sábado, 30 de janeiro de 2021

Lajeado: “No coração dos deuses”

Se a memória não me falha (é, tô ficando velho) foi no verão de 1997 (talvez 1998) que Lajeado foi invadida por aventureiros em busca de um tesouro escondido por essas bandas. Aqui eles se deparariam com a bandeira do velho Fernão Dias e acabariam nas garras de uma poderosa nação indígena – que habitava essas paragens.

Aventureiros? Bandeirantes? Indios? Tesouros? Não, não estou ficando louco. Não é invenção do meu tempo de meninisse. Estou falando do primeiro longa metragem gravado no Tocantins e que teve a cidade de Lajeado como um dos seus cenários. Nesse tempo morávamos numa chácara às margens do rio Tocantins próximo a chácara de dona Júlia e seu Josias, quando de repente começaram a erguer uma aldeia Krahô e um pouco mais acima um acampamento de garimpeiros.

Num lugar onde não havia novidades, aquela novidade alvoroçou todos nós, especialmente as crianças – sobretudo quando chegaram os índios krahô e os atores “globais” liderados por ninguém menos que Antônio Fagundes – que naquele período fazia muito sucesso por essas bandas por ter protagonizado a novela “O Rei do Gado” de Benedito Rui Barbosa.

Lembro que uma noite acompanhamos a gravação de uma cena com o Antônio Fagundes e os índios Krahô na aldeia fictícia. Foi o único momento que os lajeadenses tiveram acesso ao set de filmagem. Mesmo assim não foi possível saber do que se tratava a estória – o que fazia com que ficássemos especulando sobre. 

Depois de um tempo fomos convidados para o evento de lançamento do filme que ocorreria em Porto Nacional (onde também havia sido gravado cenas do filme). Lembro que a multidão presente no evento em praça pública gostou muito da exibição. Eu particulamente não me recordo o que senti e nem me lembro do que se tratava o filme. Acho que nem eu e nem boa parte dos que saíram do Lajeado para acompanhar a exibição.

O filme

Além da gravação da cena com o Antônio Fagundes citada acima, outra coisa que eu não havia esquecido era o nome do filme – “No coração dos deuses”. A partir dessa referência fui pesquisar para saber mais sobre a obra e tive a grata surpresa de descobrir que a mesma havia sido disponibilizada na íntegra no YouTube (https://youtu.be/tNd0qn5-Mr4) Só então eu descobri do que se tratava. E fiquei encantado não só pela questão emotiva que me fez recordar a minha infância, de rever algumas paisagens que se perderam com a construção da Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães (o filme foi gravado antes das obras da UHE se iniciarem). Mas sobretudo pelo fato de se tratar de um bom filme, com uma boa estória, bons atores e uma excelente trilha sonora.

“No coração dos deuses” é um filme do cineasta Geraldo Moraes, que tem no elenco, além do Antônio Fagundes, Roberto Bonfim, Tonico Pereira, Regina Dourado, Iara Jamra, Ângelo Antônio entre outros. Sem falar na participação especial dos indios Krahô. A trilha sonara foi composta pelo André Moraes juntamente com ninguém menos que Andreas Kisser e Igor Cavaleira (Sepultura). E que contou com a participação especial do Mike Patton (Faith No More). De modo que não é surpresa que essa trilha tenha sido premiada em vários festivais de cinema como o de Brasília e o de Pernambuco. 

A estória se desenvolve em torno de um grupo de aventureiros que partem em busca do tesouro dos martírios após encontrar um mapa do século XVII que indica a sua existência. Ao partir em busca desse tesouro sertão adentro eles não imaginam o que encontraram e o que passaram. A aventura não os levaram a outro lugar apenas, mas também a outra época histórica – de um lado a bandeira do famoso Bandeirante Fernão Dias, do outro uma poderosa nação indígena. Decifrar os mistérios do mapa e enfrentar os obstáculos que surgirão no caminho será o desafio desses aventureiros para que encontrem o tesouro.

A mim me pareceu um filme de aventura ala “Indiana Jones” como poucas vezes vi no cinema brasileiro. Isso sem tentar reproduzir fórmulas importadas. Há muita referência a nossa cultura e ao nosso folclore. O elenco está afiadissimo, com destaque para atuação do Antônio Fagundes. Os efeitos especiais foram bem trabalhado e a fotografia está impecável ajudada pela paisagem exuberante do Tocantins, e mais especificamente do Lajeado. 

Diante disso não poderia deixar de recomenda-lo. Seja pela curiosidade pelo fato de ter sido o primeiro longa metragem a ter sido gravado no Tocantins – quem sabe buscar identificar algumas paisagens da cidade de Lajeado antes da construção da UHE. Seja pelo prazer de assistir um filme de aventura com uma boa estória, um ótimo elenco e uma excelente trilha sonora. Ou ainda para aprender um pouco sobre nossa cultura e nossa história – o que faz desse filme uma boa dica para se trabalhar a questão da formação e povoamento do norte goiano.


Por Pedro Ferreira Nunes – Educador, Poeta e Escritor Popular. 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

A pandemia de COVID-19 e o setor Cultural no Tocantins

Entre os setores mais atingidos pelas consequências das medidas impostas para contenção da COVID-19, o cultural é certamente um deles. Por outro lado surgiu a oportunidade, e necessidade, dos artistas saírem da sua zona de conforto e buscarem alternativas para produzir e divulgar suas produções artísticas. 

No Tocantins não foi diferente, mesmo tendo um setor cultural fragilizado pela falta de políticas públicas de apoio e incentivo a cultura. Tivemos ao longo desse período pandêmico diversas iniciativas que mostram uma rica produção artística por parte dos artistas tocantinenses em diversas áreas. Bem como a utilização das mídias digitais para divulgação e compartilhamento dessa produção. Como consequência desse processo temos hoje uma maior apropriação, por parte da classe artística regional, do mundo digital, e da parte do público, um maior número de referências artísticas locais.

Eu particularmente passei a conhecer só agora nesse período pandêmico, muitos artistas que produzem arte no Tocantins. Olha que me considero um cara antenado e informado. Mas a questão é que estes artistas não tem a oportunidade de circular, e nós que vivemos no interior sobretudo,  acabamos não tendo acesso a eles, e nem eles a nós. Com as lives e outros eventos virtuais isso se tornou possível. 

Certamente a iniciativa da Prefeitura de Palmas com o edital Palmas Curte Arte em Casa e da Prefeitura de Porto Nacional com a edição virtual  da Semana Cultural e da Feira Literária muito contribuíram para que os artistas de diversas áreas se sentissem estimulados a ocupar os espaços virtuais como o youtube. Desse modo se você pesquisa hoje no youtube: Palmas Curte Arte em Casa ou Flip portuense, você terá um ótimo leque de opções com atrações culturais Tocantinenses. Além disso é possível encontrar o trabalho de outros artistas produzidos de forma independente. 

Se por um lado houve esse avanço por outro o retorno financeiro não foi o mesmo. O que mostra que o espaço virtual não substituí o presencial. Ainda mais por que os eventos culturais mobilizam toda uma cadeia de produção para além do artista. É sabido que alguns artistas conseguem lucrar com eventos on line, esse não é o caso de 99,9% dos nossos artistas.

Daí a importância da lei Aldir Blanc que injetará 17,4 milhões na economia do Tocantins através de Projetos Culturais – mostrando a sua importância para além de um recurso destinado a gerar uma renda para classe artística. Daí também a revolta por parte dessa classe artística com a devolução, por parte do governo Estadual, de 1,2 milhões, que poderiam ter sido usados para contemplar mais projetos e assim beneficiar muito mais artistas. 

Se não houvesse demanda tudo bem, mas ao que parece, não houve foi vontade política. De modo que creio ser correto o questionamento levantado tanto em relação a este ponto como a outros. Por exemplo, a respeito dos critérios utilizados para a seleção dos projetos. 

Mesmo antes desse questionamento público, quando consultei a lista para ver quais artistas seriam contemplados, esse aspecto me chamou atenção – o nome de alguns contemplados em mais de um projeto ou que não vivem exclusivamente da arte (ou pelo menos que não tem essa como a principal fonte de renda). 

Não gosto de dar o meu exemplo pessoal, mas vou fazê-lo. Eu tenho alguns projetos artísticos, sobretudo no campo da literatura. Mas não achei que seria ético da minha parte inscrever projeto meu, sendo que atualmente estou empregado. Se eu me escrevesse e fosse contemplado poderia está tirando a vaga de um artista mais necessitado do que eu, no atual contexto. 

Se fosse um edital de Cultura regular tudo bem, mas estamos falando de uma lei que tem como objetivo “promover ações para garantir uma renda emergencial para trabalhadores da Cultura e manutenção dos espaços culturais brasileiros durante o período de pandemia do Covid‐19” (Lei Aldir Blanc). Se eu tenho outra fonte de renda por que vou tomar o lugar daqueles que não tem? Mas tudo bem, não estou aqui para julgar. Cada um com sua consciência. Por outro lado, os pareceristas, que segundo o governo tinha um perfil técnico, deviam ter se atentado para isso.

De todo modo, se executados, os diversos projetos contemplados irão contribuir para que 2021 seja um ano movimentado no Tocantins, do ponto de vista cultural. E a partir daí não só garantir uma renda mínima para artistas e espaços artísticos, como também para o fortalecimento da cultura no Tocantins. Óbvio,  esse fortalecimento só se dará de forma contínua, no momento que tivermos políticas públicas para cultura numa perspectiva de Estado e não de governo, numa perspectiva permanente e não pontual. Aos artistas cabe continuar não se acomodando e se reinventando – buscando alternativas para produzir e divulgar os seus trabalhos sem a necessidade de editais.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador,  Poeta e Escritor Popular. 

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Seguindo...

Não sei até quando, mas o fato é que agora em fevereiro este blog completará 9 anos de existência. São 9 anos mantendo uma regularidade de publicação semanal de pelo menos um novo conteúdo autoral (como pode ser conferido nos arquivos do blog). O desejo e a disposição é de continuar, por enquanto vamos seguindo.

Não é fácil manter um blog com conteúdos autorais, ainda mais quando esse conteúdo se refere a textos que exige tempo para pesquisa e produção. E mesmo sabendo que poucas pessoas leem, não abro mão do mínimo de qualidade. O que significa portanto que a pesquisa e a produção são fundamentais. 

Da minha parte não estou preocupado com a quantidade, mesmo sabendo que mais publicações significa mais visualizações. O que faz eu continuar seguindo é saber que o blog é uma referência no pensamento crítico no Tocantins – talvez o único com esse perfil. Buscamos dá voz as lutas populares e ser um espaço de questionamento da ordem dominante.  

Em 2020 conseguimos manter a média de publicações dos outros anos. Com muita dificuldade é verdade, devido ao fato de que o meu trabalho na educação básica exigiu muito de mim. Por outro lado me possibilitou novos aprendizados e a inspiração para alguns textos que inclusive foram publicados no blog. Não sei como será 2021, se conseguirei manter a média de produção dos últimos 9 anos, por enquanto, para iniciarmos mais um ano, compartilho as dez postagens mais populares do ano passado. E aproveito também para compartilhar o link do nosso recém criado perfil no Twitter, caso queira nos seguir por lá  (https://mobile.twitter.com/BarrancasDo).

10 Postagens mais vistas de 2020

Crônicas da quarentena: A difícil tarefa de ficar em casa no verão tocantinense: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/04/cronicas-da-quarentena-dificil-tarefa.html

A questão do fornecimento de água em Lajeado: Hora de pensar na municipalização do serviço: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/03/a-questao-do-fornecimento-de-agua-em.html

ESCOLA VAZIA: Um olhar dos estudantes do CENSP-Lajeado sobre educação em tempos de pandemia: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/08/escola-vazia-um-olhar-dos-estudantes-do.html

“O Rio não tá pra peixe” – intervenção artística na Ponte dos Imigrantes Nordestinos: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/06/o-rio-nao-ta-pra-peixe-intervencao.html

COVID-19: Esperança e Medo: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/03/covid-19-esperanca-e-medo.html

Byung Chul Han e Slavoj Zizek: Duas perspectivas para o mundo pós-pandemia de COVID-19: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/03/byung-chul-han-e-slavoj-zizek-duas.html

Literatura tocantinense: Pedro Tierra e o seu Porto submerso: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/03/literatura-tocantinense-pedro-tierra-e.html

Sobre a diferença entre gostar e confiar: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/04/sobre-diferenca-entre-gostar-e-confiar.html

Comentários a respeito das eleições municipais de 2020 em Palmas: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/01/comentarios-respeito-das-eleicoes.html

Como ser um escritor de sucesso ou para dizer que não escrevi auto-ajuda: https://pedrotocantins.blogspot.com/2020/01/como-ser-um-escritor-de-sucesso-ou-para.html


Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia.