sábado, 10 de maio de 2025

Vozes Insubmissas: O lugar dos indígenas e dos negros na construção da nossa identidade cultural

O título acima é de uma apresentação que realizamos no dia D da leitura realizada pelo Colégio Esportivo Cívico Militar Santa Rita de Cássia, Palmas-TO, no dia 26 de abril de 2025. A partir de uma temática sugerida pela área de Linguagens, responsável pela organização do evento. Nossa ideia foi chamar atenção ao racismo epistêmico. Mostrando vozes atuais que se sublevam contra este racismo.

O nosso ponto de partida foi então a contribuição da Filósofa Sueli Carneiro para compreendermos o conceito de epistemicídio. Desenvolvido por ela na sua tese de doutoramento na Universidade de São Paulo (USP). Carneiro nos dirá que se trata de um processo de negação dos conhecimentos de grupos excluídos. Tornando-se um dos mais eficazes e duradouros instrumentos de dominação racial. O que não nos falta são exemplos ao longo da história que evidenciam essa afirmação. Por exemplo, a criminalização de expressões culturais desses grupos como a proibição do samba, da capoeira, do tupi guarani como língua e nos dias de hoje, as religiões de matrizes africanas.

Privar as pessoas de expressar sua cultura por meio da língua e de outras manifestações é uma das formas mais perversas de violência que nem sempre temos consciência. Apesar disso, buscamos mostrar como a influência dessas culturas estão presentes na nossa cultura enquanto povo. Por exemplo, em palavras que proferimos no dia a dia mas que não temos consciência da sua origem como: Açaí, Capim, Jacaré, Pipoca, Urubu.

No caso de nós Tocantinense, o nome do próprio Estado é de origem tupi. Pesquisadores apontam que: A palavra “Tocantins” tem suas raízes na língua tupi, que foi uma das línguas indígenas mais faladas no Brasil durante o período colonial. Nessa língua, “Tocantins” é uma combinação de duas palavras: “tucã” e “tins”. A primeira parte, “tucã”, significa “tucano”. Os tucanos são aves conhecidas por seus bicos coloridos e marcantes, que se destacam em meio à diversidade da fauna brasileira. Agora, vem a parte curiosa: “tins” se traduz como “nariz”. Portanto, “Tocantins” pode ser traduzido literalmente como “nariz de tucano”.  (Brener Nunes, Gazeta do Cerrado, 2023).

Ainda nessa linha, não podemos esquecer de uma das mais genuínas expressões da cultura tocantinense, a sussa (dança) criada por negros escravizados no Tocantins.

Para compreender o epistemicídio e o racismo no Brasil, Sueli Carneiro é uma pensadora incontornável. Na sua tese clássica de doutoramento (Dispositivo de racialidade: a construção do outro como não ser como fundamento do ser) ela defende que a superação do racismo “deve ser coletivo, onde o cuidado de si e o cuidado do outro se fundem na busca pela emancipação.”

Outra voz insubmissa que não podemos deixar de ouvir é a do filósofo Ailton Krenak - indígena do povo Krenak. É sem dúvida uma das figuras mais relevantes na defesa dos territórios dos povos originários e do meio ambiente. Na sua obra, ideias para adiar o fim do mundo (2019), ele nos diz: “do nosso divorcio das integrações e interações com a nossa mãe, a Terra, resulta que ela está nos deixando órfãos, não só aos que em diferentes graduação são chamados de índios, indígenas ou povos indígenas, mas a todos nós.” Krenak alerta para as consequências de uma visão mecanicista da natureza. E provoca uma reflexão sobre nossas ações.

A filósofa Djamila Ribeiro foi outra voz apresentada por nós. Outra intelectual negra que também levanta sua voz contra o racismo. O seu manual antirracismo, pequeno em volume, mas grande em conteúdo é um livro que deve ser distribuído em todas as escolas públicas. Ressaltamos a sua mensagem de que não basta não ser racista. Precisamos ser antirracista. Ou seja, diante de uma situação de racismo não podemos ficar calados. Pois se não nos tornamos cúmplices.

Fazendo o movimento do macro para o micro, e do micro para o macro. Não pudemos deixar de falar sobre vozes insubmissas no Tocantins. E a partir daí trouxemos o exemplo do Rogério Xerente, primeiro indígena a receber a carteira de advogado da OAB no Tocantins e da Assistente Social e Poeta Quilombola - Ana Mumbuca. Num lindo poema, Ana nos diz: Sou um pedacinho de muitos/ Sou quem caminha e vira o caminho/ Eu sou pelo que fomos/ Para além do que fizeram com nós.

E essa foi a nossa mensagem final. Essas vozes insubmissas nos conclamam a não aceitar a condição de inferioridade que tentam submeter alguns grupos. Nesse caso especifico os negros e indígenas. Mas há outros tantos - que não aceitam a condição que lhes é imposta como as mulheres e os gays.

Enfim, acredito que conseguimos deixar a mensagem que gostaríamos de ter deixado. Talvez nem todos assimilaram. Mas se conseguimos, no caso Eu e a Maria Eliza (que fez a exposição do trabalho auxiliada por mim), alcançar um ouvido receptivo, já foi uma grande conquista.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins.

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