segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Paisagens Sertânicas

“Meu mar é o sertão”.
Chico Cesar

Sempre quis conhecer o nordeste brasileiro, não o litoral – o mar, as praias. Mas o sertão. O sertão das estórias de cordel, de Virgulino Lampião, de Luiz Gonzaga que eu ouvia na minha infância. Depois na adolescência ao ler “Vidas Secas” de Graciliano Ramos, ao conhecer a poesia do Patativa do Assaré, e ao ler e assistir o “Auto da compadecida” de Ariano Suassuna. Já adulto, são as canções do Elomar Figueira Mello que mantem essa paixão acesa. E é justamente suas canções que ecoam nos meus ouvidos quando da janela do ônibus contemplo essa paisagem triste, triste mas bela. Essa paisagem sertânica, que trago dentro de mim, desde muito menino.

Contemplo a paisagem e penso comigo: o tempo por aqui parou. Nem o agronegócio e o seu projeto de “modernização” chegou por aqui. As casinhas de barro, de adobe e pau a pique resistem. A rocinha de milho, de mandioca, uma criação de bode, as galinhas, alguma vaquinha, o jumento, a oficina de fazer farinha. As igrejas ainda estão enfeitadas com as bandeirolas das festas juninas – dos festejos de São Pedro, Santo Antônio e São João. O povo resiste mesmo diante das dificuldades que não são poucas. A água é escassa, a seca castiga. Mas é melhor permanecer ali do que engrossar os índices de miséria das periferias das grandes cidades. 

Seguimos rumo ao litoral, meus companheiros mal veem a hora de chegar ao mar, conhecer as praias. Eu preferia ficar por ali, embrenhar sertão adentro, conhecer a história daqueles povoados, das pessoas que ali sobrevivem. E quem sabe até não encontrasse um parente distante que meu avô Romualdo e meu pai Zé Ferreira deixaram para trás quando decidiram deixar o sertão nordestino para viver no antigo norte goiano. 

Quem sabe um dia eu não retorne a essa “pátria veia do sertão” para viver numa casinha dessas, cultivar uma rocinha de milho, criar uns bodes e desenterrar minhas raízes paternas. Ai como eu queria ter tido a oportunidade de ouvir as estórias do meu avô Romualdo a cerca da sua vida por ali. O que o fizera deixar o sertão nordestino para ir viver no sertão tocantinense? Sei que ele tinha muitas estórias para contar, nasceu em 1910 e viveu até a década de 50 – viveu o período áureo do cangaço, do reinado de Lampião. Mas não tive essa oportunidade, quando ele morreu, eu era ainda criança.

Voltando para casa e olhando da janela do ônibus aquela paisagem, reflito a cerca da semana de debates e discussões em Fortaleza no Encontro Nacional de Estudantes de Filosofia, que teve como tema “Repensar a filosofia no Brasil”. Se de fato quisermos repensar a filosofia no Brasil devemos olhar mais para o nosso interior, para o nosso sertão. E nessa viagem percebi que não se trata de uma tarefa fácil. Percepção que não veio das discussões e debates, mas de um exemplo simples, do fato de que as pessoas estavam mais preocupadas em conhecer o mar do que voltar o olhar para aquela paisagem que nos acompanhou em boa parte da viagem e que compartilho nessas poucas fotografias.




























Pedro Ferreira Nunes – É Educador Popular e Estudante de Filosofia da UFT.

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