sábado, 10 de abril de 2021

Resenha: Sexs Pastels e o Punk Rock do Gatillazo

 El fin del mundo está a punto de llegar

y los culpables (aparte de tú y yo)

la ultraderecha imbécil, el dinero y dios.

Gattilazo

Como um amante do rock, sobretudo punk e metal, ouço qualquer novidade que caia em minhas mãos. No entanto nem tudo fará parte da minha play list de cabeceira. Esta é um tanto restrita (o mesmo se sucede com relação a livros e filmes). E para esse círculo restrito, essa banda de punk rock espanhol que conheci recentemente, já faz parte. Trata-se da Gatillazo, creio eu não muito ouvida no Brasil, mas pelo que vi pelos números de visualizações no YouTube, bastante apreciada na Espanha e em países de língua espanhola como o Chile.

Encontrei os caras por acaso na internet e afetado pelo som e pela performance do seu vocalista (Evaristo Páramos) me fez imediatamente buscar mais coisas sobre a banda. E na medida que eu ia os conhecendo, mais os apreciava. Baixei então um disco gravado de uma performance ao vivo deles intitulado de “Sexs Pastels” (a referência a banda britânica Sexs Pistols não é mera coincidência), e desde então tenho ouvido cotidianamente. 

Carregado de ironia e sarcasmos eles destilam uma crítica contundente ao capitalismo, ao fascismo, ao nacionalismo e a monarquia através de suas letras acompanhadas de um som veloz.

A banda foi formada em 2005 por ex-integrantes de outro grupo de punk rock espanhol (La Polla Record). Tendo como integrantes na sua formação atual: Evaristo Páramos – vocais, Txiki – guitarra, Tripi – bateria, Butonbiko – baixo e Angel – guitarra. 

Em “Sexs Pastels” temos a banda numa grande performance num estúdio ao vivo. No melhor estilo punk rock, como um soco no estômago, tocando um petardo atrás do outro em 1 hora e 10 minutos. 

Para começar temos “Pánfilo panfleto ataca de nuevo” onde criticam as mudanças de liberdade prometidas pelo capitalismo aos países que rompem com sua política: “Cuando el neoliberalismo rompe una revolución. La verdad salta a la vista. Que la violencia es la que sostiene el sistema capitalista”. Violência para impor uma ordem pior que a anterior. Em seguida temos “Asín es la vida” onde falam da postura conformista dos indivíduos diante de tanta miséria: “Qué podemos decir dice la mayoría (Así es la vida), qué le vamos a hacer si no hay solución (Así es la vida), no queremos saber, no hay ninguna salida (Así es la vida)”. Assim é a vida e temos que nos conformar pois nada irá mudar. É exatamente esse tipo de postura que a classe dominante espera de nós. 

Em “Con perdón” eles criticam a postura de quem muda de posição ao obter algumas benesses do poder: “Cuando era más joven yo te quería matar, era un intolerante fácil de adoctrinar, pero ahora he cambiao, se lo que hacer, y que decir y digo: Viva españa y viva el rey – viva dios, viva la ley, al servicio y siempre fiel mi constitución”. Na canção o exemplo é em relação a monarquia espanhola. Mas também serve para outros posicionamentos oportunistas.

Na sequência temos “Tortura”, onde denunciam a opressão contra quem ousa se rebelar contra sistema, ainda que “democrático”: Incomunícame, encapúchame, trasládame. Aterrorízame, golpéame, amenázame. Hazme perder la noción de la realidad. Hasta que firme tu declaración. “Buen Menú” é a próxima. E desse ironia sobre a violência institucional: Menú bien equilibrado, nutritivo y muy variado. Entremés de asesinato, vamos con el primer plato: Sopa de comportamiento desviado y agresivo, ensalada de desgracias sencilla o mixta con tropezones de policía. Bocaditos de estudiante... puré de represión”.

Bem camaradas, já deu para sentir que os caras não estão de brincadeira, e não estamos nem na metade. No entanto vamos parando por aqui, pois creio que já deu para perceber o posicionamento político da banda através da sua música, em especial do seu vocalista Evaristo Páramos – que é uma referência na luta anticapitalista Espanhola. Antes gostaria de destacar três canções que estão em “Sexs Pastels”, que foram as que me fizeram prestar mais atenção nas letras das músicas. Trata-se de “Ya no quiero ser yo”,  “Comunicado Empresarial” e Ridículo.

Na primeira eles falam da alienação que nos é imposta pelo sistema dominante, uma alienação que nos leva a deixar de ser quem somos. “Me he mirado en el espejo y no me he reconocido. En el extraño que se ve tras el cristal. Si el pasado y el presente se reflejan. Y no mienten tengo que hacer algo por mi porvenir. Ya no quiero ser yo. Ya no quiero ser yo. Ya no...”. É sem dívidas uma bela letra. Na segunda eles falam da substituição da mão de obra do operariado por máquinas, isso a partir do ponto vista patronal: Nunca más vais a tener trabajo ya no os necesitamos más. Porque es mentira que se trate de una crisis. El trabajo está muerto y éste es su funeral. Y se acabó, es el fin. Ya nadie necesita al proletario feliz”. Aqui salta a vista a visão da burguesia acerca dos trabalhadores como coisa que quando não serve mais deve ser descartado. Na terceira é uma crítica contundente ao cristianismo, sobretudo as suas instituições: “Cristiano muerto, matón cristiano querido soldado de cristo. Cristiano amado, amor cristiano todos los judas te besaron. Seáis bienaventurados mercaderes del señor, él os manda acumular”. Aqui a mercantilização da fé é o ponto chave.

É isso camarada, se você aprecia um bom punk rock (anticapitalista). Gatillazo não irá ti decepcionar. Em tempos de avanço da ultradireita, suas canções são gritos de resistência que merecem ser ecoados no mundo todo. Pois como eles alertam em Hsuícidio: “El fin del mundo está a punto de llegar, y los culpables (aparte de tú y yo), la ultraderecha imbécil, el dinero y dios”.

Pedro Ferreira Nunes é – Educador, Poeta e Escritor Popular 

terça-feira, 6 de abril de 2021

A Plataforma Escolas Conectadas e o desafio da Formação Continuada

As mudanças que tem ocorrido no campo educacional em decorrência da Pandemia de COVID-19 veio mostrar a importância da formação continuada no cotidiano dos educadores. Sobretudo ao possibilitar a aquisição de novos conhecimentos e a apropriação de ferramentas que nos dê condições de responder aos velhos e novos desafios que surgem no nosso cotidiano. 

Em relação a educação em tempos de pandemia podemos dizer que aqueles profissionais que não se acomodaram, certamente, não tiveram grandes problemas com esse negócio de ensino híbrido, aulas remotas (seja através de material impresso ou lives), salas de aulas virtuais entre tantas outras. Já em relação aos que se agarraram as práticas tradicionais, esperando um milagre de que do dia para noite retornariamos a “normalidade”, não podemos dizer o mesmo.

Ora, educar numa perspectiva transformadora exige de nós educadores o desafio constante de não se acomodar. Mas como não se acomodar? Não deixando de aprender, adquirir novos conhecimentos, e se apropriando de ferramentas que nos possibilite propiciar um ensino significativo em qualquer contexto. 

Quando falamos em formação continuada nos referimos sobretudo a concepção defendida por Mészáros no seu celebre “Educação para além do Capital”. De acordo com o Filósofo húngaro uma formação verdadeiramente continuada deve ser obra dos próprios educadores. Somos nós que devemos definir e autogerir a nossa formação. Para tanto podemos nos apropriar das diversas ferramentas e plataformas a nossa disposição, sobretudo no ambiente virtual.

São diversos os espaços que ofertam conteúdos de qualidade. Entre eles destacaria uma que me é mais familiar por ter feito alguns cursos por lá. Trata-se da plataforma Escola Conectadas – onde encontramos diversos cursos ofertados por instituições de Ensino credenciadas pelo Ministério da Educação  (MEC). 

Além do conhecimento há uma infinidade de possibilidades para serem desenvolvidas na nossa prática pedagógica tanto presencial como remotamente – tudo gratuito com direito a certificado.

O Escola Conectadas é uma iniciativa conjunta da Fundação Telefônica Vivo e Fundação Bancária La Caixa, iniciado em 2015, voltado para educadores brasileiros. E tem como objetivo oferecer cursos online de formação para Professores da Educação Básica – cursos que se dividem em duas modalidades: Mediados e autoformativos (Para maiores informações e acesso ao catálogo dos cursos acesse o link: https://www.escolasconectadas.org.br/).

Conheci a plataforma por acaso ao receber um convite para o curso “Escola digital: curadoria de objetos digitais”. Como estávamos num contexto de aula remota a temática me chamou atenção, sobretudo pelo termo “curadoria” que não me era estranho. A partir dessa primeira experiência decidi fazer outros cursos ofertados pela plataforma, entre eles: “Escola digital: tecnologia e currículo” e  “Produção colaborativa do conhecimento: redes para multiplicar e aprender”. São cursos importantes, eu diria que nem tanto pelos conteúdos, mas pelas ideias que nos possibilita desenvolver os nossos projetos.

Além do Escolas Conectadas há uma infinidade de opções para que nós educadores não nos acomodemos com os conhecimentos adquiridos na Universidade. Óbvio, é preciso se apropriar dessas ferramentas de forma crítica. O que significa que não devemos nos tornar meros reprodutores, transmissores de conhecimentos – distante da realidade que estamos inseridos ou utilizar ferramentas inacessíveis aos estudantes. 

Dito isso, é importante salientar que não podemos deixar de lado a luta mais ampla por transformações profundas no âmbito educacional. Sobretudo quando falamos em educação formal, pois por mais que o educador se esforce no sentido de melhorar enquanto profissional, a falta de estrutura e o excesso de burocracia não ajudam. Nesse sentido a formação continuada na perspectiva defendida por Mészáros pode contribuir inclusive para que não se perca de vista esse horizonte de uma transformação radical no âmbito educacional. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Pós-Graduando em Filosofia e Direitos Humanos. 

quarta-feira, 31 de março de 2021

Para dizer que não escrevi sobre Esperança

Poema: A canção 

De repente tudo se fez em silêncio, 

um silêncio absoluto.

Não se ouvia som:

de vozes,

ou de automóveis. 

Do vento,

ou dos pássaros. 

Da criançada brincando na rua,

ou dos vizinhos conversando.

Do movimento nos bares,

ou no comércio em geral.

Era como se ele fosse,

a única alma viva,

naquele lugar.

Ele então se sentiu sozinho,

de uma maneira

como já mais havia se sentido.

Ele então teve medo. 

- Sozinho no mundo? 

O que farei? 

Serei o único sobrevivente desse desastre?

Pensou consigo.

Ele sentiu vontade 

de correr para a rua,

na esperança de encontrar 

com mais alguém. 

Mas sabia que não podia,

não podia sair.

Era preciso ficar em casa.

- Para quê ficar em casa?

Tudo está perdido.

Todos estão mortos.

Não há mais salvação. 

Dizia ele já é entrando em desespero.

E já entrando em desespero, 

lembrou de uma canção. 

Ele então pegou um violão, 

E começou a toca-lá.

“Don’t worry about a thing, 

cause every little thing,

gonna be all right.

Saying, don’t worry about a thing, 

cause every little thing,

gonna be all right...”.

De repente ele ouviu,

uma voz na casa ao lado,

cantarolar a canção. 

Na outra casa,

e na casa em frente também. 

Logo era toda a rua a cantar,

toda a cidade.

Ele então se encheu de alegria,

não se sentiu mais sozinho.

E teve a certeza de que,

tudo ficaria bem,

tudo ficaria bem.


Por Pedro Ferreira Nunes, in Antologia Literária Ruas Vazias - O CoronaVírus em Prosa e Verso. Editora Veloso, 2020.

segunda-feira, 29 de março de 2021

Um olhar sobre a juventude Lajeadense.

 “Eles dizem que você é doente,

e que isso é fase adolescente,

mas não, não vá se entregar.

Dê uma outra chance pra você, 

não se isole por que você, 

Você é alguém...”.

Cólera 

Uma breve nota introdutória 

Esse artigo foi escrito há quase um ano. A ideia era publica-lo ainda em 2020 no Blog Das Barrancas do Rio Tocantins, como uma contribuição ao debate local sobre políticas públicas, sobretudo tendo em vista que estávamos em ano eleitoral. No entanto acabei não fazendo. Faço agora por acreditar que as reflexões que trago, continuam pertinentes.

Políticas Públicas para juventude

“Até quando vou aguentar,/ essa cidade parada,/ que não se movimenta,/ e nem me deixa movimentar?”. Esse verso é do poema “Até quando?” escrito por mim no meu tempo de colegial. Recordei dele quando ouvi de vários jovens lajeadenses frases que remetiam a esse mesmo sentimento. Não pude deixar de pensar comigo: - As coisas não mudaram tanto por aqui. O discurso desses jovens é exatamente o mesmo da minha geração.

É importante destacar que não ouvi isso de uma meia dúzia de jovens mas de algumas dezenas. Desse modo ainda que não tenha o peso de uma pesquisa, creio que temos ai elementos para refletirmos sobre a juventude Lajeadense. Daí o objetivo desse texto – que ele possa ser um estímulo para se buscar ouvir a juventude, pensar, discutir e elaborar políticas para esse segmento da comunidade de Lajeado. 

O episódio relatado aconteceu durante uma dinâmica que desenvolvi nas turmas do Ensino fundamental (6° ao 9° ano) e Ensino médio (1° a 3° Série) do Colégio Estadual Nossa Senhora da Providência. Eles deveriam responder as seguintes questões: 1- Nome; 2- Onde nasceu; 3- Gosta de...; 4- Lajeado é...; e 5- O que espera da disciplina. O objetivo da dinâmica era apenas estabelecer um contato inicial onde eu pudesse ter uma idéia do perfil daqueles jovens (com os quais iria trabalhar) e a relação deles com a cidade onde moram. Mas ai fui surpreendido com as respostas que ouvi, sobretudo em relação a questão quatro. A surpresa não foi por discordar das respostas mas pela semelhança entre elas e o discurso da minha geração. 

Para no mínimo 90% dos jovens ouvidos Lajeado é uma cidade parada que não oferece oportunidades para que possam se desenvolver tanto no aspecto educacional como cultural. Em suma, uma cidade onde não há política pública para juventude.

É exatamente o mesmo discurso da minha geração, como podem perceber pelo verso do poema “até quando?” de minha autoria, mas que reflete o espírito daquela geração. Para mim isso mostra em grande medida, que apesar das mudanças econômicas e sociais pelas quais a cidade passou (sobretudo após a construção da Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães), para a juventude as coisas permanecem iguais. E uma das consequências disso é a ausência de um sentimento de pertencimento ao lugar. E quando você não se sente parte do lugar, acaba não se importando muito com os problemas locais e suas resoluções.

Por isso para muitos desses jovens o caminho é jogar uma mochila nas costas e partir em busca de um lugar onde tenham oportunidades para se desenvolver. Depois de algum tempo alguns até retornam, mas a grande maioria não. Outros dividem a vida entre  Lajeado e Palmas. E como a capital oferece oportunidades que não existe no Lajeado, a tendência é esses jovens viverem mais em Palmas e ter Lajeado como um lugar de repouso – uma cidade dormitório.

Esse foi o destino de muitos da minha geração, como também de outras. E se não houver uma quebra de paradigma será também o desta.

Há também aqueles que optam (ou não conseguem sair). Para esses as perspectivas são ainda piores. Sem uma qualificação melhor e um mercado de trabalho escasso não há muito alternativa de escolha. Alguns constituem famílias muito jovens – as meninas engravidam ainda na adolescência e são obrigadas a abandonar a escola – os meninos encontram no álcool e outras drogas ilícitas uma fuga da realidade. Aliás, o alcoolismo e a gravidez na adolescência são duas expressões da questão social muito comum na juventude lajeadense – que não serão extintas sem políticas públicas que enfrente esses problemas.

Diante disso, faz-se necessário pensar em políticas públicas para juventude lajeadense, ou continuaremos perdendo talentos  (e sua energia) que poderiam ser utilizados para a melhoria das condições de vida na cidade, para outros municípios, outros Estados ou ainda pior, para as drogas e para o crime. Isso, no entanto, não significa que o enfoque dessas políticas públicas deva partir da ideia da juventude como problema social, mas sim como sujeitos sociais. 

Seguindo essa linha, é importante destacar a diferença entre essas duas perspetivas. De acordo com Groppo (2017) quando a juventude é tida como um problema social, “ela aparece na figura do perigo, risco ou regressão às drogas, à promiscuidade e a violência”. Já quando o jovem é visto como sujeito social, se reconhece “ a importância de se ouvir, entender e considerar as vozes juvenis no mundo público: na escola, no trabalho e na política, inclusive na formulação das políticas públicas para a juventude”. 

Para Andrade (2010) houve uma mudança, á nível nacional, no que consiste a elaboração de políticas públicas para juventude e a problematização dos diretos dos jovens. De acordo com essa autora “na última década, a juventude conquistou uma posição de destaque na agenda nacional. No campo das políticas públicas específicas para este segmento social, considera-se que o país avançou a passos largos”. Ela ressalta como exemplo a criação do Conselho Nacional de Juventude (CNJ), o Pro Jovem e a criação de estruturas administrativas a níveis estaduais e municipais. Ainda de acordo com Andrade (2010) “direitos e oportunidades são palavras-chaves na linguagem que caracteriza a atual Política Nacional de Juventude. São reafirmados os direitos à saúde, à educação de qualidade, às oportunidades de inserção no mundo do trabalho, à moradia, ao lazer e à segurança, ou seja, consolidam-se políticas que visam direitos universais”. 

Diante disso o desafio é fazer com que essa política chegue efetivamente a toda a juventude brasileira – o que não é uma tarefa fácil, ainda mais com o desmonte do estado brasileiro que tem sido levado a cabo pelo governo Bolsonaro. Nos municípios pequenos como Lajeado então, ainda é mais difícil. Sobretudo pela falta de articulação e organização da juventude para se fazer ouvir pelo poder público local. Desse modo as parcas políticas que existem acaba tendo como visão o jovem como problema social. 

Para se contrapor a esse processo é fundamental que a juventude se articule e se organize (seja em movimentos populares, movimento estudantil, sindicatos, associações entre outros) para reivindicar e lutar pelos seus direitos. Em Lajeado já houve alguma iniciativa nesse sentido, mas que se perderam sobretudo pelo fato dos lideres desses movimentos terem se deixado cooptar. Hoje o que restou foram alguns grupos de jovens ligados as igrejas (católicas e protestantes), mas que não representam e nem tem capacidade de dialogar e organizar a juventude de Lajeado em torno de pautas comuns.

A juventude lajeadense não pode ficar de braços cruzados esperando que a iniciativa de criar políticas públicas parta somente do poder público. Afinal de contas ninguém melhor do que ela própria para dizer o que quer ou pelo menos o que não quer. Aliás, eis aí uma diferença entre a minha geração e a geração atual. Se a minha geração não teve uma participação efetiva na política institucional da cidade, discutindo e contribuindo na elaboração de políticas públicas. Pelo menos não se acomodou e protagonizou movimentos culturais importantes que rompia com a mentalidade conservadora local. Num momento que era bem mais difícil ter acesso a produtos culturais (pois não havia internet, radio, ginásio de esportes e Palmas não era tão acessível como é hoje) não nos acomodavamos e construiamos alternativas para que não tivéssemos que “cortar os pulsos” para escapar do tédio. 

Não se trata aqui de dizer que uma geração foi melhor que a outra (o discurso saudosista do tipo: - Ah, na minha geração as coisas eram diferentes) pois como pontuamos no início o discurso de ambas as gerações acerca do Lajeado não é diferente, a diferença é a atitude. Enquanto aquela geração buscava agir (mesmo com todas as limitações), a geração atual se acomoda. E se fazendo alguma coisa já é difícil mudar, imagine não fazendo nada. 

Isso no entanto não exime o poder público no sentido de garantir, estruturalmente, condições para que os jovens possam se desenvolver. Esse foi um dos limites da minha geração – não ter consciência política para cobrar do poder público direitos e oportunidades para se desenvolver. De modo que se essa geração de agora conseguir alcançar essa consciência, dará um salto significativo.

Nesse sentido o primeiro ponto é desconstruir a visão que se tem acerca da política – uma visão que leva a apatia ou a negação. Uma visão construída a partir de uma compreensão reducionista da política entendida unicamente a partir da briga dos partidos políticos pelo poder, do vale tudo eleitoral e dos desvios éticos.

A política não se reduz às organizações partidárias, às eleições ou à corrupção. De acordo com Aristóteles (1961) “o objetivo da vida política é o melhor dos fins” e o melhor dos fins é a felicidade á qual alcançamos através de uma vida virtuosa. Nesse contexto o papel da política é buscar “com que os cidadãos sejam bons e capazes de nobres ações”. Como podemos perceber, é o oposto do que se compreende por política na atualidade – como um meio para alcançar interesses individuais.

Diante disso, defendo o resgate do conceito clássico de política. Tal como concebida por Aristóteles. Creio que é a partir daí que será possível desconstruir a visão reducionista de política. Ora, para ter uma vida política ativa você não precisa necessariamente estar filiado a um partido político e se candidatar a um cargo público. Para ter uma vida política ativa você deve buscar contribuir para que sua cidade seja um lugar melhor para se viver. Mas como? Você deve estar perguntando. Fiscalizando as ações do poder público, denunciando os desvios e os descasos com os recursos públicos, participando das discussões acerca dos problemas locais, propondo projetos entre outros. Óbvio, essas ações terão mais eficácia se forem frutos de um coletivo e não iniciativas individuais. Esse coletivo pode ser um grêmio estudantil, uma associação, uma pastoral social, um sindicato entre outros.

Nesse contexto enfatizamos o papel da educação – educação compreendida no seu sentido abrangente tal como defendida por filósofos como Mészáros. Nessa concepção de educação o processo formativo não se reduz a escola, pelo contrário. Mészáros ressalta que, muito do nosso processo contínuo de aprendizagem se situa fora das instituições educacionais formais. De modo que se quisermos romper com a lógica educacional hegemônica, não podemos desprezar os diferentes saberes produzidos fora do ambiente formal. Ele no entanto, não nega a importância da educação formal, e inclusive acredita que apartir do momento que ela conseguir estabelecer um  intercâmbio progressivo com outros processos educativos, que não os formais, poderá realizar suas aspirações emancipadora – poderá contribuir para que os jovens possam se conscientizar politicamente. E a partir dessa tomada de consciência lutar pelos seus direitos e por mais oportunidade.

É importante destacar que em Lajeado algumas políticas do poder público local (em especial a garantia de transporte público universitário gratuito) contribuiu para que na última década o número de jovens com uma melhor formação profissional aumentasse no município. Não há números disponíveis acerca de quantas pessoas foram beneficiadas com essa iniciativa. Aliás seria interessante a Secretaria Municipal de Educação fazer esse levantamento, para que tivéssemos uma ideia melhor da importância dessa política. Ainda que não seja uma política exclusiva para juventude ela é a mais beneficiada. Não tenho dúvida que muitos jovens não teriam condições de cursar um curso técnico ou superior em Palmas se não fosse a garantia do transporte gratuito. 

Por outro lado essa iniciativa é insuficiente para atender todos os jovens que concluem o ensino médio todos os anos no Colégio Estadual Nossa Senhora da Providência. Daí a importância de buscar parceria com instituições de ensino para realização de cursos técnicos e superiores no próprio município. No final de 2019 á prefeitura de Lajeado anunciou parceria com o IFTO (Instituto Federal do Tocantins) para oferta de três cursos técnicos no município na modalidade á distância (EAD), o que sem dúvida é um avanço. Nessa linha é importante que também se pense na oferta de cursos superiores e de pós-graduação. Ainda que na modalidade EAD. 

Conjuntamente com a questão educacional deve se pensar em políticas para aproveitar a mão de obra qualificada que está sendo formada. E isso se dá a partir do investimento em diversas áreas para dinamizar o comércio local e criar novas oportunidades de negócios – como por exemplo no setor de turismo que é sempre lembrado nas campanhas eleitorais – mas só nas campanhas eleitorais. Também tem a pesca, a agricultura, o artesanato entre outros setores que tem potencial para melhorar a economia da cidade e ampliar as oportunidades de trabalho. O que não dá é a prefeitura continuar sendo o maior empregador do município, pois por mais boa vontade que tenha o gestor ou gestora de plantão, é impossível empregar todo mundo que precisa de trabalho na cidade. 

Por outro lado não tem sentido ter mão de obra qualificada na cidade e trazer pessoas de outros municípios para ocupar essas vagas (a não ser que seja por concurso público, onde prevalece o mérito da pessoa e não quem indica e por quê).

Mas como diz os Titãs (a banda) na canção “Comida” – “A gente não quer só comida. A gente quer comida diversão e arte...”. Para juventude então isso é fundamental. E é ausência disso em grande medida responsável pelo discurso de que Lajeado é uma cidade parada. Não há cinema, não há teatro, não há museus, não há exposições artísticas, não há shows musicais, não há livrarias, não há eventos culturais que valorizem a cultura da região (há não ser algo pontual). Em suma, não há eventos artísticos em Lajeado. 

No entanto não quer dizer que as pessoas não se divertem. Até por que não precisam de muito para se divertir – tendo cachaça e som as pessoas se viram. E isso os bares oferecem. Mas se quiser um programa (onde não apenas se divirta mas também aprenda e melhore como ser humano) deve se deslocar para capital. E é o que muitos jovens fazem. 

Diante disso defendemos a necessidade de se pensar em políticas públicas para juventude também no campo cultural – construindo espaços e promovendo eventos para que os jovens tenham acesso a produções artísticas diversificadas. E quiçá futuramente possam se tornar artistas, produzir  e expor seus trabalhos. Talentos a cidade tem, mas esses talentos precisam ser lapidados.

Iniciativas nesse sentido deve ocorrer também no campo dos esportes – que não pode ficar reduzido ao futebol. Lajeado tem diversos talentos em outras áreas como o skate, voleibol, ciclismo, atletismo entre outros que merecem a atenção do poder público.

Enfim, Lajeado precisa avançar muito no que consiste a instituição de políticas públicas para a juventude – políticas públicas que garanta o acesso á educação, saúde,  mercado de trabalho mas também á cultura. Esse é o caminho para que o município consiga evitar que seus jovens tenham que abandonar o lugar por falta de oportunidades. No entanto não acreditamos que isso ocorrerá enquanto a juventude não tomar consciência de que ela é quem deve protagonizar esse processo. E aí quem sabe no futuro quando se perguntar para os jovens o que Lajeado é para eles, teremos uma resposta diferente da atual.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Pós-Graduando em Filosofia e Direitos Humanos. 

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REFERÊNCIAS 

ANDRADE, Carla Coelho de. Juventude e políticas públicas no Brasil. IPEA. Ano 7, Edição 60. Brasília, 2010.

GROPPO, Luís Antonio. Juventude e políticas públicas: comentários sobre as concepções sociológicas de juventude. Desindades. Vol 14. Rio de Janeiro. Mar. 2017.

MÉSZÁROS, István. A educação para além do capital. – 2º ed. – São Paulo: Boitempo, 2008.

domingo, 21 de março de 2021

Reflexões sobre o Bolsonarismo a partir do “Esboço para uma teoria das emoções”, de Jean-Paul Sartre

Por que nos emocionamos? Vamos da alegria a tristeza – do medo a coragem. Sentimos cólera entre outros? É o que busca responder no seu “Esboço para uma teoria das emoções” o filósofo francês Jean-Paul Sartre. Seu objetivo é fazê-lo a partir de uma perspectiva fenomenológica. Nosso objetivo aqui é a partir da leitura dessa obra refletir sobre a conduta emotiva do Bolsonaro e seus correligionários. 

Sartre é um dos grandes nomes da Filosofia e da Literatura na contemporaneidade. Deixou importantes obras nesses dois campos. Entre elas destacam-se: O ser e o nada (1943), O existencialismo é um humanismo  (1946), A náusea  (1938), A idade da Razão (1945). Já a obra em questão aqui foi publicada em 1939 e tem uma forte influência da perspectiva filosófica de Heidegger e Husserl, que ele entrou em contato em 1933 ao ganhar uma bolsa de estudo que lhe permitiu estudar no Instituto Francês de Berlim (Alemanha).

Em “Esboço para uma teoria das emoções”, Sartre inicia pontuando as diferenças entre uma abordagem fenomenológica e uma abordagem psicológica. É a partir daí que ele afirma que o fenomenólogo deve buscar o significado da emoção. Esse significado é o todo da consciência humana – que não vem de fora, como é o caso da alegria e da tristeza. Mas que certamente busca algo além. 

Sartre nos dirá que a emoção é uma forma organizada da existência humana. Desse modo ela precisa ser abordada como um fenômeno. Nosso filósofo se opõem fortemente a perspectiva de que a emoção seria desordem ou um caos puro em relação ao nosso ser psíquico com o mundo. 

Ao analisar algumas teorias clássicas sobre a emoção, em especial a de W. James – que vê a emoção como grupos de fenômenos. A saber, os Psicológicos  (Estado de Consciência) e os Fisiológicos  (Consciência das manifestações). E a teoria de Janet que a vê como uma conduta – discordando de que a mesma seria apenas distúrbios fisiológicos, mas também consciência de um fracasso e de uma conduta de fracasso. Sartre reafirma a visão de que a conduta emocional não é de modo algum reflexo de uma desordem. Pelo contrário, é um sistema organizado de meios que visam a um fim.

Nosso filósofo dirá que esse sistema organizado é usado para mascarar, substituir, rechaçar uma ação que não se pode ou não se quer assumir. Um bom exemplo que nos ajuda a entender melhor essa questão é a diferença entre o nosso comportamento na vida real e nas redes sociais (virtuais). Sartre salienta que do ponto de vista psicológico somos nos que nos colocamos em estado de inferioridade e agimos de forma medíocre, buscando soluções grosseiras. Nesse contexto, para o nosso filósofo, a cólera é uma evasão.

 O exemplo da conduta de Bolsonaro e seus correligionários, nos faz compreender bem essa questão. O discurso de ódio é sempre utilizado como uma fuga do problema ou como uma tentativa de desviar o foco da discussão. Analisando a teoria psicanalítica, Sartre nos diz que não é possível compreender a emoção se não buscarmos uma significação – que está na consciência e não fora dela. De modo que para descobrir essa significação a consciência deve ser interrogada de dentro para fora e não o contrário. 

Para Sartre tudo o que se passa na consciência só pode ser compreendida a partir da própria consciência. O que significa dizer que os fatos emotivos só podem ser compreendidos pela própria consciência. Nosso filósofo afirma que a partir da perspectiva psicanalítica, a consciência que se faz ela mesma consciência. E a partir dai organiza a emoção como resposta a uma situação exterior. 

Analisando a conduta do Bolsonaro a partir dessa perspectiva podemos afirmar que a indiferença expressa nas suas ações diante das milhares de vítimas da sua política de combate ao Coronavírus. É na verdade uma conduta organizada para esconder a sua culpa. Muitas vezes pensamos que as suas declarações são irrefletidas. E podem  até ser. Mas é importante se atentar para o que diz Sartre ao apresentar o seu esboço sobre a teoria fenomenológica, ele diz que uma conduta irrefletida não é inconsciente. Ela é consciente dela mesma.

A partir da perspectiva fenomenológica, Sartre define a emoção como transformação do mundo. Pois mesmo quando não há mais perspectivas não deixamos de agir. Ao agir não podemos evitar o perigo, e  não podendo evitar eu nego. É  A partir daí que compreendemos o medo – como uma consciência que visa negar através de uma determinada conduta. 

A partir dessa perspectiva podemos fazer um paralelo com o discurso negacionista do Bolsonarismo. Tal discurso reflete a incapacidade de se buscar uma  mudança de conduta, que levaria a uma mudança de situação. Na verdade o que se quer é mudar a situação sem mudar a conduta, o que dificilmente ocorrerá.

Para o nosso filósofo a emoção é sofrida, tendo em vista que a sua origem é uma degradação espontânea e vivida da consciência diante do mundo. Ele também chama atenção para o fato de que a consciência é vítima  de sua própria armadilha. Por exemplo em relação ao medo, quanto mais se foge mais medo se tem. Para Sartre a emoção é a intuição do absoluto. Perceber um objeto qualquer como horrível é percebe-lo sobre o fundo de um mundo que se revela como sendo horrível. No caso de Bolsonaro o que temos é o ódio e a indiferença como válvula de escape, quanto mais negacionismo mais ódio e indiferença. Para concluir, Sartre nos diz que junto com a consciência emotiva sempre há uma reflexão cúmplice que percebe. Isto é, há sempre uma justificativa para minimizar determinadas condutas. Como se diz popularmente, “passar a mão na cabeça”.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Pós-Graduando em Filosofia e Direitos Humanos. 

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Referência: SARTRE. Jean-Paul. Esboço para uma teoria das emoções. Tradução de Paulo Neves. - Porto Alegre. L&PM, 2008.

quarta-feira, 17 de março de 2021

A importância da sistematização na Educação Formal

“Se conseguimos fazer da sistematização uma prática constante, há mais possibilidades de realizarmos um trabalho adequado a realidade...”. 

Na perspectiva da educação popular a sistematização das experiências é um fator importante para que se tenha consciência dos avanços e limites no caminho formativo traçado. E a partir daí, corrigir a rota se necessário, ou aprofundar o caminho. Ora, sistematizar não se resume a fazer relatos de experiências ou preencher planilhas como ocorre na educação formal. Mas também de um momento importante de reflexão sobre a nossa prática enquanto educadores. 

Nesse sentido, afirmamos a importância da sistematização na práxis educativa. Porém na educação formal precisamos compreendê-la para além de uma simples exigência por parte da burocracia estatal. Sendo assim o nosso ponto de partida deve ser entender o que é sistematizar, pois, se não sabemos o que é, certamente não iremos compreender a sua importância. Logo, compreender a importância da sistematização passa por saber o que é sistematizar. E o que é sistematizar? 

De acordo com Antônio Fernando Gouvêa da Silva (2007), a partir do texto “Sistematização”, do Programa Popular, Instituto Cajamar, sistematizar é “realizar um processo coletivo de análise crítica das práticas desenvolvidas, a partir dos registros feitos ao longo da construção de tais práticas”. A partir dessa afirmação podemos destacar alguns pontos. Primeiro, a ênfase no coletivo, afinal de contas a nossa prática educativa se desenvolve no coletivo. O segundo é a análise crítica das práticas desenvolvidas para que consigamos ir até a raiz do problema. E terceiro a importância do registro acerca das nossas práticas. Geralmente na educação formal quando se fala em sistematização o foco é nesse terceiro ponto, já o segundo e o primeiro são negligenciados 

Ainda na linha de entendermos o que é sistematizar, Antônio Fernando Gouvêia da Silva (2007) nos chama atenção para alguns aspectos importantes como o fato de que a sistematização deve ser um processo permanente que vai nos possibilitar aprender e construir conhecimentos coletivos. Para o nosso autor (2007) “a sistematização possibilita chegar a uma maior consistência, tanto teórica, quanto metodológica, e, principalmente, a uma reorganização e ao redimensionamento da prática, enquanto ação transformadora da realidade”.  

Em suma, a sistematização nos possibilita um domínio sobre a nossa prática educativa, sobretudo se se tem como perspectiva uma ação transformadora. Como isso é possível na educação formal com todos os limites que o sistema de ensino impõe? Não tenho uma resposta para essa questão. Mas creio que o processo de sistematização numa perspectiva transformadora (que é essa que estamos defendendo aqui) nos possibilitará encontrar uma resposta. 

Bom, sabemos o que é sistematizar. A pergunta que vem agora na nossa cabeça é: para que sistematizar? Antônio Fernando Gouvêa da Silva (2007) nos diz o seguinte: “para identificar, reconhecer os diferentes momentos do processo, situar as características que definem cada um deles e explicar por que e como eles se relacionam e se articulam”. Em suma, para saber onde estamos e por que estamos em um determinado estágio e não em outro. Isto é, compreender melhor o contexto, ter consciência dos nossos limites, mas também da nossa capacidade de agir. 

Depois de sabermos o que e para que sistematizar. É hora de refletirmos sobre quando e como sistematizar. Para tanto continuemos com Antônio Gouvêia da Silva. Sobre a questão de quando sistematizar já vimos mais acima. Mas é importante reafirmarmos. De acordo com nosso autor (2007) é fundamental que seja “um exercício permanente, concomitante ao próprio desenrolar da prática. É o que chamamos de práxis (numa perspectiva Marxiana). Isto é, compreender a relação entre teoria e prática para que possamos ter uma ação transformadora. 

Já em relação a questão de como sistematizar. O nosso autor dirá que não existe uma fórmula de como fazê-lo. Porém destaca alguns pontos que devem ser levados em consideração, entre eles: 1- Registro das atividades desenvolvidas e a descrição dos fatos e processos significativos; 2- Interpretação e analise dos fatos; e 3- Instrumentalização para retorno à prática. Em suma, é a práxis freiriana fundamentada no tripé: Ação, Reflexão, Ação. 

Acredito que é possível e necessário o desenvolvimento dessa práxis no ensino formal. E o desenvolvimento dessa práxis passa necessariamente por um processo de sistematização numa perspectiva transformadora. E isso não será possível através de medidas de cima para baixo. Mas a partir da consciência dos próprios educadores. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Pós-Graduando em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente trabalha como Professor da Educação Básica no CENSP-Lajeado. 

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REFERÊNCIA: SILVA, Antônio Gouvêia da. A busca do tema gerador na práxis da educação popular. Curitiba: Editora Gráfica Popular, 2007. 

sábado, 13 de março de 2021

Eu também vou comentar: Sobre a anulação das condenações do Lula

No ritmo de torcida de futebol que se transformou a nossa política essa semana foi como se um time tivesse se sagrado campeão de um importante campeonato. Sim, estou falando da decisão do Ministro do Supremo Tribunal Federal que anulou as condenações do Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, provocando uma tsunami de postagens nas redes sociais, tanto contra como a favor do Lula. 

Confesso que não fui afetado pela euforia dos que comemoraram, nem pelo ódio dos que discordam da decisão. Mas de tristeza por ver que parte significativa da militância progressista coloca nas mãos de um “porvir” a possibilidade de mudança do contexto caótico que estamos vivendo. Ainda mais quando esse “porvir” seria a eleição (dentro do jogo democrático burguês) de uma espécie de “salvador”. É meus camaradas, já vimos essa história algumas vezes e sabemos bem como ela acaba.

Bom, não entro aqui no mérito da decisão do Ministro Edson Fachin. Mas é importante ressaltar que desde que o site The Intercept Brasil tornou público uma série de mensagens trocadas pelo então Juiz Sergio Moro com os Promotores da Operação Lava jato. É impossível negar que não houve fraude processual contra o Ex-presidente - Luiz Inácio Lula da Silva. Por outro lado, não creio que se acredite cegamente que Lula é totalmente inocente das acusações que pesam sobre ele. Caberá a justiça (da classe dominante) definir se ele é culpado ou inocente. Até por que no meu caso, não tenho formação jurídica como também não estudei essas acusações a fundo para poder expressar qualquer juízo a respeito.

É importante chamar atenção para esse aspecto, pois para alguns é como se a decisão do Juiz Edson Fachin tivesse declarado que Lula é inocente. E não foi o que aconteceu, o que aconteceu foi a anulação de processos que deveriam ter ocorrido em outro Tribunal Regional, no caso o de Brasília e não de Curitiba. A decisão, portanto, é que se corrija esse erro processual. No entanto nada garante que ao final o resultado não seja o mesmo, isto é, a condenação do ex-presidente. Até por que ao que parece a decisão parece mais favorecer a Sérgio Moro, que poderia escapar das acusações de suspeição, do que o próprio Lula.

Analisando todo esse cenário, para mim duas questões se evidenciam: o desespero e a falta de perspectiva por parte dos setores progressistas brasileiros. Ora, não há outra definição se não de desespero e falta de perspectiva colocar numa “possível” candidatura do Lula em 2022, a esperança de derrotar o Governo Bolsonaro.

Até lá o que fazemos? Continuaremos de braços cruzados ou destilando ressentimentos nas redes sociais enquanto Bolsonaro aprofunda seu projeto de espoliação dos direitos dos trabalhadores e desmonte do Estado? Ficaremos assim a espera de uma nova eleição onde tudo pode mudar ou aprofundar o que aí está? Pobre de nós, pobre de nós. 

Lula, inegavelmente, contínua sendo um grande líder político do campo progressista no Brasil, quiçá da América Latina. Mas é importante não se esquecer das suas contradições, sobretudo enquanto Governo. Foram muitos erros cometidos durante os seus mandatos (e os de Dilma). No entanto esses erros não são assumidos e não se vê uma autocrítica por parte do Partido dos Trabalhadores  (PT). De modo que o campo progressista não pode colocar na mão de Lula e do seu partido as perspectivas de mudanças – mudanças necessárias para destruir a ordem dominante. 

Certamente tanto Lula como o Partido dos Trabalhos tem um papel importante nesse processo, restará saber se utilizaram esse poder para fortalecer um projeto comum da esquerda ou do Partido. Quanto ao campo progressista a tarefa imediata contínua sendo o trabalho de base e a luta pelo impeachment do Bolsonaro. Pois, para finalizar, repito, é inaceitável que coloquemos as nossas perspectivas de mudanças numa eleição futura numa “possível” candidatura do Lula. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Pós-Graduando em Filosofia e Direitos Humanos.