quinta-feira, 17 de junho de 2021

Resistência e luta no interior do Tocantins

Diego Rivera
Chegaram no terreiro da humilde casa e fizeram o comunicado. – vocês precisaram deixar esse terreno, pois adquirimos o mesmo do antigo proprietário e agora ele nos pertence. 

Eles não puderam deixar de ficar abalados com aquela notícia. Para onde iriam? Já estavam há mais de 10 anos ocupando e cultivando aquele terreno e ter que abandona-lo assim do dia para noite não podia ser. – temos direitos e não iremos abrir mão deles.

- Que direito? Pobre não tem direito. Conformem-se, peguem as trouxas e vão embora. Eles tem muito dinheiro. Já mais vão abrir mão dessa terra. Dizia o povo da região. 

Foi então que eles perceberam que a luta seria dupla. Contra o suposto proprietário e contra a mentalidade conformista daqueles que preferiam abrir mão dos seus direitos a enfrentar os poderosos. Essa mentalidade, aliás, era pior. Pois além de desencorajar. Não conseguindo o objetivo, passava a criticar. Dizendo se tratar de uma ingratidão.

- Nos exploram. Querem nos expulsar da terra que adquirimos por direito. E isso é ingratidão? 

- Não. Não desistam. O direito de posse é de vocês.  E vocês precisam fazer esse direito valer. Vão na Defensoria Pública. Não confiem nas autoridades locais. Se elas puderem interferir de alguma forma será para favorecer os poderosos.

E assim eles fizeram. Seguiram o Conselho do Assistente Social e foram até a Defensoria Pública. Enquanto o defensor parecia não muito convicto da ação, o suposto proprietário agia. Agia por um lado articulando com funcionários da prefeitura. E por outro através de ações criminosas como mandando suspender de forma ilegal o fornecimento de água e energia do terreno. 

Eles não entenderam quando o serviço de água e energia fora suspenso. – ora, sempre pagamos a fatura em dia. O que está acontecendo? Descobriram que o suposto proprietário havia solicitado a transferência dos serviços para o seu nome e depois pedido a suspensão. A justificativa junto a justiça era que os posseiros não estavam pagando a fatura e com isso o nome do suposto proprietário estava ficando sujo.

O objetivo era intimidar os posseiros, fazer terrorismo. Mas o tiro saiu pela culatra. A justificativa utilizada pelo suposto proprietário para pedir a suspensão do serviço de água e energia era muito fácil de desmontar. Os registros das empresas fornecedora apontariam que esses serviços de água e energia nunca tiveram no nome do suposto proprietário. Como também de que nunca deixaram de ser pago – as vezes com atraso devido a condição de vida difícil da família de posseiros. 

- Como pode um Juiz, fora da sua jurisdição. Autorizar um absurdo desses. Não vamos deixar isso ficar assim. Vamos aonde for preciso. A Defensoria Pública precisa agir depois dessa se não cada vez mais eles se sentiram no direito de agir criminosamente contra vocês. Alertou o Assistente Social. 

- Se a Defensoria Pública no interior não quer entrar com a ação vamos para Capital.

- O que ele está esperando para agir?! O terreno pertence a vocês por direito. O defensor já deveria ter entrado com o pedido de posse. Nós aqui não podemos. Tem que ser ele lá no interior. 

Eles então voltaram para o interior. Chegando lá não tiveram grande dificuldade. O Defensor já tinha sido convencido, não se sabe por quem, a entrar com a ação. 

- Vocês são doidos.  Eles vão matar vocês. Desistam disso. Ao invés de apoio, era o que ouviam. Como também: -Ah, querem tomar a terra do homem. No fundo, não passava de um discurso que revelava o ressentimento contra aqueles que não se acomodam e lutam pelos seus direitos.

Quando chegou o momento de julgar a ação. Não houve disputa. Era tão evidente que o terreno pertencia aos posseiros que a defesa do suposto proprietário não teve muito o que fazer. Pior ainda teve que justificar a ação criminosa ao mandar suspender o serviço de água e energia do terreno.

Esse pequeno relato é de uma história real. Omito o nome dos envolvidos propositadamente, até por que o mais importante é o exemplo – o exemplo de que não devemos nos intimidar e deixar de lutar pelos nossos direitos. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. 

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