segunda-feira, 21 de outubro de 2019

“Aparências nada mais...”

“Aparências nada mais” – poderíamos utilizar essa frase de uma canção (composta por Cury e Ed Wilson, que se tornou famosa na voz do Márcio Greyck) para definir a mudança de nome dos partidos politicos brasileiros – já que na prática a estrutura interna, a lógica de funcionamento e os líderes partidários permanecem inalterados. Mas se tratando de política brasileira onde impera o lema: Mudar para não mudar! Não há ai nenhuma novidade.

A instituição “partidos” (não é a única ) vem sendo muito questionada devido os casos de corrupção frequentes trazidos a luz pela Polícia Federal – Mensalão Tucano, Mensalão do PT, Mensalão do DEM, Lava Jato – são alguns dos casos que revelaram relações corruptas entre políticos e empresários. Tais episódios fizeram surgir numa grande parcela da população um sentimento antipartidos e um anseio por mudanças. A responda das legendas partidárias para essa crise moral não poderia ter sido mais engenhosa – tira o termo “partido” e o problema está resolvido.

Isso me fez lembrar a crítica de Marx a Proudhon na “Miséria da filosofia”. Para Marx (2009), Proudhon queria resolver as contradições da sociedade capitalista eliminando termos “inconvenientes” – conclusão que chegara pelo fato de ter ficado na análise dos termos que denomina as coisas ao invés de analisar as coisas propriamente. E ao fazer isso, o pensador francês ficava no campo da retórica e não dá lógica. Marx não perdoava e ironicamente sugeria, a partir da perspectiva proudhoniana: “a sociedade pretende eliminar todos os inconvenientes que a atormentam? Muito bem: basta-lhe eliminar os termos inconvenientes, alterar a linguagem e dirigir-se a Academia, encomendando-lhe uma nova edição do seu dicionario!” (2009, p. 71). 

Se os brasileiros estão desacreditados nos partidos políticos, é simples, cria uma nova terminologia para definir as agremiações partidárias: AVANTE, MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO, REDE, NOVO, SOLIDARIEDADE, CIDADANIA, DEMOCRACIA CRISTÃ, PODEMOS, PATRIOTA, PROGRESSISTAS, REPUBLICANOS, DEMOCRATAS e por ai vai. 

Na prática nada muda, pois permanecem as velhas estruturas, com a velha lógica de funcionamento e com os velhos caciques no comando.  Um exemplo emblemático nesse sentido é do Cidadania – antigo PPS – fundado em 1992 a partir d’um racha do PCB pelo Roberto Freire – que permace no comando da legenda quase 30 anos depois. Outro exemplo é o Democracia Cristã – antigo PSDC – que desde a sua fundação em 1997 é comandado por José Maria Eymael. 

Quando há alguma renovação no comando das legendas,  com figuras mais jovens assumindo a presidência, essa renovação também é só aparente. Como é o caso do Democratas – antigo PFL – comandado por Antônio Carlos Magalhães Neto – herdeiro político de Antônio Carlos Magalhães. Ou do Podemos – antigo PTN – comandado por Renata Abreu – filha do fundador do partido – Dorival de Abreu. 

Outra prova recente de que a mudança de nomes dos partidos não significa uma mudança de lógica no funcionamento dessas legendas foi a aprovação pelo congresso nacional do projeto de lei que altera as regras para partidos políticos e para as eleições. O projeto de lei beneficia claramente as legendas partidárias ao permitir uma série de benesses como anistia a multas eleitorais. 

É por essas e outras que os partidos políticos (ainda que omitam esse termo) ao invés de combater o sentimento antipartidos por parte da população. Acaba alimentando-o. E talvez seja esse o objetivo – por que assim as pessoas se afastam da política, deixando-a nas mãos dos políticos tradicionais – o que é péssimo para democracia. 

Para filósofa francesa Simone Weil (1909-1943) a preocupação de todo partido é com o seu próprio crescimento. Logo  se uma mudança de nome contribuí para isso, por que não? O importante é se tornar hegemônico e não contribuir para cultivar os valores democráticos. 

A proposta de Weil é radical – suprimir os partidos políticos. Pois se esses tem como única finalidade o seu próprio crescimento e não o bem comum, farão de tudo para alcançar esse fim – sobretudo, mentir e impedir o pensar de forma autônoma. Essa questão foi colocada pela filósofa durante a segunda grande guerra mundial. E nos parece voltar a tona novamente através do clamor antipartidos.

Não estou convencido que esse seja o caminho. Até por que se suprimissemos os partidos o que colocariamos no lugar? Iriamos para a lógica de cada um por si? Me parece não ser o melhor caminho. Mas uma coisa é fato se os partidos continuarem com a lógica de funcionamento atual – olhando para o próprio umbigo e fazendo mudanças apenas na aparência – não faltaram vozes em defesa da supressão dos partidos.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins. 

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