quarta-feira, 23 de novembro de 2016

RESENHA: Nem tudo é relativo – A questão da verdade. De Hilton Japiassu.



“Uma vida sem interrogação e sem paixão não merece ser vivida.”
Hilton Japiassu

O maranhense de Carolina Hilton Japiassu, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), licenciado em filosofia pela PUC/RJ, com mestrado e doutorado em Grenoble na França. E com estudos avançados na área de epistemologia em Estrasburgo também na França. Dedica-se desde 1968 ao estudo da epistemologia área na qual é uma autoridade reconhecida internacionalmente. Influenciado por Jean Piaget e Barchelard. Já escreveu diversos livros, entre eles: Nascimento e Morte das Ciências Humanas, Introdução ao Pensamento Epistemológico, Introdução a Ciências Humanas, Um Desafio da Filosofia, Interdisciplinaridade e patologia do saber entre outros.

Em “Nem tudo é relativo – A questão da verdade”, Hilton Japiassu tece uma critica veemente ao relativismo e os defensores de tal teoria que tem crescido vertiginosamente no último período. Especialmente, após a década de 1970 com a derrocada das ideias de esquerda e a consolidação da hegemonia neoliberal.
Com uma linguagem objetiva e clara, uma defesa apaixonante das ciências, do universalismo e da razão, claro, sem deixar de apontar alguns problemas que deve ser superado pelo conhecimento científico, especialmente o ocidental. Japiassu denuncia o risco do pensamento relativista e o dogmatismo a que isso pode nos levar. Sem abrir mão da polêmica e de uma critica consciente e consequente, aliás, o que segundo ele deve ser o papel de todo intelectual – não aceitar a naturalização das coisas, pois se não acabamos nos tornando justificadores da ordem estabelecida e nos somando aqueles que querem enterrar os conflitos sociais e politico – o que caracteriza a conjuntura atual. Partindo dai Japiassu faz uma forte critica a sociedade atual marcada por um conformismo generalizado e por sujeitos passivos (teleconsumidores). Como também por uma arte modernista de museu, que cultua o vazio politico e onde “os filósofos de televisão” buscam dá sentido ao insignificante

Em Nem tudo é relativo – A questão da Verdade. Japiassu também irá abordar a disputa entre racionalistas e relativistas, apontando as contradições do discurso de ambos. Pois mesmo sendo um defensor do racionalismo Japiassu não deixa de reconhecer alguns problemas que devem ser superados por esse pensamento. No entanto é no relativismo, como aponta o próprio nome do seu livro, que ele descarrega sua metralhadora giratória de criticas.

No primeiro capitulo do livro Hilton Japiassu mostra a onda relativista identificada como o pensamento pós-moderno – que se caracteriza pela negação da universalidade, da ciência com um conhecimento universalmente valido, e a verdade sendo reduzida ao que se ajusta ao dado sistema de crenças. Segundo o pensamento relativista nem a lógica nem a evidência desempenham um papel importante na construção do conhecimento. Dai que para Japiassu o relativismo deve ser entendido como determinismo social. O autor aponta que até 1970 a critica dos relativistas era em cima da ideologia dominante, dai para frente voltou-se para ciências. E dai surge a posição relativista de que a universalidade das ciências é uma ilusão – o que Japiassu vai refutar com veemência – questionando a questão da neutralidade absoluta, da negação da razão, e da ditadura da razão.  Japiassu alerta os riscos tanto do relativismo positivista baseado na tradição de Augusto Comte como do relativismo perspectivista dos Nietzchenianos, aliás, o relativismo perspectivista acaba desembocando no niilismo. Dai que para Japiassu não dá para pegar o pensamento relativista totalmente como verdadeiro, especialmente o que afirma que a ciências deve ser considerada como um conto de fadas. 

Hilton Japiassu não faz uma defesa cega das ciências. Muito pelo contrario, ele aponta com clareza os seus limites. No entanto para ele só pode haver ciência racional e só pode haver razão universal – o que confronta com as afirmações relativistas.

No segundo capitulo do livro “Nem tudo é relativo – a questão da verdade”. Hilton Japiassu vai abordar “o relativismo em questão”. Onde ele começa reconhecendo o fato de que o pensamento relativista nos ajuda a romper com o velho racionalismo. O qual ele ver como um problema para a busca da verdade. Japiassu afirma que não há como relativizar a razão sem racionalizar a relatividade. Logo para ele falta ao relativismo um pouco mais de ceticismo. Partindo desse pressuposto Japiassu vai apontar oito pontos que deve ser pensados para superarmos tanto o relativismo como o velho racionalismo;

1-      O risco do cientificismo que busca converter a ciência numa religião;
2-      A racionalidade cientifica precisa se tornar critica e autocritica;
3-      A necessidade de confrontar-se com outras culturas;
4-      Superar a ideia de que o racionalismo ocidental é o racionalismo universal;
5-      A necessidade de superar o relativismo cultural;
6-      Afirmar o relativismo como uma teoria intolerante;
7-      Não aceitar e fazer a critica ao etnocentrismo;
8-      Ao negar o eurocentrismo e o etnocentrismo tomar cuidado para não cair no relativismo irracionalista.

Em Nem tudo é relativo – A questão da verdade. Japiassu abordará a necessidade de se fazer uma critica consciente e bem fundamentada. Não se pode rejeitar, mas também não se pode aceitar tudo. É preciso ter autocritica. Nesse sentido Japiassu vai concluir seu livro descarregando uma artilharia de critica ao relativismo quando este tem por fim cair no ceticismo, que acaba por rotular erroneamente as diferenças entre ocidente e oriente e acaba caminhando para o irracionalismo – um caminho que pode levar a justificação de dogmatismos. Para Japiassu não dá para aceitar a fabula de uma sociedade sem conflitos defendida pelos relativistas. O autor de Nem tudo é relativo – a questão da verdade deixa claro que sem criticas a sociedade não evolui. Para os relativistas, segundo Japiassu, numa sociedade não há espaço para contestadores, logo pode se afirmar que os relativistas são conformistas, e os indivíduos em tal sociedade são privatizados. O que é contestado com veemência pelo autor.  Por fim para Japiassu não é aceitável a negação da universalidade pelos relativistas. Pois é fato que algumas coisas nos transcendem independente de nossas crenças e cultura. Logo para ele a aceitação do universal esta na afirmação do que o outro não nos é estranho logo é possível à comunicação.

Podemos classificar o livro Nem tudo é relativo – a questão da verdade, de Hilton Japiassu como um manifesto, uma apaixonante defesa da razão, da racionalidade, da ciência e do conhecimento cientifico. É um livro corajoso, que não tem medo de criticar, de polemizar, de buscar dialogo sem abrir mão de suas posições, que, diga-se de passagem, estão bem fundamentadas. Tal obra precisa ser reverenciada especialmente em um período onde aqueles que ousam levantar a voz contra a ordem estabelecida, contra o status cos são simbolicamente violentados. Diante da exposição empolgante de Hilton Japiassu em Nem tudo é relativo – a questão da verdade. Devemos nos perguntar a que serve tal teoria? Uma teoria que rejeita a critica, os conflitos sociais e prega a existência de uma sociedade perfeita. Que privatiza o individuo e nega completamente o conhecimento cientifico. Não neguemos algumas contribuições desse pensamento pós-moderno, mas não nos deixemos enganar – nem tudo é relativo.

Esse debate colocado por Hilton Japiassu neste livro deve ser travado, não só no âmbito da academia, mas na sociedade como um todo. Aliás, é um erro que vem sendo cometido no ultimo período pelos intelectuais, não transpor os debates para além dos muros da universidade, a forma acessível da escrita de Japiassu contribui para que mais pessoas tenham acesso a esta discussão. E no período de crise que vivemos é fundamental travarmos tal debate. 

“Uma vida sem interrogação e sem paixão não merece ser vivida” – essa frase emblemática escrita por Japiassu na introdução do seu livro fala por si mesma. Mesmo em uma conjuntura difícil, onde a mediocridade permeia todos os campos da sociedade – seja na politica, na economia, na cultura. Não podemos abrir mão de exercer o nosso papel de questionar, de criticar, de subverter a ordem estabelecida. Pois como escreveu o grande poeta alemão Bertold Brecht – não aceiteis o que é de habito como natural, pois nada é impossível de mudar.

Pedro Ferreira Nunes – Estudante de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins

Referência Bibliográfica

JAPIASSU, HILTON. Nem Tudo é Relativo – A Questão da Verdade – São Paulo: Editora Letras & Letras, 2000.


*Trabalho apresentado à disciplina de Leitura e Produção de Textos Científicos. Do Curso de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins. Revisado para o blog “Das barrancas do Rio Tocantins”.

Acesse o documento em pdf no link: https://drive.google.com/drive/my-drive 

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