Nasci
e cresci no interior, no cerrado, nas margens do rio Tocantins. Tive uma
infância povoada de lendas, de causos e contos populares contados pelas pessoas
mais velhas, historias que nos metiam muito medo.
Não
podíamos tomar banho no rio Tocantins por que havia o Boto e a Pirarara que
comiam gente, além da sucuri e do nego d´agua. Si andávamos no cerrado era
perigoso encontrarmos com o lobo guará, a onça pintada entre outros animais
ferozes.
Já
à noite tínhamos medo de fantasmas, da aparição de luzes misteriosas, de som de
passos em grotas, de fogos que surgiam do nada. Tudo isso fazia com que não
saíssemos sós de casa, sempre que saiamos era no mínimo em dupla. Até mesmo
pegar um balde de água na cacimba.
Ouvíamos
historias de pessoas que morriam afogadas no rio Tocantins. – Que eram
engolidos pela boiuna (grande cobra d’água). De pescadores que desapareciam e
eram devorados por animais encantados que viviam nas profundezas das águas do
Tocantins. Esses animais encantados eram pessoas que haviam morrido no rio e que
não eram batizadas e que seus corpos nunca haviam sido encontrados.
Também
ouvíamos historias sobre crianças que desapareciam no cerrado, que eram
roubados dos braços das próprias mães por lobos guarás ferozes.
A
semana santa era o período mais macabro, pois geralmente era o período em que
pessoas se transformavam em animais ferozes. Havia uma lenda que dizia que
quando há incesto na família, essas pessoas se transformavam em porcos
selvagens ou lobisomem, e essas transformações só chegavam ao fim se essas pessoas
fossem cortadas por alguma lamina. Dia de lua cheia ninguém colocava o pé para
fora de casa.
Sempre
ouvíamos essas historias que aconteciam ao nosso redor. Foi lá na serra,
aconteceu com fulano de tal. Nunca presenciamos nenhuma dessas aparições, mas
não ousávamos duvidar que de fato elas acontecessem.
Hoje
refletindo sobre todas essas historias que povoaram a nossa infância, vejo que
era uma forma dos nossos pais nos protegerem. Para que não saíssemos sozinhos.
Pois de fato era muito perigoso tomar banho no rio Tocantins, no córrego
Lajeado, sobretudo em período de cheia, não por causa de animais ferozes, mas
sim pela fúria da água.
É
claro que às vezes os nossos avós e nossos pais exageravam na dose e o medo nos
paralisava tanto que quando precisava não conseguíamos fazer o que nos pediam.
No entanto quando íamos crescendo a vontade de ganhar o mundo e conhecer novas
pessoas, viver novas experiências era maior do que qualquer medo que podíamos
ter.
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