✔Uma das principais críticas que tenho ouvido sobre a nova dinâmica do Ensino Médio é que os estudantes não estão tendo liberdade para escolher os itinerários formativos, como prometido. Pois a falta de condições estruturais das escolas, e de profissionais qualificados, não permite que essa escolha seja feita;
✔É importante lembrar que foi promessas como essa que proporcionou um apoio de 80% a reforma, através de uma consulta realizada pelo Governo Michel Temer. Ora, era evidente, que quem conhece as condições estruturais das escolas públicas, sobretudo no interior do interior do Brasil, sabe que isso é impossível;
✔Não me surpreende os problemas que vem ocorrendo com a implantação da nova grade curricular do Ensino Médio. Sobretudo por que essa mudança foi meu objeto de análise no trabalho de conclusão de curso na graduação em Filosofia, intitulado de uma reflexão sobre a reforma do ensino médio a partir de Marcuse e Mészáros;
✔Esse trabalho me proporcionou entender a lógica por trás das mudanças propostas. E creio, me preparou para enfrenta-lá com mais tranquilidade a partir do chão da escola;
✔Enquanto professor de uma escola, não temos a opção de querer ou não a nova configuração do currículo escolar. Mas podemos resistir de outras formas. Como? Negando a lógica dominante que busca impor uma racionalidade tecnológica e restaurar o papel da crítica por meio de uma pedagogia radical nos moldes do que defendia Marcuse. Ou seja, aproveitar as contradições do sistema para jogar contra o sistema;
✔Um exemplo prático é o componente curricular de Projeto de Vida. Criado numa lógica para formar corpos dóceis para o mercado de trabalho, podemos nos apropriar dele e trabalha-lo numa perspectiva filosófica por meio de uma metodologia problematizadora;
✔As eletivas e trilhas de aprofundamento também são espaços que podemos disputar para recuperar e ampliar os espaços perdido pela área de humanas;
✔Ou seja, se é verdade que a nova estrutura curricular do ensino médio, nos trás uma série de limites, também há possibilidade de subversão da lógica imposta. Por que no final das contas quem concretiza o currículo é a professora e o professor na sala de aula;
✔Diante disso, não acredito que o caminho é a revogação do Novo Ensino Médio. Sobretudo se for para retornar a concepção que tínhamos anteriormente, que sejamos honesto, estava longe de ser progressista;
✔Precisamos sim defender mudanças que rompa com a lógica voltada para construção de uma racionalidade tecnológica. Essas mudanças só tem sentido se forem feitas a partir do chão da escola. Ou seja, ouvindo professores e estudantes;
✔Nesse sentido, no início do ano, já colocamos em debate o lugar da Filosofia e das Ciências Sociais nas trilhas de aprofundamento da Rede Estadual da Educação do Tocantins. Creio que é um debate mais necessário no contexto atual do que a bandeira pela revogação do novo ensino médio;
✔Aliás se levarmos adiante a pauta pela revogação do novo ensino médio devemos nos questionar qual a força que temos no congresso nacional para aprovar uma reforma progressista. Não nos esquecemos que temos um dos parlamentos mais conservadores da história;
✔Acredito que podemos restaurar o pensamento critico sem necessariamente revogar a nova estrutura curricular. Óbvio que isso passa pela necessidade de formação dos professores para que compreendam de fato a nova dinâmica e a partir daí consigam subverte-la;
✔Para que tenhamos mais força nesse debate precisamos estar organizado enquanto professores que atuam na educação básica. Nesse sentido é interessante iniciativas como dos professores de Filosofia no Ceará que criaram uma associação, em São Paulo já existia e também há uma discussão na Associação Nacional de Pós-graduação em Filosofia (ANPOF) nesse sentido;
✔Um dos papéis dessa associação seria de reivindicar o ensino de Filosofia na Educação Básica com profissionais formados na área. Nesse sentido, fazer o enfrentamento para que tenha mais vaga nos concursos públicos para esses profissionais. Por exemplo, no concurso da educação do Tocantins há apenas 56 vagas num estado onde temos 139 municípios. No entanto não houve nenhum questionamento ao edital. Por que não houve? Por que não há organização dos professores dessa área;
✔Enfim, acredito que o debate acerca do novo ensino médio deve se deslocar da sua revogação para o que podemos fazer diante do que está posto. Até por que o Governo Lula já deixou claro que não tem disposição em fazê-lo, o congresso nacional também não. E a mobilização social não demonstra força para demove-los do contrário;
✔Essa também é a análise do Filósofo e Professor Renato Janine Ribeiro (Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC) numa entrevista recente para Carta Capital onde ele fala sobre os 100 dias do Governo Lula;
✔Até agora, a análise do Professor Renato é a mais lúcida em relação a essa temática. Inclusive a fala dele acerca de que muito das críticas feita ao novo ensino médio é feita por quem não conhece a realidade do ensino médio. Ele também defende a possibilidade de se fazer uma reforma da reforma, claro, ouvindo professores e estudantes;
✔Cabe a nós que estamos no chão da escola, fazer o enfrentamento a racionalidade tecnológica – fazendo da sala de aula uma trincheira de resistência – tanto nas aulas como nos projetos, tanto na formação geral básica como nos itinerários formativos.
Pedro Ferreira Nunes – especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atual como Professor da Educação Básica no CENSP Lajeado.
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