto com os filhos. Tentando de toda forma protegê-los. Quase sempre deles mesmos - de suas ações movidas mais pela emoção do que pela razão. Por isso há um receio por parte dos pais do relacionamento deles. Ambos são vistos como instáveis emocionalmente. E realmente são. Como então eles podem ajudar um ao outro? De modo que a preocupação daqueles que estão ao seu entorno não é de todo sem fundamento. Mas o psiquiatra que encoraja a amizade entre os dois consegue enxergar os que os demais são incapazes, encorajando a relação entre eles. O fato é que eles vão se conectando, a priori, pelo interesse de Pat Jr. na promessa de Tiffany em lhe reaproximar de Nikki, e posteriormente pelo amor que surge da convivência. É a partir dessa convivência que ele supera a obsessão pela ex-mulher se permitindo a viver uma nova história.
Há uma frase atribuída ao Baruch Espinosa que expressa a ideia de que não devemos menosprezar os atos das pessoas. Mas procurar compreendê-los. Não é fácil sobretudo quando estamos obcecados por algo ou alguém. Qualquer ação que vai contra aquilo que consideramos correto merece o nosso desprezo. É o que percebemos no início do relacionamento de Pat Jr. com Tiffany. Mas com a convivência vem a compreensão e da compreensão vem o amor - o amor por aquilo que a pessoa é e não pelo que gostaríamos que fosse.
Na perspectiva espinosana o amor é um afeto alegre que aumenta a nossa potência de agir. Sua causa é exterior a nós. Ou seja, está em outros corpos. Mas o esforço de persistir na existência sim, o qual o nosso filósofo define de conatus. Porém um depende do outro. Nessa linha, Azevedo (2018) a partir do pensamento de Espinosa afirma que: As relações afetivas alteram nosso conatus; assim, tal como o alimento é fonte de energia vital, nossos vínculos também nos alimentam, revigorando a nossa alma. Apetite e desejo nos levam a agir conforme os nossos encontros, ou seja, são determinados pelas afecções que nos chegam das relações externas.
Um dos fatores que provocava afecções tristes, como o ódio, em Pat Jr, fazendo-o se comportar de forma violenta era quando ele ouvia a música que tocou no dia do seu casamento e que era a mesma canção que estava tocando quando sua esposa estava lhe traindo. Já quando dançava com Tiffany era afetado por afecções alegres. Podemos dizer assim que o encontro entre Pat Jr. e Tiffany foi um bom encontro. E o que é um bom encontro? De acordo com Espinosa, são aqueles que aumentam a nossa potência de agir - que nos permitem perceber nossa condição, dando força para superarmos aquilo que limita a nossa existência. É isso que acontece com Pat Jr. - seu encontro com Tiffany e tudo que acontece a partir daí leva-o a compreensão de que é necessário encerrar um ciclo e iniciar outro. E nesse processo de mudança algumas coisas precisam ficar para trás, incluindo pessoas.
Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia (UFT) e Professor na Rede Pública Estadual de Ensino do Tocantins.
domingo, 10 de agosto de 2025
Mama, I’m Coming Home ou sobre reconciliação
Sua performance emociona a todos - tanto os presentes como os milhões que acompanham pelas mídias audiovisuais o show. Por que tanta comoção? Não é a primeira vez que Ozzy acompanhado do competente Zakk Wylde no violão e na guitarra interpreta essa canção que tem entre os seus compositores ninguém menos que o grande Lemmy (Motorhead). E é baseada na relação, em especial um período de separação, do príncipe das trevas (como Ozzy é “carinhosamente” apelidado) com sua esposa e empresária Sharon Osbourne.
Agitado como sempre foi no palco, não é por opção que Ozzy performa sentado num trono. Mas pelos estragos feitos pelo mal de Parkinson que o tirou do palco há alguns anos. No entanto, sua voz está potente como sempre. Um pouco embargada pela emoção do momento, o que acaba dando mais potência a uma canção que fala de voltar para casa (de reconciliação). Seria a canção perfeita para terminar aquele verdadeiro festival por onde desfilou grandes nomes do Rock and Roll para celebrar o legado do Black Sabbath - considerada a banda fundadora do metal. E a despedida de Ozzy dos palcos. De modo que a emoção tanto de Ozzy como do público era reflexo desse sentimento de adeus.
Depois dessa apresentação com sua banda solo o príncipe das trevas continuaria no palco para receber seus companheiros do Black Sabbath: Tony Iommi - Guitarra, Geezer Butler - contrabaixo e Bill Ward - bateria. Aquela seria a última vez que o mundo iria ver a formação original performando ao vivo. E para isso eles escolheram o lugar onde tudo começou - a cidade de Birmingham (Inglaterra). Apesar da idade de todos presenciamos uma grande performance. Coroada com a clássica paranoid.
Talvez essa tenha sido a melhor escolha para terminar o show - é uma música mais animada. Enquanto Mama, I’m Coming Home é um tanto melancólica. E o objetivo era que as pessoas saíssem dali alegres. E elas saíram.
No entanto, vendo os registros das apresentações, o momento em que ele entoa Mama, I'm coming home, acompanhado pelo público emocionado, foi o que mais me afetou. De modo que eu acredito que esse registro entrará para história como um daqueles momentos icônicos do rock and roll. Como a interpretação do Joe Cocker da canção dos The Beatles "With a Little Help From My Friends" no festival Woodstock (1969).
Não me lembro quando ouvi pela primeira vez Mama, I’m Coming Home. Mas lembro que fui afetado instantaneamente. Não foram poucas as vezes que a ouvia nas madrugadas goiana tomando cerveja e com saudades do Tocantins, de casa, de minha mãe. Hoje quando a ouço, lembro que já não tenho casa para onde voltar - não tenho mais minha mãe, pelo menos não fisicamente. Por isso a emoção do Ozzy nesse concerto final me comoveu tanto.
Fiquei refletindo sobre a beleza daquele momento. O quanto nós não gostaríamos de ter a chance de, na hora final, dizer para aquela pessoa que tanto amamos do nosso sentimento. Agradecer por tudo e dizer que ficaremos bem. Para mim foi exatamente isso que aconteceu em Birmingham. Os artistas que por lá passaram (Metallica, Guns n Roses, Lamb of God, Slayer entre outros) juntamente com o público deixaram essa mensagem ao grande Ozzy e seus companheiros de Black Sabbath. Que por sua vez retribuíram com uma breve, mas, marcante performance. Sem falar na atitude de doar os milhões de dólares arrecadados para instituições de saúde.
Num contexto em que um dos clássicos da banda (War Pigs) está mais atual que nunca diante do que vemos acontecendo na Ucrânia, Rússia, Irã, Israel e sobretudo na Palestina. Não deixa de ser um grande exemplo vindo de um gênero estigmatizado pela status quo.
Por fim, em um mundo onde as relações estão cada vez mais atravessadas pelo egoísmo - onde cada um só pensa em si, no seu ponto de vista, nos seus interesses. A letra de Mama, I’m Coming Home é um alerta para que não deixemos o egoísmo nos afastar de quem amamos. Conflitos sempre haverá numa relação seja ela com quem quer que seja. Mas às vezes é necessário ceder para que seja possível uma reconciliação. Pois nada é mais importante do que ter quem amamos ao nosso lado. Que façamos isso enquanto pudermos, pois haverá um momento que já não teremos essa chance.
Pedro Ferreira Nunes - Apenas um rapaz latino americano, que gosta de ler, escrever, correr e ouvir rock in roll.
terça-feira, 5 de agosto de 2025
Conjunturais - 2025
Questionei um amigo que mora no interior do Tocantins como estava a nova gestão à frente da prefeitura da sua cidade. Ele comentou que não conhecia o perfil administrativo do atual mandatário, mas que via com preocupação um certo populismo que ao seu ver pode ser prejudicial a cidade (a opção de não falar o nome do gestor e do município é proposital. E não tem haver com medo de retaliação. Mas pelo fato de que independente de qual município do interior você seja, certamente irá se identificar). Eu diria que essa prática não é uma exceção daquele político. Mas uma estratégia amplamente utilizada com o objetivo de se manter no poder. Para um político populista o importante não é enfrentar os problemas reais da comunidade, mas agradar a plateia. E aqui o termo plateia é utilizado de forma proposital. Pois é como uma plateia e não como cidadãos que a maioria das pessoas nessas cidades se comportam. Até porque cria-se uma dependência por meio de contratos temporários que os silenciam. Como também a realização de festividades que criam uma falsa visão de prosperidade. Enquanto isso não se observa nenhuma melhora em relação à infraestrutura local, a melhoria na prestação de serviços e a geração sustentável de empregos.
Num diálogo com outro amigo percebi outro elemento que corrobora com a visão de que determinados perfil de gestão é prejudicial a cidade. Esse amigo relatava a situação num órgão governamental do município. Segundo ele, antes havia menos servidores e o trabalho fluía melhor. Hoje a quantidade é maior e as coisas parecem que não andam. Quando há alguma cobrança, o indivíduo ameaça ir atrás do gestor municipal para reclamar. Tal postura não existiria se não houvesse anuência por parte desse gestor. Percebemos assim uma total falta de respeito a hierarquia organizacional do órgão, bem como a falta de autonomia dos chefes imediatos. Com isso a prestação de serviço fica prejudicada. Isso é reflexo de uma prática comum que é a de utilizar os órgãos públicos como cabide de emprego em troca de votos. Muitas pessoas não têm o perfil para exercer determinado serviço. Mas porque apoiou fulano de tal acaba sendo contratado. O resultado é isso. Quando o prefeito ou prefeita, tira a autonomia dos seus secretários (e estes por suas vez tira a autonomia dos seus diretores), está contribuindo para uma gestão fraca. Em decorrência disso quem acaba sofrendo é a população que precisa de um determinado serviço público. Ninguém quer desagradar ninguém (para não perder apoio político) e quem acaba perdendo é a cidade.
Pela ausência de uma iniciativa privada forte as prefeituras do interior acabam tendo que assumir integralmente a organização e realização de eventos culturais como as temporadas de praias. Até aí tudo bem. Porque além de garantir à população o acesso ao lazer e a cultura. Também fomenta a economia local e a geração de renda. No entanto, o investimento nessas festividades deve ser feito com responsabilidade, sem desperdício de dinheiro público. Não é isso o que percebemos em alguns municípios tocantinenses como aponta levantamento feito pelo Portal de Notícias do Arnaldo Farias. E ações do Ministério Público. Essa fiscalização deveria partir da Câmara de Vereadores e acompanhada pela população em geral. Pois é inadmissível o cache destinado a contratação de determinados artistas por gestões de cidades que não o básico como escolas e unidades de saúde decentes. Outro fator é a programação que pouco contempla os artistas locais. Além de priorizar um determinado segmento artístico. De modo que paira a suspeita de que até que ponto tudo isso serve apenas para desviar dinheiro público.
Ao assumir a prefeitura de Palmas percebemos no dia a dia algumas mudanças que revelavam o perfil gestor do Eduardo Siqueira Campos. Ou seja, apesar de pouco tempo foi possível perceber uma diferença significativa em relação a gestão anterior (Cinthia Ribeiro), a capacidade política de articulação com diferentes grupos (no seu secretariado tem de petistas a bolsonaristas) e a intervenção na cidade por meio de obras, inclusive na periferia. Mas de repente, 6 meses após a sua posse, a população da capital e, porque não do interior, é surpreendida com sua prisão e consequentemente o seu afastamento da cadeira de chefe do executivo municipal. Quem conhece a história do herdeiro político (como Prefeito, Senador, Secretário de Estado e Deputado) do velho José Wilson Siqueira Campos não poderia se surpreender com essa prisão - o que não deixa de ser surpreendente é o motivo - De acordo com a CNN Brasil acusado de ter vazado “informações sigilosas sobre inquéritos em curso no STJ, prejudicando a eficácia de diligências contra políticos e juízes do Tocantins.” Não deixa de ser trágico. Logo agora que o Eduardo estava tendo a oportunidade de dar a volta por cima - encerrar sua carreira política fazendo uma gestão histórica à frente da prefeitura da capital do Tocantins.
Durante a campanha a prefeitura de Palmas Eduardo conseguiu mostrar um perfil moderno, inspirado em nomes como o Prefeito de Recife (PE) - João Campos, fez uma campanha extrovertida atraindo um grande apoio da juventude. Esse certamente foi um dos motivos que fez com que ele saísse de terceira via para candidato eleito, superando a franca favorita Janad Valcari (com o apoio do Bolsonaro, do Governador Wanderlei e do Senador Eduardo Gomes) e o Deputado Estadual Júnior Geo (com o apoio da Prefeita Cinthia Ribeiro e sua gestão). No entanto, ele não deixou de ser um Siqueira. Acreditou que poderia usar mão de métodos questionáveis, utilizados pelo seu pai enquanto governador, para angariar apoio e sair ileso. Mas os tempos são outros Eduardo - que essa prisão sirva para ele aprender essa lição. Já os demais políticos que se solidarizam com ele mostram que essas estratégias questionáveis para conseguir o poder ou mantê-lo é uma prática tão comum que não deveria ser considerada crime. Para esses o recado que os tempos são outros também é necessário. Por outro lado, esse apoio também é reflexo da análise de que Eduardo Siqueira não tardaria em assumir novamente a cadeira de Prefeito. Sendo o seu apoio fundamental nas eleições do próximo ano onde iremos às urnas eleger Deputados, Senadores, Governador e Presidente.
Quem não fez a análise correta foi o vice-prefeito da capital (Carlos Veloso) e os seus conselheiros políticos. Ora, não precisa ser um especialista em direito para saber que a prisão do Eduardo Siqueira Campos não se sustentaria por muito tempo. A suspeita que paira sobre ele é muito frágil para que venha perder o mandato. De modo que o mais correto por parte do vice-prefeito era permanecer fiel até que, pelo menos, os recursos do prefeito fossem analisados e despachados pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin. A partir daí, com uma situação mais clara, era natural que ele moldasse a gestão ao seu perfil, escolhendo pessoas que se alinham a esse perfil. Mas a soberba acabou levando a erros que o colocou como uma das figuras mais odiadas da política tocantinense. Eduardo Siqueira Campos que não é nenhum amador na arte de fazer política não pensou duas vezes em aproveitar o episódio para sair fortalecido. Por sua vez, a população palmense tem que comemorar mesmo, nem tanto a volta do Eduardo Siqueira Campos, mas a oportunidade de ter se desfeito de um grupo perigoso que usa a religião para se fortalecer politicamente.
Não poderia ser diferente quando estamos tão distantes das eleições de 2026, ainda mais com as “surpresas” que a política tocantinense nos reserva. De modo que qualquer coisa que se fale sobre articulações e nomes, sobretudo para o executivo estadual, não passa de especulação. Mas uma coisa é fato, o Governador Wanderlei terá um papel central. Tanto que o seu apoio é disputado por dois nomes de peso - a Senadora Dorinha (União Brasil) e o presidente da Assembleia Legislativa do Tocantins - Deputado Estadual Amélio Cayres (Republicanos). Com uma gestão praticamente sem oposição, o Governador tem realizado um mandato bem avaliado pela população. E essa popularidade, assim como a força da máquina pública, é cobiçada por quem pretende disputar um cargo eletivo nas próximas eleições. Um terceiro nome que se coloca como candidato ao governo estadual é do Vice Governador - Laurez Moreira. No entanto, como oposição. Ainda que uma oposição velada. Ou seja, por enquanto, o maior desafio do grupo no poder é chegar num consenso acerca do candidato que vai representá-lo na chapa majoritária. Pois não há nenhum nome com força, no contexto atual, para fazer frente ao candidato apoiado, seja ele quem quer que seja, pelo Governador Wanderlei. Alguém poderá lembrar: - Ora, a Janad foi apoiada pelo Governador mas não levou. Eu respondo: - as eleições estaduais tem outra dinâmica diferente da disputa municipal, sobretudo na capital.
Lula avança para o fim do seu mandato sem conseguir o que prometeu - unir o país. Quem minimamente compreende a política. Sabe que esse lema (união e reconstrução) não passava de uma falácia. Alguém com o mínimo de honestidade intelectual achava mesmo que o bolsonarismo estava enterrado após a derrota eleitoral de 2022? Derrota relativa, né?! Pois em que pese Bolsonaro não ter conseguido a reeleição, sendo derrotado por Lula, a extrema direita elegeu um grupo significativo de deputados e senadores além de aliados nos Governos de Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás. Resultado. Por mais esforço que faça, inclusive derramando emendas no congresso nacional em troca de apoio, o governo Lula não consegue avançar e mudar a percepção da população sobre a fragilidade de sua gestão. Mesmo assim, Lula ainda é o único que consegue se mostrar com alguma possibilidade de derrotar o candidato que representa o retorno da extrema direita - o que é lastimável a dependência da esquerda e das forças progressistas de uma figura. Pois ao que parece o bolsonarismo consegue sobreviver sem Bolsonaro, já o lulismo sem o Lula.
Em suas análises o filósofo Paulo Arantes sempre chamou atenção para os limites do governo Lula, sobretudo diante de um congresso majoritariamente alinhado aos interesses da elite. E o que se viu nos últimos anos é que as pautas do governo que avançaram foi a custa de muita barganha, em especial as ditas emendas parlamentares. Mesmo assim, quando há algum projeto que vai contra os interesses da burguesia, nem as emendas evitam uma derrota do governo. Até mesmo parlamentares de partidos que ocupam ministérios no governo não pensam duas vezes em dar seu voto contrário. Nesse contexto, salvo exceções, a população em geral se comportava como espectadora nesses embates, se limitando a reagir nas disputas de narrativas nas redes sociais. Mostrando por um lado a incapacidade de diálogo (que reflete na falta de apoio) do governo com a população. E por outro lado a desarticulação do movimento sindical e popular. Diante disso, o congresso fez o que bem quis nos últimos anos sem enfrentar grande oposição por parte da sociedade civil organizada. No entanto, com tanto poder na mão, cresceu a soberba. E essa acabou se voltando contra o parlamento brasileiro comandado pelo dito centrão (na verdade a direita tradicional). O ponto de erupção do descontentamento popular - a aprovação do aumento do número de deputados. Evidenciando a contradição entre o discurso de austeridade e a farra com dinheiro público favorecendo as elites. Isso acabou abrindo uma enorme oportunidade para o fortalecimento da luta popular colocando em pauta o fim dos privilégios fiscais a uma elite abastada bem como a redução da jornada de trabalho. Pautas que alcançam um grande apoio popular. Este apoio não pode ficar apenas no âmbito virtual. Nesse sentido, as organizações da classe trabalhadora precisam desenvolver estratégias que colocam o povo na rua. Pois é através da luta popular que podemos vislumbrar a aprovação do fim da escala 6x1 e a taxação dos supericos. Além de instigar o debate necessário de quem é o congresso nacional (quais os interesses representam) e semear a necessidade de uma mudança nas eleições de 2026 com a eleição de candidatos alinhados com os anseios populares.
Há que se reconhecer que a luta popular não estava morta. Organizações como o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e a APIB (Associação dos Povos Indígenas do Brasil) nunca deixaram de fazer o enfrentamento político em torno de suas demandas. No entanto havia a necessidade de uma articulação entre esses diferentes grupos que são vítimas de um mesmo sistema. Diante disso, a estratégia do plebiscito popular é extremamente acertada. Pois, primeiro, está resgatando um elemento fundamental numa democracia de fato - que é a escuta da população. Segundo, oportuniza um canal de diálogo que pode resultar num saldo organizativo. Ao responder um questionamento sobre se a eleição do Obama não teria criado uma falsa ilusão acerca do fim do racismo nos Estados Unidos, a filósofa Ângela Davis (2018) lembra que mudanças estruturais são frutos de movimentos de massa bem organizados. Não podemos nos iludir achando que uma hora vamos eleger um salvador da pátria. Óbvio que, para a luta popular, é melhor você ter alguém com quem você possa dialogar na presidência do que alguém que nos criminalize. No entanto, não podemos nos acomodar. Inclusive devemos, de forma organizada pressionar esse presidente para que o governo possa tomar uma linha mais progressista.
Uma das características do governo Trump (EUA) é o protecionismo como resposta à perda de força do imperialismo estadunidense no cenário internacional. É cada vez mais evidente que do ponto de vista econômico a China ameaça a hegemonia Ianque. De modo que as ações de Donald Trump podem ser vistas como uma espécie de desespero - de uma tentativa de retomar um protagonismo que está cada vez mais ameaçado. O Brasil não foi o único país no mundo a ser alvo das tarifas trumpistas - o que no entanto chamou atenção foi alguns dos argumentos utilizados, sobretudo a defesa do Bolsonaro. Deixando assim evidente uma questão que nenhum analista político sério poderia deixar de reconhecer - a medida foi exclusivamente política - e diria mais - uma espécie de chantagem querendo obrigar o governo brasileiro a se curvar diante do Governo Trump (que reproduz o discurso de vitimização do Bolsonaro), abrindo mão da nossa soberania. Alguns analistas até quiseram igualar a postura interventiva trumpiana a visita que o presidente Lula fez a Cristina Kirchner (em prisão domiciliar acusada de corrupção durante os seus governo a frente da casa rosada) numa reunião da cúpula do Mercosul em Buenos Aires (Argentina). O que não tem nada haver. Uma coisa é você prestar solidariedade a um aliado político que você acredita que está sendo perseguido. Outra coisa é você utilizar a máquina estatal para tentar obrigar um Estado soberano a proteger um aliado político que você acredita que está sendo perseguido. Não dá para falar que houve um erro de análise por parte dos Bolsonaros (do Eduardo sobretudo) ao acreditar que a medida de Trump iria provocar uma onda interna de pressão ao Governo Brasileiro e o judiciário a recuar do processo que investiga a tentativa de golpe de Estado promovida após as eleições de 2022. É assim que eles fazem política, não estão preocupados com as consequências para o país desde que isso signifique manter uma narrativa que permita alimentar sua base de apoio. É nesse contexto que se pode compreender as ações que levaram à prisão domiciliar do Jair Bolsonaro.
Não há como falar do cenário internacional sem mencionar o Genocídio que está acontecendo na Palestina com a anuência das principais potências do ocidente. Isso evidencia mais do que tudo o que o filósofo estadunidense Noam Chomsky já havia dito sobre o porque não há por parte dos governantes de países que fazem parte da União Europeia (entre outros) o mesmo posicionamento que tem em relação ao conflito entre Rússia e Ucrânia - a Palestina não tem riqueza e nem poder. E assim lavam as mãos para que o governo fascista de Israel leve adiante o extermínio do povo palestino. Ainda corroborando com a fala do Chomsky, a gente viu como o conflito com o Irã caminhou rapidamente para um cessar fogo. Se os palestinos tivessem o mesmo poder de resposta dos iranianos a coisa seria diferente. A resolução desse conflito passa por uma ampla campanha de solidariedade aos palestinos e denúncia das atrocidades cometidas pelo governo Israelense. Esse movimento é cada vez mais crescente apesar do silêncio da grande mídia. Nesse sentido, retomemos a filósofa Ângela Davis que há vários anos vem se manifestando em defesa da causa palestina e denunciando o governo de Israel. É fundamental articular as lutas contra as opressões com a causa palestina. Pois não se trata de uma questão isolada. Mas parte de um processo que reverbera na luta em defesa dos direitos humanos em todo o mundo. Por fim, concluo fazendo minha as palavras do Vladimir Safatle no encerramento da aula magna (que teve como objeto a relação da Filosofia (e do pensamento crítico) com a situação em Gaza) no departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP), no início de 2024: eu gostaria de lembrar que não há liberdade sem terra e que não há vida possível sem liberdade. Com isso fica evidente que a nossa compreensão de liberdade não é abstrata como a concepção liberal. Devemos portanto lutar para que ela se concretize. E ela só se concretizará quando todos tiverem condições de existência.
segunda-feira, 30 de junho de 2025
Resenha: Porkão festival 2025
Fazia alguns anos que eu não ia num festival de rock. No Tocantins então tinha ido uma única vez na primeira edição do Agosto de Rock em Miracema, lá nos idos de 2004. Depois fui morar em terras goianas e acabei forjando meu gosto pelo punk e metal em festivais no DCE da UFG, no Martim Cererê e no Centro Cultural Oscar Niemeyer assistindo shows de bandas como o Sepultura, Ratos de Porão, Matanza, Claustrofobia, Ressonância Mórfica, Spiritual Carnage, Rolling Chamas entre outras.
Quando vi no programa que a banda santista Surra (SP), seria a Headliner do festival me intimei a ir. Afinal de contas, não é muito comum bandas como essa fazerem shows em terras tocantinas. Tanto que seria a primeira vez deles por essas bandas. Seria também a oportunidade de apreciar bandas locais que fazem música autoral de muita qualidade como a Magoo e o bando Urtiga e a Poeta do Caos.
O evento aconteceu numa noite de sábado, quando boa parte da cidade estava no arraiá da capital. Nada que atrapalhasse um público significativo comparecer ao evento. Até porque quem gosta de rock in roll, em especial metal e punk não vai deixar de ir para um festival com Surra e companhia para ir numa festa junina. E não digo isso por uma questão valorativa, até porque aprecio muito a cultura popular expressa nessas festas.
As apresentações tiveram início com a Bullet proof, banda palmense, que chegou metendo o pé na porta com o seu new metal de qualidade. Essa palavra vai aparecer em todas as demais apresentações, pois de fato foram todas apresentações de qualidade. E nesse sentido é preciso reconhecer a equipe de som - o som de todas as apresentações estavam impecáveis. Tanto das bandas locais como das atrações nacionais (o Leeo fez questão de ressaltar isso numa fala). Era possível apreciar cada instrumento. Nesse sentido da Bullet proof destaco o guitarrista que fazia um beck vocal gutural e o baterista.
A banda seguinte a subir no palco foi a Poeta do Caos, vinda de Paraíso (TO). Também com letras autorais Cláudio Macagi (vocalista) e companhia colocou o público para dançar num ritmo que lembrou o rock setentista e o Marcelo Nova da Camisa de Vênus. Além da performance do Cláudio, os demais músicos também mostraram muita competência nos seus instrumentos.
A banda seguinte foi a Vocifer que nos mergulhou no metal novamente, mas agora numa pegada melódica ala Angra. Confesso que não sou um apreciador de metal melódico mas não posso deixar de reconhecer o talento da banda. Com destaque para o seu frontman. Não é atoa que eles têm ganhado espaço no cenário nacional disponibilizando material de muita qualidade. Vendo a relação da banda com o público vi que parte significativa dos que ali estavam acompanham o trabalho do grupo e fazem parte da sua base de fãs. E para mostrar ainda mais a competência deles, eles foram o grupo de apoio do Marcello Pompeu na sua apresentação solo que veio em seguida.
Pompeu, para quem aprecia metal no Brasil, dispensa apresentações. Com mais de 60 anos de idade e 40 de carreira, é vocalista da lendária banda Korzus (SP). De modo que não é de se admirar que sua apresentação fosse uma catarse coletiva. Sobretudo porque ele brindou os presentes com interpretações de bandas clássicas como Kiss, Judas Priest, Slayer, Metallica e, não poderia faltar, Korzus. Nessa apresentação os músicos da Vocifer mostraram mais ainda sua competência.
Em seguida foi a vez da banda que eu mais esperava - a Surra. Antes o André Porkão, emocionado, subiu ao palco para agradecer a presença de todos.
Enfim, foi uma noite e tanto, regado a rock in roll e cerveja. Aliás, preciso falar que a cerveja estava no ponto. Me despedi da menina do caixa ao comprar a saideira e segui renovado para casa. Vida longa ao Porkão festival, vida longa ao underground tocantinense, ao punk, ao rock in roll.
Pedro Ferreira Nunes - Apenas um rapaz latino americano, que gosta de ler, escrever, correr e ouvir rock in roll.
quarta-feira, 25 de junho de 2025
Crônicas de final de bimestre: Síndrome da centopeia ou sobre avaliação
Nesses anos de docência para mim todo final de bimestre não é diferente. Por um lado os estudantes correndo atrás da gente buscando um pontinho a mais e por outro as exigências burocráticas de lançamentos no sistema de gerenciamento escolar (SGE). Sobre esse segundo não tenho muita dificuldade já que não sou daqueles que deixam tudo para última hora. Já em relação a nota dos estudantes o meu critério é simples.
Como ponto de partida todo mundo tem 10,0. Manter essa média até o final do bimestre depende do que cada um produz ou deixa de produzir em sala de aula. Isso significa que o estudante é avaliado de forma contínua a partir de três aspectos: conceitual, procedimental e atitudinal. O resultado final é que são raros aqueles que chegam ao final do bimestre com a média 10,0. O que ocorre no geral são estudantes precisando de pontos extra para alcançar a média ou melhorar. Em relação a alcançar a média não sou muito exigente. Pois não há no meu horizonte a palavra reprovação. Já conseguir uma média 8,0 em diante é outra história.
Há sempre aqueles estudantes que não se importam com a nota que vai para o boletim, desde que esteja dentro da média. Mas há aqueles que compreendem que aquilo não é apenas um número. E sim reflexo do que eles foram como estudante no bimestre e a partir daí buscam modificar a situação.
Enquanto professor gostaríamos que isso fosse o comportamento de todos, mas compreendo que faz parte de um processo. No entanto, quando alguns despertarem talvez seja tarde. Não, não me culpo por isso. Compreendo que como professor tenho uma limitação. Por mais brilhante que eu seja (e não sou) se o estudante não quiser, não tem como fazer milagres.
Mas enfim. Desde o ano passado tenho feito o seguinte com os estudantes que buscam melhorar sua média. Eles são desafiados a elaborar um memorial do que trabalhamos no bimestre ou escrever um ensaio filosófico a partir de um tópico determinado. Nesse bimestre especificamente me deparei com uma antiga fábula chinesa (a centopeia confusa) num livro de filosofia do Juvenal Savian e então solicitei que os estudantes, que quisessem, poderiam elaborar um ensaio acerca dela.
A fábula retrata uma centopeia despreocupada e feliz que um dia encontra um sapo que lhe faz uma pergunta existencial: - quando você anda, em que ordem você mexe suas patas? A centopeia não só não soube responder. E por mais que refletisse em busca de uma resposta não encontrou. Essa questão a perturbou tanto que ela não conseguiu mais pôr as patas em movimento. E ao não se mover ficou presa em seu buraco e morreu de fome.
Quando propus o exercício não havia refletido sobre. De modo que não criei expectativa acerca do que receberia dos estudantes. Meu objetivo era instigá-los a pensar e ao ver a reação deles a primeira leitura já me dei por satisfeito. No entanto, à medida que ia recebendo os ensaios fui buscar compreender a fábula e ver em que medida aquela mensagem contribuiria para mudança de visão daqueles estudantes.
O que me ocorreu foi justamente uma relação com o processo avaliativo. Quando fazemos uma avaliação corremos o risco de que o estudante se comporte como a centopeia. Diante de um determinado resultado começa a dizer que não é capaz e de fato se torna incapaz. Não compreende que os questionamentos/críticas são importantes para o nosso aprendizado e a partir daí a melhora de nós mesmos. O fato de ter ido mau numa prova, de não ter conseguido responder a um questionamento, não significa que é o fim. Será que eles entenderam? Contribuir para isso será meu objetivo no próximo semestre.
Por Pedro Ferreira Nunes - Professor de Filosofia na Rede Estadual de Ensino do Tocantins.
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