quinta-feira, 17 de julho de 2014

Conto: Um certo José

      Por Pedro Ferreira Nunes

Após mais um dia de trabalho José pega o ônibus de volta para casa, é o primeiro dos quatro que terá que pegar para chegar à periferia onde mora. Há oitos anos desde que chegou do interior que trabalha como faxineiro em um supermercado. Tinha mulher e quatro filhos.

José nasceu e cresceu em uma pequena cidade como muitas que existem no interior do nosso país. Não há trabalho, não há infraestrutura, não há condições para se viver dignamente. Nem se quer terra havia. A pequena chácara onde nasceu e cresceu juntamente com seus irmãos teve que abandonar devido à construção de uma usina hidrelétrica sobre o rio.

Quando morava na chácara mesmo passando dificuldade conseguia tirar da terra o suficiente para viver com dignidade, no entanto desde que fora obrigado a deixar sua terrinha passou a sobreviver às duras penas naquela pequena cidade que não lhe dava nenhuma condição para viver dignamente, assim ele juntou sua mulher e seus filhos e decidiu partir dali em busca de uma vida melhor em um grande centro.

Assim que chegou naquela cidade não teve dificuldade para arrumar um trabalho como faxineiro em um supermercado, havia muita gente do interior trabalhando na capital, e os trabalhadores de sua terra tinham a fama por ali de serem bons funcionários.

No entanto nem tudo eram flores, o salario mínimo que recebia se quer dava para sobreviver, mal podia pagar o aluguel do barracão onde morava com sua esposa e seus filhos, a comida era escassa, não havia nenhuma mordomia, mesmo com a esposa de José o ajudando com o seu salario de diarista.

José tinha a esperança de quem sabe um dia comprar sua casa própria, mas como se o dinheiro que ganhava mal dava para sobreviver? Passou se um ano, três, seis, já havia oito anos que estavam ali, mas a vida não melhorava. José continuava pagando aluguel e sobrevivendo com um salario de fome.

As vezes ele pensava na sua terra, no interior onde vivera, na chácara onde crescera e teve que abandonar para que o governo pudesse construir uma usina hidrelétrica para vender energia e encher o bolso de dinheiro das elites locais. Pensava em voltar um dia, mas sabia também que a vida por ali não seria fácil, naquela cidade pelo menos tinha trabalho, não era grande coisa, mas era melhor do que nada.

José continuava a sua rotina, tinha a esperança de um dia sair do aluguel, sua esposa já não tinha tanta esperança assim e, portanto decidiu voltar para o interior com os filhos e deixar José só ali. No dia em que ele chegou ao barracão em que morava e viu que sua esposa havia o deixado, ele perdeu o chão, não podia acreditar, foi para um bar bebeu todas, no outro dia não conseguiu ir para o trabalho.

No outro dia quando chegou ao trabalho seu gerente deu lhe uma grande bronca e o fez assinar uma advertência por ter faltado o trabalho, nos oito anos que estava ali ele nunca havia faltado e mesmo assim na primeira vez que fizera levara uma grande bronca do patrão e teve que assinar uma advertência.

José seguia no ônibus de volta para o barracão onde morava de aluguel, sentia muita falta de sua mulher, de seus filhos, queria tê-los a seu lado, sonhava um dia sair do aluguel e ter uma casa própria. Ouvia a propaganda política do governo dizendo que estava acabando o déficit habitacional, já havia oito anos que José havia assinado um cadastro e nada de sua casa sair.

Passou se dez, vinte, trinta anos e José continuava como faxineiro no chão daquele supermercado. Nunca mais soube noticia de sua mulher, dos seus filhos, não voltou mais para terra onde nascera e crescera, continuava morando de aluguel em um barracão, sozinho.

Após mais um dia de trabalho e enfrentar o transporte caótico de volta para o barracão onde morava. José tranca-se no seu quarto, deita em sua cama e adormece. Sonha com sua mulher, com seus filhos, todos estão na cidade do interior onde ele nasceu e cresceu. Vivendo felizes na pequena chácara de sua família.


José adormece profundamente e já mais acorda novamente, enfim realiza o sonho de conseguir uma casa própria, sete palmos de terra de onde já mais será tirado. No cemitério da cidade do interior onde nasceu e cresceu, ali viverá eternamente ao lado de seus pais, irmãos, mulher, filhos e amigos.

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