terça-feira, 25 de junho de 2024

Palmas e as festas juninas ou em defesa da celebração

Creio que há poucas cidades fora do nordeste que vivem as festas juninas tão intensamente como Palmas. Acredito que isso seja reflexo da comunidade nordestina presente na capital e no Tocantins. E a maior expressão desse movimento é o arraiá da capital construído sobretudo por quem mora na periferia.

É da periferia que vem as quadrilhas que fazem o arraiá da capital ser o espetáculo que é. Mas esse é apenas o ponto de culminância de um movimento que acontece em todas as regiões da capital, em espaços como escolas, feiras livres, igrejas entre outros. Entre os nomes que se destacam estão a Cafundó do Brejo (a junina mais antiga da cidade), Matutos da Noite, Estrela do Sertão e Nação Junina.

Assim como no nordeste, esses grupos juninos se profissionalizaram e se organizam muito antes das festividades para poder apresentar o melhor espetáculo e ser reconhecido pelo público e pela crítica em campeonatos regionais e nacionais que premiam os melhores.

Não dá para negar a beleza das quadrilhas e reconhecer a importância delas para a cultura sertânica. Além de ser um espaço feito, sobretudo, pela juventude demonstrar o seu talento na música, na dança, na escrita e na moda. Em resumo, desenvolver e demonstrar a criatividade - fruir e produzir cultura.

Apesar de reconhecer a importância e beleza desse movimento confesso que ainda prefiro as quadrilhas tradicionais. Talvez porque tenho um olhar nostálgico. Me lembro da minha infância na rua Maranhão em Miracema - da baixa preta - de quando dançava quadrilha na escola. 

Entendo, no entanto, que as coisas mudam, para os nossos olhos nostálgicos nem sempre para melhor. Mas é legal ver a força desse movimento na capital. Comecei a observar isso morando no Aureny I (berço de grupos pioneiros das quadrilhas juninas em Palmas).

Foi num certo domingo do mês de abril. Ouvi gritos como numa torcida num jogo de futebol. Mas não era bem futebol. Lembrei então dos famosos grupos juninos de Palmas e fui pesquisar na internet para ver se achava alguma coisa. E encontrei uma reportagem falando que o Aureny I é berço de dois grupos: Cafundó do Brejo e Caipiras do Borocoxó. Aí então confirmei minhas suspeitas. Depois, um dia a noite, os vi ensaiando na feira coberta do setor. E então, percebi o quanto eles levam a sério. E o quanto é importante para a periferia da Capital, esquecida pelo poder público no que diz respeito a políticas de incentivo à produção e fruição cultural.

Mas também é importante para todos nós que estamos absortos no tempo do trabalho e nos esquecemos de um aspecto fundamental da vida que é a celebração. Nessa linha é importante o que diz Byung-Chul Han no seu texto “Tempo de celebração - a festa numa época sem celebração”:

“A festa é o evento, o lugar onde estamos junto com os deuses, onde inclusive nós próprios nos tornamos divinos. Os deuses se alegram quando os seres humanos jogam e brincam; os seres humanos jogam e brincam para os deuses. Se vivemos numa época sem festa, se vivemos numa época desprovida de celebrações, já não temos mais qualquer relação com o divino.”

E falando em festas juninas percebemos um caráter religioso muito forte, sobretudo ligado ao catolicismo. Não por acaso o símbolo principal é uma fogueira em homenagem a São João. Pereira Júnior, ressalta que: “Os festejos joaninos são integrantes do patrimônio cultural em seu sentido mais amplo, articulando de maneira dinâmica o trabalho e o lazer, a devoção e o entretenimento, instaurando um período particular de expressão de valores e tradições populares.” 

Ainda de acordo com este autor: “São esses movimentos de celebração, essas trocas e intercâmbios que nos permitem afirmar que há uma identidade inerente ao período joanino que atribui ao evento um caráter cultural singular, além de um lugar de memória.”

Para concluir retomemos ao Byung-Chul Han que fala sobre a importância do tempo de celebração, sobretudo num contexto atual:

"O tempo da celebração é o tempo pleno, em contraposição ao tempo do trabalho, como tempo vazio, que deve ser simplesmente preenchido, que se move entre tédio e ocupação. A festa, ao contrário, realiza um instante de elevada intensidade vital.”

Nós brasileiros compreendemos isso como ninguém. Pois somos um dos povos mais festivos do planeta. E as festas juninas são um exemplo nesse sentido ao lado do carnaval. 

Pedro Ferreira Nunes - É Professor da Educação Básica na Rede Estadual da Educação do Tocantins.

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