Algo lhe dizia que não sairia vivo dali. As pessoas que passavam por ele naquele corredor olhavam-o como se estivesse vendo um morto. Ele sabia que isso não ia demorar acontecer. Os anjos da morte nos seus cavalos negros a qualquer momento se materializariam naquele lugar, fazendo ecoar o som feroz de suas armas. Mais tardavam, fazendo com que os minutos se transformassem em horas. – o que fiz para merecer esse final? A tortura psicológica daquele momento era pior que tudo.
Ele não temia a morte. Sempre fora um homem temente a Deus. Este certamente estaria lhe reservando um bom lugar. Lamentava deixar sua esposa, filhos e netos. Mas se o seu destino era pagar com a vida um erro de um filho. Nada podia fazer. Se não orar e pedir a proteção de Deus para aqueles que ficavam. Orava inclusive pela alma dos seus algozes. – Pai, perdoai-vós, eles não sabem o que fazem.
Por ele não estaria mais naquele lugar. Mais fora orientado a aguardar o amanhecer para que pudesse voltar para casa em segurança. Para ele estava apenas adiando o inevitável. Já mais voltaria a ver a casa que construira com tanto sacrifício. Desde cedo trabalhando duro e o máximo que conseguira fora aquela casinha e uma aposentadoria de miséria. Mas não se lamentava, pelo contrário, agradecia a Deus pelo que tinha – era pouco, mas havia conquistado com trabalho.
Não entendia por que o seu amado filho, mesmo com tanto conselho, decidira pelo caminho da criminalidade. Foram noites e noites de joelhos dobrados, juntamente com sua esposa, orando para Deus, pedindo para que aquele menino tomasse juízo. Mas nada de mudança. Agora estava morto. Tão jovem, tão jovem. Tudo bem que não era flor que se cheirasse. Mas será que merecia aquele destino? Questionava-se.
Se o filho, mesmo com o crime que cometera, não merecia a morte sumária. Ele muito menos. Se tinha mentido para Policia num primeiro momento não fora para proteger o filho criminoso, mas por receio do que esse poderia fazer a si e a sua mulher. Agora que havia esclarecido no seu depoimento o por que dá mentira, sua consciência estava mais tranquila do que nunca. Morreria como culpado de cumplicidade, mas seria absolvido pela justiça divina.
Que noite longa. Parecia nunca ter fim. Ele tentou tirar um cochilo. Mas os pensamentos não lhe dava trégua. Pensava na sua esposa, nos filhos, na casa, nos irmãos da igreja, na plantação de mandioca. Mesmo com a idade avançada e sendo aposentado, não fugia do trabalho. Qualquer pedacinho de terra ele aproveitava para plantar uma mandioquinha, um feijão, um milho, uma abóbora, para ajudar no orçamento da família.
Ele tentava esquecer dos acontecimentos que o fizeram chegar ali – do confronto que levou a morte do seu filho. Tentava inclusive esquecer de onde estava. Imaginava-se no lugar da sua infância em meio a natureza. Como era bom a vida no campo. Não havia a violência que existe nas cidades. A relação de respeito entre pais e filhos eram outra. Mas passos rapidos nos corredores o fizeram lembrar de onde estava.
Quando os anjos da morte chegaram, o local escureceu. Ele não esboçou reação. Estava sereno. Eram muitos, muitos foram os disparos. Seu corpo ficou estendido no corredor. E os anjos partiram deixando um rastro de sangue, na noite mais longa naquela cidade interiorana.
Por Pedro Ferreira Nunes – Um rapaz latino americano, que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in roll.