quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

Sobre o discurso do governo Temer a cerca da Reforma da Previdência

 “... as aparências, as aparências não me enganam não...”.
Belchior

A palavra de ordem do governo Michel Temer (PMDB) para convencer a população da sua proposta de reforma da previdência é: - combater os privilégios. Isso mesmo, Temer e sua tropa de choque quer convencer a opinião pública de que há uma casta de servidores públicos (trabalhadores) que precisam perder certos privilégios em beneficio do bem comum, isto é, a sobrevivência do sistema público previdenciário.

O discurso do governo de combater os privilégios, repetido diariamente nos meios de comunicação é forte e tem um impacto significativo na população pobre. População que está cansada de viver na miséria vendo uma pequena casta de privilegiados mamar nas tetas do Estado. De modo que essa população não se negaria em apoiar a ação do governo de combater tais privilégios.  E se não apoiar enfaticamente, pelo menos não irá se mobilizar contra a reforma da previdência, já que está não lhe atingirá, mas apenas “os privilegiados”.  E assim caímos sem perceber numa armadilha que nos levará direto para o matadouro. 

- Ora, eu não sou um servidor público federal, não tenho os privilégios que eles têm, por que diabos vou me mobilizar contra uma reforma da previdência que não me atingirá?!

Cuidado, muito cuidado com esse discurso. É justamente o tipo de postura que o governo espera despertar. E é o tipo de postura que nos levará ao mesmo fim do personagem do poema “Intertexto” do poeta Alemão Bertold Brecht.

“Primeiro levaram os negros, mas não me importei com isso. Não sou negro. Em seguida levaram alguns operários, mas não me importei com isso. Eu também não era operário. Depois prenderam os miseráveis, mas não me importei com isso. Por que eu não sou miserável. Depois agarraram uns desempregados, mas como tenho o meu emprego, também não me importei. Agora estão me levando, mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém, ninguém se importa comigo”.

A tática do governo Temer através do discurso veiculado pela propaganda oficial tem como finalidade dividir a classe trabalhadora, fazendo com que os setores mais pauperizados fiquem indiferentes com o que aconteça com aqueles que têm melhores condições de vida. Uma indiferença que é criada a partir do discurso do governo de que o objetivo da reforma previdenciária é combater privilégios. Dai que é preciso desmontar esse discurso. Mas como fazê-lo? 

Creio que isso se dá através da problematização de duas questões. Primeiro é preciso questionar – quando o governo fala em combater privilégios, quais seriam esses privilégios? E segundo – quem são estes privilegiados? 

A resposta é clara, os tais privilégios para o governo são direitos historicamente conquistados. E os privilegiados são servidores públicos (trabalhadores) que conquistaram tais direitos. Percebe-se, portanto um recorte de classe por parte do governo (apesar disso ser negado). Pois a sua política de combate aos privilégios limita-se a um setor bastante especifico da sociedade. Esse recorte de classe fica mais evidente quando analisamos, por exemplo, que “enquanto propõe que o brasileiro trabalhe por mais tempo para se aposentar, a reforma da previdência social ignora os R$ 426 bilhões que não são repassados pelas empresas ao INSS. O valor da divida equivale a três vezes o chamado déficit da previdência em 2016...” (Repórter Brasil, 2017). Ainda de acordo com o Repórter Brasil (2017) “somente 3% das companhias respondem por mais de 63% da divida previdenciária”. Entre estas empresas estão o Bradesco, a JBS, a Marfrig e a Vale. Logo se vê que para o governo combater privilégios é retirar direitos dos trabalhadores. Claro, para poder manter os privilégios do patronato. Por isso justamente é que o trabalhador deve arcar com um suposto rombo que não foi criado por ele. E ai cinicamente o governo fala em combater privilégios?! 

Ora falar em combater privilégios no Brasil e limitar-se a uma reforma da previdência que atinge diretamente apenas uma classe social revela muito bem a característica cínica desse governo, pois na linha do que diz o filósofo Vladimir Safatle sobre o cinismo, as ações do governo Temer busca repetir uma aparência de legitimidade, no entanto é apenas aparência. E as aparências já não me enganam, tal como não enganavam Belchior. E que espero, não engane você também.

Pedro Ferreira Nunes é Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio. Também cursa Filosofia na Universidade Federal do Tocantins, fazendo parte da Coordenação Geral do Centro Acadêmico de Filosofia – CAFIL/UFT e do PIBID Filosofia.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Crônica: - Ai, ai!!!

Estava sentado lendo um livro na varanda de casa quando me chamou atenção à discussão entre dois meninos que estavam brincando próximo dali – coisa não muito rara. De modo que o que me chamou mais atenção mesmo foi à utilização da seguinte expressão por eles: “ai, ai”. Não é uma expressão incomum aqui no Tocantins, pelo contrário. Inclusive, trata-se de uma expressão que pode adquirir significados variados dependendo do contexto que é utilizada.

De repente um garoto falou – ai, ai. A resposta do outro imediatamente foi um – ai, ai. Os dois utilizaram a mesma expressão, no entanto expressando um sentido diferente. Mas como podemos saber a diferença de uma para outra num contexto de uma conversa? O tom da voz e a expressão corporal. O tom da voz e a expressão corporal é fundamental para sabermos o que quer dizer esse “ai, ai”. Para quem não conhece esse linguajar é um tanto difícil, mas quem tá habituado se entende bem.

Se fosse traduzir a discussão entre os garotos seria mais ou menos assim: 

O primeiro garoto disse: - Ai, ai (Lá vem ele com suas gracinhas).

O segundo garoto: - Ai, ai (O que é que eu tô fazendo?).

O primeiro aplicou a expressão num contexto de indignação perante a atitude do outro, que o respondeu usando a expressão num contexto de surpresa. 

O interessante é que não só eles se entendem, mas também os outros que acompanham esse diálogo um tanto econômico nas palavras. Isso mesmo, no Tocantins o “ai, ai” expressa muito mais do que geralmente a expressão significa em outras regiões do país. Alguns dicionários informais apontam, por exemplo, que “ai, ai” significa amor, outros apontam que é utilizada numa situação de conforto ou prazer. Mas como mostra o exemplo da conversa entre os garotos acima, não é bem esse significado ou não é apenas esse significado, pelo menos não em terras tocantinas.

Numa conversa com um tocantinense certamente você ouvirá essa expressão. E ela poderá ter muitos significados. Poderá significar uma alegria diante de algo inesperado, como poderá significar desprezo perante uma atitude qualquer. 

- Ai, ai (Não precisava disso).

- Ai, ai (Vê se ti enxergar ou que você pensa que é?!).

Poderá significar um descontentamento como também um contentamento. Em suma, é uma expressão que no Tocantins adquire um caráter ambíguo. Isto é, tem múltiplos sentidos.

Também é uma expressão bastante reveladora da característica do tocantinense, que geralmente é introspectivo e de poucas palavras. E é nesse contexto por tanto que o “ai, ai” bem como outras expressões dessa natureza tornam-se fundamentais na cultura linguística tocantinense.

E você que lê essas linhas provavelmente ao final dirá – ai, ai. Isto é. Esse cara não tem coisa melhor para fazer?!

Pedro Ferreira Nunes – É poeta e escritor popular tocantinense.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Reflexão sobre a educação do povo surdo a partir do filme "E seu nome é Jonas".

Pedro Ferreira Nunes 
Graduando de Filosofia da UFT

O Filme “E o seu nome é Jonas” é da década de 1970, lançado nos Estados Unidos da América – de Autoria de Michael Bortman e dirigido por Richard Michaels. Passado mais de 30 anos do seu lançamento às questões que ele nos trás são bastante atuais. Sobretudo por que majoritariamente o que ocorre no cotidiano é a reprodução de preconceitos que vemos no filme, como por exemplo, para citar apenas um mais leve, que o surdo é um deficiente. No decorrer dos anos várias lutas do povo surdo ocorreram e várias conquistas foram obtidas. O fato de num curso de licenciatura estar tendo uma disciplina de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) é um bom exemplo. 

No entanto é preciso avançar muito mais, sobretudo no campo educacional. E o filme “e seu nome é Jonas” nos faz ter um olhar sensível para condição do surdo na nossa sociedade. E aqui o termo “nossa” é bem aplicado, pois a sociedade que vivemos (hegemonicamente) é feita para os ouvintes. Para Strobel (2008) para comunidade ouvinte, o nascimento de uma criança surda é uma catástrofe porque estão acostumados com padrão “normalizador” para integrar à vida social e também desconhecem o “mundo dos surdos”.

O filme conta uma história comovente de uma família diante dos desafios para que o filho Jonas (surdo) possa ter uma vida “normal” em sociedade. Mas o que é ter uma vida “normal”? O que é ser “normal”? É se curvar diante do que a cultura hegemônica nos impõe? Aqui é importante chamar atenção para o que afirma Strobel (2008) sobre os riscos de uma cultura unitária: “a ideia unitária de uma cultura está relacionada na sociedade com as ideologias hegemônicas, de padronização, de normalização, onde todos devem se identificar com essa cultura única em um determinado espaço”. (2008; 16). É essa visão que coloca o surdo como um deficiente. Como um incapaz. Como um anormal. Sendo que a ciências muitas vezes é utilizada para justificar absurdos dessa natureza. No filme, Jonas é uma vitima desse processo, sobretudo quando é diagnosticado erroneamente como um deficiente mental, sendo obrigado á passar três anos internado numa escola para deficientes mentais, o que contribui para que o seu processo de ensino-aprendizagem seja afetado negativamente.

Os pais ao descobrirem o erro tentam recuperar o tempo perdido, mas tanto eles como a sociedade em geral não estão preparados para enfrentar essa situação. De modo que antes de educar o filho surdo, eles devem ser educados para poder dar conta de criar as condições para que Jonas se eduque. Para tanto é preciso compreender que a cultura não é unitária ou é algo estagnado. A esse respeito Strobel (2008) afirma que “a cultura não vem pronta, daí por que ela sempre se modifica e se atualiza, expressando claramente que não surge com o homem sozinho e sim das produções coletivas que decorrem do desenvolvimento cultural experimentado por suas gerações passadas”. E ao longo do filme vemos esse processo de transformação dos personagens.

Mas não é um processo fácil. E o filme também mostra os percalços dessa caminhada. Por exemplo, quando o pai de Jonas decide abandonar a família por não conseguir lhe dar com a situação. Sobretudo pela pressão da comunidade que os cercam, que cada vez mais os leva para o isolamento. Desse modo é a mãe que assume toda a responsabilidade pela educação do filho. Não sem crise – não sem muitas vezes pensar em desistir, por não perceber nem uma “evolução” de Jonas diante dos seus esforços. Jonas por sua vez constrói uma relação de muito afeto com o seu avô, o único que o trata de maneira humanizada. Aliás, a morte do avô de Jonas será um marco importante na estória. Por ser um exemplo de tomada de consciência da realidade do garoto. A esse respeito Petrilli (2011) afirma que “a nossa consciência da “realidade” é uma consciência mediada por procedimentos signicos. Enquanto tal, é condicionada pelas nossas experiências pregressas individuais e coletivas...”.

Quando Jonas já havia aprendido a língua de sinais, e tinha a capacidade de entender os signos que traduzem os significados que se dá as coisas, ele tomou consciência do que havia acontecido com o seu avô, que ele tanto amava. O momento é mais marcante quando ele consegui passar isso para a sua avó. Que também nesse momento o reconhece não mais como um deficiente, mas como um sujeito consciente. A esse respeito é importante salientar o que afirma Geraldi (2010) “se a consciência tem sua materialidade própria nos signos, e se estes somente emergem do processo de interação entre uma e outra consciência, então a própria consciência é resultante de um processo de encarnação material do que lhe é exterior – os signos – que pertencem não ao individuo, mas ao grupo social organizado em que as interações – e a emergência dos signos – se concretizem”. (2010; 139). Outro momento do filme onde podemos perceber essa interação num grupo social onde os signos se manifestam concretamente é na cena onde Jonas começa a entender a língua de sinais.

O Surdo como Sujeito Consciente através da Língua e da Cultura

Em “E seu nome é Jonas”. Aliás, um nome (do filme) bastante significativo, pois mostra o quanto vivemos numa cultura impositiva. Na qual aqueles que não se enquadram são visto como “retardados” ou “sem cultura”. Percebemos um processo de transformação tanto do personagem principal que dá nome ao filme bem como daqueles que estão a sua volta. Tal transformação se dá, sobretudo diante da sensibilidade da mãe de Jonas ao perceber que o método educativo no qual o seu filho está sendo submetido não está surtindo o efeito esperado. Ela então vai buscar alternativas. E ao se deparar com uma família de surdos buscará uma aproximação na esperança de que eles lhe apontem algum caminho. É a partir dessa aproximação que ela descobrirá a existência de uma cultura surda. Cultura surda? Isso mesmo. De acordo com Strobel (2008) “cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modifica-lo a fim de se torna-lo acessível e habitável ajustando-se com as sua percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas e das “almas” das comunidades surdas. Isto significa que abrange a língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo”. Foi justamente isso que a mãe de Jonas pode vivenciar quando foi com uma amiga numa festa da comunidade surda. Ali ela pode presenciar que os surdos não tem a apenas a língua de sinais, mas também ideias, crenças, hábitos e costumes.

A mãe de Jonas mergulha nesse universo e percebe a gama de possibilidades que o seu filho tem para ter uma vida feliz. Eis ai uma passagem nesse filme um tanto poética – “a metamorfose de mãe”. A sua transformação ao descobrir que os surdos tem sua cultura, isto é, língua, ideias, crenças, costumes e hábitos. E a sua grandeza é aceitar isso, e não fazer como se faz costumeiramente, impor a cultura dos ouvintes. “Segundo o discurso ouvintista, o sujeito surdo para estar bem integrado à sociedade deveria se adaptar à cultura ouvinte, porque somente assim poderia viver “normalmente”. Se não conseguir, é considerado “desviante””. (Strobel, 2008; 23). Ela sabia bem que esse discurso não condizia com a realidade que ela estava vivendo. Desse modo ela compreendeu que era preciso aceitar que não existe apenas uma forma de ver o mundo. Que não poderia privar o seu filho de conviver numa cultura que era diferente da sua. Quando ele tivesse consciência o suficiente poderia muito bem decidir se queria ou não pertencer àquela cultura. Aqui reafirmamos o que dissemos anteriormente, primeiro foi preciso à educação da mãe para que então ela pudesse saber como lhe dar com o filho surdo.

E o que caracteriza essa cultura surda defendida tão enfaticamente por autores como Strobel, Caldas, McCleary, Rodrigues, Kalatai entre outros? É a língua. A língua é um fator primordial. Nesse contexto estamos falando da língua de sinais. De acordo com Caldas (2012) “a identidade surda é uma alteridade que se constrói através de um sistema linguístico. Por isso é necessário que os surdos estejam em constante contato com a língua de sinais”. O filme mostra muito bem isso, o quanto foi importante à apropriação da língua de sinais pelo jovem Jonas. O quanto isso foi importante para o desenvolvimento do seu processo de ensino-aprendizagem. O quanto foi importante para se tornar um sujeito consciente, ainda que se tratasse de uma criança – mas que através da língua de sinais conseguia entender a realidade que estava inserida. Inclusive tendo consciência da morte.

E o passo importante para essa transformação foi à apropriação da língua de sinais, foi à convivência com outros surdos que se caracterizavam pelo orgulho de ser surdo, de pertencer à comunidade surda. McCleary chama atenção para isso: “o orgulho que os surdos sentem em relação à sua língua é apenas um aspecto – um reflexo – de uma coisa maior: seu orgulho de ser surdo... dizer que você tem orgulho de ser surdo é um ato político. É por que você começa a balançar o mundo do ouvinte. Ele começa a ter menos controle sobre você. E quando isso acontece, começa a abrir espaço para mudança”. (2003; 2, 3). E essa tem sido a luta do povo surdo, luta por mudanças no sentido que a comunidade dos ouvintes compreenda sua cultura e acima de tudo a respeite. O filme mostra muito bem como isso não é algo fácil. São séculos de luta e a invisibilidade em torno dessa problemática continua ainda de forma evidente. Sobretudo por que vivemos numa sociedade demasiado positivista que hegemonicamente cultiva o discurso de que “os diferentes” são problemas. Por fim, o filme mostra um fato que carece de muita atenção, que é a inoperância do Estado em garantir políticas públicas que atendam o povo surdo. De modo que se não fosse à perseverança da mãe de Jonas, ele não teria conseguido desenvolver sua aprendizagem, o máximo que conseguiria era uma espécie de adestramento.

Os surdos e a Questão Educacional

Outro fator importante que o filme “E o seu nome é Jonas” nos faz refletir é sobre a educação dos surdos – um debate relevante e bastante atual. O filme abordou algumas metodologias que são utilizadas no processo de desenvolvimento da aprendizagem dos sujeitos surdos. Além de mostrar de forma enfática as duas visões que historicamente olham para surdez. A visão a partir do modelo clínico-terapêutico e a visão a partir do modelo sócio antropológico. De acordo com Rodrigues (2008) “a adoção de uma dessas visões demonstra as concepções e conceitos de quem olha e, certamente, guiará a uma série de perspectivas e atitudes com relação aos surdos e ao seu processo de ensino-aprendizagem”.

Essa questão pode ser vista com muita evidencia no filme. Por exemplo, quando foi tomado consciência de que Jonas era surdo e não um deficiente mental, ele foi levado para uma instituição que justamente tinha essa visão clinico-terapêutico, tanto que a metodologia ali utilizada era o Oralismo. 

De acordo com Kalatai (2012) “o principal objetivo da metodologia Oralista é desenvolver a fala do surdo, pois para os defensores deste método, a língua falada era considerada essencial para a comunicação e desenvolvimento integral das crianças surdas”. Esse método pode ser bem exemplificado em dois momentos no filme. Por exemplo, quando Jonas é submetido a um teste onde ele tem que apertar um botão sempre que ouvir um sinal que é disparado por um aparelho, como recompensa recebe um doce. Percebe-se ai também a utilização do método psicológico behaviorista. Isso mesmo, a surdez é tratada mais a partir de uma perspectiva clinica do que de uma perspectiva humanista. 

Para Kalatai (2012) “diante da concepção clinica da surdez e do surdo, as escolas são transformadas em salas de tratamento. As estratégias pedagógicas passam a ser estratégias terapêuticas”. Ainda nessa perspectiva, citando Streiechen, Kalatai afirma (2012) “como consequência das práticas Oralistas, os surdos não aprendem a falar. Conseguiam pronunciar apenas algumas palavras que eram repetidas de forma mecânica sem saber o que elas realmente significam”. É o que percebemos no momento em que Jonas está sentado numa mesa com outras crianças, cada uma com uma placa com o seu nome escrito, pendurado no pescoço, e as crianças são estimuladas a falar seu nome. É justamente desse momento que surge o nome do filme – e seu nome é Jonas.

Diante dessa questão percebemos bem a lógica da visão clínico-terapêutico, que de acordo com Rodrigues (2008) “...trouxe uma visão estritamente relacionada à surdez com patologia, enfatizando o déficit biológico. Assim, aqueles que se alicerçam nesse modelo consideram a surdez como mera deficiência sensorial... Nesse modelo clínico, os surdos ou deficientes auditivos possuem uma deficiência que precisa ser tratada com o proposito de reabilitá-los à convivência social”.

Diante da percepção do fracasso desse método, a mãe de Jonas buscou outro caminho. E esse caminho passava pela utilização da língua de sinais para desenvolver o processo de ensino-aprendizagem do garoto. Essa decisão da mãe de Jonas não agradou nem um pouco a escola na qual ele estava matriculado, que tinha uma visão clinico-terapêutico da surdez e utilizava o Oralismo como método de ensino para os surdos. A partir do contato da mãe de Jonas com o povo surdo ela descobre uma nova visão a cerca da surdez. Que é uma visão a partir do modelo sócio antropológico. De acordo com Rodrigues (2008) essa visão “compreende-se a surdez como uma experiência visual, ou seja, como uma maneira especifica de se construir a realidade histórica, politica, social e cultural”. Ao contrário do modelo clinico-terapêutico a surdez é considerada como uma diferença e não como uma deficiência. Desse modo, surdo é aquele que se reconhece como tal e “independentemente do grau da perda auditiva, reconhecem-se como surdos, na medida em que valorizam a experiência visual e se apropriam da LS como meio de comunicação e expressão... Nessa mesma perspectiva, as pessoas com deficiência auditiva seriam aquelas que rejeitam a condição da surdez na medida em que tentam resgatar a experiência auditiva por meio de próteses e implantes, desprezando a LS e estabelecendo seu único meio de comunicação através da LO”. (2008; 61).

Desse modo podemos afirmar que a visão sócia antropológica requer novas metodologias educacionais que podem ser utilizadas na educação dos surdos. E o filme mostrou essas metodologias. Por exemplo, a metodologia utilizada para que Jonas aprendesse a língua de sinais foi a Pedagogia Surda – feita pelos surdos e para os surdos. Foi essa metodologia que possibilitou a transformação de Jonas. Nessa linha é importante ressaltar o que diz Kalatai (2012) sobre a Pedagogia Surda: “a metodologia realmente desejada pelo povo surdo é a Pedagogia Surda, visto que as lutas destas pessoas giram em torno da constituição da subjetividade do jeito surdo de ser, ou seja, da construção de sua verdadeira identidade e consagração de sua cultura, e que só poderá ocorrer no encontro com seus pares”. Foi justamente isso que ocorreu com Jonas quando ele começou a aprender a língua de sinais, com um jovem que demostrava ter muito orgulho de ser surdo. Um processo de ensino aprendizagem que se deu na informalidade, mas foi de extrema relevância para o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem do garoto. E de fato, sobretudo na situação especifica de Jonas, nos parece que era a opção mais adequada. Se há 30 anos a Pedagogia Surda estava na informalidade, hoje não mudou muita coisa. Talvez o que tenha mudado é que hoje a Pedagogia Surda está pelo menos sendo pautada. 

Outra metodologia educacional que pudemos perceber no filme “E seu nome é Jonas” foi à comunicação total. Essa metodologia não foi utilizada na educação do Jonas. Mas estava presente no filme, sobretudo na relação da família que apresentou à mãe de Jonas a comunidade dos surdos. Eles comunicavam com o filho através de sinais, mas ao mesmo tempo o filho estava matriculado numa instituição que utilizava o Oralismo. E que abominava a utilização da língua de sinais no processo de desenvolvimento da aprendizagem das crianças surdas. Talvez tal fato tenha se dado pela condição da mulher, que apesar de ser surda conseguia oralizar. Nessa linha a respeito da Comunicação Total, Kalatai (2012) alerta para o fato de que essa metodologia não traz resultados satisfatórios pelo fato de defender o uso simultâneo das duas línguas – “a fala e os sinais (biomodalismo)” trata-se de duas línguas distintas e com estruturas diferentes que dificulta a aprendizagem. Outro fator importante a se destacar em relação à Comunicação Total é que essa metodologia não se opõem ao Oralismo, no entanto é considerada um passo adiante no reconhecimento de que há alternativas para além da imposição do método oralista. No entanto como vimos anteriormente, não deixa de ser insuficiente nas palavras de Kalatai.

Por fim podemos perceber no filme a presença da metodologia Bilíngue De acordo com Kalatai (2012) “a metodologia Bilíngue destaca que os surdos adquirem conhecimentos por meio do canal visual e a mistura entre línguas, utilizadas na Comunicação Total, dificultava a aquisição do conhecimento pelos surdos, pois cada língua tem características próprias e independentes, tornando-se assim impossível falar ambas as línguas (sinalizada e oral) ao mesmo tempo no âmbito escolar”. E essa tem sido a luta do Povo Surdo.

Nós diagnosticamos em nosso campo a imperativa necessidade da Educação Bilíngue de Surdos. A partir desses lugar que falamos, contamos a história das lutas do Movimento Surdo Brasileiro em defesa das nossas Escolas Bilíngues. A história em defesa das nossas escolas especificas vem de tempos longínquos... Nós, os surdos, não queremos ser tutelados, queremos o exercício da liberdade pela forma e escolha linguística e cultural condizente com o nosso modo de viver e experienciar, de sermos surdos, diferentes dos ouvintes. Somente nós, surdos, que sabemos o que é melhor para nós, da forma como precisamos ser educador...” (Campello, 2014; 73).

Não é uma tarefa fácil, sobretudo pela especificidade dessa luta, pois a violência contra os Surdos é uma espécie de violência simbólica, que inclusive não é visto como violência. E é uma luta que bate de frente com o Estado, que por sua vez é um instrumento de dominação e de imposição de uma cultura hegemônica. Mas o movimento Surdo não tem duvida que lutar pelos seus direitos é a única alternativa.

O filme “E seu nome é Jonas” termina com Jonas sendo matriculado numa Escola para crianças surdas – que tem uma visão sócio-antropológica da surdez e que utiliza o bilinguismo como metodologia. Ele então não se sentirá mais isolado no mundo, pois existem crianças que compartilham a mesma língua dele – a língua de sinais, e, por conseguinte a mesma cultura. Ele se sente bem ambientado e se reconhece naquele espaço. O que contribuirá para que o seu processo de ensino-aprendizagem ocorra satisfatoriamente. 

O filme termina, mas a vida real continua e infelizmente nem sempre o final é feliz para muitos outros Jonas. Muitos outros Jonas que são rotineiramente violentados. Isso mesmo – violentados. Pois o que é tratar o diferente como um deficiente se não uma violência?! Violência tanto contra os Surdos como com suas famílias que são ludibriadas, que não encontram o apoio necessário por parte do Estado para que possam educar seus filhos de forma adequada. A visão clinico-terapêutica da Surdez não foi superada – ela está ai. E por que ainda está ai? Por que gera lucro. Por que alguns poucos se beneficiam da ignorância da grande maioria. Desse modo os desafios para que essa situação se modifique não são pequenos, pois é uma luta que vai contra um modelo hegemônico na sociedade. 

No entanto o povo Surdo tem tomado consciência e lutado para modificar essa realidade. Sobretudo a partir da atuação em dois campos: No político e no educacional. No campo politico lutando por uma legislação que garanta direitos para o povo Surdo e no educacional lutando por metodologias como o Bilinguismo e a Pedagogia Surda. E a partir dessa luta conseguiu-se importantes conquistas. Dentre estas conquistas uma no meu modo de ver, que foi fundamental, foi dar visibilidade a essa causa. Por exemplo, quando hoje ligamos a televisão e vemos a presença de interpretes de LIBRAS em pronunciamento políticos ou mesmo em telejornais – o que evidencia o reconhecimento da existência de uma comunidade que utiliza essa língua. Outro fator é a presença da disciplina de LIBRAS nos cursos de licenciatura que tem por finalidade a formação de professores. E isso é muito importante por que por um lado possibilita uma maior produção acadêmica a respeito dessa questão, inclusive a partir da própria perspectiva dos Surdos. E por outro lado tem a responsabilidade de formar professores que poderão encontrar um Jonas pela frente e que diante dessa situação poderá ou não reproduzir o discurso hegemônico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

CALDAS, Ana Luiza Paganelli. Movimento Surdo: identidade, língua, cultura. Trad. Rev. Luiz Daniel Rodrigues. In: Um olhar sobre nós surdos: leituras contemporâneas. P. 58-147. – 1 Ed. – Curitiba, PR: CRV, 2012.

CAMPELLO, Ana Regina; Resende, Patrícia Luzia Ferreira. Em defesa da escola bilíngue para surdos: a história de lutas do movimento surdo brasileiro. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, Edição Especial n. 2/2014, p. 71-92. Editora UFPR.

GERALDI, João Wanderley. Ancoragens: estudos bakhtinianos. São Paulo/SP: Pedro e João, 2010.

KALATAI, Patrícia; Streiechen, Eliziane Manosso. As principais Metodologias Utilizadas na Educação dos Surdos no Brasil. Universidade Estadual do Centro-Oeste, campus Irati, 2012.

MCCLEARY, Leland. (2003) Orgulho de ser surdo. In: ENCONTRO PAULISTA ENTRE INTERPRETES E SURDOS, 1, (17 de maio) 2003, São Paulo: FENEIS-SP (Local: Faculdade Sant´Anna).

PETRILLI, Susan. Em outro lugar e de outro modo. São Paulo/SP: Pedro e João, 2017.

RODRIGUES, Carlos Henrique. Situações de Incompreensão Vivenciadas por Professor Ouvinte e Alunos Surdos na Sala de Aula. Faculdade de Educação da UFMG: Belo Horizonte, 2008.

STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a Cultura Surda. – Florianópolis: Ed. da UFSC, 2008.

*Trabalho Apresentado á Disciplina de LIBRAS, do Curso de Licenciatura em Filosofia da Universidade Federal do Tocantins -UFT.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Conto: O Menino e o Boto

Para meu sobrinho, Pedro Henrique.

As águas do rio Tocantins estavam cheias. Era período de chuva e os botos animados seguiam a correnteza brincando animadamente com os cardumes de peixes que subiam rio acima para reproduzirem.

Enquanto isso os pescadores agoniados tentavam espanta-los batendo com o remo na água. Preocupados com suas redes.

- Vai pra lá bicho ruim. Não vão rasgar nossas redes.

Porém os botos não se importavam. Achavam que os pescadores estavam brincando com eles. O que deixava os pescadores ainda com mais raiva daquele animal “perverso” que destruía suas redes e roubavam-lhes os melhores pescados. Isso mesmo, por essas bandas do Tocantins os botos são visto como animais perversos. Não faltando estórias a cerca das suas peripécias – Estórias de mistérios que quase sempre desperta medo na população ribeirinha.

Mas não aquele menino que pescava piaus naquela tarde a beirada do rio. Ele não compreendia por que tanto medo de animais tão belos e encantadores.

O menino cresceu ouvindo estórias terríveis sobre o que os botos aprontavam por ali – viravam embarcações com mulheres gravidas, matavam pescadores, comiam gente. E assim hora e outra se ouvia estórias de uma canoa que havia sido tombada por um boto ou de um pescador desavisado que havia caído no rio e sido devorado por uma daquelas criaturas.

- Menino, nem pense em tomar banho no rio sozinho, pois si um boto ti pegar você já era.

- Pois é. Ouvi falar que o filho de fulano de tal foi comido por um boto.

- É mesmo cumade?

- É verdade. Seu Zé Pescador que falou.

Mas o menino não acreditava muito naquelas conversas. Mesmo assim ele não tinha coragem de entrar nas águas do rio Tocantins sozinho. Quando ia pescar, só na companhia dos pais ou dos irmãos mais velhos. E só pescava da beirada sem por se quer o pé na água.

Naquela tarde que ele pescava piaus tranquilamente ouviu um barulho muito perto de onde estava. O que seria? O seu irmão que havia ido pescar com ele tinha saído para jogar tarrafa e lhe deixou sozinho por um momento. No entanto ordenou-lhe:

- Não coloque nem o pé na água que já volto. Mas o menino estava inculcado com aquele barulho.

– O que seria aquele barulho?! Questionava-se.

Curioso o menino decidiu olhar mais de perto para ver o que era e para sua surpresa descobriu que havia um boto preso numa rede de pescar. O boto debatia-se tentando escapar da rede, mas quanto mais se debatia mais preso ficava.

- Socorro, socorro. Gritava o boto.

- E agora o que eu faço? Pensava consigo o menino.

– Se eu soltar ele será que depois não vai me comer? Não vai me levar para o fundo da água e me matar afogado? Pensava o menino se lembrando das estórias terríveis que ouvia sobre os botos.

- Socorro, socorro. Continuava o boto a gritar.

Foi então que o menino tirando uma coragem não se sabe da onde decidiu entrar na água para salvar o boto. Sabia que tinha que fazê-lo bem de pressa, pois se seu irmão ou outro pescador chegasse e visse aquela cena com certeza iria matar o pobre animal que era apenas um filhote. E assim após muita luta enfim o menino conseguiu libertar o boto. Que muito feliz agradeceu:

– Obrigada amiguinho, obrigada amiguinho. Já mais vou esquecer o que tu fez por mim.

E o boto seguiu livre nadando pelas águas do Tocantins, pulando de felicidade e acenando para o menino – que por sua vez não podia esconder a alegria de ter salvado o jovem boto. Mas decidiu guardar aquela alegria apenas para si. Pois não contaria para ninguém o que tinha feito. Até por que seus pais seriam capazes de proibi-lo de ir ao rio Tocantins se soubessem.

O tempo passou e o menino já era um homem. Não virou um pescador como seu pai e seus irmãos. Virou um biólogo que se dedicava a estudar a vida aquática no rio Tocantins – preocupado com a diminuição de algumas espécies de peixes que outrora se encontrava em abundancia por ali.

Certo dia em uma expedição de estudos sobre os cardumes de peixes no rio Tocantins a embarcação de sua equipe foi surpreendida por um grande temporal e o forte banzeiro conseguiu virar o barco que ele estava. Ele estava muito longe da margem, não sabia nadar muito bem. Não tinha jeito – com as condições do tempo com certeza morreria afogado.

Quando o jovem já estava perdendo as forças de tanto se debater na água para que não morresse afogado nas profundezas do Tocantins – um boto apareceu e lhe puxou até a margem do rio. Ele quase desacordado reconheceu bem pelas cicatrizes no animal – era o boto que ele havia tirando daquela rede de pescador quando criança.

– Obrigada amiguinho, obrigada amiguinho. Já mais vou esquecer o que tu fez por mim.

Pedro Ferreira Nunes – Poeta e Escritor Tocantinense.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

O amor pode destruir o ódio?!

Parece uma questão clichê de folhetim barato não é mesmo?! Até por que o mundo caminha no sentido contrário, isto é, o triunfo do ódio sobre o amor. Sendo assim como acreditar que o amor pode destruir o ódio? Antes de tentar responder a questão levantada é preciso saber: Afinal de contas o que é o amor? O que é o ódio? Qual a relação entre esses dois afetos? Não são questões difíceis de serem respondidas se partirmos dos clichês. Mas não é nosso objetivo aqui. Nosso objetivo é falar do amor e do ódio através da perspectiva filosófica de Baruch Spinoza, especialmente na sua obra: “Ética Demostrada a Maneira dos Geômetras”, Terceira parte - Sobre a Origem e a Natureza dos Afetos.

Desse modo antes de falar sobre o amor e o ódio propriamente, é preciso entender o que Spinoza compreende por afetos. Afetos são “afecções do corpo que aumentam ou diminui, ajuda ou limita a potência de agir do corpo”. E nessa afirmação encontramos um conceito central no pensamento de Spinoza – potência. Outro conceito importante é esforço. Potência e esforço são fundamentais para compreendermos a relação entre amor e ódio. E a compreensão dessa relação entre amor e ódio passa pelo entendimento de quais seriam nossos afetos primários. E quais seriam? O Desejo, a Alegria e a Tristeza. Segundo Spinoza o Desejo (Cupiditas) é o apetite com a consciência dele mesmo. Alegria (Laetitiae) é uma paixão pela qual a Mente passa a uma perfeição maior. Já a Tristeza (Tristitiae) é uma paixão pela qual ela passa a uma perfeição menor. É a partir dos afetos primários que se originam todos os demais. Inclusive o amor e o ódio.

Pronto, já sabemos de onde se origina o amor e o ódio, mas o que seriam essas afecções? Para Spinoza o Amor (Amor) é uma alegria concomitante a uma causa externa e que buscamos conservar. Já o Ódio (Odium) trata-se de uma tristeza concomitante a uma causa externa da qual buscamos nos afastar ou destruir. E como podemos amar ou odiar? Amamos pela Simpatia (Sympathia) que é Alegria. E Odiamos pela Antipatia (Antipathia) que é Tristeza. Parece simples, não é?! Mas não é tão simples assim.

Spinoza afirma que quando nossa mente é afetada por dois afetos simultaneamente, por exemplo, o amor e o ódio. Quando posteriormente for afetado por um deles, também será afetado pelo outro. Dessa forma por acidente, qualquer coisa pode ser causa de alegria, tristeza ou desejo. Em suma, podemos simultaneamente amar e odiar o mesmo objeto. Estes afetos contrários ao estado da mente provoca a flutuação da alma (animi fluctuario) – hora amamos, hora odiamos. Essa flutuação se dá pelo fato de que o corpo humano é composto de muitíssimos indivíduos de natureza diversa. Logo pode ser afetado de diversos modos.

Para Spinoza, amamos quem nos ama e odiamos quem nos odeia. Sendo assim, se odeio farei mal e se amo farei bem. Isso também parece uma questão óbvia né?! Mas é ai que está o problema. Como todos querem ser amados e louvados acabam se odiando e, por conseguinte fazendo o mal – Numa sociedade que cultua o individualismo, como é o caso da sociedade baseada no modo de produção capitalista, essa máxima tem sido levada ao extremo. Desse modo não é de se admirar que não raramente passemos a odiar aquilo que amávamos. E se alguém começar a odiar a coisa amada esse ódio será maior que o amor. Pois a tristeza será maior, tanto pelo ódio como pelo fato que já amou a coisa.

Mas o contrário também pode acontecer – alguém pode começar a amar a coisa odiada e esse amor será maior que o ódio. Dai que nosso filósofo afirma que o amor pode destruir o ódio. E aqui chegamos a nossa questão inicial – para Spinoza o amor que se origina do ódio, o amor que vem daquilo que odiávamos é maior. Seria, portanto preferível buscar amar aquilo que odiamos? Já que isso nos permitirá alcançar uma espécie de “amor supremo”? Spinoza brinca dizendo que seria a mesma coisa de querer ficar doente para depois obter a cura. E isso ninguém quer.

O que podemos concluir de tudo isso? Que sim, que o amor pode destruir o ódio, mas também que o ódio pode se sobrepor ao amor. Isso dependerá de agirmos racionalmente e da potência e do esforço de perseverar em uma dessas direções. 

Pedro Ferreira Nunes é – Educador Popular e bolsista do Pibid-Filosofia da UFT na Escola Estadual Frederico José Pedreira Neto.

*REFERÊNCIA: SPINOZA, Baruch. Ética Demostrada a Maneira dos Geômetras - Terceira Parte “Sobre a Origem e a Natureza dos Afetos”. Tradução: Roberto Brandão. Disponível em: http://docs11.minhateca.com.br/66423427,BR,0,0,BARUCH-Spinoza-Etica-Demostrada-a-maneira-dos-Geometras-PT-BR.pdf. Acesso em: 16 Out. 2017.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Poema: Hasta la victoria siempre!

Venho de outros tempos
Forjado em mil batalhas
‘hasta la victoria siempre’
A nossa luta não para.

Em Palmares com Zumbi
Em Canudos com Conselheiro
Eu lutei até o fim
Ao lado dos meus companheiros.

Com Lampião no sertão
Zé Porfírio em Goiás
João Pedro lá em Sapé
Lutas monumentais.

Ao lado de Marighela
Com muito orgulho lutei
Na guerrilha do Araguaia
Confiante eu marchei.

Marchei com a Coluna Prestes
Com Julião nas ligas camponesas
Na revolta da chibata
Atuamos com firmeza.

No eldorado dos Carajás
Vi muitos companheiros tombar
E no massacre de Corumbiara
Eu também estava lá.

Ao lado de Chico Mendes
Na defesa da floresta
E com o cacique Raoni
Defendendo o que nos resta.

No Pinheirinho em São José dos Campos
Resistimos bravamente
No Parque Oeste Industrial
Não foi diferente.

Mataram-me tantas vezes
Outras tantas fui aprisionado
Me espancaram brutalmente
Sem dó fui torturado.

Mas continuo de pé
Resistindo e lutando
Podem me matarem sempre
Que acabo me levantando.

Sou o povo brasileiro
Que constrói este país
Haveremos de triunfar
Seremos um povo feliz.

Viemos de outros tempos
Forjado em mil batalhas
‘Hasta la victoria siempre’
A nossa luta não para.

Pedro Ferreira Nunes
Casa da Maria Lucia. Lajeado – TO. Lua Nova, Inverno de 2018.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Mais um período de luta na defesa dos interesses das e dos Estudantes de Filosofia da UFT

 
Mais um período de luta na defesa dos interesses das e dos Estudantes de Filosofia da UFT 
 
Chegamos ao final de mais um período na Universidade Federal do Tocantins – Campus de Palmas. E queremos através deste boletim prestar conta e fazer um breve balanço da gestão Despertar é preciso! A frente do CAFIL – Centro Acadêmico de Filosofia da UFT. Bem como apontar alguns desafios para o próximo período.
Desde já desejamos a todas e todos um final de período exitoso, boas férias e que possam recarregar as energias para enfrentar os desafios do ano vindouro.
Consolidação de uma gestão democrática e participativa
A gestão Despertar é preciso! Assumiu o CAFIL (Centro Acadêmico de Filosofia da UFT) em março de 2017. E desde então temos pautado nossas ações nas decisões coletivas – ocupando os espaços de representação (Colegiado de Filosofia e Conselho Diretor), bem como nos demais espaços que se faz necessária a nossa presença. Sendo que no período atual essa política foi consolidada. Bem como uma política de comunicação através dos informes e das publicações via grupo do wattssapp, no facebook e no nosso blog.
O que também conseguimos consolidar foi à parceria com a Coordenação do Curso de Filosofia, por exemplo, na Recepção dos Calouros, na semana intercursos – Os 100 anos da Revolução Russa e na II Jornada Filosófica. Fizemos mais um pedido de camisetas e fortalecemos mais ainda a imagem do curso de filosofia no campus de Palmas. Hoje sem duvidas a atuação do Centro Acadêmico de Filosofia é referência para o movimento estudantil na UFT e já não nos ignora tal como outrora.
Todas essas conquistas são frutos da luta coletiva – se não houvesse um amplo apoio das e dos estudantes de Filosofia da UFT essas conquistas não seriam possíveis. Inclusive destacamos a contribuição de estudantes do curso que não fazem parte da coordenação geral do CAFIL, mas que não se negaram a assumir tarefas e contribuir na realização dessas ações. E assim vamos construindo um trabalho de base para que quando terminar nossa gestão o CAFIL não entre em vacância como em outros momentos.
Fortalecimento do Movimento Estudantil na UFT
O CAFIL teve um papel de destaque nas eleições do DCE-UFT – contribuindo assim para que fosse reconstituído o principal instrumento de representação das e dos estudantes na Universidade. O DCE estava em vacância há quase 01 ano. Fizemos parte da comissão eleitoral (representando o campus de Palmas) e mesmo diante de todas as dificuldades cumprimos o nosso papel de cabeça erguida até a realização das eleições e a posse da nova gestão. Acompanhamos também as eleições para o Diretório Acadêmico de Palmas e ficamos felizes em ver os estudantes do curso de Filosofia participando do processo e inclusive compondo chapas. Sem duvidas estamos com uma representação estudantil mais forte, claro, isso não é fruto apenas da nossa luta, mas de todas as entidades estudantis da UFT, e, sobretudo das e dos estudantes que mesmo não fazendo parte dessas entidades participaram do processo.
Executiva Nacional de Estudantes de Filosofia - ENEF
O CAFIL fez parte da recriação da Executiva Nacional de Estudantes de Filosofia, que ocorreu no 33º ENEFIL na cidade de Fortaleza - CE, juntamente com centros acadêmicos e diretórios acadêmicos de todas as regiões do país. Sem dúvidas um marco importante na articulação e organização nacional das e dos estudantes de filosofia para fortalecer a nossa resistência contra os ataques à educação, o sucateamento da universidade pública e especificamente ao curso de filosofia por parte do governo ilegítimo de Michel Temer.
Desde então temos mantido contatos permanente com a executiva nacional de estudantes de filosofia e temos estreitado relações com representantes da região norte amadurecendo a possibilidade de construção do EREFIL – NORTE (Encontro Regional de Estudantes de Filosofia da Região Norte).
Participação no ENEFIL
A delegação da UFT Foi uma das maiores delegações do 33º ENEFIL. A maioria estava participando pela primeira vez de um evento desse porte – Era uma delegação inexperiente, mas que, no entanto teve uma participação significativa, inclusive apresentando trabalhos. Problemas ocorreram e que devem ser corrigidos nos próximos eventos, mas nada que tenha prejudicado a participação da delegação como um todo.
Nesse sentido devemos o quanto antes nos planejar e nos organizar para participar da próxima edição que se realizará em Santa Maria – RS, em 2018. Não podemos abrir mão de estarmos num espaço tão importante para nossa formação. Desde já assumimos o compromisso de lutar incansavelmente para garantir a participação de uma caravana da UFT no evento.
Oferta de disciplinas de Verão no curso de Filosofia – Uma conquista importante
Uma conquista importante no qual nós do CAFIL tivemos um papel importante foi à aprovação pelo Colegiado de Filosofia da oferta de disciplinas de verão. Com isso os estudantes que estão com pendencia nas disciplinas que serão ofertadas terão a possibilidade de regularizar sua situação. É claro, essa conquista só foi possível por que conseguimos sensibilizar os professores e a coordenação do curso da importância da oferta dessas disciplinas. No entanto é fundamental que os estudantes não deixem passar essa oportunidade. E assim, se for bem sucedido essa experiência, teremos condições de reivindicar futuramente a oferta de mais disciplinas.
Recepção dos Calouros dos cursos de Filosofia e Teatro
Num período em que houve tantas denuncias de trotes machistas, racista e homofobicos na UFT. Inclusive tomando as manchetes da imprensa regional. O CAFIL juntamente com acadêmicos do curso de Teatro organizou uma recepção conjunta com apresentações artística dos veteranos e com uma roda de conversa sobre o papel do movimento estudantil na universidade. Além disso, elaboramos e distribuímos um boletim especialmente para os calouros falando sobre o papel do Centro Acadêmico, sobre a vida universitária e nos colocando a disposição para auxilia-los no que fosse necessário. Foi com certeza um momento marcante e muito exitoso que nos comprometemos em repetir no próximo período.
Desafios para o próximo período
Nesses quase dez meses a frente do Centro Acadêmico de Filosofia da UFT tivemos importante conquistas, mas temos consciência que é possível muito mais. E nos comprometemos em continuar buscando fortalecer e preservar as conquistas que alcançamos, mas também avançar no sentido de conquistar muito mais. No entanto precisamos do apoio de todas e todos. Não só do apoio, mas também da participação efetiva na construção e nas ações do CAFIL. Pois como falamos em outro momento – um Centro Acadêmico forte, autônomo e de luta só é possível com o envolvimento de todas e todos os estudantes do curso e não apenas de sua coordenação geral.
Nesse próximo período vamos intensificar a luta para garantir uma sala para o CAFIL. Uma questão prioritária, que estamos devendo aos estudantes do curso de filosofia. Queremos deixar claro que não abrimos mão dessa demanda. A direção do Campus de Palmas nos garantiu uma sala, mas até agora não cumpriu sua promessa. Esperamos que eles cumpram com o que fora acordado o quanto antes.
Também iremos propor a confecção de novas camisetas do curso de filosofia com uma nova arte e cores. Sendo que este novo modelo de camiseta será submetido para ser aprovado ou não por todas e todos do curso de filosofia.
Faremos uma assembleia geral no inicio do próximo período para avaliarmos coletivamente o primeiro ano de gestão (da gestão Despertar é preciso!) a frente do CAFIL – Centro Acadêmico de Filosofia da UFT. E a partir dai decidir a cerca da continuidade ou não dessa gestão, da realização de novas eleições, modificações estatutárias (se necessárias) entre outros.
Por fim, nos colocamos a disposição de todas e todos. Estamos abertos ao diálogo e as criticas para que possamos melhorar cada vez mais a nossa gestão.
Abraços revolucionários, atenciosamente,
Coordenação Geral do Centro Acadêmico de Filosofia – CAFIL da Universidade Federal do Tocantins.
...Aquí está una de las tareas de la Juventud, impulsar, dirigir con el ejemplo la producción del hombre del mañana, y en esa producción y en esa dirección está incluida la producción propia, porque nadie es perfecto..”. Ernesto Che Guevara.