Da terra do carnaval
Onde a maioria é pobre
E se fode pra viver
Ratos de Porão
Se não me falhe a memória ouvi o som dos Ratos de Porão pela primeira vez em 2006 quando morava em Goiânia. O som em questão era a música “expresso da escravidão”, do último álbum que eles haviam lançado (Homem inimigo do homem), que estava sendo vinculada na programação da Rádio Venenosa FM.
Aquele som sujo, veloz e pesado acompanhando uma letra com uma dura crítica social me afetou muito. Eu já apreciava canções de protestos, canções que foram fundamentais para formação da minha consciência política, mas nenhuma delas tinham aquelas características. A partir daquele momento passei a me interessar cada vez mais pela banda e por aquele estilo de música.
No final de 2006, quando assisti um show ao vivo da banda no Goiânia Noise (Festival de Rock), me tornei um super fã da banda. Que show senhoras, que show senhores. A partir dali a minha guinada para o mundo da música pesada se deu de forma irreversível. Passei a apreciar não só a música mas a cultura que dali se forma – os ambientes dos festivais, as pessoas, o jeito de falar, de se comportar entre outros.
O primeiro disco que adquiri da banda foi o “Só crássicos” (2000) – uma coletânea com vários sucessos, entre eles: Crucificados pelo sistema, Beber até morrer, Igreja Universal, Crise Geral, Aids, pop e repressão e FMI. Depois adquiri o “Ao vivo no CBGB” (2003) com belas performances nas canções: Obesidade mórbida acidental, Toma trouxa, Agressão/repressão e Biotech is Godizlla.
Ai depois vieram outros, entre eles o último álbum lançado (Século Sinistro), que creio conseguiu mais do que qualquer um capitar o espírito das jornadas de Junho de 2013. Mas o meu preferido é um álbum ao vivo de 1992 – “RDP ao Vivo”. Os caras simplesmente destroem (num bom sentido) tudo do início ao fim.
Para quem não sabe, a banda Ratos de Porão nasceu em 1981 em São Paulo, no seio do movimento punk. No entanto no decorrer dos anos foram se distanciando, sobretudo em relação ao som, desse movimento. Mas a sua postura crítica em relação ao sistema dominante nunca abandonaram – já mais fizeram qualquer tipo de concessão para entrarem no “maestrim”.
Desde o seu surgimento a banda passou por diversas formações. E a mais duradoura é a atual que conta com: Jão na Guitarra, João Gordo no vocal, Boca na bateria e o Juninho no contrabaixo.
Agora em 2021 a banda completa 40 anos de caminhada – uma caminhada que tem como legado um rico material que nos ajuda a compreender a história do nosso país. Mesmo que não se goste do som que a banda faz, e eu inclusive compreendo que não se aprecie esse tipo de música, não se pode negar a relevância das mensagens que ela passa através das letras das canções –analisem uma letra de qualquer álbum da banda e me digam o contrário.
Já se vão muitos anos que ouvi pela primeira vez o som da banda. Desde então conheci muitas bandas, tanto dentro como fora do Brasil. Mas os Ratos de Porão continua como a número 01 na minha lista de bandas preferidas. Suas canções não me deixam esquecer da realidade que vivemos e da necessidade de não se acomodar diante dela. É por tanto uma inspiração no momento que eu escrevo algum texto contra o sistema dominante.
São 40 anos de história, e nessa data importante não poderia deixar de reconhecer todo o legado que a banda construiu até agora, e espero que continuem construindo por muitos e muitos anos. Infelizmente esse reconhecimento não virá de muitos lugares, pois sabemos bem como os nossos artistas são tratados nesse país. Ainda mais artistas com o perfil da banda Ratos de Porão. Mas creio eu, isso não deve ser motivo de ressentimento por parte da banda, mas sim de orgulho. Orgulho por incomodar aqueles que querem manter as coisas tal como estão – que se incomodam quando veem alguém tirando suas máscaras e injetando indignação e inconformismo nas nossas veias.
Por Pedro Ferreira Nunes – Educador, Poeta e Escritor Popular.