- Olá, tudo bom?! Vocês sabem
quem quer ir trabalhar no roçado em uma fazenda na região de Miranorte? A gente
paga bem e damos toda estrutura para quem for.
Miro não era morador daquela
cidade, mas já tinha sido visto outras vezes por ali como também em outras
pequenas cidades do interior do Tocantins, sempre procurando trabalhadores para
trabalhar em fazendas do seu patrão – um dos maiores latifundiários do país,
mas que ninguém se quer sabia o nome, só sabiam que era um político de renome
nacional.
Miro sabia que não era difícil
encontrar gente para trabalhar nos latifúndios de seu patrão por ali. Já que
não era fácil arranjar trabalho nas pequenas cidades do interior, há não ser
nas fazendas. E por tanto se não quisessem morrer de fome os trabalhadores
tinham que migrarem para os grandes centros do país ou então submeter-se a dura
labuta nas grandes fazendas.
Ele sabia até onde encontrar
os trabalhadores – era só ir até o bar pioneiro no centro da cidade, próximo ao
pé de pequi na praça cinco de maio que lá estaria um monte deles tomando
cachaça e jogando sinuca, pois na falta do que fazer era assim que eles
passavam o tempo.
João e Raimundinho que estavam
ali logo se interessaram pela proposta. Não estava sendo fácil a vida para eles
em Lajeado, não tinha trabalho e por tanto estavam com extrema dificuldade para
manter suas famílias. Eles conheciam como era o duro trabalho no roçado, mas se
não tinha alternativa era preciso agarrar o que viesse.
- Quanto tempo é de trabalho?
E a diária?
- Bom, trabalho lá é para uns
três meses. Masa gente trás vocês de quinze a quinze dias para visitar suas
famílias. A diária é de 50 reais.
- E então Raimundinho, cê
topa? Eu topo.
- Se você vai, eu também vou.
- Tá certo, a gente vai então.
- Ótimo. Vocês não sabem mais
de uns três para ir com a gente não?
- A gente vai ver, ai ti
falamos.
- João, eu acho que o Lazão, o
Neguim e o Zezim topam.
- É mesmo.
- Vocês sabem onde eles estão
para eu ir falar com eles?
- Sim, vamos lá. Disse João.
Tudo combinado agora era se
despedir das mulheres, dos filhos, dos amigos e seguir rumo à fazenda liberdade
na região de Miranorte do Tocantins. Doía-lhes no peito ter que abandonar seus
familiares para ir trabalhar tão longe, mas carregavam nas mochilas a esperança
de retornarem em breve para junto deles com grana para pagar o mercado e o
aluguel que já estava alguns meses atrasados. Além do mais, Miranorte não era
assim tão longe de Lajeado.
A caminhonete seguia estrada
adentro pela zona rural de Miranorte, já estavam algumas horas viajando e nada
de chegarem ao tão aguardado destino. Cada vez que iam se adentrando rumo à
fazenda liberdade, eles percebem que estavam cada vez mais distante de qualquer
civilização. Na carroceria da caminhonete João, Raimundinho, Lazão, Neguim e
Zezim olhavam-se já demostrando preocupação – pois logo perceberam que ficariam
num lugar bastante isolado, bem distante da cidade e de qualquer povoado sendo
impossível, portanto se deslocar dali há não ser de carro.
Eles já eram acostumados
trabalhar na roça, porém sempre trabalhavam em fazendas no entorno da cidade
onde moravam e que pertenciam a pessoas que moravam ali. Agora pela primeira
vez eles se deslocavam para trabalhar em um lugar tão distante em terras de
pessoas que eles se quer conheciam. Mas estava feito. Eles haviam aceitado o
convite e já estavam quase chegando à fazenda. Agora era trabalhar e rezar para
que tudo desse certo.
João sentia uma forte angustia
no peito, estava arrependido de ter aceitado o convite para trabalhar ali, mas
agora não havia volta era preciso encarar o trabalho duro e dar forças para
seus outros companheiros que o tinham como um exemplo de homem forte e
destemido.
Era quase noite quando enfim a
caminhonete chegou na sede da fazenda. Todos cansados perguntaram:
- Chegamos?
- Na fazenda a gente já chegou
faz horas. Mas é aqui que iram passar a noite. Aqui é a sede da fazenda, onde
mora a gerencia e os patrões ficam quando vem aqui.
Os amigos se olharam pensando
o tamanho que era aquele latifúndio sendo que eles andavam há varias horas
dentro dele de carro.
- A gente vai ficar onde Miro?
- Vocês ficaram em um
alojamento mais próximo de onde irão trabalhar. Por tanto tomem um banho, comam
bem e depois vão dormir que amanhã 05h da manhã nós levaremos vocês de carro até
o local do trabalho.
Bem cedinho todos já estavam
de pé pronto para irem para o roçado.
- Bom, vocês ficaram aqui
nesse alojamento. Vocês se viram para fazer a comida de vocês. Se precisarem de
alguma coisa fala comigo ou com o Chicão que nós damos um jeito, é claro que depois
descontaremos dos salários de vocês.
O alojamento era um barracão
de palha sem nenhuma estrutura no meio de uma mata isolada bem distante da casa
sede da fazenda.
João, Raimundinho, Lazão,
Neguim e Zezim não gostaram do que viram.
- Mas Miro, não foi isso que a
gente combinou!
- Bom, vocês não vieram passear
aqui não, vocês vieram foi trabalhar. E cuidem logo se não vocês não recebem
não.
Subiu um ódio por dentro de
João, uma vontade de avançar em Miro e lhe dar uma cossa, mas percebeu que além
de Miro, o tal Chicão e outros dois peões estavam armados.
Raimundinho percebendo a raiva
de João, procurou acalma-lo:
- Tá certo, a gente veio aqui
para trabalhar. Então vamos lá.
- Estão vendo esta mata ai? É
para derrubar toda por que iremos fazer pasto pra gado.
E segurando no cabo da arma
falou:
- Ninguém sai daqui enquanto
não acabar o serviço viu?!
Em seguida saiu acompanhado de
Chicão, mas deixou dois peões armados vigiando os amigos no roçado.
- Para que essa gente armada
nos vigiando? Nós não somos bandidos! Falou Zezim indignado.
- Deixa pra lá que nós só vamos
trabalhar quinze dias aqui e não voltaremos mais. Comentou Raimundinho.
- E você acha mesmo que ele
vai cumprir a promessa de nos levar em casa de quinze em quinze dias? Ele não
cumpriu as outras promessas, também não irá cumprir essas. Vão forçar a gente a
trabalhar até terminar o roçado e Deus sabe o que eles faram com a gente, se
ainda deixaram voltarmos pra casa. Respondeu João incrédulo.
- Vira essa boca pra lá
camarada. Tá amarrado em nome de Jesus.
- A gente tem que arrumar um
jeito de fugir daqui se a coisa continuar desse jeito.
- Como faremos isso. Você não
viu a distancia que nós estamos de Miranorte? Além do mais por que você acha
que esses caras estão armados nos vigiando?
- Deixem de conversa e vão
trabalha cambada. Gritou de longe os jagunços armados.
- Vamos trabalhar, o que não
nos faltará é tempo para gente pensar o que fazer para sair dessa enrascada. De
uma coisa eu sei, minha mãe não me criou para eu ser escravo de ninguém. A
gente dará um jeito de sair daqui. Disse João.
* Do livro 'A morte do Socialismo' de Pedro Ferreira Nunes.