terça-feira, 25 de março de 2025

Crônica: Miracema já não é mais a mesma

Chácara dos meus Avós
Os lugares não mudam. O que muda somos nós. Creio que é isso que quer dizer Rubens Alves quando diz que não devemos voltar a um lugar que tanto amamos esperando encontrá-lo da mesma forma de outrora. Ele dirá que iremos nos decepcionar pois o que queremos no fundo é encontrar com o tempo. E aquele tempo já não existe mais. A não ser na nossa memória.

Ao longo da nossa vida alguns lugares vão se tornando muito especiais para nós. À medida que a idade avança creio que aqueles da nossa infância vão ganhando mais relevo ainda. Pelo menos este é o meu caso. A ponto de se um dia o senhor do tempo vier propor um dia no passado em troca de uns 10 anos a menos de vida eu certamente optaria por um dia da minha infância. 

Esse dia muito provavelmente seria no final do ano quando toda a família se reunia na chácara dos meus avós maternos. Ou quando íamos para o Lajeadinho nos juntar à família de Dona Rosalina. Ou uma tarde na baixa preta quando chegávamos da escola e íamos jogar bola no campo de terra e voltávamos ensopados da chuvinha que dera.

Ah, o que foram aqueles dias, não posso descrever com palavras. Por mais que eu tente sempre faltará algo. Mas posso tentar resumir tudo numa palavra: vida. Era a vida se revelando em cada detalhe. Na preparação da comida, nos enfeites da árvore de natal cuidadosamente elaborada por Vovó. Nas brincadeiras, nos sorrisos, nos abraços.

“Eu era alegre como um rio
Um bicho, um bando de pardais
Como um galo, quando havia
Quando havia galos, noites e quintais…”

Esses versos do Belchior expressam fielmente o sentimento que traz as lembranças da minha infância.

O Lajeadinho já não existe, hoje está submerso pelo lago da Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães. A chácara sim. Mas já não é a mesma. Assim como a baixa preta. Miracema não é mais a mesma. A festa agropecuária, os festejos de nossa senhora de Fátima no bairro Correntinho. Não são mais as mesmas as festas juninas. O grupo império da baixa preta. O estádio castanheirão já não recebe nos seus gramados o saudoso duelo entre o Miracema Esporte Clube e o Tocantins Esporte Clube. Quanta dor sinto ao passar em frente as ruínas do Iracema Club palco de tantos carnavais. E o mercadão então. O que fizeram com o mercadão? A banquinha de revista na praça Derocy Morais. O lavacara.

Os meus primeiros anos no Colégio Estadual José Damascena Vasconcelos. Da professora Marlene. Nunca me esqueci da professora Marlene. Aí professora Marlene. Que bela era a professora Marlene. Foi a primeira das muitas professoras pelas quais me apaixonei. Meus colegas da escola primária. Por onde andam? Fernanda, Marcos, Patricia, Marcelo, Adriele, Priscila, Fatima. Já não me recordo de todos. Alguns deles ainda se recordam de mim? O menino tímido que buscava passar despercebido.

“Pedro, pedroca.
nariz de taboca.
Trocou a mulher
por um saco de pipoca”.

Dona Rosa gostava de declamar esse versinho para mim. Colocando o meu apelido de “Que troca”. Oh Dona Rosa. Saudades da senhora. Saudades de mamãe. De irmos lavar roupa na fonte. Na verdade, a meninada gostava mesmo era de tomar banho, lavar roupa era só um detalhe.

Hoje quando ando pelas ruas de Miracema sinto um certo estranhamento. Busco em cada esquina me reencontrar. Mas me lembro que eu já não sou eu. Como vou encontrar com algo que já não existe? Como doí Miracema, como doí.

Pedro Ferreira Nunes - é apenas um rapaz latino-americano, que gosta de ler, escrever, correr e ouvir rock n roll.

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