segunda-feira, 20 de novembro de 2023

bell hooks e o amor na luta contra o racismo



- Amar é um ato de resistência. Você provavelmente já ouviu essa frase por ai. Para bell hooks não se trata de uma retórica vazia. Essa filósofa estadunidense acredita mesmo que amar é um ato de resistência. No entanto para que essa frase não se torne uma retórica vazia. Primeiro: É preciso compreender o que é o amor. Segundo: Entender o seu poder transformador. Em relação a esse segundo. Para entender o poder transformador do amor é necessário amar. Ou melhor – se amar em primeiro lugar. O que não é fácil para aqueles que sofrem opressão,  que são inferiorizados. É o caso do povo preto - em especial as mulheres – vítimas do regime escravocrata. É portanto para essas que bell direciona o seu poderoso discurso em defesa do amor como um instrumento político na luta contra as opressões. Mesmo compreendendo que a escravidão afetou a capacidade de amar dos negros, sobretudo das mulheres. Ela acredita que o amor pode curar – tornando os indiviudos mais fortes na luta pela construção de um mundo melhor. 

Mas voltemos ao início quando dissemos que para que a frase: - amar é um ato de resistência. Não caia numa retórica vazia. Precisamos compreender o que é o amor. bell seguirá uma definição do amor como “uma intenção e uma ação”. Ou seja, o amor não é apenas sentimento. É também ação. Se eu não expresso o que sinto por meio de atos. Então não estou praticando o amor. É aquela velha história – falar ti amo é fácil. Mas a nossa filósofa lembra que o amor é mais do que palavras. Nesse sentido ela nos diz que é “preciso reconhecer que a opressão e a exploração distorcem e impedem nossa capacidade de amar”. E para fundamentar sua fala ela trás o exemplo da escravidão – que criou, segundo bell, no “povo negro uma noção de intimidade ligada ao sentido prático de sua realidade”. Ou, seja, num contexto de violência extrema reprimir os sentimentos era uma questão de sobrevivência. 

Não nos falta obras para entendermos o que bell está falando. Mas não poderia deixar de citar algumas como os filmes: 12 anos de escravidão (EUA) e Vazante (BRA). Gosto também dos poemas do Castro Alves. Entre tantos destacaria “a canção do africano” (1863), que destaco aqui os versos finais:

O escravo então foi deitar-se,
Pois tinha de levantar-se
Bem antes do sol nascer,
E se tratasse, coitado,
Teria de ser surrado,
Pois bastava escravo ser.

E a cativa desgraçada 
Deita seu filho, calada,
E põe se triste a beijá-lo,
Talvez temendo que o dono
Não viesse, em meio do sono,
De seus braços arrancá-lo”.

É de que se compreender o por que que os indivíduos que lutam pela sobrevivência não deem espaço para o amor. Porém, mesmo num contexto de extrema dificuldade, bell defende ser possível encontrar espaços para amar. E mais. Para essa filósofa, amar é uma condição sine qua non para irmos além da sobrevivência. Desse modo ela enfatiza que o autoconhecimento e o autocuidado são dois aspectos fundamentais para que não nos tornemos pessoas frágeis. De acordo com suas palavras “a arte e a prática de amar começam com a nossa capacidade de nos conhecermos e afirmar”. E quando conhecemos a nós mesmo. Nos aceitando – e não se deixando afetar pelo que os outros acham ou dizem. Teremos mais força não só apenas de seguir em frente mais também de contribuir com aquilo que acreditamos.

Nossa filósofa encerra sua reflexão ressaltando que “quando conhecemos o amor, quando amamos, é possível enchergar o passado com outros olhos: é possível transformar o presente e sonhar o futuro”. Para ela esse é então o poder do amor – o amor cura. Essa cura não é de fora para dentro. Mas o contrário. Quando, através do amor, conseguimos curar nossas feridas internas, nos tornamos mais fortes na luta contra toda forma de opressão.

Para finalizar, talvez desviando do nosso foco inicial ou não, a partir dessa leitura da bell hooks a consciência negra acabou fazendo mais sentido para mim. Diante disso não podemos deixar que ela se torne apenas mais uma data no nosso calendário. Mas como um momento de olhar com outra perspectiva para nossas raízes – com suas heranças, buscando assim transformar o presente e sonhar um futuro sem racismo – em que as vidas negras realmente importa.

Pedro Ferreira Nunes – Professor da Educação Básica. Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. 

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