Comecemos já por afirmar nossa tese central, a de que Marcuse, a partir da sua teoria crítica nos dá uma importante contribuição para pensarmos uma educação para emancipação a partir de uma pedagogia radical. Primeiro ao chamar atenção para as consequências de uma educação unidimensional, que funciona a partir da substituição do negativo por uma consciência feliz. Tirando do indivíduo a capacidade crítica, tornando-o alheio aos problemas da comunidade. Segundo propondo a superação dessa educação por meio de uma pedagogia radical (bildung) que a partir de um movimento crítico reconstrua a racionalidade humana, em substituição a racionalidade tecnológica, caminhando em direção a possibilidades futuras.
Não sejamos ingênuos. O contexto atual nos deixa bastante pessimista quanto à possibilidade de uma mudança qualitativa tanto na esfera educacional como na sociedade em geral. O status quo conseguiu de tal forma controlar os indivíduos, sobretudo por meio do consumo, que parece impossível vislumbrar alguma ruptura. A não ser tutelada pela classe dominante. Dito isso, uma possibilidade de mudança na esfera educacional que restaure a racionalidade humana parece cada vez mais remota.
Olhando para o contexto brasileiro percebe-se que as mudanças do último período tem como fim transformar a educação pública em mercadoria. Marcuse (1964) já apontava para esse movimento nas sociedades desenvolvidas onde percebia uma contradição entre o aumento do acesso à educação por um lado, mas a perda de potencialidade por outro. Vemos esse movimento no contexto atual com a diminuição da carga-horária de componentes curriculares como Arte, Geografia, História, Filosofia e Sociologia em benefício de Projeto de Vida e eletivas de empreendedorismo. Tolhendo a criatividade e o pensamento crítico.
Ora, uma educação voltada para o atendimento dos interesses mercadológicos não necessita da crítica. Sobretudo porque em última análise a educação unidimensional é doutrinária. E sendo doutrinária não há espaço para o contraditório. Isso fica mais evidente quando analisamos os documentos orientadores que estabelece inclusive o que e como o professor deve desenvolver os objetos de conhecimento trabalhados em sala de aula.
A priori isso parece não ser nada nocivo. São “sugestões” para que o professor possa desenvolver na sala de aula de forma mais eficaz as competências e habilidades que estão sendo trabalhadas. Ele não precisa pesquisar nada. O objeto já vem determinado, as referências a ser utilizadas, os textos, os instrumentos a serem utilizados. É só pegar e aplicar. Mas quando o professor se torna apenas um replicador daquilo que é pensado por um técnico perde a sua capacidade de pensar. E a partir daí pode perfeitamente ser substituído por uma máquina.
Acreditamos que apesar dos limites é possível, e necessário, assumirmos uma pedagogia radical, que a partir de diferentes estratégias didáticas, em especial o papel da arte, restaure a razão crítica e a busca pela libertação política, no caminho de construção de uma educação para emancipação. Para tanto é necessário compreender criticamente as tendências em curso no campo educacional, seja no ensino superior ou na educação básica, e a partir daí podemos vislumbrarmos mudanças qualitativas.
Entender o nosso papel enquanto educadores, que somos os responsáveis por concretizar o currículo na sala de aula, é fundamental. É preciso compreender, e Marcuse salienta isso, o papel político no ato de educar. Nesse caso não se trata de doutrinação. Mas, a partir de diferentes estratégias didático-pedagógicas, pode-se instigar o pensamento crítico. Acreditando na linha do que diz o filósofo brasileiro Paulo Arantes (2023), de que enquanto houver pensamento crítico há possibilidade de que surjam cidadãos. Cidadãos de fato, ou seja, aqueles que lutam pelos seus direitos.
Pedro Ferreira Nunes - É Professor na Rede Pública Estadual de Ensino do Tocantins. Graduado em Filosofia (UFT). Especialista em Filosofia e Direitos Humanos (Unifaveni). E Mestre em Filosofia (UFT).
Nenhum comentário:
Postar um comentário