Para responder a nossa pergunta é necessário definirmos o que são ritos de passagem.
Bem, ritos de passagem, pode ser definido como mudanças significativas que marcam nossas vidas. Por exemplo, a passagem da adolescência para vida adulta. Nesse processo de transição há um conjunto de acontecimentos que vão marcando nossas vidas. Dependendo da cultura em que estamos inseridos esses acontecimentos são vivenciados de diferentes formas. Numa análise superficia nos parece que há por trás dessa ideia a concepção filosófica de que somos seres sociais. E que por tanto nossa identidade é construída a partir das relações socioculturais.
Voltando a questão dos ritos de passagem é importante destacar que se trata de um objeto de estudo da antropologia. E tem sobretudo em autores franceses, importantes contribuições. Por exemplo, Van Gennep que no início do século XX publicou uma obra onde se dedica ao estudo desse tema propondo a seguinte divisão: ritos de separação, que seria o caso de formatura ou sepultamento; ritos de margem, como o período da gravidez ou noivado; e os ritos de agregação, como batismo ou casamento. Lévi-Strauss por sua vez aponta que os ritos de passagem tem um papel de coesão social. Ou seja, de manutenção da união do grupo. E a partir dai para uma ideia de continuidade por meio da conservação de tradições. Já Claude Rivière chama atenção para os ritos de passagem que estão presente no nosso cotidiano e que muitas vezes nem damos conta disso. Ele destaca por exemplo os ritos que há no ambiente escolar, desde a chegada, o cumprimento de horário e as atividades desenvolvidas. Para Rivière esse processo terá na adolescência a sua fase mais crítica já que é nessa fase onde o jovem sofrerá um conflito interior expressado por um comportamento muitas vezes antisocial. Romper ou continuar com as tradições familiares eis um dos principais dilemas com os quais os jovens se deparam.
Esse dilema é representado em diferentes obras de arte, sobretudo na música popular como podemos destacar em canções como herdeiro da pampa pobre, da banda gaúcha Engenheiros dos Hawaii:
“passam às mãos da minha geração/Heranças feitas de fortunas rotas/Campos desertos que não geram pão/Onde a ganância anda de rédeas soltas./Se for preciso eu volto a ser caudilho/Por essa pampa que ficou pra trás/Por que não quero deixar pro meu filho/ A pampa pobre que herdei de meu pai”.
Bem, agora que temos mais claro o que são ritos de passagem. Vamos conhecer o que são os jogos estudantis do Tocantins (JETS).
O JETS nada mais é do que uma tradicional competição esportiva promovida pela Secretaria da Educação do Tocantins (SEDUC-TO). Seguindo a tradição grega fundamentada na Paidéia. Ou seja, numa formação integral dos indivíduos. Não por acaso os jogos estudantis são inspirados nas olimpíadas e mais importante do que a competição são os valores éticos promovido por meio dos jogos. Nessa perspectiva não basta demostrar talento para o esporte, o aluno-atleta tem que provar ser um indivíduo ético – que respeita as normas estabelecidas. Para tanto se faz necessário mostrar certa maturidade.
Para muitos é a primeira experiência de uma vivência longe de casa. Pela primeira vez irão conviver, ainda que por um curto período, com pessoas diferentes do seu cotidiano. E isso exige um outro nível de comportamento. Por exemplo, a submissão a regras de convivência que não existe no ambiente doméstico. O que em certa medida aponta para o que será a vida adulta.
Guardo com muito carinho a lembrança da minha participação no JETS enquanto estudante. Lembro que a nossa atuação na competição foi um desastre. E talvez isso tenha me ajudado em certo sentido a me tocar que a carreira de atleta não era para mim. Mas a sensação de participar do evento com um grupo de colegas queridos superou qualquer fracasso e permaneceu vivo na minha memória. Agora anos depois participando como parte da comissão técnica, eu me vi em vários meninos da nossa delegação.
Enfim, eu acredito que ao retornar a escola esse estudante que participou do JETS não será mais o mesmo. A vivência que ele teve lhe coloca num nível de amadurecimento diferente dos demais. Por isso que considero esses jogos estudantis como um rito de passagem. Ainda não estamos falando de uma passagem para a vida adulta. Mas para uma nova percepção do mundo, certamente. Sobretudo diante das derrotas. Para esse jovem o mundo já não se resumirá a sua casa, a sua escola ou a sua cidade. E quem sabe a partir dai ele não tome consciência de que conseguir um lugar de destaque nesse mundo novo exige um esforço redobrado.
Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular, Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. E Professor da Educação Básica no CENSP Lajeado.
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