terça-feira, 7 de maio de 2019

Freud “Psicologia das Massas e Análise do EU”

“Não há tempo há perder
as engrenagens não podem parar.
Não há tempo pra pensar
não há tempo pra sofrer...”.
Inocentes

Por Pedro Ferreira Nunes

Para tratar da Psicologia das Massas Sigmund Freud (1856-1939) partirá da contribuição de dois autores: Le Bon – especialmente a descrição que esse autor faz da alma coletiva. E McDougall que trabalha a organização da massa. Freud, no entanto, vai além, ao enfatizar que mais do que compreender o que é uma massa, é preciso entender como ela adquire a capacidade de influenciar de modo decisivo a vida psíquica do indivíduo.

Freud concorda com a descrição que Le Bon faz da alma coletiva, sobretudo de que “a massa é impulsiva, volúvel, e excitável” – ainda que apontando algumas críticas, por exemplo, quando Le Bon descreve as novas características que o indivíduo adquire ao entrar numa massa, a saber: um sentimento de poder invencível, o contagio mental, e a sugestionabilidade. Para Freud é evidente que a segunda e a terceira não são do mesmo tipo. Porém Le Bon não deixa isso bem claro. 

Mas a principal crítica de Freud a Le Bon é acerca do papel do líder e a importância do prestigio – para Le Bon o prestigio pode ser adquirido de forma artificial ou pessoal. Para Freud isso não “se harmonizar com a sua brilhante descrição da alma coletiva”. É por isso que mais adiante ele trará a questão libidinal como um fato importante para compreender a relação entre o líder e a massa. Uma relação que vai além do prestigio.

Freud chama atenção para “outras abordagens da vida anímica coletiva”. Segundo ele apesar de autores como Le Bon terem feito uma boa descrição da alma coletiva, é preciso “reconhecer outras manifestações da formação de massas, atuando em sentido contrário, e que devem conduzir a uma bem mais alta avaliação da alma coletiva”. É então que ele analisará a contribuição de McDougall – que se desenvolve, sobretudo em torno do processo de organização da massa. Essa organização é que difere a massa de uma multidão, por exemplo. 

Para Freud esse esforço de organização da massa é a busca em prove-la “daquelas mesmas qualidades que eram características do indivíduo e que nele foram extintas pela formação da massa”, por exemplo, uma identidade particular que a diferencia de outras massas. A partir dai surge uma questão que também carece de analise que é a afetividade.

Num interior de uma massa o indivíduo sofre uma intensa transformação. Por um lado, a sua afetividade é intensificada, por outro a sua capacidade intelectual diminui. De modo que é impossível compreende-lo a partir unicamente da perspectiva racional. Freud defende que não é possível compreender o indivíduo na massa sem a questão do libido – da afetividade. Ele defende que as relações de amor também constituem a alma coletiva. “Se o indivíduo abandona sua peculiaridade na massa e permite que os outros o sugestionem, que ele o faz por que existe nele uma necessidade de estar de acordo e não em oposição a eles, talvez, então, por amor a eles”.

Outro ponto importante abordado por Freud é acerca dos diferentes tipos de massa, por exemplo: Passageiras e duradouras, homogêneas e não homogêneas, naturais e artificiais, primitivas e diferenciadas. Ele, porém, se desdobrará na análise de duas massas artificiais – igreja e exército. Que também podem ser definidas como duradouras, não homogêneas e diferenciadas. Em suma, massas que não são organizações simples. E o ponto fundamental para essa análise é o fator libidinal que existe no interior dessas organizações (tanto exército como a igreja) mantendo a massa coesa.

Para mostrar como a essência da massa reside nas ligações libidinais, Freud trás o exemplo do pânico, que pode ser notado sobretudo no exército. “o pânico surge quando uma massa desse tipo se desintegra. É caracterizado pelo fato de as ordens do superior não serem mais ouvidas e cada um cuidar apenas de si, sem consideração pelo demais. As ligações mútuas cessaram, e uma angústia enorme e sem sentido é liberada”.

Nas massas os instintos amorosos estão desviados de suas metas originais, o que não significa que aja menos energia. Segundo Freud: “Já notamos, no quadro do habitual investimento sexual de objeto, fenômenos que correspondem a um desvio do instinto em relação a seus fins sexuais. Nós os descrevemos como graus de enamoramento, e reconhecemos que envolvem certa diminuição do Eu”.

Além dessas questões apresentadas brevemente acima, Freud também abordará a questão da identificação – a mais antiga manifestação de uma ligação afetiva a uma outra pessoa. E o instinto gregário – a compreensão do homem como um animal de horda, membro individual de uma horda conduzida por um chefe. Entre outros pontos.

Trata-se de uma obra bastante rica, cuja leitura, contribui sobremaneira para compreendermos um pouco melhor não só a conjuntura política do nosso país (o fenômeno Bolsonaro) como também o que vem ocorrendo em outras partes do globo como a crise na Venezuela e a ascensão da extrema direita na Europa e nos Estados unidos da América.

REFERÊNCIAS

FREUD, Sigmund. Psicologia das Massas e Análise do EU. Volume Autônomo. Editora Psicanalítica internacional: Viena, 1921.

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