Á Maria Lúcia, minha
mãe.
Esses
dias Maria Lúcia chegou horrorizada do Supermercado com uma cena que
presenciou. Segundo ela um pessoal que descarregava uma carga de banana para
ser comercializada no local, jogou um produto com um cheiro muito forte nas
frutas. Sabendo de qual produto se tratava ela logo deduziu que o objetivo era
acelerar o processo de amadurecimento das bananas.
Trata-se
do veneno popularmente conhecido como “mata-mato” (composto de carbono e
fósforo e que tem no gliofosato seu principal agente ativo). Não existe
controle na venda do produto, de modo que qualquer um pode adquiri-lo, e também
não há controle em como e no que o veneno será utilizado. Por essas bandas ele
é bastante utilizado para limpar as ervas daninhas dos quintais. Mas também em
lavouras no processo de “dessecação” preparando a terra para o plantio. No caso presenciado por Maria Lúcia – para
acelerar o processo de amadurecimento das frutas. Pois quanto mais rápido
amadurecem, mais rápido podem ser comercializadas. E quanto mais rápido são
comercializadas mais lucro vai para o bolso dos produtores e comerciantes.
Mais
e os consumidores? Como fica a saúde de quem consome esses produtos a base de
veneno? Não precisa ser um especialista para saber que o consumo desses
produtos faz um estrago considerável no nosso organismo. E foi isso que deixo
Maria Lúcia horrorizada – o fato de que estamos nos alimentando de veneno. Isso
que o que ela viu foi apenas a ponta do “iceberg”. A produção de alimentos com
a utilização de venenos altamente perigosos para saúde do seres humanos é um
caso sério. O documentário “O Veneno está na Mesa” do Silvio Tendler nos dá uma
idéia dessa realidade, como também uma série de pesquisas que apontam o risco
de provocar câncer tanto em quem consome como em quem produz. Sem falar nos
problemas hormonais apontados pela pesquisadora Larissa Bombardi – autora do
atlas “Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Européia”.
Boa
parte dos problemas apontados pelos pesquisadores em relação ao uso de
agrotóxico é ligado ao processo de produção nas lavouras. Mas no caso
presenciado por dona Maria Lúcia o caso é ainda mais alarmante. O veneno estava
sendo aplicado nas frutas na porta do supermercado e logo seguiram para
comercialização. De modo que o efeito nocivo a saúde de quem consumir aquelas
frutas será muito maior.
Outro
ponto importante que não se pode perder de vista é a questão ambiental. Pois a
utilização desses venenos na produção de alimentos traz enormes prejuízos ao
meio ambiente. Entre eles o extermínio da biodiversidade.
Em
relação a essa questão um bom exemplo é a morte das abelhas. Em uma reportagem
recente, Pedro Gregori (Agência Pública) afirma, que em três meses apicultores
encontraram meio bilhão de abelhas mortas, sendo que em cerca de 80% dos exames
feitos foram encontrados agrotóxicos. E o que isso acarreta? Uma alteração na
cadeia alimentar. Pois segundo a pesquisadora Carmem Pires “as plantas precisam
das abelhas para formar suas sementes e frutos, que são alimento de diversas
aves, que por sua vez são a dieta alimentar de outros animais”.
Mesmo
diante de todo esse contexto o interesse econômico fala mais alto. Por isso o
Brasil – que já é campeão no consumo de agrotóxico a nível mundial – ao invés
de estar discutindo como evitar que isso avance. Segue no caminho contrário
defendendo a flexibilização da lei que regulamenta o uso de agrotóxico – uma
lei que já e por demais flexível. Pois permite, por exemplo, que se utilize em
terras brasileiras 22 tipos de agrotóxicos que são proibidos na Europa. Um
desses é o glifosato que é o principal agente ativo do veneno “mata-mato”. Isso
mesmo, aquele que dona Maria viu sendo aplicado nas bananas em um grande
Supermercado e que serão consumidas por vários cidadãos lajeadenses.
No
Tocantins, nos últimos anos, órgãos de fiscalização vêm comemorando o aumento
da devolução de embalagens de agrotóxicos pelos produtores. Dados de 2017
aponta que foram devolvidas cerca de 722,3 toneladas de embalagens. Isso mesmo,
você não leu errado, toneladas. Ora, isso não deveria ser motivo de comemoração,
mas de preocupação. Pois significa que há uma quantidade muito grande de
agrotóxico sendo aplicado nas lavouras tocantinenses. E se levarmos em
consideração que nem todos os venenos têm sua venda e aplicação controladas
(como no caso do mata-mato) e que, portanto as embalagens são descartadas de
qualquer jeito devemos ficar mais preocupados ainda.
Até
por que não são raros os casos de “intoxicação por agrotóxico no Estado do
Tocantins”. Como aponta Silva (2016) em um estudo importante onde ele chama
atenção dos gestores da Saúde para esse problema. De acordo com este autor “há
indícios de que o consumo de agrotóxico agrícola no Tocantins tem impactos
significativos no ambiente e na saúde da população, principalmente nos
trabalhadores rurais e seus familiares”. Numa pesquisa consistente com vários
dados Sérgio Luiz de Oliveira Silva revela aquilo que a propaganda do
agronegócio esconde – as contradições de um modelo agrícola nefasto.
Se
todos tivessem consciência disso não tenho dúvidas que ficariam horrorizados
tal como ficou dona Maria Lúcia diante da cena que viu. Mas não basta o espanto
– é preciso agir. E essa ação deve se dá em duas frentes: No campo político -
enfrentando os ruralistas e os seus representantes nos parlamentos. E no campo
educacional – conscientizando a população dos riscos para nossa saúde da
produção e consumo de alimentos com agrotóxicos. Isso no atual contexto é uma
tarefa por demais difícil, mas para quem não concorda com esse estado de coisas,
não há alternativa.
Pedro Ferreira Nunes – É “apenas um
rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo
do interior”.
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