segunda-feira, 20 de junho de 2022

Qual o sentido de fazer uma avaliação que não tem nota?

Eis a pergunta que um estudante me fez durante uma aula de revisão do Componente Curricular de Ensino Religioso. Respondi prontamente que pelo conhecimento. Afinal de contas, me parece óbvio, que estudamos em busca do conhecimento. Desse modo a nota é, ou deveria, ser secundária. Então, outro estudante me questionou: - mas sem nota não passamos de ano. Tentei argumentar que se você estuda e adquiri conhecimento sobre determinado objeto, a nota será uma consequência óbvia. 

Encerramos a discussão mais aquilo ficou na minha cabeça. Fiquei pensando comigo que se a partir do nosso processo de ensino-aprendizagem o estudante constrói a ideia de que a nota é mais importante do que o conhecimento, então estamos falhando.

Compreendo que estamos imersos numa sociedade dominada pela cultura do útil, isto é, “do que eu ganho com isso”. Como a escola não esta isolada do resto da sociedade isso acaba refletindo nas Salas de aula. Qual professor nunca ouviu a frase: - Isso vale quanto ponto, professor? Se não valer ponto não vou fazer não. E por aí em diante. No entanto, não deveriamos reforçar isso – o que me parece que acontece, sobretudo por parte do sistema de ensino que, por exemplo, mede a qualidade da educação, a partir das notas obtidas em provinhas e provões.

É também por essa lógica que se definirá quem terá sucesso nos vestibulares, Enem e outros similares na definição de quem consegue uma vaga num curso universitário. A nota se torna por tanto um instrumento de seleção entre os capazes e os incapazes. E por tanto de exclusão dos que não obtém sucesso nesse processo.

A nota é também um instrumento de coerção, utilizada para coagir o estudante a seguir as regras, a se submeter a autoridade do professor na sala de aula. Se você é professor provavelmente já ouviu (ou disse) – na hora da avaliação fulano me paga. 

No contexto pandemico muito se falou da necessidade de repensarmos o nosso método avaliativo. E agora por último, na Rede Estadual de Educação, há uma recomendação para não deixar nenhum estudante ficar a baixo da média (7,0). Como era de se esperar isso causou a revolta de parte dos Professores que viu a medida como um estímulo para que o estudante se acomode e não leve a sério o seu processo formativo – um argumento que reafirma o que dissemos sobre o equívoco de colocar a nota acima do conhecimento.

Não estou aqui querendo me colocar acima desses profissionais, pois como um professor imerso nesse ambiente acabo reproduzindo essa prática naqueles componentes curriculares que dão nota. No entanto, tenho feito um esforço reflexivo na busca de alternativas de avaliações – sempre com a preocupação de não punir o estudante, mas também não flexibilizar ao ponto de transformar esse processo num faz de conta.

O problema é que o mesmo sistema de ensino que nos cobra flexibilidade no momento de avaliar acaba nos amarrando, pois no final das contas o que importa são os números. Daí você tem que quantificar o conhecimento que o estudante adquiriu numa nota. E acaba sendo mais cômodo isso ser feito através de uma avaliação verificadora de conteúdo  (por meio de questões objetivas). 

O que é uma contradição já que o discurso agora é que o ensino se dá a partir do desenvolvimento de habilidades e competências. Por outro lado, se não for assim, como esses estudantes estarão preparados minimamente para disputar uma vaga numa Universidade?

Enfim, no final das contas acho que o estudante tinha razão. Não tem sentido fazer uma avaliação que não tem nota. Se a dinâmica do sistema é colocar a nota como mais importante que o conhecimento é uma perda de tempo por parte do estudante estudar para algo que não influe no seu sucesso final, isto é, passar de ano. Se fosse diferente aí sim, precisaríamos rever.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente é Professor da Educação Básica no CENSP-LAJEADO.

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