terça-feira, 20 de maio de 2025

Precisamos falar sobre as eleições do SINTET e do José Roque

Como uma categoria que tem na sua base profissionais qualificados e engajados politicamente não consegue se mobilizar o suficiente para organizar mais de uma chapa a nível estadual nas suas eleições internas? Como essa mesma categoria permite que uma mesma pessoa fique na presidência da sua entidade por tantos mandatos consecutivos?

Uma resposta para tais questionamentos seria o fato de que temos um sindicato atuante proporcionando diversas conquistas para a categoria. Que tem na figura do seu presidente um militante combativo que conduz a entidade com muito brio não havendo portanto questionamentos por parte da base. Ou talvez seja pelo fato de que a oposição que existe na categoria não seja suficientemente competente para se constituir como uma força real que faça frente ao grupo hegemônico. Ou ainda a categoria, salvo exceções, não ver o sindicato como algo relevante pelo qual vale a pena dedicar um pouco da sua energia.

Em relação ao primeiro ponto devemos reconhecer que trata-se de uma entidade sindical atuante. E que ao longo dos anos vem proporcionando conquistas significativas para a categoria. Ainda que nessa dinâmica é preciso diferenciar a diretoria estadual das diretorias regionais. E a partir daí pontuar que há uma maior combatividade por parte de algumas regionais do que de outras. Mas no final das contas o que aparece é o nome do SINTET. 

Quanto à figura do presidente estadual (José Roque) também não podemos deixar de reconhecer sua história e importância na luta. Por outro lado, ninguém que fica tanto tempo à frente de uma entidade como o SINTET fica ileso. Há um desgaste natural assim como uma acomodação a um cargo - que se torna mais importante que a causa. E é essa a situação do José Roque. É cada vez mais evidente que o seu tempo passou. Que a sua contribuição como presidente estadual do SINTET já deu. E que o seu maior gesto de grandeza agora seria dar espaço para outro nome. Mas esperar esse gesto de alguém que foi formado numa cultura de esquerda de culto ao personalismo é iludir-se.

José Roque e o grupo que lhe dá sustentação (isso é um fator importante a se destacar. Pois sem uma base de sustentação ele não sobreviveria por tantos mandatos consecutivos). Fazem parte do que o Vladimir Safatle denomina de populismo de esquerda que consiste na visão de que é preciso “um modelo de construção de hegemonia baseado na emergência política do povo contra as oligarquias tradicionais detentoras do poder”. Esse povo é constituído a partir de demandas reprimidas que “todas elas devem convergir em uma figura que seja capaz de representar e vocalizar esta emergência de um novo sujeito político.” 

Nesse contexto, o papel do sindicato é contribuir para que esse modelo em construção possa se efetivar. Tendo numa determinada figura a representação e vocalização deste projeto. O problema, de acordo com Safatle, é que essa perspectiva política mostrou sua ineficácia, sobretudo durante o governo Bolsonaro. No entanto, os defensores dessa perspectiva continuam sem querer ver o óbvio. 

Trazendo para o nosso contexto a discussão recente em torno do PCCR da educação mostrou de forma inconteste o quanto a direção estadual, liderada pelo José Roque é no mínimo, medíocre. Numa reunião pública transmitida pelo youtube ficou evidente a capitulação da direção estadual a proposta do governo. 

Por outro lado, é evidente que a oposição que existe no interior da categoria, não tem força suficiente para construir uma chapa que faça frente ao grupo hegemônico. Pelo contrário, há uma espécie de acordão que reflete nas eleições das regionais, a maioria com chapa única, assim como a estadual. Acredito que esse fenômeno é mais reflexo da falta de interesse da categoria com sua entidade representativa do que pelo trabalho realizado pelas diretorias sindicais. 

Se, se realizasse uma pesquisa junto a categoria sobre a percepção acerca do sindicato, o resultado negativo não nos surpreenderia. Ainda mais porque o José Roque conseguiu personalizar a entidade. E muitos colegas não conseguem separar as duas coisas. Com isso, não percebem que a indiferença é o que contribui para que as coisas permaneçam tal como estão. 

A minha atitude assim que me efetivei como professor da rede estadual de ensino do Tocantins foi me filiar ao SINTET. E continuarei por compreender a importância do movimento sindical não só na melhoria das condições de trabalho e salarial. Mas da sociedade como um todo. Acredito que é a partir desse movimento que poderemos vislumbrar uma mudança futura. O José Roque não é eterno. O sindicato sim. Pelo menos enquanto vivermos numa sociedade que tem o trabalho como o seu eixo central.

Por Pedro Ferreira Nunes - Professor de Filosofia na Rede Estadual de Ensino do Tocantins.

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Quincas Borba e a humanidade como liquidificador

Há uma música da banda punk paulista Ratos de Porão que retrata a ascensão e queda de uma banda de rock. Presente em um dos álbuns do grupo - anarkophobia (1991). Após alcançar o auge,  como ato final desse drama que chama atenção para a efemeridade do sucesso temos os seguintes versos: Com suas mentes semi estragadas/Não conseguiram mais tocar/Rapidamente foram esquecidos/Voltaram a ser ninguém. Lembrei dessa canção quando decidi escrever algumas linhas, afetado pela leitura do romance machadiano Quincas Borba (1891). Que nos mostra de maneira inconteste as contingências da vida.

Não é sem uma dor no coração que vamos acompanhando o drama de Pedro Rubião - professor da escola primária na cidade de Barbacena (MG). O seu destino muda ao conhecer o filósofo Quincas Borba - autor de uma filosofia denominada de humanitas - que consistia na tese de que a morte é necessária para que haja vida. Nesse sentido, a guerra é necessária.

"Ao vencedor as batatas."

Essa frase que Quincas Borba elabora alegoricamente para explicar sua filosofia não sairá da cabeça de Rubião. Acompanhando-o até a morte. 

- Não há morte. O encontro de duas expansões, ou a expansão de duas formas, pode determinar a supressão de uma delas; mas, rigorosamente, não há morte, há vida, porque a supressão de uma é princípio universal e comum. Daí o caráter conservador e benéfico da guerra. Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos, que assim adquire forças para transpor a montanha e ir à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas, se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que o homem só comemora e ama o que lhe aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas. 

Mas vamos ao começo. A amizade de Rubião com o velho filósofo acabará fazendo-o herdeiro de toda a fortuna que este acumulara ao longo da vida. Apenas com a condição de que o jovem interiorano cuidasse do seu cachorro, também chamado de Quincas Borba. Essa fortuna com a qual Rubião jamais poderia imaginar será a sua ruína. Imediatamente ele deixa Barbacena para trás. E segue para o Rio de Janeiro para tomar posse de toda a sua fortuna. E ter uma vida diferente da que vivia ali.

Ingênuo como é, se cercará de pessoas que acredita serem suas amigas, mas que só querem usá-lo. Nutrirá um amor doentio por Sofia, esposa de Cristiano Palha - que não terá escrúpulo em usar essa paixão para tirar vantagens. Faz de tudo para ser aceito aquela sociedade que nunca lhe pertencerá. E pagará um preço alto, sua lucidez.

É importante salientar que apesar de ingênuo, Rubião não deixa de ser ambicioso. E se analisarmos profundamente, será mais a ambição do que a ingenuidade que acelerará sua queda. Ou talvez a soma dos dois. Em relação a ambição. Primeiro a de herdar a fortuna do filósofo Quincas Borba. Segundo de ter o amor de Sofia. E terceiro de conseguir um cargo político na corte. A sua ingenuidade foi sobretudo confiar em pessoas que acreditava serem suas amigas.

Ailton Krenak ao criticar o conceito de humanidade faz uma analogia com um liquidificador. Para se encaixar você precisa deixar suas raízes e se incorporar ao ideal do homem branco Europeu. Quando esquecemos nossa origem nos tornamos presas fáceis de um sistema  que impõe um determinado modo de vida. A ingenuidade de Rubião impediu que ele percebesse a sua queda. À medida que ia perdendo a fortuna deixava de ser um amigo e tornava-se um peso. O único que não o abandonara fora Quincas Borba - o cachorro.

Não que os demais personagens sejam maus. Eles não ficam pensando ou planejamento como dilapidar o pobre Rubião. Apenas estão buscando se integrar à “humanidade”. Isso significa agir de determinada forma. Colocando seus interesses acima de tudo.

Para Rubião a realidade foi se tornando cada vez mais insuportável. No fundo ele sabia que estava sendo usado. Que ninguém verdadeiramente se importava com ele. Que o seu amor por Sofia jamais seria correspondido. Diante disso, a fuga da realidade foi a forma que ele encontrou para se proteger.

Num momento de lucidez deixou o Rio de Janeiro e retornou para Barbacena onde morreu perdido no seu delírio de grandeza. Vagando pelas ruas como um mendigo e proferindo a frase enigmática.

- Ao vencedor, as batatas.

Na sua cabeça tornara-se rei. Também na sua morte Quincas Borba dizia ser quem não era - o filósofo Santo Agostinho. Mas o fim de um foi bem diferente do outro.

Não morreu súbdito nem vencido. Antes de principiar a agonia, que foi curta, pôs a coroa na cabeça, - uma coroa que não era, ao menos, um chapéu velho ou uma bacia, onde os espectadores palpassem a ilusão. Não, senhor; ele pegou em nada, levantou nada e cingiu nada; só ele via a insígnia imperial, pesada de ouro, rútila de brilhantes e outras pedras preciosas. O esforço que fizera para erguer meio corpo não durou muito; o corpo caiu outra vez; o rosto conservou porventura uma expressão gloriosa.

O seu fiel companheiro, o cachorro Quincas Borba, também adoeceu e morreu poucos dias depois do seu dono.

A forma serena com que encontrou seu fim, pode ser a prova de que Rubião compreendera a filosofia humanitas. Ele entendeu que a sua morte era necessária para que outros vivessem. Deixou sua Barbacena rumo ao Rio de Janeiro, lá lutou sua guerra e retornou para sua terra, vencido. Deixando ao vencedor, seus despojos. Assim também é a nossa sina nisso que chamamos de humanidade. O que aprendemos com Ailton Krenak é que não precisa ser assim.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins.

sábado, 10 de maio de 2025

Vozes Insubmissas: O lugar dos indígenas e dos negros na construção da nossa identidade cultural

O título acima é de uma apresentação que realizamos no dia D da leitura realizada pelo Colégio Esportivo Cívico Militar Santa Rita de Cássia, Palmas-TO, no dia 26 de abril de 2025. A partir de uma temática sugerida pela área de Linguagens, responsável pela organização do evento. Nossa ideia foi chamar atenção ao racismo epistêmico. Mostrando vozes atuais que se sublevam contra este racismo.

O nosso ponto de partida foi então a contribuição da Filósofa Sueli Carneiro para compreendermos o conceito de epistemicídio. Desenvolvido por ela na sua tese de doutoramento na Universidade de São Paulo (USP). Carneiro nos dirá que se trata de um processo de negação dos conhecimentos de grupos excluídos. Tornando-se um dos mais eficazes e duradouros instrumentos de dominação racial. O que não nos falta são exemplos ao longo da história que evidenciam essa afirmação. Por exemplo, a criminalização de expressões culturais desses grupos como a proibição do samba, da capoeira, do tupi guarani como língua e nos dias de hoje, as religiões de matrizes africanas.

Privar as pessoas de expressar sua cultura por meio da língua e de outras manifestações é uma das formas mais perversas de violência que nem sempre temos consciência. Apesar disso, buscamos mostrar como a influência dessas culturas estão presentes na nossa cultura enquanto povo. Por exemplo, em palavras que proferimos no dia a dia mas que não temos consciência da sua origem como: Açaí, Capim, Jacaré, Pipoca, Urubu.

No caso de nós Tocantinense, o nome do próprio Estado é de origem tupi. Pesquisadores apontam que: A palavra “Tocantins” tem suas raízes na língua tupi, que foi uma das línguas indígenas mais faladas no Brasil durante o período colonial. Nessa língua, “Tocantins” é uma combinação de duas palavras: “tucã” e “tins”. A primeira parte, “tucã”, significa “tucano”. Os tucanos são aves conhecidas por seus bicos coloridos e marcantes, que se destacam em meio à diversidade da fauna brasileira. Agora, vem a parte curiosa: “tins” se traduz como “nariz”. Portanto, “Tocantins” pode ser traduzido literalmente como “nariz de tucano”.  (Brener Nunes, Gazeta do Cerrado, 2023).

Ainda nessa linha, não podemos esquecer de uma das mais genuínas expressões da cultura tocantinense, a sussa (dança) criada por negros escravizados no Tocantins.

Para compreender o epistemicídio e o racismo no Brasil, Sueli Carneiro é uma pensadora incontornável. Na sua tese clássica de doutoramento (Dispositivo de racialidade: a construção do outro como não ser como fundamento do ser) ela defende que a superação do racismo “deve ser coletivo, onde o cuidado de si e o cuidado do outro se fundem na busca pela emancipação.”

Outra voz insubmissa que não podemos deixar de ouvir é a do filósofo Ailton Krenak - indígena do povo Krenak. É sem dúvida uma das figuras mais relevantes na defesa dos territórios dos povos originários e do meio ambiente. Na sua obra, ideias para adiar o fim do mundo (2019), ele nos diz: “do nosso divorcio das integrações e interações com a nossa mãe, a Terra, resulta que ela está nos deixando órfãos, não só aos que em diferentes graduação são chamados de índios, indígenas ou povos indígenas, mas a todos nós.” Krenak alerta para as consequências de uma visão mecanicista da natureza. E provoca uma reflexão sobre nossas ações.

A filósofa Djamila Ribeiro foi outra voz apresentada por nós. Outra intelectual negra que também levanta sua voz contra o racismo. O seu manual antirracismo, pequeno em volume, mas grande em conteúdo é um livro que deve ser distribuído em todas as escolas públicas. Ressaltamos a sua mensagem de que não basta não ser racista. Precisamos ser antirracista. Ou seja, diante de uma situação de racismo não podemos ficar calados. Pois se não nos tornamos cúmplices.

Fazendo o movimento do macro para o micro, e do micro para o macro. Não pudemos deixar de falar sobre vozes insubmissas no Tocantins. E a partir daí trouxemos o exemplo do Rogério Xerente, primeiro indígena a receber a carteira de advogado da OAB no Tocantins e da Assistente Social e Poeta Quilombola - Ana Mumbuca. Num lindo poema, Ana nos diz: Sou um pedacinho de muitos/ Sou quem caminha e vira o caminho/ Eu sou pelo que fomos/ Para além do que fizeram com nós.

E essa foi a nossa mensagem final. Essas vozes insubmissas nos conclamam a não aceitar a condição de inferioridade que tentam submeter alguns grupos. Nesse caso especifico os negros e indígenas. Mas há outros tantos - que não aceitam a condição que lhes é imposta como as mulheres e os gays.

Enfim, acredito que conseguimos deixar a mensagem que gostaríamos de ter deixado. Talvez nem todos assimilaram. Mas se conseguimos, no caso Eu e a Maria Eliza (que fez a exposição do trabalho auxiliada por mim), alcançar um ouvido receptivo, já foi uma grande conquista.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins.

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Lajeados

Todo lugar é o retrato das vivências que construímos ao longo da vida. Por isso a visão que temos desse lugar é o reflexo dessas vivências. Se somos múltiplos como diz Nietzsche. A cidade também é múltipla. Pois ela é fruto da multiplicidade dos seus habitantes. Tanto de pessoas que ali nasceram como das que vieram de outros cantos. O fator tempo me parece ser fundamental nessa relação. Sobretudo numa perspectiva cíclica. E é isso que pretendo mostrar nas linhas a seguir sobre a minha relação com a cidade de Lajeado dividida em sete ciclos. O que me faz falar em Lajeados no plural.

O primeiro Lajeado é o da minha infância. Quando íamos a passeio. Ainda não havia praças, ruas asfaltadas. Energia elétrica, água encanada, televisão, telefone era um privilégio de poucos. Os bares na ilha verde eram de palha. De palha eram muitas casas. O nosso lugar de repouso era a casa de Dona Alderina na chácara de Dona Caetana próximo às barrancas do rio Tocantins, que depois seria herdada pelo Tuta e a Rosa.

O segundo Lajeado é o do final da minha infância quando mudamos definitivamente. O lugar onde íamos visitar tornou-se a nossa morada. Nossa casa era de palha, próximo ao Tuta e a Rosa na chácara de Dona Caetana, perto das barrancas do rio Tocantins. Ficávamos próximo a chácara de Dona Julia e Seus Josias. Depois construímos uma casa de adobe. Não havia água encanada, não havia energia elétrica. Plantávamos roça de toco do outro lado do rio, pescávamos e coletávamos buriti, pequi, bacaba, coco babaçu. Caçávamos. 

Estudando no Colégio Nossa Senhora da Providência comecei a fazer amizade para além dos filhos de Dona Alderina e Dona Isabel. Sobretudo com o Laercio e o Vadson. Eu era tímido em demasia. Mas ia sobrevivendo. Gostava mesmo era do mato. E de ler. Desde que descobri na biblioteca escolar que podia pegar livro emprestado e levar para casa não deixei de fazê-lo. Mesmo tempos depois, quando já morávamos na cidade e tínhamos energia elétrica e televisão. As aulas mais marcantes eram certamente da Professora Carlina, Professora Irmã Conceição, Professora Jesus e Professora Valdineia.

O terceiro Lajeado é o da minha adolescência. Dos tempos do ensino médio. A cidade movimentada pela construção da usina hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães. As festas, as amizades, os amores. Aos poucos o menino tímido começou a se transformar. Continuava lendo, arriscava a escrever os primeiros textos da própria inspiração. Ouvia rock, reggae, rap. Passou a usar brinco - a ter um estilo subversivo. Incomodava. Mas na escola destacava-se como um dos melhores.

A cidade já havia mudado bastante em relação ao que era quando chegamos ali. O carnaval, as festas juninas e os festejos de nossa senhora da divina providência eram as mais animadas. Os forró na Gema também eram animados. O point da cidade era o farol na praça 5 de maio. Talvez esse tenha sido o Lajeado mais significativo na minha formação. Guardo com carinho as lembranças desse período. De certa forma continuo sendo aquele menino sonhador do colegial. Que dizia não saber o que queria, mas tinha certeza do que não queria. As aulas mais marcantes foram da Professora Patrícia, Professora Rita e Professor Carlito. Ah, o Professor Carlito. Grande referência.

O quarto Lajeado é o do início da minha maioridade. O qual a minha conexão era unicamente a partir do que minha mãe relatava quando ia nos visitar em Goiânia no mês de julho. Desse período não há muito o que falar. Apenas que o lugar continuava sendo inspiração para os meus textos. E a cada ano que passava o desejo de retornar ia se tornando mais forte.

O quinto Lajeado é o do fim da minha juventude. A cidade que encontrei após alguns anos morando em outro lugar. Num primeiro momento foi um estranhamento ao perceber que não era o mesmo Lajeado da minha adolescência - os tempos eram outros. Muitos não acreditavam que eu me adaptaria. Mas me adaptei. Foi um período de recomeço. De voltar a viver com minha mãe. De cuidar dela, dela cuidar de mim. Dos forrós que íamos mais Dona Rosalina. Dos shows no aniversário da cidade. Das festas juninas. Das pequenas conquistas que íamos conseguindo melhorando a casa e nossa condição de vida.

Ninguém além dela acreditava em mim - que um dia eu teria uma oportunidade de trabalho e iria proporcioná-la uma vida mais tranquila. Me apoiava incondicionalmente nos meus estudos na faculdade. E só não fazia mais porque eu não permitia. Sempre fala que se eu não pudesse dar, não tiraria nada dela. Pois ela já me dava o suficiente - teto para morar, e comida para me alimentar.

O sexto Lajeado é o do inicio da minha maturidade. Da minha atuação como professor no Colégio Estadual Nossa Senhora da Providência. Das amizades. Sobretudo com os Professores Raimundo e Carlos. Dos projetos. Da relação com os estudantes. Do respeito adquirido junto a comunidade. Da condição de, ainda que por pouco tempo, proporcionar uma vida mais tranquila á minha mãe. Essa nova situação não me fez perder a minha essência - um pessoa simples. Que gosta da simplicidade. De continuar estudando, buscando conhecimento e ajudar o próximo dentro das minhas possibilidades.

O sétimo Lajeado é o atual. Ou o da minha maturidade. Já não estou lá no dia a dia. Mas considero minha morada. Talvez eu nunca mais volte a morar lá, vai saber. Mas não perco a conexão. Pelo menos com a casa de minha mãe, que após sua morte virou da família. Mantenho contato com meus amigos e familiares que lá vivem (meus livros). Mas tenho convivido muito pouco com eles. Os únicos lugares que saio é a distribuidora ou o mercadinho para comprar alguns víveres. Passo o tempo cuidando do quintal (das plantas), lendo e bebendo. Tenho bebido muito.

Enfim, hoje é celebrado o aniversário da cidade. Essa data só me lembra de Mamãe, Dona Rosa, Dona Alderina e do Quati Branco. Por tanto não é mais uma data feliz para mim. Talvez por isso eu não tenha ido aos shows. Ou talvez não (quem sabe se fosse o Ratos de Porão eu até me animasse. Rs). 

Qual será o próximo Lajeado? Haverá um próximo? São perguntas que o tempo irá responder.

Pedro Ferreira Nunes - Apenas um rapaz latino americano, que gosta de ler, escrever, correr e ouvir rock in roll.

quarta-feira, 30 de abril de 2025

Nietzsche e Mario Bergoglio - O Papa Francisco

Se há algo que não deveria nos surpreender é a morte. Sobretudo quando estamos falando de uma pessoa que já viveu muitas primaveras - que o corpo dá sinais de que não suportará muitos dias por mais esforços que façam os médicos. Mesmo assim nos surpreendemos. Isso em grande medida reflete a maneira como nós ocidentais nos relacionamos com a morte. O nosso permanente esforço de evitar o inevitável. Foi assim, com surpresa, que recebemos a notícia da morte do Mario Bergoglio - O Papa Francisco. Não deveríamos, a morte é um fenômeno natural. Ainda mais se tratando de uma pessoa idosa.

O fato de Bergoglio ter se tornado o maior líder espiritual dos católicos e ter transcendido esse espaço por sua postura consequente em defesa dos direitos humanos e de uma cultura de paz. Não o torna imortal - pelo menos, não fisicamente. Por que então tanta comoção diante do seu falecimento? Talvez porque esse evento nos mostra que ninguém, por mais importante que seja, escapará ao seu destino. E isso faz com que olhemos para nós mesmos, para vida que estamos levando. Para as memórias que deixaremos quando chegar a nossa hora - do nosso legado.

Diante da comoção da morte do Papa Francisco lembrei do Nietzsche. Estranho não?! Esse filósofo alemão talvez tenha sido quem fez a crítica mais contundente ao cristianismo - em especial a Igreja Católica. Aliás, é uma coisa que alguns críticos do Nietzsche não entendem, a sua crítica nunca foi direcionada ao Cristo, mas a instituição criada em seu nome. Nosso filósofo ressaltava a grandeza de Jesus Cristo, dizendo que ele havia sido o único cristão genuíno - que vivia conforme aquilo que pregava. Já dos seus seguidores não podíamos dizer o mesmo.

Mas analisando a trajetória do Papa Francisco (Mario Bergoglio) e a sua postura como líder espiritual dos cristãos católicos. Me pareceu que ele seria digno de ser considerado por Nietzsche como um cristão assim como Jesus. A coerência entre aquilo que ele defendia e as suas ações se complementavam de maneira rara. Isso certamente foi algo que mexeu com muita gente não-cristã. Que reconhece na figura do Papa Francisco mais do que um líder espiritual - o exemplo de um ser humano que conseguiu superar a vivência medíocre que nós nos submetemos.

Nietzsche também é um dos filósofos que nos ajuda a ver a morte com outros olhos. Mostrando como ela faz parte da nossa existência. Ele fala em morte perpétua para explicar, segundo Scarlett Marton, que não há vida sem morte e vice-versa. Compreender isso e agir a partir de suas convicções, sem remorsos, é o que deve ser feito.

Foi assim que fez o Papa Francisco. Por mais discordância que tenhamos em relação ao que prega o cristianismo/catolicismo, não podemos deixar de reconhecer isso. Ele viveu conforme seus ideais mostrando que discursos que não estão coerente com a prática não devem ser levados em consideração. Não era perfeito. Assim como nenhum ser humano é. Mas fora certamente um ser extraordinário. Como tantos outros que tivemos ao longo da história.

“Não tenham medo da vida, por favor! Tenham medo da morte, da morte da alma, da morte do futuro, do fechamento do coração. Disto vocês devem ter medo. Mas da vida não, a vida é bela. A vida é para ser vivida e para doá-la aos outros” (Papa Francisco)

Diversos especialistas apontam que a filosofia de Nietzsche sempre foi uma filosofia em defesa de uma vida ativa. E o que é a frase acima do Papa Francisco se não uma defesa intransigente da vida ativa. Se há algo que devemos temer não é a morte física. Pois esta é inevitável. Mas a morte do nosso espírito, ou seja, daquilo que acreditamos, da nossa capacidade de sonhar e de amar.

Talvez possamos fazer um paralelo entre a morte do Papa Francisco e a morte de Deus em Nietzsche, provocada por nós mesmos. Em sua obra A Gaia Ciência, nosso filósofo diz: “Não deveríamos nós mesmos nos tornar deuses, para ao menos parecer dignos dele? Nunca houve um ato maior – e quem vier depois de nós pertencerá, por causa desse ato, a uma história mais elevada que toda a história até então”.

A comoção diante da morte do Papa Francisco tem uma dose de remorso por parte dos cristãos. Pois eles têm consciência, sobretudo os Cardeais, que não vivem uma vida coerente com o evangelho que pregam. Que a morte do seu líder possa contribuir para que mudem. O que acho difícil.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins. 

sexta-feira, 25 de abril de 2025

A importância das associações de Bairros na construção do Direito à Cidade

Sempre me incomodou ao andar pelas ruas do Jardim Aureny I (Palmas) o estado de abandono das praças. Fiquei me questionando qual o sentido de ter tantas praças se não há uma manutenção da limpeza dessas áreas por parte do poder público. Outra questão foi acerca do papel dos moradores. Por que ao invés de cobrar do poder público a limpeza das praças, transformam-nas em depósito de lixo. Com isso temos dois polos: o poder público que negligencia as áreas periféricas. Do outro a população que acredita que o espaço público não lhe diz respeito.

A falta de consciência por parte da população acerca do seu papel na melhoria da qualidade de vida no território em que vive foi objeto de discussão entre eu e uma colega. Num determinado momento começamos a falar da atuação da associação de moradores. E comentei que ao meu ver existem só no papel. Ela retrucou, trazendo o exemplo da associação que preside - a do bairro Jardim Aureny IV. Ao ver a empolgação dela. Eu recuei da minha posição muito feliz. Convidando-a para um bate-papo no contexto de um projeto da Área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas que estávamos desenvolvendo no Colégio Esportivo Cívico Militar Santa Rita de Cássia no Aureny I sobre papel da Mulher na Comunidade, a falar da sua experiência. Pois assim como eu, provavelmente havia muita gente que não conhecia a Associação de Morador do seu bairro e o quanto elas são importantes na busca por uma melhor qualidade de vida da comunidade.

O bate papo foi muito produtivo. E confirmou a impressão que eu tinha, são poucas as pessoas que já ouviram falar de uma associação de moradores atuante em Palmas e qual o papel que elas exercem na comunidade. Mas a partir daquele bate papo tanto elas como eu saberia que há uma associação de moradores que faz um trabalho importante nesse território - a do bairro Aureny IV. Não por acaso conseguiram parceria com instituições como o SENAI através do qual realizam formação profissional para comunidade. Com a Central Única das Favelas (CUFA) através da qual faz um trabalho social junto às mulheres negras. E com a Universidade Federal do Tocantins por meio de um projeto de extensão capitaneado pelo Professor João Bazzoli.

Wânia Máritha (esse é o nome dela) fala de forma apaixonada do seu trabalho como presidente da associação. Da sua eleição ao enfrentar uma campanha misógina que tentou desqualificá-la por ser mulher e mãe solteira. As conquistas que obteve das maiores às menores. Como a associação que mais distribuiu cesta básica durante a pandemia de COVID-19 e a construção de um quebra-molas numa rua movimentada garantido a segurança dos transeuntes.

Nós que acreditamos na solidariedade, na cooperação e no trabalho coletivo não podemos deixar de nos empolgar também com a fala da Wânia. Por outro lado, sabemos que nem todos os presidentes de associação de moradores tem como preocupação o bem comum. Como reflexo disso, em alguns bairros elas só existem de fato no papel. Mas se quisermos vislumbrar outro paradigma de desenvolvimento para Palmas isso passa pelo fortalecimento do protagonismo das comunidades. E nesse contexto as associações de moradores são indispensáveis.

Essa compreensão também encontramos no Bazzoli (2017) que afirma não haver possibilidade de vislumbrarmos outra concepção de cidade sem o protagonismo popular. É nesse sentido que ele desenvolve o seu projeto de extensão universitária que tem o Jardim Aureny IV como um dos territórios onde atua. Trata-se de uma iniciativa importante vinda da academia que, se tratando de UFT, precisa ter uma atuação melhor por meio de projetos de extensão na periferia.

No seu livro Direito à cidade (1968), o filósofo francês Henri Lefebvre nos diz que “as cidades e o urbano não podem ser compreendidos sem as instituições oriundas das relações de classe e de propriedade”. Que instituições são essas? A serviço de quem elas estão? Essas instituições convivem entre si buscando os seus interesses. No caso da associação de moradores elas são um instrumento político de participação da comunidade nos rumos da comunidade. Ela não surge de cima para baixo. Mas como fruto de um processo de conscientização e mobilização dos moradores locais.

Ainda seguindo a linha no que diz Lefebvre sobre o direito à cidade. Este só pode ser formulado como o direito à vida urbana, transformada, renovada. Sendo que a efetivação desse direito não requer apenas uma legislação. Mas a participação dos trabalhadores a partir de uma atividade prática-sensível. Pois ninguém melhor do que eles sentem na pele a falta de um transporte público de qualidade, de saneamento básico, da limpeza urbana, da falta de equipamentos culturais entre outros.

E as associações de moradores, como produto dessa atividade prática-sensível é um instrumento importante para que possam se organizar e mobilizar em defesa do direito à cidade.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins. 

domingo, 20 de abril de 2025

Ailton Krenak e as ideias para adiar o fim do mundo

Quando falamos em fim do mundo logo nos remetemos a um discurso teológico que prega a adesão a certa doutrina como meio para ser salvo no momento do juízo final. Não é esse o objeto do Krenak. Mas provocar uma reflexão que nos faça pensar na relação que estabelecemos com o meio ambiente e com os nossos companheiros de jornada neste planeta. Logo, se quisermos adiar o fim do mundo, desse mundo. Precisamos repensar nessas relações pautadas em interesses mercadológicos.

Ideias para adiar o fim do mundo (2019) é uma das obras mais interessantes desse indígena do povo Krenak (localizado na região do Vale do Rio Doce, Minas Gerais) que há várias décadas levanta sua voz em defesa dos povos originários. Filósofo, escritor, ativista do meio ambiente. Ailton Krenak teve sua trajetória coroada recentemente ao se tornar o primeiro indígena a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras (ABL). É de sua lavra também títulos como: Futuro Ancestral (2022), A vida não é útil (2020),  O lugar onde a terra descansa (2000).

Como um bom filósofo, o ponto de partida de Krenak é o questionamento. E o questionamento que desencadeia a sua reflexão sobre a possibilidade de adiarmos o fim do mundo é acerca do conceito de humanidade.

“Como justificar que somos uma humanidade se mais de 70% estão totalmente alienados do mínimo exercício de ser? A modernização jogou essa gente do campo e da floresta para viver em favelas e em periferias, para virar mão de obra em centros urbanos. Essas pessoas foram arrancadas de seus coletivos, de seus lugares de origem, e jogadas nesse liquidificador chamado humanidade. Se as pessoas não tiverem vínculos profundos com sua memória ancestral, com as referências que dão sustentação a uma identidade, vão ficar loucas neste mundo maluco que compartilhamos”.

O trecho acima mostra, digamos, o método do Krenak, alicerçado na tradição oral dos povos indígenas. Temos ao longo das páginas de ideias para adiar o fim do mundo uma conversa, um diálogo. De modo que o nosso filósofo dialoga com a tradição filosófica ocidental mas mantendo a sua identidade. Sua escrita é de fácil compreensão, não fugindo da polêmica.

No trecho acima chamaria sobretudo atenção para esse processo de desenraizamento no qual somos submetidos. Sobretudo os povos das águas e das florestas que são expulsos dos seus territórios para dar lugar à monocultura. O filósofo faz uma analogia bem interessante do conceito de humanidade com um liquidificador. Ou seja, para você ser considerado humano precisa abrir mão das suas raízes e se dissolver na massa. Os povos indígenas e africanos sabem muito bem disso, pois sentiram na pele durante o processo de formação da nação brasileira.

Krenak conta que o título da obra surgiu como uma provocação. Ele fora convidado para uma palestra na Universidade de Brasília (UNB) e ao ser questionado qual seria o título da sua exposição disse: Ideias para adiar o fim do mundo. Desse modo, a origem dessa obra é um conjunto de várias palestras que ele deu tanto no Brasil como em outros países.

“Estar com aquela turma me fez refletir sobre o mito da sustentabilidade, inventado pelas corporações para justificar o assalto que fazem à nossa ideia de natureza. Fomos, durante muito tempo, embalados com a história de que somos a humanidade. Enquanto isso — enquanto seu lobo não vem —, fomos nos alienando desse organismo de que somos parte, a Terra, e passamos a pensar que ele é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza”.

Nesse outro trecho de ideias para adiar o fim do mundo, Krenak defende sua concepção da natureza - a ideia de um organismo do qual todos nós fazemos parte. Opondo-se portanto à visão da natureza como uma máquina presente no pensamento de filósofos como René Descartes.

Um ponto interessante acerca deste livro é a visão do ser humano como um ser parasitário. Uma discussão que vai ganhar evidência com a pandemia de COVID-19.

“O que aprendi ao longo dessas décadas é que todos precisam despertar, porque, se durante um tempo éramos nós, os povos indígenas, que estávamos ameaçados de ruptura ou da extinção dos sentidos das nossas vidas, hoje estamos todos diante da iminência de a Terra não suportar a nossa demanda”.

Durante a pandemia de COVID-19 até se cogitou a possibilidade de uma mudança de paradigma no sentido de uma sociedade pautada na solidariedade e na cooperação. Mas não é isso que estamos vendo. Certamente o Ailton Krenak e outros pensadores que fazem esse alerta são classificados de catastrofistas. Mas a realidade mostra cada vez mais quem está com a razão. Ainda que essa palavra razão seja bastante ligada ao conceito de humanidade.

Mas enfim. Não é nosso objetivo aqui fazer uma análise aprofundada da obra em questão. Mas apenas apresentá-la fazendo algumas pontuações. Ideias para adiar o fim do mundo é na minha compreensão um livro clássico de filosofia. Mas não se trata de uma tentativa de imitar pensadores europeus. Certamente Krenak não despreza a filosofia ocidental de matriz europeia. Mas não se limita a ela. Buscando a fundamentação do seu pensamento na sua ancestralidade.

“Quando despersonalizamos o rio, a montanha, quando tiramos deles os seus sentidos, considerando que isso é atributo exclusivo dos humanos, nós liberamos esses lugares para que se tornem resíduos da atividade industrial e extrativista.”

Isso me fez lembrar de um documentário (Tocantins - Rio Afogado) tocantinense do Hélio Brito que mostra o impacto sociocultural da construção de Usinas Hidrelétricas ao longo do leito do rio. Com a construção da Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães o rio Tocantins para muitos já não é mais o rio Tocantins e sim o lago de Palmas - onde o interesse comercial se sobrepõem a vida.

Krenak nos questiona qual o mundo estamos deixando para o futuro e qual o que gostaríamos de receber. Será se nossas ações são coerentes com o que dizemos? Para o nosso filósofo não é possível pensar em adiar o fim do mundo enquanto nos colocarmos como algo fora da natureza, como se não fizéssemos parte dela.

Enfim, já era para ter encerrado lá atrás. Mas me empolguei um pouco. Concluo portanto convidando-os a ler ideias para adiar o fim do mundo. No meu caso, além de lê-lo, nos últimos anos, tornei-o um dos livros que faz parte da bibliografia das minhas aulas de Filosofia. Por isso, super recomendo.

Por Pedro Ferreira Nunes - Mestre em Filosofia pela UFT e Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins.