sexta-feira, 8 de março de 2019

Em tempos medíocres, algumas lições de filosofia que os políticos deveriam aprender.

A mediocridade tomou conta do ambiente político nacional. E tem na principal figura representativa da república (o presidente Jair Bolsonaro) a expressão maior desse novo paradigma – onde os imbecis são exaltados e pensar de forma racional tornou-se um crime. Por tanto, não é de se admirar, que nesse contexto se questione o ensino de Filosofia no Ensino Médio e se defenda o retorno da disciplina de Moral e Cívica como no período da Ditadura Militar. 

A filosofia vai na contramão do discurso medíocre. Nos legando importantes lições que todos nós deveríamos aprender, sobretudo os políticos. Elencaremos aqui, seis delas: Debater de forma racional; Reconhecer nossos erros; Não roubar; Se defender das mentiras; Saber diferenciar aparência de essência; E lembrar que muito dos novos problemas na realidade existem há séculos. Antes, de nos adentrarmos em cada uma dessas lições, é importante salientar o que afirma Hancock (2018) acerca do fato de que “a filosofia não nos faz pessoas melhores, porém nos proporciona ferramentas para analisarmos nossas decisões”. Sobretudo se elas são pautadas em um processo racional ou se nos deixamos guiar pelas emoções meramente.

A primeira lição que a filosofia nos dá é que o debate de idéias e posições deve se desenrolar de forma racional. E o que seria debater de forma racional? O primeiro ponto é que num debate racional não pode haver desqualificação – quando há desqualificação é um sinal de que falta argumento. Infelizmente é o que mais tem ocorrido no cenário político nacional – é só verificar as diversas noticias sobre bate bocas e trocas de acusações. Um exemplo emblemático bem recente foi à eleição da presidência do senado federal. Ora, o debate racional pressupõe algumas regras como, por exemplo, respeitar o outro – o que não significa que você tenha que concordar. Nessa linha um filósofo que nos ajuda muito a refletir sobre essa questão é o alemão Habermas com sua “Ética do discurso”.

A segunda lição que a filosofia nos dá é acerca da necessidade de reconhecermos nossos erros. Pois afinal de contas como diz um velho dito popular “errar é humano”. Todos nós erramos, e os políticos não são exceções. O problema é quando você erra e não reconhece que errou. Como no recente episódio que Sr. Bolsonaro postou numa rede social um vídeo com conteúdo erótico para criticar genericamente o carnaval. E ao ser questionado ao invés de reconhecer o erro encarou as críticas como insulto. Ora, quando não reconhecemos os nossos erros estamos fadados a repeti-los. Isso de certa forma explica por que o atual governo, e, sobretudo Bolsonaro tem errado tanto. 

Ainda nessa linha, uma questão importante na filosofia ressaltada pelo professor Eduardo Infante é que um diálogo não é uma competição onde se tenha que derrotar o outro. Pelo contrário, há que se reconhecer “que en el discurso del outro también hay verdad”.

A terceira lição nos parece bastante obvia. Ninguém em sana consciência dirá que é certo pegar aquilo que não lhe pertence. Para tanto não precisamos nem ser especialistas em Ética. Ora, mas se todos fazem, por que não fazê-lo? É o que muitos dizem. Com isso se apropriar daquilo que não lhe pertence tornou-se algo banal. E infelizmente essa é uma realidade bem conhecida por nós brasileiros – o mau da corrupção que assola toda a sociedade e não apenas um partido político como alguns nos tenta fazer crer. Carrasco Conde, citando Kant, afirma que isso se dá por que usamos os demais seres humanos como meios e não como fins em si mesmos.

A questão da Ética é um tema caro pra filosofia desde os seus primórdios. É só lembrarmos, por exemplo, que uma das obras clássicas de Aristóteles é “Ética a Nicômaco”. Spinoza, Kant, Adolfo Sanchez Vasquez entre outros filósofos também se dispuseram a refletir sobre essa problemática. De modo que a filosofia tem muito a nos dizer acerca dessa questão. Sobretudo a respeito de que agir corretamente não deve ser um principio seguido apenas pelos políticos, mas por todos os indivíduos na sociedade. Até por que não se pode perder de vista que os políticos são frutos da sociedade, se eles são corruptos é por que vivemos numa sociedade corrupta. 

A quarta lição é aprender a se defender das mentiras. Pois por mais questionável que seja, o fato é que os políticos usam mão delas para alcançar seus objetivos. Não raramente eles têm que dar explicações acerca dessas mentiras que são ditas, sobretudo no processo de campanha. Um bom exemplo é o que dizia Sérgio Mouro (Ministro da Justiça) antes de compor o governo Bolsonaro sobre o Caixa 2 e o que diz agora no seu projeto Anticrime. Para Hancock (2018) quando mentimos para alguém com o objetivo de conseguirmos seu voto, estamos usando essa pessoa como uma ferramenta em nosso próprio proveito. Isso ocorre e continuará ocorrendo. Por isso que para a filosofia não é importante nem tanto o fato dos políticos mentirem. Mas sim como evitar para que não sejamos enganados por essas mentiras. E um caminho para tanto, seria não nos deixar levar pelo marketing e a propaganda.

Chegamos então à quinta lição que a filosofia nos dá, que é saber diferenciar aparência de essência. O velho Marx já nos alertava para o fato de que a aparência não corresponde à essência. Pois a aparência ao mesmo tempo que revela, oculta. De modo que não basta vê a aparência, precisamos buscar compreender a essência das coisas. É a partir daí que as transformações são possíveis. Quando os políticos ficam nas aparências mostram que não querem mudar nada, mas apenas maquiar a realidade. Um bom exemplo para compreendermos melhor essa questão foi à carta do ministro da Educação do Governo Bolsonaro pedindo que as escolas gravassem as crianças cantando o hino nacional, com o slogan de campanha do presidente eleito – uma medida que seria simplesmente para fazer propaganda oficial do Governo tentando esconder a falta de capacidade de apresentar algum projeto relevante que mude a realidade da educação brasileira. Ainda em relação a essa quinta lição, Eduardo Infante afirma que “la filosofia se preocupa por buscar el ser detrás de las apariencias”. Eis por que ela incomoda tanto.

Por fim, a sexta lição que a filosofia nos ensina é que muito dos problemas que achamos que são novos, na verdade são antigos. O que podemos verificar ao estudar a história da filosofia. Não é raro ouvir daqueles que estão lendo alguma obra filosófica escrita há séculos, um ar de surpresa com a atualidade das questões trabalhada pelos autores. Isso mostra que os problemas levantados pelos diversos filósofos não foram superados. No entanto é preciso olhar-los no contexto histórico que foram escritos e com quem dialogavam. O que não quer dizer, no entanto, que não são relevantes para compreendermos os problemas que enfrentamos hoje. Nesse sentido é importante as palavras de Carrasco Conde de que a história da filosofia não é só história do passado. 

Referência

6 lecciones de filosofía que los políticos podrían haber aprendido. Disponivel: https://verne.elpais.com/verne/2018/10/19/articulo/1539947599_056178.html

Pedro Ferreira Nunes – É “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”.

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