O que seria ter responsabilidade política? O ponto de partida para responder essa questão é entender o que é política. Pois não tem como falar em responsabilidade politica se não sabermos antes o que é política. Tal questão se torna ainda mais fundamental nos nossos dias que parece se caracterizar por uma negação da política.
A palavra política vem do grego polis que significa cidade. E de acordo com Marcondes (2001), é “tudo aquilo que diz respeito aos cidadãos e ao governo da cidade”. Isto é, aos negócios públicos. E aqui já observamos três conceitos importantes para compreensão da política: Cidadão, Governo e Público. Não, não destrincharemos cada um deles. Mas é importante notar que no seu sentido original, a política é constituída desses três elementos.
Na tradição clássica em geral Marcondes (2001) nos diz que “a política pertence ao domínio do conhecimento prático e é de natureza normativa, estabelecendo os critérios da justiça e do bom governo”. Tendo como fim a busca pelo bem-estar na sociedade – na existência coletiva.
Aranha (2003) também segue essa linha, apontando a política como “a arte de governar, gerir o destino da cidade”. Ora, quem tem o dever de fazer isso se não os cidadãos através da intervenção na esfera pública?! A autora nos trás dois conceitos importantes para compreendermos a política – poder e força. Para Aranha (2006) “a política se refere às relações de poder” e para que alguém exerça esse poder é necessário força. Ressaltando que quando em política se fala em força não necessariamente está se falando do uso da violência explicita.
Diante dessa questão é possível fazer uma relação com o que diz Marcuse na sua obra: “A Ideologia da Sociedade Industrial: O Homem Unidimensional”. Este autor vai exatamente apontar a instrumentalização da tecnologia para dominação política. Ele nos diz que “a tecnologia serve para instituir formas novas, mais eficazes e mais agradáveis de controle social e coesão social.” (1973, p. 18) E como fica a política nesse contexto? A política é negada, sobretudo, quando de acordo com Marcuse (1973) o debate político perde a “sua função critica básica” de independência de pensamento, autonomia e direito à oposição.
Nessa linha de negação da política que nos parece ser uma das características da contemporaneidade é importante trazer a reflexão do filosófo Desidério Murcho no seu artigo sobre “O fim da política”. Murcho (2010) afirma que atualmente um interesse intenso pela vida política só faz sentido para generalidade das pessoas quando o conforto da sua vida privada está em risco, ou quando têm a esperança de que uma mudança política terá resultados importantes para qualidade da sua vida privada.
Desse modo é plausível falar em fim da política, pelo menos no seu sentido clássico – onde a preocupação como vimos era com o bem comum, o coletivo, o público e não a vida privada de cada indivíduo . Para Murcho (2010) “a generalidade da população sempre encarou a vida pública como um mero meio para ter uma vida privada melhor”. Dai que para o filósofo só há uma preocupação com a política por parte da generalidade dos indivíduos quando seus interesses privados são atingidos. Para o autor isso explica a ascensão de gestores no lugar dos políticos tradicionais. Que inclusive são eleitos justamente com o discurso de negação da política.
Para onde isso nos levará? Quais as consequências disso para nossa existência coletiva na cidade? Todos estão cientes dessas consequências? Bom, é aqui que entra a questão da responsabilidade. De acordo com Marcondes (2001) “a noção de responsabilidade está estritamente ligada à noção de liberdade, já que um indivíduo só pode ser responsável por seus atos se é livre, isto é, se realmente teve a intenção de realizá-los, e se tem plena consciência de os ter praticado”.
Diante disso é interessante retomarmos Marcuse, sobretudo ao abordar a questão da liberdade na sociedade contemporânea. De acordo este autor (1973) “sob o julgo de um todo repressivo, a liberdade pode ser transformada em poderoso instrumento de dominação.” Ora, como falar em responsabilidade política nesse contexto de negação da politica – uma negação que nos parece que se dá justamente pela falta de consciência das suas consequências. E o que seria essa responsabilidade política?
O primeiro ponto é seguir a linha que adotamos nesse texto, isto é, começar por entender o que é política. Sem ter consciência a respeito do que é e qual o papel da política não tem como haver responsabilidade política. Nessa perspectiva é fundamental resgatar o conceito clássico de Política, sobretudo no que concerne a busca pelo bem-estar comum. Apontando o fato de que quando nos preocupamos apenas com o nosso bem estar privado ou de determinado grupo, estamos negando a política e caminhando perigosamente para o campo do fundamentalismo e da intolerância – e não precisamos ir muito longe na história da humanidade para perceber que o saldo desse caminho não é positivo.
Desse modo, para finalizar, a maior responsabilidade política que devemos assumir é a defesa da política como um elemento central na vida em sociedade – o que novamente nos faz voltar ao ponto de que é preciso saber o que é política e a sua importância para construção de uma sociedade democrática.
Referência Bibliográfica
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia – 3 ed. revista – São Paulo: Moderna, 2003.
MARCONDES, Danilo; JAPIASSÚ, Hilton. Dicionário Básico de Filosofia. 3º Edição. Jorge Zahar Editor – Rio de Janeiro; 2001.
MARCURSE, Herbert. A Ideologia da Sociedade Industrial: O Homem Unidimensional. Tradução: Giasone Rebuá. 4º Ed. Zahar Editores – Rio de Janeiro, 1973.
MURCHO, Desidério. O fim da Política. Disponível em: criticanarede.com. Acesso em: 30 de Agosto de 2017.
*Pedro Ferreira Nunes – É Graduando em Filosofia pela UFT.
*Trabalho apresentado à disciplina de Fundamentos de Filosofia Política, do curso de Licenciatura em Filosofia da Universidade Federal do Tocantins. Palmas, 2018.