segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Fazenda Liberdade

Fazenda Liberdade

- Olá, tudo bom?! Vocês sabem quem quer ir trabalhar no roçado em uma fazenda na região de Miranorte? A gente paga bem e damos toda estrutura para quem for.

Miro não era morador daquela cidade, mas já tinha sido visto outras vezes por ali como também em outras pequenas cidades do interior do Tocantins, sempre procurando trabalhadores para trabalhar em fazendas do seu patrão – um dos maiores latifundiários do país, mas que ninguém se quer sabia o nome, só sabiam que era um político de renome nacional.

Miro sabia que não era difícil encontrar gente para trabalhar nos latifúndios de seu patrão por ali. Já que não era fácil arranjar trabalho nas pequenas cidades do interior, há não ser nas fazendas. E por tanto se não quisessem morrer de fome os trabalhadores tinham que migrarem para os grandes centros do país ou então submeter-se a dura labuta nas grandes fazendas.

Ele sabia até onde encontrar os trabalhadores – era só ir até o bar pioneiro no centro da cidade, próximo ao pé de pequi na praça cinco de maio que lá estaria um monte deles tomando cachaça e jogando sinuca, pois na falta do que fazer era assim que eles passavam o tempo.

João e Raimundinho que estavam ali logo se interessaram pela proposta. Não estava sendo fácil a vida para eles em Lajeado, não tinha trabalho e por tanto estavam com extrema dificuldade para manter suas famílias. Eles conheciam como era o duro trabalho no roçado, mas se não tinha alternativa era preciso agarrar o que viesse.

- Quanto tempo é de trabalho? E a diária?

- Bom, trabalho lá é para uns três meses. Masa gente trás vocês de quinze a quinze dias para visitar suas famílias. A diária é de 50 reais.

- E então Raimundinho, cê topa? Eu topo.

- Se você vai, eu também vou.

- Tá certo, a gente vai então.

- Ótimo. Vocês não sabem mais de uns três para ir com a gente não?

- A gente vai ver, ai ti falamos.

- João, eu acho que o Lazão, o Neguim e o Zezim topam.

- É mesmo.

- Vocês sabem onde eles estão para eu ir falar com eles?

- Sim, vamos lá. Disse João.

Tudo combinado agora era se despedir das mulheres, dos filhos, dos amigos e seguir rumo à fazenda liberdade na região de Miranorte do Tocantins. Doía-lhes no peito ter que abandonar seus familiares para ir trabalhar tão longe, mas carregavam nas mochilas a esperança de retornarem em breve para junto deles com grana para pagar o mercado e o aluguel que já estava alguns meses atrasados. Além do mais, Miranorte não era assim tão longe de Lajeado.

A caminhonete seguia estrada adentro pela zona rural de Miranorte, já estavam algumas horas viajando e nada de chegarem ao tão aguardado destino. Cada vez que iam se adentrando rumo à fazenda liberdade, eles percebem que estavam cada vez mais distante de qualquer civilização. Na carroceria da caminhonete João, Raimundinho, Lazão, Neguim e Zezim olhavam-se já demostrando preocupação – pois logo perceberam que ficariam num lugar bastante isolado, bem distante da cidade e de qualquer povoado sendo impossível, portanto se deslocar dali há não ser de carro.

Eles já eram acostumados trabalhar na roça, porém sempre trabalhavam em fazendas no entorno da cidade onde moravam e que pertenciam a pessoas que moravam ali. Agora pela primeira vez eles se deslocavam para trabalhar em um lugar tão distante em terras de pessoas que eles se quer conheciam. Mas estava feito. Eles haviam aceitado o convite e já estavam quase chegando à fazenda. Agora era trabalhar e rezar para que tudo desse certo.

João sentia uma forte angustia no peito, estava arrependido de ter aceitado o convite para trabalhar ali, mas agora não havia volta era preciso encarar o trabalho duro e dar forças para seus outros companheiros que o tinham como um exemplo de homem forte e destemido.

Era quase noite quando enfim a caminhonete chegou na sede da fazenda. Todos cansados perguntaram:

- Chegamos?

- Na fazenda a gente já chegou faz horas. Mas é aqui que iram passar a noite. Aqui é a sede da fazenda, onde mora a gerencia e os patrões ficam quando vem aqui.

Os amigos se olharam pensando o tamanho que era aquele latifúndio sendo que eles andavam há varias horas dentro dele de carro.

- A gente vai ficar onde Miro?

- Vocês ficaram em um alojamento mais próximo de onde irão trabalhar. Por tanto tomem um banho, comam bem e depois vão dormir que amanhã 05h da manhã nós levaremos vocês de carro até o local do trabalho.

Bem cedinho todos já estavam de pé pronto para irem para o roçado.

- Bom, vocês ficaram aqui nesse alojamento. Vocês se viram para fazer a comida de vocês. Se precisarem de alguma coisa fala comigo ou com o Chicão que nós damos um jeito, é claro que depois descontaremos dos salários de vocês.

O alojamento era um barracão de palha sem nenhuma estrutura no meio de uma mata isolada bem distante da casa sede da fazenda.

João, Raimundinho, Lazão, Neguim e Zezim não gostaram do que viram.

- Mas Miro, não foi isso que a gente combinou!

- Bom, vocês não vieram passear aqui não, vocês vieram foi trabalhar. E cuidem logo se não vocês não recebem não.

Subiu um ódio por dentro de João, uma vontade de avançar em Miro e lhe dar uma cossa, mas percebeu que além de Miro, o tal Chicão e outros dois peões estavam armados.

Raimundinho percebendo a raiva de João, procurou acalma-lo:

- Tá certo, a gente veio aqui para trabalhar. Então vamos lá.

- Estão vendo esta mata ai? É para derrubar toda por que iremos fazer pasto pra gado.

E segurando no cabo da arma falou:

- Ninguém sai daqui enquanto não acabar o serviço viu?!

Em seguida saiu acompanhado de Chicão, mas deixou dois peões armados vigiando os amigos no roçado.

- Para que essa gente armada nos vigiando? Nós não somos bandidos! Falou Zezim indignado.

- Deixa pra lá que nós só vamos trabalhar quinze dias aqui e não voltaremos mais. Comentou Raimundinho.

- E você acha mesmo que ele vai cumprir a promessa de nos levar em casa de quinze em quinze dias? Ele não cumpriu as outras promessas, também não irá cumprir essas. Vão forçar a gente a trabalhar até terminar o roçado e Deus sabe o que eles faram com a gente, se ainda deixaram voltarmos pra casa. Respondeu João incrédulo.

- Vira essa boca pra lá camarada. Tá amarrado em nome de Jesus.

- A gente tem que arrumar um jeito de fugir daqui se a coisa continuar desse jeito.

- Como faremos isso. Você não viu a distancia que nós estamos de Miranorte? Além do mais por que você acha que esses caras estão armados nos vigiando?

- Deixem de conversa e vão trabalha cambada. Gritou de longe os jagunços armados.


- Vamos trabalhar, o que não nos faltará é tempo para gente pensar o que fazer para sair dessa enrascada. De uma coisa eu sei, minha mãe não me criou para eu ser escravo de ninguém. A gente dará um jeito de sair daqui. Disse João.

* Do livro 'A morte do Socialismo' de Pedro Ferreira Nunes.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Sobre a ilegalidade da greve dos professores da rede municipal de Palmas

“Latem os cachorros, Sacho? Latem, respondeu ele. Então, Sancho, é que caminhamos.”
Dom Quixote

A gestão do prefeito Carlos Amastha (PSB) não perdeu tempo e entrou na justiça com pedido para que a greve dos professores da rede municipal fosse declarada ilegal. A justiça estadual por sua vez não tardou em tomar uma decisão declarando a ilegalidade da greve – determinando uma multa diária para o SINTET caso insista na paralisação. E Agora o que fazer? Continuar o movimento grevista ou renderem-se as vontades do prefeito Carlos Amastha?

Tal decisão sobre a continuidade ou não do movimento grevista cabe exclusivamente aos professores da rede municipal de Palmas – eles, somente eles, sabem onde o calo aperta, e por tanto, somente eles, podem declarar a ilegalidade ou não da greve.Isso mesmo, não cabe à prefeitura de Palmas e muito menos a justiça determinar a ilegalidade da greve, pois não são eles que enfrentam no dia a dia os problemas decorrentes do descaso com a educação pública no município de Palmas. Não são eles que têm que dar aulas em salas sucateadas e receberem salários defasados. Aliás, o que deveria ser declarado ilegal é retirar direito dos trabalhadores tal como faz o prefeito Carlos Amastha, mas contra isso a gloriosa justiça tocantinense nada faz.

Não é a primeira vez e nem será a ultima que a justiça tomará esse tipo de decisão declarando de ilegais movimentos grevistas legítimos. Esse processo de judicialização e criminalização das lutas dos trabalhadores é uma velha tática dos governos de plantão Brasil afora – que tem como objetivo desmobilizar os trabalhadores para que estes abram mão dos seus direitos e aceitem sem resistir e questionar o que querem lhes enfiar goela abaixo. 

Tal postura nos faz questionar – e o direito de greve? Onde esta o direito do trabalhador garantido na constituição federal de fazer greve? Infelizmente esse direito constitucional vem sendo continuamente subtraído da classe trabalhadora, como tantos outros direitos. Isso sim é ilegal – negar direitos historicamente conquistados, mas para isso a justiça é cega, completamente cega.

O fato fundamental é que não pode ser uma decisão judicial que determinará a continuidade ou não do movimento grevista, só os professores, que com suor e lagrima, fazem a educação no município de Palmas tem legitimidade para isso, só a eles cabe o papel de declarar se a greve é ou não ilegal.

Nós do Coletivo de Educação Popular José Porfírio, que estamos ao lado do povo trabalhador tocantinense na luta pelos seus direitos, especialmente daqueles que lutam por uma educação pública, gratuita e de qualidade, nos solidarizamos e nos colocamos de forma incondicional ao lado dos professores da rede municipal de Palmas que legitimamente lutam pelos seus direitos.Vamos juntos na luta!
Pedro Ferreira Nunes
Coletivo José Porfírio


Lajeado – TO, 13 de Outubro de 2015.

Breve nota sobre o ajuste fiscal do governador Marcelo Miranda e a ausência da esquerda neste debate

Há poucas semanas o governador Marcelo Miranda (PMDB) conseguiu aprovar sem maiores dificuldades um pacote de medidas, que aumenta os pesados impostos que a população tocantinense já paga, na assembleia legislativa. O chamado ajuste fiscal visa segundo o governador aumentar a arrecadação do estado que esta em crise. Se já não bastasse o ajuste fiscal do governo federal que retira direitos dos trabalhadores e aumenta a carga tributaria em cima da população, agora os tocantinenses terão ainda mais que arcar com o ajuste fiscal do governo estadual.

Os deputados estaduais aprovaram o aumento nas alíquotas de energia, IPVA de carros populares, alíquotas de combustíveis, bebidas alcoólicas, perfumaria entre outros. Assim o tocantinense que já paga uma das tarifas de energia mais cara do mundo, terá mais um aumento. Sem falar da tarifa de água que quase dobrou este ano e a tarifa do transporte coletivo. Enquanto isso os privilégios e regalias continuam na assembleia legislativa do Tocantins, como por exemplo, o pagamento do auxilio moradia. Levantamento do ‘Jornal do Tocantins’ aponta que o parlamento tocantinense é um dos mais caros do Brasil. Que inclusive gasta mais do que pode, mesmo assim não há nenhum projeto para reduzir os gastos com os deputados ou os gastos do governo estadual.

Ao contrario do que aconteceu no Rio Grande do Sul e no Paraná, o ajuste fiscal do governo Marcelo Miranda foi aprovado sem maiores dificuldades na assembleia legislativa do Tocantins. Não houve nenhuma mobilização ou manifestação por parte dos servidores públicos estaduais e demais organizações da classe trabalhadora. Nenhuma notinha de repudio por parte das organizações de esquerda tocantinense. Aliás, a esquerda tocantinense esteve totalmente ausente neste debate. Como tem estado ausente na luta do povo trabalhador no ultimo período no Tocantins – seja na greve dos servidores públicos federais e estaduais, da educação estadual e municipal, das universidades federais, da policia civil, do aumento da tarifa do transporte coletivo e agora do ajuste fiscal do governo estadual.

Salvo a atuação de alguns valorosos militantes, à esquerda enquanto organização tem estado por fora das mobilizações e lutas travadas pelos trabalhadores no Tocantins. O Fórum de luta que deveria desempenhar um papel na articulação das organizações populares esta inoperante. Enquanto isso os ataques aos direitos da trabalhadora e do trabalhador são desfechado de todos os lados.

É urgente a necessidade de articulação das diversas organizações populares que atuam no Tocantins para juntos se organizarem contra os ataques aos direitos dos trabalhadores – partidos como PSOL, PCB e PSTU não podem conversar apenas para discutir tática eleitoral. Juntamente com movimentos populares como o MTST e o MST e movimentos sindicais como o ANDES e o SINTET devem criar um fórum de luta permanente de fato para lutar contra os ataques dos governos de plantão aos direitos do povo trabalhador. Tal tarefa é urgente, ou se não, o governo de plantão continuará enfiando goela abaixo da população pacotes como o do ajuste fiscal aprovado recentemente na assembleia legislativa sem maiores dificuldades.


Pedro Ferreira Nunes é educador popular e militante do Coletivo José Porfírio.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Cultura popular tocantinense - A contribuição dos negros e indígenas na musica e na dança

Muitos questionam se o Tocantins tem uma cultura popular característica, já que até pouco tempo atrás fazia parte do território de Goiás. O que faz com que muita gente acaba reproduzindo o discurso de que a cultura popular tocantinense é a mesma dos goianos. A verdade é que apesar de ser um estado novo a cultura e a arte popular do Tocantins tem suas próprias características. Especialmente a cultura negra e indígena.

Os negros e os povos indígenas deram uma contribuição importante ao longo da história na construção da identidade cultural e artística tanto a nível nacional como também regional. Se formos buscar na historia veremos que as raízes culturais mais profunda do Tocantins estão na cultura dos povos indígenas que já habitavam este território muito antes dele ser desbravado pelos bandeirantes que aqui chegaram em busca de ouro e diamante. A contribuição dos negros não é menos importante – eles tiveram um papel fundamental na construção da cultura e da arte nessa região que viria se tornar o estado do Tocantins. Foram os negros escravizados pelos bandeirantes na exploração do ouro e diamante que, por exemplo, criaram a súcia.

A súcia é uma dança de origem africana trazida pelos negros que vieram trabalhar como escravos nas minas de ouro e diamante em Arraias, Natividade, Porto Nacional e outras regiões do estado. Portanto a súcia é uma expressão artística genuinamente tocantinense – uma marca histórica da resistência dos negros que foram tão explorados no Tocantins.

Já sobre á musica feita no Tocantins podemos destacar que a sua principal característica é a sua diversidade, pois foi e é construída por artistas que aqui nasceram, mas também por aqueles que vêm de outras regiões e escolheram o Tocantins para morar. E é esta diversidade que faz a riqueza da musica e a dança feita no Tocantins.

Porém seria prematuro afirmar que temos uma arte popular acabada. Se o próprio estado do Tocantins ainda esta em construção, a arte popular feita no Tocantins ainda esta em construção. Sobretudo a arte que é feita pelas novas gerações. Arte esta que precisa dialogar com as nossas raízes culturais, sobretudo as raízes culturais negras e indígenas. Nesse sentido podemos destacar alguns artistas como Genésio Tocantins, Juraídes da Cruz,Toninho Andrade, Everton dos Andes, Chiquinho Chocolate, Dorivam e os tambores do Tocantins que se preocupam em fazer esse diálogo nos seus trabalhos artísticos tanto no campo musical como na dança.

O Tocantins é um estado multicultural – tal característica se dá pelo fato de ser um estado onde recebemos pessoas de várias partes do Brasil. Aqui vivem goianos, paulistas, mineiros, maranhenses, cariocas, gaúchos, paraenses, paranaenses, cearenses, piauienses. Em suma, pessoas de todos os cantos do país. Além de cubanos, japoneses, norte americano, canadense, africano entre outras nacionalidades. Essa formação multicultural do Tocantins reflete no tipo de arte que é feita no estado. Uma arte rica e diversa. O povo tocantinense que aqui nasceu ou aqueles que escolheram essa terra para viver são privilegiados por viver num território com uma grande riqueza cultural. Com uma arte popular importante, mais ainda em construção.

Só lamentamos que os governantes não deem o devido valor a arte popular construída no Tocantins. A falta de apoio e estrutura, a falta de condições para produzir e divulgar faz com que essa arte tão rica acabe sendo pouca conhecida pela população tocantinense – especialmente a musica e a dança.

Pedro Ferreira Nunes é poeta, escritor e educador popular.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Ida ao salão do livro do Tocantins

Apesar de ser um amante dos livros, da literatura – tanto que acabei me enveredando pela poesia e pela prosa – nunca havia ido a um encontro literário. Mas ao tomar conhecimento da realização da 9º edição do salão do livro do Tocantins. Vi que era a oportunidade de viver essa experiência. E assim eu fiz – joguei uma mochila nas costas, peguei um ônibus e segui rumo ao parque do povo – centro de convenções de Palmas onde estava sendo realizado o evento.

Tal como muitos amantes dos livros – estudantes, músicos, atores, poetas e escritores tocantinenses – recebi com muita empolgação a noticia da realização da 9º edição do salão do livro, ainda mais após dois anos sem o mesmo ser realizado. Pois nós que sabemos da importância da leitura e ousamos fazer literatura nesse país – um país onde à leitura não é levada a sério. Não podemos negar a importância do salão do livro para construção de uma cultura literária no e do Tocantins.

E foi com toda essa empolgação que fui ao salão do livro, participar do primeiro evento literário da minha vida. E não me arrependi, ao contrario, enlouqueci. Fiquei louco diante de tantos livros – nunca havia visto tanto livro na minha vida. Ali no meio daquele tanto de livros – eu me sentia como uma criança numa fabrica de chocolates ou num parque de diversão. Como uma mulher consumista num shopping center ou melhor – um cão faminto diante de uma vitrine de carnes num açougue.

- Ah, como queria ter muita grana para comprar muitos livros – um caminhão de livros. Diante disso ficar ali passou a ser uma tortura – ver e não poder levar – não poder levar tanta coisa boa que não encontramos no dia a dia. Mesmo sem muita grana consegui comprar alguns livros – coisas finíssimas que há muito tempo procurava – mas eu queria muito mais. E foi por isso que tive que sair dali rapidamente para não enlouquecer mais ainda.

Mas a verdade é que foi uma experiência incrível a minha ida na 9º edição do salão do livro do Tocantins – um amante de livros tal como sou não poderia ser diferente. Imagino o tanto de gente que não teve a mesma sensação. Especialmente as crianças e jovens que por ali estiveram pela primeira vez. Espero que este importante evento nunca mais saia do calendário de atividades realizadas pelo governo do Tocantins.

O salão do livro é um patrimônio do povo tocantinense – um instrumento importantíssimo para construção de uma cultura literária no e do Tocantins. E por isso precisa ter continuidade independente do governo de plantão. Aliás, que o salão do livro seja uma politica de estado e não de governo. E que os organizadores possam a partir do ano que vem fazer ações para interiorizar o salão do livro.

Pedro Ferreira Nunes é poeta, escritor e educador popular.


segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Patrimônio histórico e cultural na serra do Lajeado esta ameaçada de acabar em até 10 anos

O alerta foi da Arqueóloga Drª Julia Cristina de Almeida Berra do IPHAN, numa palestra sobre a arte rupestre da serra do Lajeado, no encontro internacional de arte e cultura realizado nos dias 17 e 18 de setembro na cidade de Lajeado do Tocantins. A Drª Julia Cristina afirmou que o estado de conservação das pinturas rupestres é péssimo e com mais duas queimadas, tal como a que aconteceu recentemente no município, essas pinturas poderão desaparecer.

A arte rupestre da serra do Lajeado é um patrimônio histórico e cultural pouco conhecido pela população tocantinense, desconhecida, sobretudo, pela população que vive na região onde se encontra os sítios arqueológicos. Desconhecimento que tem levado a destruição dessa riqueza.

Os estudos que levaram a descoberta dos primeiros sítios arqueológicos nessa região iniciaram-se com a construção de Palmas. Hoje existem 52 sítios ao todo. A arte rupestre encontrada na serra do Lajeado tem como característica a variedade de pinturas, algo que não se encontra em outros sítios arqueológicos pelo Brasil. Essa característica também mostra que a região fora habitada por povos nômades diversos.

Não há estudos que apontam quem fez estes desenhos. Ou que aponta um período preciso de quando foram feitas. Alguns são bem antigos, outros mais recentes. Pesquisadores acreditam que estes desenhos podem ter sidos produzidos entre 12 a 7 mil anos. O fato desses povos terem sido exterminados dificulta os estudos para saber a origem dessa arte.

Descaso do poder público, Falta de estrutura para fazer pesquisas e poucos profissionais

Essa é a realidade de quem faz arqueologia no Tocantins, como bem colocou o professor Drº Marcos Aurélio Câmara Zimmermann da UNITINS. Na discussão sobre artefatos líticos e cerâmicos com o professor Drº Marcos Aurélio ficou claro que o descaso do poder público, a falta de estrutura para fazer pesquisas e a escassez de profissionais reflete no fato de que não é possível dar conta da demanda existente no Tocantins.

A discussão mostrou também a responsabilidade da comunidade na proteção desse patrimônio histórico e cultural. No entanto para que a população possa desempenhar este papel é preciso que ela tome conhecimento disso – da importância dessas riquezas históricas. Dai a necessidade da educação patrimonial nas escolas. Mas cabe ao poder público garantir através de leis a estrutura adequada para concretizar essa proteção.

Outra questão importante colocada pelo professor Marco Aurélio foi à necessidade da construção de um museu na cidade de Lajeado para que os objetos explorados nos sítios arqueológicos da cidade, que estão hoje num museu em Porto Nacional possam retornar para Lajeado. É preciso também que a câmara de vereadores aprove o quanto antes leis para garantir a preservação do patrimônio histórico e cultural tal como foi feito em outros municípios tocantinenses, por exemplo, Palmas e Gurupi.

O quadro apresentando pela Arqueóloga Julia Cristina e pelo Professor Marcos Aurélio sobre a situação da arqueologia no Tocantins – arte rupestre e os artefatos líticos e cerâmicos – não é nem um pouco animador. O risco da perda desse patrimônio histórico e cultural é eminente. Especialmente a arte rupestre. Nesse sentido é fundamental que o poder público e a comunidade tocantinense em geral despertem para necessidade de preservarmos essa riqueza. Riqueza que pertence a todos nós. E que é preciso que nos apropriemos dela de forma consciente – nas escolas, nas universidades, entre outros espaços – para podermos preserva-la.

O encontro internacional de arte e cultura do município de Lajeado

Além da discussão sobre arte rupestre na serra do Lajeado e dos artefatos líticos e cerâmicos nos
sítios arqueológicos do município de Lajeado. Discutiu-se a cosmologia do povo xerente, a necessidade da educação patrimonial nas escolas e o nucleamento inicial de Lajeado a partir de 1850.
Realizou-se também no encontro oficinas de argila, cestaria, fantoche e lítica. Apresentações culturais das escolas – teatro e dança. Apresentação de artistas populares – musica, literatura de cordel, fantoches e exibição de filmes.

A exposição de artefatos líticos e cerâmicos de Lajeado organizado pelo Núcleo tocantinense de arqueologia foi um dos pontos altos do encontro. Como também a exposição dos trabalhos artesanais feitos pela Associação das Mulheres Artesãs.

Aliás, o encontro internacional de arte e cultura do município de Lajeado foi organizado e realizado pela Associação das Mulheres Artesãs – AMAE. E foi com certeza um marco importante para cultura da cidade de Lajeado como também do estado do Tocantins. Resgatar a historia do município e preservar o patrimônio histórico e cultural invejável que o Tocantins possui, e especialmente a cidade de Lajeado, é dever de toda a sociedade. E este encontro realizado pela AMAE foi com certeza o primeiro passo nesse sentido.

Diante disso é fundamental que outras edições desse encontro possam se realizar, para que a cada ano possamos discutir, debater e apontar – sociedade e poder público – ações para preservar esse patrimônio histórico e cultural.


Pedro Ferreira Nunes é educador popular e militante do Coletivo José Porfírio.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Breve reflexão sobre o processo das conferências públicas no Brasil



Não é de hoje que tenho uma posição critica as conferências realizadas pelo poder público tanto a nível regional como nacional. Especialmente a partir do momento que tomei conhecimento de que as políticas aprovadas coletivamente nestes espaços são simplesmente engavetadas pelos governos de plantão. Podemos apontar um exemplo emblemático – a conferencia nacional de comunicação realizada em 2010, onde uma série de questões para democratização da mídia no Brasil – foram aprovadas, mas cinco anos depois, nenhuma saiu do papel.

Há vários outros exemplos, o que careceria de um estudo mais aprofundado para aponta-los, o que não é o objetivo desse breve artigo, fica ai por tanto a tarefa para nossa academia. O que proponho aqui é uma breve reflexão sobre o processo das conferencias – se de fato estão cumprindo o seu papel que é de debater, propor e elaborar coletivamente politicas públicas para melhorar a vida da população. 

Ora, se as decisões levantadas nestes espaços são simplesmente engavetadas não é desperdício de dinheiro público a sua realização? Pois é de conhecimento de todos que não é barato o custo para realização das conferencias – gasto com material impresso, camisetas, transporte, alimentação, hospedagem entre outros. Tudo isso com recursos públicos para realizar uma farsa, pois infelizmente é isto que tem caracterizado estas conferências públicas. 

Outro fator a se refletir é a participação da sociedade civil organizada neste processo. Uma participação mínima. E isso é reflexo da falta de credibilidade da população neste espaço como um instrumento para construção coletiva de politicas públicas para melhorar a vida da comunidade. Nas conferências municipais, especialmente no interior essa realidade é ainda pior, poucas pessoas da sociedade civil comparecem, e os que lá vão, não participam ativamente, ficam apenas aplaudindo e levantando crachás.

Nas poucas conferências públicas que tive a oportunidade de participar como a de juventude nos municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia e das cidades em Palmas o maior numero de participantes são de burocratas ligados ao serviço público. São eles que coordenam e dirigem os trabalhos, são eles que propõem as politicas que devem ser aprovadas e são eleitos como delegados. Na maioria das vezes propostas rebaixadíssimas que mesmo assim não são colocadas em praticas – tanto no município, nem no estado e pior ainda a nível nacional.

Em uma conversa recente com uma servidora pública do município de Lajeado – ela comentava que não via sentido na realização da conferência municipal de assistência social na cidade, pois não via sentido perder tempo discutindo, elaborando e aprovando propostas que já mais seriam colocadas em praticas pela prefeitura municipal. Ela dizia saber muito bem disso, pois havia participado da conferência anterior que não tinha dado em nada.

Foi a partir desse dialogo e do acompanhamento de duas conferências públicas que se realizaram recentemente no município de Lajeado (assistência social e segurança alimentar). Que reavivou as críticas que trago comigo já há algum tempo a cerca do processo das conferências públicas no Brasil. Crítica que se tornou mais contundente ao presenciar como se dá este processo no interior – assim podemos afirmar – se nas grandes cidades as conferências tem todos os problemas que já relatamos a cima, imaginem no interior do interior do Brasil.

No Lajeado, por exemplo, grande parte das pessoas que foram convidadas se quer sabiam que iriam participar de uma conferência pública municipal ou pior ainda, não sabiam se quer o que é uma conferência pública. Na conferência de assistência social o convite para os idosos não dizia em momento algum que o evento se tratava de uma conferência, mas sim de um momento de recreação. Já na de segurança alimentar o convite dizia que era para um jantar em homenagem ao dia dos pais. Ora, que contribuição que essas pessoas podiam dar em uma discussão que elas se quer sabiam do que se tratava e  com que proposito se dava. Sem falar na desonestidade e a falta de respeito com essas pessoas que foram ludibriadas a participar dessas conferências.

Estes exemplos mostram que o próprio poder público não leva os processos de conferência a sério, que realizam por realizar, simplesmente para cumprir tabela, já que eles mesmos sabem que nada do que será aprovado ali iram colocar em prática. E se o poder público que é o responsável por efetivar as políticas que são aprovadas nestes espaços não leva as conferências a sério. Qual o estímulo à população tem para participar? E assim segue a realização das conferências públicas no Brasil.

Pedro Ferreira Nunes é educador popular e militante do Coletivo José Porfírio