sábado, 20 de novembro de 2021

O trabalho escravo na contemporaneidade a partir da perspectiva artística

“A degradação tem o seu preço/De trecho em trecho para trabalhar/A liberdade em troca de miséria/Mancada séria pode matar./A soma de toda pobreza/Desmoraliza o social/Mão de obra farta escravizada/Direitos Humanos é opcional...”. 

Assim inicia a letra da canção “Expresso da Escravidão” da banda Punk Paulista – Ratos de Porão. É uma das canções que compõem o 15°  álbum do Grupo – “Homem inimigo do homem” (2006). A sonoridade e a temática da letra me instigaram a conhecer tanto a banda como aquele assunto. E é essa segunda questão que nos interessa aqui.

Era a primeira vez que ouvia falar em trabalho análogo á escravidão. Apesar de que para nós que vivemos no interior, não ser uma realidade desconhecida. E a contundência característica da música feita pelo Ratos de Porão, foi como um soco no estômago. Uma letra direta com um som agressivo metendo o dedo na ferida – escancarando uma realidade vivenciada por trabalhadores rurais de Norte a Sul do Brasil.

“Escalado pelo tal de Gato/explorado pelo fazendeiro/Meses, meses, meses de trabalho/enganado e nada de dinheiro./Objeto descartável/coagido pelo medo/Latifúndio escravagista, opressão pelo desespero”.

E o refrão então. É um questionamento que continua atual e cada vez mais necessário: “Quanto custa um homem no.../Expresso da escravidão?/Quanto custa um homem no.../Expresso da escravidão no Brasil?/Escravidão contemporânea no Brasil!/Escravidão contemporânea no Brasil!”.

Temos em “Expresso  da Escravidão” um exemplo de um olhar artitistico para a questão da Escravidão Contemporânea no Brasil. Isto é, um olhar que busca nos sensibilizar para um determinado problema. Essa sensibilização se dá quando o artista consegue expressar algo que nos afeta. E somos afetados sobretudo por algo que nos modifica – essa modificação se dá a partir do momento que começamos a questionar – a pensar sobre algo que achávamos que era natural.

A temática do trabalho em condições análogas a escravidão tem sido recorrente no campo da Arte. Sobretudo pelo que dissemos anteriormente. Não só Na música, mas também na poesia, na pintura, na fotografia, na teledramaturgia e no cinema.

Em relação ao cinema temos algumas produções importantes. Entre elas, o documentário “Nas terras do bem virá” (2007) do Diretor Alexandre Rampazzo. É uma obra de arte que não só mostra a situação degrante que trabalhadores rurais são submetidos, como também os conflitos por terra no Norte do Brasil. 

Tanto a canção “Expresso da Escravidão” como o documentário “Nas terras do bem virá” apresentam um quadro que se passa sobretudo no interior do Brasil – em grandes latifúndios. No entanto é importante destacar que o trabalho análogo a escravidão está em todas as partes, inclusive nas grandes metrópoles. 

Trata-se de uma realidade, que de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), atinge mais 40 milhões de pessoas em todo o mundo – uma realidade que tem piorado com a flexibilização das leis trabalhistas e o avanço de políticas econômicas ultraliberais.

Nesse sentido o filme “Sete prisioneiros” (2021) Dirigido por Alexandre Moratto, é um bom exemplo ao mostrar o trabalho análogo a escravidão nas grandes metrópoles. Aqui o cenário não é um latifúndio no interior do interior do Brasil, mas a principal cidade econômica do país (São Paulo). Outro ponto importante é que esse filme chega justamente num momento de retrocessos no que se refere ao combate ao trabalho análogo a escravidão, sobretudo no Brasil. 

Por outro lado há que se reconhecer que nos últimos 15 anos o combate ao trabalho análogo a escravidão conseguiu importantes conquistas. Entre elas,  uma que considero bastante significativa, é inserção dessa temática no currículo da Educação Básica. Inclusive, no caso do Tocantins, subsidiando os Professores com materiais e formações para trabalhar a temática. É um avanço importante, por que no meu tempo de colegial não se trabalhava essa questão. Não por que o problema não existisse, pelo contrário. Fazia parte da nossa realidade, mas era naturalizado. Foi só quando ouvi “Expresso da Escravidão” é que comecei a entender isso.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente atua como Professor da Educação Básica no CENSP-Lajeado.

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