domingo, 16 de dezembro de 2018

Obviedades: Sobre a situação do DCE UFT.

O Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal do Tocantins encontra-se em vacância mais uma vez (se não me engano desde outubro – quando finalizou o mandato da ultima gestão eleita). Desde então várias tentativas de realização de um CEB (Conselho das Entidades de Base) não vingaram. Por que não vingaram? Eis a questão que pretendemos responder.

As justificativas que vieram a público até o momento são diversas. Entre elas, duas me chamaram atenção. A primeira foi acerca de quem teria legitimidade para convocar um Conselho de Base. E a segunda foi por questões estruturais. O que me chamou atenção é que para mim essas justificativas revelam uma pequenez política do movimento estudantil na UFT. Não, não me apedrejem. Explico por que. Antes compreendamos o que é pequenez política.

Pequenez política é quando agimos de forma mesquinha – pensando mais nos nossos interesses pessoais do que na coletividade. Para conseguir os nossos objetivos não pensamos duas vezes em agir com baixeza e utilizando de artifícios intelectualmente e moralmente condenáveis. Ousaria dizer que quem age com pequenez na política não faz política e sim politicagem.

Voltemos à questão. Em relação a legitimidade para convocar o Conselho de Base ficou notório a tentativa de falsificar o estatuto da entidade para dar legitimidade para quem já não tinha. Já em relação à falta de estrutura um movimento estudantil que não tem a capacidade de se autofinanciar para realizar um encontro anualmente não sei nem o que dizer. Não há justificativa. Mas o pior é que quem conhece os bastidores sabe bem que não é isso. Tanto a legitimidade para convocar o CEB como a questão estrutural seria facilmente superada se houvesse disposição para o diálogo e os interesses coletivos fossem colocados acima dos interesses particulares.

Mas não, preferem ficar perdendo tempo numa disputa mesquinha para ver quem consegue convocar o CEB que dará quórum. E por que isso? Por que acreditam que assim conseguiram vantagens na disputa futura. Por isso boicotam-se mutuamente (O problema é que sem CEBE não há disputa). E quem perde com isso? Todas e todos os estudantes da Universidade Federal do Tocantins que estão sem o seu órgão máximo de representatividade. E a perspectiva é que entremos em 2019, um ano nebuloso com a ascensão de um governo de extrema direita na presidência da república, sem uma nova gestão. E isso, por pequenez política do movimento estudantil na UFT.

Ora, antes do inicio de qualquer campeonato esportivo os dirigentes precisam se reunir para deliberar acerca do regimento que irá regular as disputas, como também quem serão os responsáveis por garantir que esse regimento seja respeitado. Sem isso não há jogo. De modo que os envolvidos tem que deixar a rivalidade de lado e sentarem na mesma mesa para construir se não um consenso, pelo menos algo aprovado pela maioria.

As eleições para um Diretório Central dos Estudantes (DCE) não é uma disputa esportiva. Mas o processo não é muito diferente. Para que aja eleição é preciso elaborar um regimento eleitoral e eleger uma Comissão que ficará responsável por garantir o respeito a esse regimento. Sem isso não há eleição. De modo que as entidades de base (Diretórios Acadêmicos e Centros Acadêmicos) precisam sentar na mesma mesa para deliberar sobre o regimento das eleições bem como quem será a Comissão Eleitoral. E isso se dá através da realização do CEB.

Bom, o que acabo de dizer é bastante óbvio. Todos que estão envolvidos no processo têm plena consciência disso. Mas por que agem de forma diferente? Isso evidência mais ainda as suas pequenez politica.

Pedro Ferreira Nunes – Cursa Filosofia na Universidade Federal do Tocantins.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Conto: Morro encantado

Quando Sophia ia passar férias em Lajeado, adorava ouvir as estórias que sua bisavó lhe contava a cerca daquele lugar encantador. Ela tinha uma paixão inexplicável por aquele lugar – mesmo não sendo dali. Mas lá no fundo do seu coração era como se fosse. Até por que, ali era a terra de sua bisavó, de sua avó e de sua mãe.

- Bisa, por que aquele morro se chama morro encantado?

- Oh, minha filha é uma estória longa. Tem certeza que quer ouvir agora? Vai brincar mais os teus amiguinhos, aproveita o tempo que as férias já estão acabando e logo tu volta pro Goiás. 

- Não vó. Não quero brincar agora. Conta vai, a senhora sabe que adoro ouvir essas lendas.

- Isso não é lenda não menina. Isso aconteceu mesmo e ainda acontece. Que o diga os pescadores que andam por aquelas bandas.

A verdade era que dona Maria Lucia, a bisavó de Sophia adorava contar aquelas estórias. Estórias que ela ouvia quando criança. E contar aquelas velhas estórias, que quase ninguém se lembrava por ali, era uma forma dela rememorar a sua infância. Quando a velha Maria Lucia contava aquelas estórias para sua bisnetinha Sophia, ela voltava a ser a criança que fora há muitos anos.

- Minha querida há muitos anos atrás não existia a cidade de Palmas, nem Lajeado, nem Tocantinia, nem Miracema. Muito menos existia o estado do Tocantins. Nessa região existia apenas a cidade de Porto Nacional, que antes, ainda na época do império se chamava Porto Real – um povoado que se tornou cidade graças ao garimpo de pedras preciosas. Nesse tempo não havia estradas, todas as mercadorias que chegavam e saiam de Porto Real era pelo rio Tocantins através de barcos e de canoas. Esse era o transporte mais utilizado nessa região. 

- E como eles faziam para passar pela usina hidrelétrica bisavó?

- Vixe. Essa usina aqui foi construída muito tempo depois. Tu nem imagina o quanto isso aqui era diferente, o quanto isso aqui era bonito antes da construção da usina hidrelétrica. 

A velha suspirou e disse: Ah, aquele sim, foi um tempo bom, tempo que não volta mais minha querida. Mas também era muito perigoso. Muitos navegadores tiveram seus barcos tombados e perderam a vida nessas águas.

- É a senhora já me contou algumas dessas estórias, mas também com tantos animais encantados que habitam essas águas. Não é de se admirar que tanta gente tenha morrido neste rio não é mesmo?!

- Mas sabe Sophia. O maior perigo não era nem os animais encantados que vivem nas águas do Tocantins, mas sim as seis cachoeiras, que eram quase impossíveis de embarcações, passar sem tombar e afundar. Passar a cachoeira do quebra cocos, dos pilões, de todos os santos, e dos mares até que era tranquilo, mas passar a do Lajeado e a do funil era quase impossível, só os melhores canoeiros e barqueiros conseguiam. Mas deixemos a estória das seis cachoeiras de lado que outra hora de conto, vamos falar sobre o morro encantado.

- Tá certo bisa. Mas me diga antes. Pra onde eles iam com essas mercadorias se não existia nem Palmas, Lajeado, Miracema e Tocantinia?

- Eles iam para Marabá e Belém no Pará. 

- Já existiam?

- Sim.

- Tá bom bisa. Continua a contar então sobre a estória do morro encantando.

- Certa vez um barco carregado de pedras preciosas partiu de Porto Real rumo a Belém do Pará. E no caminho esse barco foi assaltado por uns piratas.

- Piratas no rio Tocantins?

- É o que o povo conta minha filha. Para ti dizer a verdade não sei bem nem o que é pirata.

- São ladrões bisa.

- Isso mesmo. Eles assaltaram o barco e conseguiram tomar todo o ouro que havia. E em seguida se esconderam neste morro carregados de ouro, diamante e outras pedras preciosas. Pois sabiam que não tardaria da coroa portuguesa que era dona de todo aquela riqueza mandar os guardas imperiais em busca da carga roubada pelos piratas.

- Nossa!

- E eles estavam certos. Não tardou do rio Tocantins ser tomado por embarcações oficiais vindo de Porto e de Belém. Os guardas imperiais não demoraram de achar o rastro dos piratas e logo adentraram a serra em busca deles. E assim que os encontraram começou uma grande troca de tiro. Os piratas perceberam que não conseguiriam resistir por muito tempo aos ataques dos guardas imperiais, pois suas munições já estavam no fim. Decidiram então esconder o ouro e fugir, e assim depois de algum tempo voltariam para busca-lo. Mas na fuga pelo morro acabaram sendo mortos pelos guardas imperiais. E mesmo o local sendo revirado de ponta a ponta o ouro nunca fora encontrado.

- Até hoje?

- Sim. Assim o povo conta.

- Quer dizer que tem um tesouro escondido no morro encantado?

- Depois desse acontecido, todos os pescadores e viajantes que navegam por aquelas bandas à noite, relatam a aparição de uma enorme bola de fogo protegendo o local. O povo mais velho acredita que essa bola de fogo é uma proteção do tesouro escondido pelos piratas, que foram mortos ali e se tornaram seres encantados e é dessa estória que nasceu o nome de morro encantado.

- Que estória incrível bisa. Inacreditável. Daria para fazer um filme.

E dona Maria Lucia ficava extremamente feliz ao ver o encantamento de Sophia por aquelas velhas estórias.  Ainda mais por que ninguém por ali se importava com aqueles causos populares, especialmente os mais jovens. E a falta de interesse levaria ao desaparecimento dessas estórias que são passadas de geração em geração de forma oral. No entanto para dona Maria Lucia ter uma jovem interessada por essas estórias era um sinal de que esses causos e contos populares permaneceriam vivos.

- Quem sabe Sophia não se torne uma escritora um dia e escreve essas estórias para que elas nunca se percam. 

Pensava consigo a velha Maria Lucia orgulhosa da sua bisnetinha que a fazia lembrar do seu tempo de criança. 

Por Pedro Ferreira Nunes - Poeta e Escritor popular tocantinense. 

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

“Não seja um universitário imbecil”

Quando entramos na academia corremos o risco de nos achar seres superiores aos demais, passamos a desprezar o conhecimento popular e nos isolamos do restante da sociedade. Foi a esse processo que o Educador Francisco Alemberg se referiu quando nos disse para não ser universitários imbecis – que acredita ser os detentores do conhecimento, os únicos capazes de transformar a sociedade com nossas teorias de gabinete.

Alemberg nos desafiou a sair das nossas redomas de vidro, colocar o pé no chão e ir ao encontro do povo. Não para levar nossas teorias buscando liberta-los, mas dispostos a aprender, e a partir dai construir conjuntamente trincheiras de resistência contra esse sistema que nos segrega. E ele tem bastante legitimidade para nos dizer isso. Pois criou uma organização social (Fundação Casa Grande) no sertão do Cariri de renome internacional – colocando uma pequena cidade interiorana que era invisível no Brasil, diria que até mesmo no Ceará, no mapa mundial. E o principal, dando condições para que as pessoas que ali vivem construam sua autonomia e sejam protagonistas de suas histórias.

No interior as elites políticas querem tudo, menos sujeitos autônomos capazes de questionar sua autoridade. Daí que muitos preferem migrar para os grandes centros em busca de melhores condições de vida. Alemberg nos mostra que essa não é a alternativa, precisamos permanecer no interior e criar condições para ter uma vida digna sem precisar deixar nossa terra. Ele nos mostra que isso não é impossível. O interior tem um acervo riquíssimo que pode ser explorado sustentavelmente em beneficio da comunidade – o que falta são sujeitos dispostos a fazer em vez de se acomodar.

Alemberg nos desafiou a olhar para o entorno da universidade, a observar o que está sendo produzido nas comunidades populares, trazer esses saberes para universidade e aprender com eles. Quando ele disse isso fiquei imaginando de quanta coisa bacana do ponto de vista cultural, cultura de resistência – temos no nosso entorno, mas que não damos o devido valor. Me refiro por exemplo as pinturas rupestres na Serra do Lajeado, a Arca em Miracema, a Arte Cerâmica das Mulheres Artesãs do Município de Lajeado, a Fundação Fava de Bolota em Palmas, o Projeto Viola de Vereda, Tambores do Tocantins, sem falar no artesanato indígena e quilombola. 

Porém é preciso não ser um universitário imbecil para poder perceber toda essa riqueza e aprender com ela. Nós a frente da gestão Despertar é preciso! do Centro Académico de Filosofia da UFT – CAFIL Prof. José Manoel Miranda sempre defendemos a necessidade de derrubarmos os muros que separa a universidade do resto da sociedade. É por isso que nos eventos que ajudamos construir fazemos questão da participação de grupos de cultura popular. E nessa V Semana Intercursos de Filosofia e Teatro a presença do Francisco Alemberg na conferência de encerramento foi mais um passo nesse sentido.

Um evento que teve como tema: “Arte, política, hoje” não poderia ter sido encerrado melhor como foi com a fala do Alemberg – compartilhando conosco sua rica experiência no sertão nordestino, mostrando como a arte é um poderoso instrumento de formação e construção de autonomia dos sujeitos. Muito significativo também para nós tocantinenses, é que Alemberg tem uma ligação forte com esse antigo norte goiano, pois viveu parte da sua infância e juventude em Miranorte, e ali aprendeu a importância da música na sua formação – um elemento fundamental em todo o trabalho que ele desenvolve.

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e militante do Coletivo José Porfírio. Cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente cursa Filosofia pela UFT.

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Breve reflexão sobre “responsabilidade política”

O que seria ter responsabilidade política? O ponto de partida para responder essa questão é entender o que é política. Pois não tem como falar em responsabilidade politica se não sabermos antes o que é política. Tal questão se torna ainda mais fundamental nos nossos dias que parece se caracterizar por uma negação da política.

A palavra política vem do grego polis que significa cidade. E de acordo com Marcondes (2001), é “tudo aquilo que diz respeito aos cidadãos e ao governo da cidade”. Isto é, aos negócios públicos. E aqui já observamos três conceitos importantes para compreensão da política: Cidadão, Governo e Público. Não, não destrincharemos cada um deles. Mas é importante notar que no seu sentido original, a política é constituída desses três elementos. 

Na tradição clássica em geral Marcondes (2001) nos diz que “a política pertence ao domínio do conhecimento prático e é de natureza normativa, estabelecendo os critérios da justiça e do bom governo”. Tendo como fim a busca pelo bem-estar na sociedade – na existência coletiva.

Aranha (2003) também segue essa linha, apontando a política como “a arte de governar, gerir o destino da cidade”. Ora, quem tem o dever de fazer isso se não os cidadãos através da intervenção na esfera pública?! A autora nos trás dois conceitos importantes para compreendermos a política – poder e força. Para Aranha (2006) “a política se refere às relações de poder” e para que alguém exerça esse poder é necessário força. Ressaltando que quando em política se fala em força não necessariamente está se falando do uso da violência explicita.

Diante dessa questão é possível fazer uma relação com o que diz Marcuse na sua obra: “A Ideologia da Sociedade Industrial: O Homem Unidimensional”. Este autor vai exatamente apontar a instrumentalização da tecnologia para dominação política. Ele nos diz que “a tecnologia serve para instituir formas novas, mais eficazes e mais agradáveis de controle social e coesão social.” (1973, p. 18) E como fica a política nesse contexto? A política é negada, sobretudo, quando de acordo com Marcuse (1973) o debate político perde a “sua função critica básica” de independência de pensamento, autonomia e direito à oposição. 

Nessa linha de negação da política que nos parece ser uma das características da contemporaneidade é importante trazer a reflexão do filosófo Desidério Murcho no seu artigo sobre “O fim da política”. Murcho (2010) afirma que atualmente um interesse intenso pela vida política só faz sentido para generalidade das pessoas quando o conforto da sua vida privada está em risco, ou quando têm a esperança de que uma mudança política terá resultados importantes para qualidade da sua vida privada. 

Desse modo é plausível falar em fim da política, pelo menos no seu sentido clássico – onde a preocupação como vimos era com o bem comum, o coletivo, o público e não a vida privada de cada indivíduo . Para Murcho (2010) “a generalidade da população sempre encarou a vida pública como um mero meio para ter uma vida privada melhor”. Dai que para o filósofo só há uma preocupação com a política por parte da generalidade dos indivíduos quando seus interesses privados são atingidos. Para o autor isso explica a ascensão de gestores no lugar dos políticos tradicionais. Que inclusive são eleitos justamente com o discurso de negação da política.

Para onde isso nos levará? Quais as consequências disso para nossa existência coletiva na cidade? Todos estão cientes dessas consequências? Bom, é aqui que entra a questão da responsabilidade. De acordo com Marcondes (2001) “a noção de responsabilidade está estritamente ligada à noção de liberdade, já que um indivíduo só pode ser responsável por seus atos se é livre, isto é, se realmente teve a intenção de realizá-los, e se tem plena consciência de os ter praticado”.

Diante disso é interessante retomarmos Marcuse, sobretudo ao abordar a questão da liberdade na sociedade contemporânea. De acordo este autor (1973) “sob o julgo de um todo repressivo, a liberdade pode ser transformada em poderoso instrumento de dominação.” Ora, como falar em responsabilidade política nesse contexto de negação da politica – uma negação que nos parece que se dá justamente pela falta de consciência das suas consequências.  E o que seria essa responsabilidade política? 

O primeiro ponto é seguir a linha que adotamos nesse texto, isto é, começar por entender o que é política. Sem ter consciência a respeito do que é e qual o papel da política não tem como haver responsabilidade política. Nessa perspectiva é fundamental resgatar o conceito clássico de Política, sobretudo no que concerne a busca pelo bem-estar comum. Apontando o fato de que quando nos preocupamos apenas com o nosso bem estar privado ou de determinado grupo, estamos negando a política e caminhando perigosamente para o campo do fundamentalismo e da intolerância – e não precisamos ir muito longe na história da humanidade para perceber que o saldo desse caminho não é positivo. 

Desse modo, para finalizar, a maior responsabilidade política que devemos assumir é a defesa da política como um elemento central na vida em sociedade – o que novamente nos faz voltar ao ponto de que é preciso saber o que é política e a sua importância para construção de uma sociedade democrática.

Referência Bibliográfica

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia – 3 ed. revista – São Paulo: Moderna, 2003.

MARCONDES, Danilo; JAPIASSÚ, Hilton. Dicionário Básico de Filosofia. 3º Edição. Jorge Zahar Editor – Rio de Janeiro; 2001.

MARCURSE, Herbert. A Ideologia da Sociedade Industrial: O Homem Unidimensional. Tradução: Giasone Rebuá. 4º Ed. Zahar Editores – Rio de Janeiro, 1973.

MURCHO, Desidério. O fim da Política. Disponível em: criticanarede.com. Acesso em: 30 de Agosto de 2017.

*Pedro Ferreira Nunes – É Graduando em Filosofia pela UFT.

*Trabalho apresentado à disciplina de Fundamentos de Filosofia Política, do curso de Licenciatura em Filosofia da Universidade Federal do Tocantins. Palmas, 2018.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Poema: Batuque

O batuque dos tambores toca profundo no meu
coração
Não sei por que
Não tenho explicação.
Quando ouço o som dos tambores
Acelera o meu coração.
Samba de coco
Maracatu
Súcia
Tambor de crioula
Ah, não tem jeito não
O som dos tambores mexe com meu coração.

O batuque dos tambores é o grito dos meus ancestrais
que foram arrancados da mãe África
Que foram escravizados, torturados, maltratados.
Mas que bravamente resistiram:
Batucando
Cantando
Dançando
Amando
E lutando.
E é por isso meus irmãos
Que o batuque dos tambores
Mexe com o meu coração.

Por Pedro Ferreira Nunes 

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Sobre as “Noticias do esbulho”.

“Vocês me dizem que o Brasil não desenvolve, 
sem o agrobiz feroz, 
desenvolvimentista.  
Mas até hoje na verdade nunca houve 
um desenvolvimento tão destrutivista...”
Reis do Agronegócio, Chico César

A divulgação do relatório realizado pela Caravana Matopiba (composta por 34 organizações brasileiras e internacionais) que aponta “indícios de grilagem de terras por empresas nacionais e estrangeiras e as consequentes violações de direitos humanos decorrentes dessas grilagens”. Sem falar dos impactos ambientais. Confirmam o que estamos denunciando já há algum tempo. 

Nunca tivemos nenhuma ilusão que esse projeto tão festejado pelas elites locais traria algum beneficio para os povos tradicionais que vivem na região. E já alertávamos para o fato que “as riquezas que serão geradas por este projeto encherá apenas os bolsos da burguesia agrária e das transnacionais. Enquanto os povos tradicionais dessa região ficaram na miséria e o bioma cerrado será completamente devastado”. (Manifesto: Em defesa do cerrado, em defesa da vida – Não ao MATOPIBA!, 2016) E esse prognostico tem se confirmado como aponta os dados divulgados pela Agrosatélite – de que já foram perdidos cerca de  171,4 mil Km2 do bioma nativo.

O que também tem se confirmado é o aumento da violência e a expulsão dos povos tradicionais – indígenas, quilombolas e camponeses pobres de suas terras. No Tocantins, por exemplo, recentemente tivemos o ataque sofrido pela Comunidade Camponesa Tauá no município de Barra do Ouro. E em Março de 2016 denunciamos as ameaças sofridas por camponeses pobres dos munícipios de Rio Sono e Lizarda. Inclusive naquela oportunidade já alertávamos para o fato de que “casos como esse tendem a se intensificar no MATOPIBA, onde será atingida uma área de mais de 70 milhões de hectares”. (NUNES, 2016)

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) também vem apontando no seu levantamento anual de conflitos no campo o aumento da violência contra os povos tradicionais na região do MATOPIBA. Aliás, violência que nós mesmos sentimos na pele quando nos manifestamos contra o projeto em dois eventos realizado no campus de Palmas da Universidade Federal do Tocantins. E em um desses eventos com a presença de diversas autoridades o objetivo era apresentar o projeto MATOPIBA para investidores internacionais. 

Nessa linha é importante destacar a participação de investidores internacionais no avanço do projeto MATOPIBA. Segundo o documento elaborado pela Caravana Matopiba um levantamento feito na Europa aponta o envolvimento de “fundos de pensão da Holanda, Alemanha e Suécia na expansão do agronegócio e nas apropriações de terras na região” transformando-as em um bem financeiro. E a partir dai a busca é em obter o máximo de lucro possível. De modo que não há nenhuma preocupação com os impactos socioambientais. E a situação se torna ainda mais degradante devido à anuência e omissão por parte dos governos tanto a nível federal, estadual e municipal. 

Essa anuência e omissão são ressaltadas pelo documento ao apontar que “o Estado brasileiro – em níveis federal, estadual e municipal – violou suas obrigações relativas aos direitos humanos ao promover o avanço do agronegócio na região, ao não proteger a população local das ações de grileiros locais, das empresas do agronegócio e dos investidores, e ao não estabelecer uma prestação de contas”. (Caravana Matopiba, 2018).

Diante da conjuntura política atual no Brasil, sobretudo da força da bancada ruralista no congresso nacional e do governo eleito. Infelizmente esse processo tende a se intensificar. O que fica evidente diante do discurso do presidente eleito (Jair Bolsonaro) e do seu futuro ministro da Casa Civil (Onix Lorenzoni) contra as organizações ambientalistas que segundo eles atrapalham o desenvolvimento do Brasil. Nos cabe questionar: Que desenvolvimento? O do projeto MATOPIBA?

O desenvolvimento que vocês prometem conhecemos bem. É o desenvolvimento que Chico César na sua canção-manifesto Reis do Agronegócio denuncia – um desenvolvimento destrutivista. Um desenvolvimento que não interessa aos indígenas, quilombolas e camponeses pobres. E nem a qualquer um que sabe da importância de protegermos e preservarmos nossas riquezas naturais.

É interessante que na hora de criticar as organizações internacionais que apoiam a defesa do meio ambiente o discurso do futuro governo é claro – “não podemos aceitar que essas ONGs ambientalistas interfiram na nossa soberania”. E o que dizer da participação do capital internacional no avanço do agronegócio adquirindo extensas áreas de terra, financiando a violência contra os povos tradicionais e usurpando seus territórios? Isso não vai contra a soberania nacional? 

Diante dessas questões mais do que nunca precisamos nos organizar e nos mobilizar contra esse modelo de desenvolvimento no qual o projeto MATOPIBA esta inserido. Nós do Coletivo José Porfírio temos denunciado e continuaremos denunciando os efeitos nefastos desse projeto, sobretudo no Tocantins. Nos colocamos terminantemente contrários a esse modelo de desenvolvimento que usurpa nossas riquezas e viola nossos direitos. E conclamamos a todos os povos do campo a levantar trincheiras de resistência nessa luta também.

Pedro Ferreira Nunes
Pelo Coletivo José Porfírio

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Ainda sobre as eleições no Tocantins: A vitória.

Se na nossa analise Marlon Reis e o seu partido Rede Sustentabilidade foram os maiores derrotados nas eleições tocantinenses. Quem seria então o maior vitorioso? O governador Mauro Carlesse (PHS) que conseguiu a reeleição ainda no primeiro turno? O MDB que mesmo em crise elegeu a maior bancada da assembleia legislativa? A família Abreu com a eleição de Irajá para o senado? Ou Eduardo Gomes e o seu partido Solidariedade?

Sem dúvida todos esses personagens têm motivos para comemorar. No entanto o maior vitorioso nesse pleito eleitoral foi o senador eleito Eduardo Gomes (SD). Gomes teve a façanha não só de ser eleito (com 248.358 votos) o senador mais votado do Tocantins com pouco mais de 34 mil votos de diferença para o segundo colocado – desbancando figuras com mandato como os senadores Vicentinho e Ataídes Oliveira. Mas também foi o principal articulador e estrategista para que seu partido (Solidariedade) ressurgisse das cinzas e tivesse um grande êxito na eleição de deputados estaduais e federais.

Por exemplo, o partido comandado por Eduardo Gomes elegeu mais parlamentares que o partido de Mauro Carlesse – o PHS. E também mais do que partidos tradicionais como PSDB, PR, PP, PSB e PT. Ficando apenas atrás do MDB.  Enquanto o partido comandado por Eduardo Gomes elegeu 3 deputados estaduais, o MDB elegeu 5. No entanto para a Câmara dos deputados o Solidariedade elegeu 2 deputados enquanto o MDB só elegeu 1. E somando a isso a eleição do próprio Eduardo Gomes para o senado faz do Solidariedade o partido mais vitorioso dessa eleição.

Diante disso, ainda que não fosse eleito para o senado, Eduardo Gomes teria o que comemorar. O que não ocorreu com o PR do Vicentinho que sai menor do que entrou na disputa. A mesma coisa pode se falar do PSD, do PSDB e até mesmo do MDB – que, aliás, foi o que mais perdeu em relação ao que conseguiu eleger em 2014. E em 2016 onde elegeu o segundo maior número de prefeitos.

O Solidariedade por sua vez que saíra derrotado em 2014 tanto com Sandoval Cardoso na disputa pelo Governo como para o senado com Eduardo Gomes perdendo para Kátia Abreu. E que em 2016 elegeu apenas 5 prefeitos – não sendo nenhum dos grandes municípios tocantinenses. Se coloca novamente como uma grande força política no cenário regional. Um fenômeno que se deve inquestionavelmente a liderança de Eduardo Gomes.

Eduardo Gomes não é uma figura nova na política tocantinense. Formado nas fileiras da antiga União do Tocantins (UT) ele já ocupou diversos cargos eletivos, incluindo de deputado federal. E foi justamente a atuação como deputado federal que pavimentou a sua eleição agora para o senado. No entanto, mesmo tendo uma forte ligação política com o Siqueirismo, Eduardo Gomes tem algumas qualidades que falta para maioria dos políticos tocantinenses (especialmente os oriundos da UT). E essas qualidades como capacidade de diálogo, articulador e estrategista fizeram com que ele tivesse a maior vitória dessa eleição tanto do ponto de vista pessoal como do ponto de vista partidário.

Eduardo Gomes tinha tudo para deixar o SD após as eleições de 2014, mas não o fez. Não abandonou o barco como fez Sandoval Cardoso e outros. Em 2016 foi outro momento que ele poderia abandonar o barco em busca de uma estrutura partidária mais forte para disputar uma vaga ao senado, mas também não o fez. Mesmo quando foi indicado para ser suplente do velho Siqueira na disputa por uma vaga ao senado –Eduardo Gomes aceitou com humildade – sem espernear. 

Gomes poderia ter feito como outros que foram em busca de espaços mais privilegiados junto a outras coligações. Ou então poderia se lançar a Câmara dos deputados – que não teria dificuldades para se eleger. Mas ao decidir ficar na suplência de Siqueira mostrou ter visão estratégica e de grupo. Pois se levasse o SD para outra coligação muito provavelmente não teria o mesmo saldo eleitoral. E acabou sendo premiado com a desistência do velho Siqueira de concorrer ao senado por problemas de saúde.

Quando isso se deu escrevemos um artigo falando que a imagem do velho Siqueira iria ser usada para fortalecer as candidaturas dos seus aliados. E foi justamente o que fez Eduardo Gomes. No entanto não podemos reduzir a sua vitória ao apoio do Siqueira. Mas sim a um trabalho de base que ele vem fazendo nos municípios há um bom tempo. Aliás, essa é uma das suas grandes características – atuar nos bastidores, longe dos holofotes.

Diante disso para nós fica evidente que Eduardo Gomes e o seu partido tiveram a maior vitória no pleito eleitoral. E a sua capacidade o coloca numa posição privilegiada diante do governo Bolsonaro (É, governo Bolsonaro, quem diria?!). Sobretudo através do desprezível Onix Lorenzoni. Com isso Eduardo Gomes tem tudo para se tornar a principal referencia política do Tocantins a nível nacional – tomando uma posição que até então era da Senadora Kátia Abreu. 

Esse movimento revela uma mudança importante na política tocantinense. Com uma renovação de quadros tomando uma posição de liderança ainda maior do que já ocupavam. Esse movimento pode ser observado não só pela vitória do Eduardo Gomes e o fortalecimento do seu partido (SD). Mas também com a eleição de Irajá Abreu (PSD) e do próprio Mauro Carlesse (PHS). Por outro lado o que fica evidente é que essa mudança é apenas de nomes já que os interesses que eles representam continuam sendo os das elites.

Pedro Ferreira Nunes – É Educador Popular e militante do Coletivo José Porfírio. Cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente estuda Filosofia na Universidade Federal do Tocantins.