Manuel Duarte de Souza nasceu no Estado do Maranhão (como tantos outros que foram e são fundamentais na construção da cidade de Lajeado), no munícipio de Pastos Bons, no ano de 1929. Ao ingressar nos quadros de funcionários do Banco do Brasil sua vida teve uma guinada importante. Viveu em diferentes Estados e regiões do Brasil, em cidades como Areia (PE), Cachoeira do Sul (RS), Juiazeiro (CE) e Goiânia (GO). Foi na capital goiana que se aposentou do serviço público. Para então se fixar, até sua morte, no município de Lajeado (TO).
Mesmo não tendo feito curso superior a sua riqueza cultural era inegável. Proporcionada, sobretudo, por um nível de vida privilegiado (em relação a maioria da população brasileira), devido a sua condição de servidor público federal. O hábito da leitura e da escrita o acompanhava desde os tempos do antigo ginásio, como podemos ver em suas memórias. Lia de tudo – Filosofia, Política, Psicologia, Poesia e Literatura em Geral. Toda essa bagagem de leitura certamente influenciou na sua escrita.
Em “Cansanção”, Manuel Duarte de Souza trafega por diferentes gêneros literários, mas poderíamos afirmar se tratar de um livro de memórias. Que começa com o nosso autor relatando sobre o seu prazer de viajar. E se encerra, 244 páginas depois, com um álbum de fotografias.
Certamente teríamos mais páginas se a editora (Anapolina LTDA) tivesse feito uma edição melhor. Creio que isso deve ter ocorrido por questões de custos. Pois não é fácil bancar uma publicação com recursos do próprio bolso sem nenhuma garantia de retorno. Mas ainda que a edição não é das melhores, a obra não perde o seu valor. Um aspecto interessante, é que ela não precisa ser lida de forma linear. Fica essa dica, portanto.
Outro aspecto que me chamou atenção foi a justificativa para o nome da obra. Para quem não conhece “Cansanção” é uma planta muito comum no sertão. Me recordo que na minha infância quando nossos pais falavam em bater em alguém com cansanção é por que a coisa era séria. Nosso autor faz uma analogia com os passarinhos que fazem ninho no Cansanção para proteger suas crias dos predadores. Ao utilizar o nome dessa famosa planta, ele estaria protegendo seus textos das críticas.
Aliás, nota-se uma indignação muito grande do autor com as possíveis críticas acerca da sua obra. Além dessa passagem onde ele justifica o nome do livro. Na introdução Manuel também volta ao assunto. Se referindo inclusive a críticas que recebera antes mesmo da publicação: “Aos tolos desafisados e burros motivados que já lançaram veneno sobre a minha obra, sem ao menos haverem lido um capítulo sequer do seu conteúdo, o meu repúdio” (Souza, p.12).
Manuel Duarte de Souza sabia, ou deveria saber, que aqueles que ousam se expor dessa forma estão sujeitos a críticas. Mas o mínimo que se espera é que essa crítica seja fundamentada, ou seja, no caso em questão, que se tenha lido a obra. Se não for assim, não há por que se incomodar tanto. Por ser o seu primeiro livro publicado, e pelo cunho pessoal, é compreensível a sua insegurança.
Entre os textos que compõem a obra destacaria o de abertura: O prazer de viajar – aqui percebemos o quanto o estudo foi importante para que o nosso autor tivesse uma perspetiva de vida diferente daquela que Pastos Bons poderia lhe proporcionar. Do desafio de tirar melhores notas para ir a São Luiz. Ou aos estudos para passar no concurso do Banco do Brasil. É a educação mostrando o seu poder de transformação.
Em textos como a “CASSI no Tocantins” temos o exemplo de alguém que sempre teve consciência dos seus direitos e lutou por eles com consciência de classe. Em textos como “Demagogice” e “Resposta a Joelmir Beting” temos alguém antenado ao debate político nacional crítico dos Governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) e seu projeto privatista. E entusiasta de Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) desde a sua primeira campanha a presidência do Brasil.
Aqui cabe ressaltar que apesar do seu interesse pelo debate político, não se envolvia com política partidária. Dessa forma compreendia a politica tal como os gregos – como a busca pelo bem comum.
Em textos como “Meu querido jatobá” temos a memória da infância. Em textos como “Mano José”, o reconhecimento da importância da família na sua vida. E por fim, em “Lajeado, teus encantos” nosso autor narra a sua saga por essas bandas. Os primeiros moradores que conhecera, as amizades que fizera, um novo amor e a sua luta pela iluminação do setor Aeroporto – atuando na perspectiva política que falamos anteriormente.
Enfim, “Cansanção”, nos mostra a história desse Maranhense que deixou sua marca na história de Lajeado e do Tocantins. Não é uma história diferente, como ele mesmo reconhece, de tantos outros jovens que nasceram no interior do Brasil. Mas ao transformar essa história numa obra literária, Manuel Duarte de Souza se diferencia dos demais. Com ela, ele alcançou a imortalidade, tornando uma referência não só para os seus familiares.
Quando tivermos uma literatura lajeadense. Manuel Duarte de Souza deverá ser lembrado necessariamente como um dos pioneiros das letras em Lajeado. Muito dos exemplares da sua obra “Cansanção” não foram comercializados. Por tanto seria uma grande homenagem, por parte do poder público local, adquirir esses exemplares junto aos seus familiares e distribuir gratuitamente para os estudantes da rede municipal de ensino. Ou então disponibiliza-los em órgãos públicos. Pois trata-se de um crime imperdoável deixar esses livros engavetados.
Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente é Professor da Educação Básica no CENSP-Lajeado.
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