No entanto, sempre que vamos para discussão teórica, sobretudo no âmbito da academia, somos lembrados da crítica Marxiana aos direitos humanos. Essa crítica encontramos no livro sobre a questão judaica (1843). Um texto em que Marx trava uma polêmica com Bruno Bauer (que havia escrito um texto sobre o problema) – fazendo parte dos escritos Marxiano – que marca o seu processo de rompimento com a esquerda hegeliana e a Filosofia Alemã.
É preciso, portanto, compreender o contexto que a crítica foi feita e ao que se pretendia – apontar, na minha análise, os limites da filosofia idealista para compreensão de uma determinada realidade e por conseguinte a sua transformação.
Num determinado trecho Marx escreve o seguinte: “o homem não foi libertado da religião. Ele ganhou a liberdade de religião. Ele não foi libertado da propriedade. Ele ganhou a liberdade de propriedade. Ele não foi libertado do egoísmo do comércio. Ele ganhou a liberdade do comércio” (2010, p. 53). Ou seja, para Marx, o indivíduo continuava submisso a um estado de coisas. Desse modo, a liberdade conquistada com a passagem da sociedade feudal para burguesa – é uma liberdade abstrata.
É nesse contexto, por tanto, que se insere a crítica a concepção de direitos humanos. Esses direitos são voltados para o indivíduo burguês – o “homem egoista”. Daí que na definição de Marx (2010, p. 48), “os direitos humanos, nada mais são do que os direitos dos membros da sociedade burguesa”.
De acordo com nosso filósofo (2010, p. 47) estamos falando sobretudo de direitos políticos. Que só podem ser exercido numa comunidade politica – parte de um sistema estatal. A partir daí um aspecto importante ressaltado por Marx é a relação entre direitos humanos e liberdade.
“O direito humano à liberdade não se baseia na vinculação do homem com os demais homens, mas, ao contrário, na separação entre um homem e outro” (2010, p. 49). Ou seja, esse direito se fundamenta no individualismo – no egoísmo. Por isso para Marx (2010, p. 50) “nenhum desses direitos transcende o homem egoísta”. Sobretudo quando analisamos a aplicabilidade prática dos direitos humanos à liberdade. Que nada mais é do que a garantia do direito a propriedade privada. E assim chegamos no nosso ponto Inicial. O direito humano trouxe ao membro da sociedade burguesa a liberdade de religião, de propriedade e de comércio. Quando que, na verdade, a luta deve ser para liberta-lo da religião, da propriedade e do egoismo do comércio.
Marx nos aponta portanto os limites dos direitos humanos nos marcos da sociedade burguesa. Pois em última análise, esses direitos servem a um determinado fim, o fortalecimento do indivíduo – o indivíduo egoísta – o indivíduo burguês – que é reconhecido pelo Estado político através desses direitos.
Diante desses apontamentos o que nos resta? Abandonar a defesa dos direitos humanos diante do fato de que eles não apontam para superação do estado de coisas atual? Ou pior, não só não apontam para superação do modo de produção atual, como contribui para manutenção da ordem burguesa.
No nosso modo de ver é preciso pensar dialeticamente como Marx. Ou seja, a partir do movimento real da história.
A crítica de Marx aos direitos humanos nos marcos da sociedade burguesa, sobretudo no contexto que ele escreveu (no final da primeira metade do Século XIX), está correta. E inclusive, é uma critica que continua atual para compreendermos o limite desses direitos. No entanto, o que percebemos, é que apesar das suas contradições, a defesa dos direitos humanos é fundamental na sociedade. Ainda que seja o direito de religião ou de propriedade. Pois num contexto em que direitos mínimos são negados. Como por exemplo, de uma comunidade tradicional usufruir do seu território. Defender esses direitos é fundamental se quisermos vislumbrar mudanças qualitativas futuras.
Essa defesa não será feito pela classe dominante – que busca manter o estado atual de coisas – mas por todos aqueles que acreditam na construção de outro modo de produção – onde as relações tenham como princípio a solidariedade e a cooperação. E não o egoísmo e a competição. Desse modo, a nossa defesa dos direitos humanos deve partir daí – compreendendo os seus limites, mas a sua necessidade no contexto atual.
Por Pedro Ferreira Nunes – Especialista em Filosofia e Direitos Humanos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário