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Área de Proteção Ambiental Serra do Lajeado |
Uma educação que se propõe libertadora não pode se furtar em trabalhar a temática dos direitos humanos na sala de aula. Foi a partir dessa compreensão que trabalhamos, na perspectiva do materialismo histórico-dialético, o tema na trilha de aprofundamento vozes da juventude: passado e presente para um futuro diferente. No contexto de uma pesquisa participante, de caráter qualitativa, no programa de mestrado profissional da Universidade Federal do Tocantins (PROF-FILO).
A questão dos direitos humanos não é alheia a educação formal. Pelo, contrário. Há diferentes documentos que orientam esse ensino. Só para citar um exemplo, destacamos o Programa Nacional dos Direitos Humanos (PNH3) de 2009, que propõem trabalhar os direitos humanos na educação básica numa perspectiva transversal tendo como obejtivo a (2009) “formação de sujeitos de direito, priorizando as populações historicamente vulnerabilizadas”.
Nosso locus
As atividades foram desenvolvidas no Colégio Estadual Nossa Senhora da Providência – localizado em Lajeado – cidade que faz parte da Área de Proteção Ambiental Serra do Lajeado. Com estudantes do Ensino Médio (1° e 2° Série do Ensino Médio) que participam da Trilha Vozes da Juventude. O perfil dos estudantes é de indivíduos oriundos das classes populares – servidores públicos, autônomos, pequenos agricultores e pescadores (na sua grande maioria em situação de vulnerabilidade). Além de viverem numa área de proteção ambiental também tiveram sua vida modificada com o impacto da construção da Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães.
O que são direitos humanos
Nosso ponto de partida não poderia ser outro se não começar por entender o que são direitos humanos. Sobretudo diante de uma visão distorcida que se tem acerca dos mesmos. Sobretudo no Brasil – onde a temática é muito ligada a área da segurança pública – como reflexo da violência policial sustentada por discursos como “bandido bom é bandido morto”, “gente de bem”, “direitos humanos é direito de bandido” entre outros.
Mas quando analisamos que a inserção da temática dos direitos humanos no Brasil se deu no contexto da resistência contra os crimes cometidos pelo Estado durante a Ditadura Civil-Militar é compreensível que aja todo um discurso que busca justificar a violação desses direitos. Sobretudo por parte daqueles que deveriam garantir a sua efetividade – os agentes públicos.
Diante disso não é possível falar em direitos humanos sem falar em política. Pois a sua efetividade passa necessariamente por uma compreensão da política como meio para se alcançar o bem comum. Também não é possível falar em direitos humanos sem falar em ética. Ou seja, em quais valores se funda a sociedade. No caso da brasileira, de acordo com a Constituição Federal de 1988, um dos seus fundamentos é a dignidade humana. E o que são os direitos humanos se não a garantia da dignidade humana?!
Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS)
A garantia da dignidade humana passa pela construção de uma cultura de respeito ao outro. Como também de um conjunto de ações que permitam aos individuos viverem com dignidade independe da sua origem social. É nesse sentido que caminha os objetivos para o desenvolvimento sustentável elaborado pela Organização das Nações Unidas (ONU) que estabelece um conjunto de metas a serem alcançados até 2030 pelo conjunto das nações que a compõe. Entre estas está o Brasil.
Foi a partir desses objetivos que buscamos trabalhar a temática dos direitos humanos em sala de aula. E a partir daí mostrar que não é uma questão alheia a realidade que muitos vivem – uma realidade de violação de direitos, mas por falta de compreensão não buscam mudar tal realidade.
Ao todo a ONU estabeleceu 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS). Optamos por trabalhar apenas 7 – aqueles mais condizentes com a realidade que os estudantes estão inseridos – e que nos permitia o maior aprofundamento em cada um deles:
(ODS 1) Erradicação da Pobreza;
(ODS 4) Educação de qualidade;
(ODS 6) Água limpa e saneamento básico;
(ODS 8) Trabalho e crescimento econômico;
(ODS 11) Cidades e comunidades sustentáveis;
(ODS 12) Consumo e produção sustentável;
(ODS 13) Combate às alterações climáticas.
Metodologia e Didática
Optamos por desenvolver as aulas a partir de uma metodologia problematizadora, tendo como fundamentação teórica o materialismo histórico-dialético. Que nada mais é do que uma Filosofia da práxis. O ponto de partida é sempre o entendimento do estudante sobre o problema em análise. A partir daí busca-se um aprofundamento a partir de exercícios diversos. É então que entra a didática pautada sobretudo no diálogo. É através do diálogo que buscamos compreender o problema tanto a partir de uma perspectiva filosófica quanto científica.
Um aspecto interessante dessa perspectiva didático-metodológica é que a sala se transforma numa espécie de oficina experimental. Ou seja, é a partir da dinâmica da sala de aula que o processo vai sendo construído. Óbvio que temos todo um planejamento e organização. De modo que toda a experimentação não é aleatória, não é um improviso sem sentido. Mas no sentido de compreender que trabalhar a partir de uma perspectiva histórico-dialética é que não existe fórmula prévias de como fazer. Ou como diria belchior – “é caminhando que se faz o caminho” e assim fizemos.
O resultado
Desde o início tínhamos a proposta de elaborar um material didático sobretudo diante da escacez, tanto a nível regional como nacional, de publicações que subsidiasse o professor na sala de aula. Pensávamos numa cartilha. O problema é que não tínhamos em o que nos inspirar.
A partir de um questionamento a ideia passou a ser uma cartilha ilustrada pelos próprios estudantes. O ineditismo da proposta – pelo menos na nossa visão – não nos dava nenhum norte de como fazê-la. E assim iniciamos o trabalho. No final das contas a cartilha foi o menor dos nossos problemas. Sua confecção foi uma consequência natural do trabalho desenvolvido em sala. Na medida que este ia se desenvolvido a cartilha ia tomando corpo.
Eis ai portanto o resultado do nosso trabalho ao longo de dois bimestres. E esperamos com ele não só chamar atenção para a problemática da necessidade da efetividade da educação em direitos humanos. Mas também disponibilizar um material didático, desenvolvido a partir da realidade da sala de aula, para quem queira assumir esse desafio que é trabalhar a educação em direitos humanos numa realidade – que muitas vezes – nega esses direitos.
Pedro Ferreira Nunes - É Professor na Rede Pública Estadual de Ensino do Tocantins. Graduado em Filosofia (UFT). Especialista em Filosofia e Direitos Humanos (Unifaveni). E Mestre em Filosofia (UFT).