sexta-feira, 25 de abril de 2025

A importância das associações de Bairros na construção do Direito à Cidade

Sempre me incomodou ao andar pelas ruas do Jardim Aureny I (Palmas) o estado de abandono das praças. Fiquei me questionando qual o sentido de ter tantas praças se não há uma manutenção da limpeza dessas áreas por parte do poder público. Outra questão foi acerca do papel dos moradores. Por que ao invés de cobrar do poder público a limpeza das praças, transformam-nas em depósito de lixo. Com isso temos dois polos: o poder público que negligencia as áreas periféricas. Do outro a população que acredita que o espaço público não lhe diz respeito.

A falta de consciência por parte da população acerca do seu papel na melhoria da qualidade de vida no território em que vive foi objeto de discussão entre eu e uma colega. Num determinado momento começamos a falar da atuação da associação de moradores. E comentei que ao meu ver existem só no papel. Ela retrucou, trazendo o exemplo da associação que preside - a do bairro Jardim Aureny IV. Ao ver a empolgação dela. Eu recuei da minha posição muito feliz. Convidando-a para um bate-papo no contexto de um projeto da Área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas que estávamos desenvolvendo no Colégio Esportivo Cívico Militar Santa Rita de Cássia no Aureny I sobre papel da Mulher na Comunidade, a falar da sua experiência. Pois assim como eu, provavelmente havia muita gente que não conhecia a Associação de Morador do seu bairro e o quanto elas são importantes na busca por uma melhor qualidade de vida da comunidade.

O bate papo foi muito produtivo. E confirmou a impressão que eu tinha, são poucas as pessoas que já ouviram falar de uma associação de moradores atuante em Palmas e qual o papel que elas exercem na comunidade. Mas a partir daquele bate papo tanto elas como eu saberia que há uma associação de moradores que faz um trabalho importante nesse território - a do bairro Aureny IV. Não por acaso conseguiram parceria com instituições como o SENAI através do qual realizam formação profissional para comunidade. Com a Central Única das Favelas (CUFA) através da qual faz um trabalho social junto às mulheres negras. E com a Universidade Federal do Tocantins por meio de um projeto de extensão capitaneado pelo Professor João Bazzoli.

Wânia Máritha (esse é o nome dela) fala de forma apaixonada do seu trabalho como presidente da associação. Da sua eleição ao enfrentar uma campanha misógina que tentou desqualificá-la por ser mulher e mãe solteira. As conquistas que obteve das maiores às menores. Como a associação que mais distribuiu cesta básica durante a pandemia de COVID-19 e a construção de um quebra-molas numa rua movimentada garantido a segurança dos transeuntes.

Nós que acreditamos na solidariedade, na cooperação e no trabalho coletivo não podemos deixar de nos empolgar também com a fala da Wânia. Por outro lado, sabemos que nem todos os presidentes de associação de moradores tem como preocupação o bem comum. Como reflexo disso, em alguns bairros elas só existem de fato no papel. Mas se quisermos vislumbrar outro paradigma de desenvolvimento para Palmas isso passa pelo fortalecimento do protagonismo das comunidades. E nesse contexto as associações de moradores são indispensáveis.

Essa compreensão também encontramos no Bazzoli (2017) que afirma não haver possibilidade de vislumbrarmos outra concepção de cidade sem o protagonismo popular. É nesse sentido que ele desenvolve o seu projeto de extensão universitária que tem o Jardim Aureny IV como um dos territórios onde atua. Trata-se de uma iniciativa importante vinda da academia que, se tratando de UFT, precisa ter uma atuação melhor por meio de projetos de extensão na periferia.

No seu livro Direito à cidade (1968), o filósofo francês Henri Lefebvre nos diz que “as cidades e o urbano não podem ser compreendidos sem as instituições oriundas das relações de classe e de propriedade”. Que instituições são essas? A serviço de quem elas estão? Essas instituições convivem entre si buscando os seus interesses. No caso da associação de moradores elas são um instrumento político de participação da comunidade nos rumos da comunidade. Ela não surge de cima para baixo. Mas como fruto de um processo de conscientização e mobilização dos moradores locais.

Ainda seguindo a linha no que diz Lefebvre sobre o direito à cidade. Este só pode ser formulado como o direito à vida urbana, transformada, renovada. Sendo que a efetivação desse direito não requer apenas uma legislação. Mas a participação dos trabalhadores a partir de uma atividade prática-sensível. Pois ninguém melhor do que eles sentem na pele a falta de um transporte público de qualidade, de saneamento básico, da limpeza urbana, da falta de equipamentos culturais entre outros.

E as associações de moradores, como produto dessa atividade prática-sensível é um instrumento importante para que possam se organizar e mobilizar em defesa do direito à cidade.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins. 

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