Quando entramos na academia corremos o risco de nos achar seres superiores aos demais, passamos a desprezar o conhecimento popular e nos isolamos do restante da sociedade. Foi a esse processo que o Educador Francisco Alemberg se referiu quando nos disse para não ser universitários imbecis – que acredita ser os detentores do conhecimento, os únicos capazes de transformar a sociedade com nossas teorias de gabinete.
Alemberg nos desafiou a sair das nossas redomas de vidro, colocar o pé no chão e ir ao encontro do povo. Não para levar nossas teorias buscando liberta-los, mas dispostos a aprender, e a partir dai construir conjuntamente trincheiras de resistência contra esse sistema que nos segrega. E ele tem bastante legitimidade para nos dizer isso. Pois criou uma organização social (Fundação Casa Grande) no sertão do Cariri de renome internacional – colocando uma pequena cidade interiorana que era invisível no Brasil, diria que até mesmo no Ceará, no mapa mundial. E o principal, dando condições para que as pessoas que ali vivem construam sua autonomia e sejam protagonistas de suas histórias.
No interior as elites políticas querem tudo, menos sujeitos autônomos capazes de questionar sua autoridade. Daí que muitos preferem migrar para os grandes centros em busca de melhores condições de vida. Alemberg nos mostra que essa não é a alternativa, precisamos permanecer no interior e criar condições para ter uma vida digna sem precisar deixar nossa terra. Ele nos mostra que isso não é impossível. O interior tem um acervo riquíssimo que pode ser explorado sustentavelmente em beneficio da comunidade – o que falta são sujeitos dispostos a fazer em vez de se acomodar.
Alemberg nos desafiou a olhar para o entorno da universidade, a observar o que está sendo produzido nas comunidades populares, trazer esses saberes para universidade e aprender com eles. Quando ele disse isso fiquei imaginando de quanta coisa bacana do ponto de vista cultural, cultura de resistência – temos no nosso entorno, mas que não damos o devido valor. Me refiro por exemplo as pinturas rupestres na Serra do Lajeado, a Arca em Miracema, a Arte Cerâmica das Mulheres Artesãs do Município de Lajeado, a Fundação Fava de Bolota em Palmas, o Projeto Viola de Vereda, Tambores do Tocantins, sem falar no artesanato indígena e quilombola.
Porém é preciso não ser um universitário imbecil para poder perceber toda essa riqueza e aprender com ela. Nós a frente da gestão Despertar é preciso! do Centro Académico de Filosofia da UFT – CAFIL Prof. José Manoel Miranda sempre defendemos a necessidade de derrubarmos os muros que separa a universidade do resto da sociedade. É por isso que nos eventos que ajudamos construir fazemos questão da participação de grupos de cultura popular. E nessa V Semana Intercursos de Filosofia e Teatro a presença do Francisco Alemberg na conferência de encerramento foi mais um passo nesse sentido.
Um evento que teve como tema: “Arte, política, hoje” não poderia ter sido encerrado melhor como foi com a fala do Alemberg – compartilhando conosco sua rica experiência no sertão nordestino, mostrando como a arte é um poderoso instrumento de formação e construção de autonomia dos sujeitos. Muito significativo também para nós tocantinenses, é que Alemberg tem uma ligação forte com esse antigo norte goiano, pois viveu parte da sua infância e juventude em Miranorte, e ali aprendeu a importância da música na sua formação – um elemento fundamental em todo o trabalho que ele desenvolve.
Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e militante do Coletivo José Porfírio. Cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente cursa Filosofia pela UFT.