sexta-feira, 24 de maio de 2019

Música popular tocantinense: Canções tocantinas.

“Venha vestida de roda, morena, espante esse mal, solidão. 
Venha que a roda catira, morena, lhe chama”.
Braguinha Barroso

Ainda criança aprendi a apreciar a música popular feita no Tocantins, especialmente as canções do Dorivan, Genésio Tocantins, Braguinha Barroso, Chico Chokolate, Juraides da Cruz e Orley Massoli. E na ausência de uma literatura regional acessível foram os versos desses artistas através de suas canções que contribuíram com a formação da minha identidade tocantinense e me influenciaram no oficio de escrever poesias, contos e crônicas.

Na minha infância destacaria três canções: Frutos da Terra do Genésio Tocantins, Senhor do Bonfim do Dorivan e Atômico do Chico Chokolate: A primeira é uma linda homenagem ao nosso cerrado e as suas riquezas: “Tem guapeva lá no mato, no brejinho tem ingá, no campo tem curriola, murici, araçá. Tem uns pés de marmelada, depois que passa a pinguela, subindo pro cerradinho, mangaba e mama-cadela”. Essa canção que na infância nos afetava de alegria, hoje nos afeta de tristeza, sobretudo por que com o avanço do agronegócio a diversidade de frutos que o cerrado tinha, já não tem. O que tem é soja, cana de açúcar e pasto pra gado. 

A segunda é um belo retrato da alma religiosa do povo tocantinense que todos os anos segue em Romaria para pedir e agradecer as bênçãos recebidas durante o ano: “Senhor do Bonfim, esse ano eu vou a pé, vou pagar minhas promessas, elevar a minha fé...”. Um povo sofrido que faz enormes sacrifício para sobreviver, mas que não perde a esperança e a fé. 

Já a terceira (uma parceria do Chico Chokolate com o Ronaldo Teixeira) é um primor – uma letra brilhante interpretada numa pegada rock in roll – que rompe com a barreira do regionalismo: “Baby, o Armagedom já aconteceu dentro do meu coração, e eu tive a sensação de ver tudo ruir. Errei ao imaginar, uma metrópole perfeita e segura do nosso amor. O Alicerce era fraco e eu não sabia, que a explosão da bomba eu não suportaria.” A canção que fala de uma história de amor que chega ao fim, e como toda história de amor que chega ao fim deixa seus estragos, é poesia da melhor qualidade: “Baby, esse brilho de mil sois pode nos cegar, Baby, feridos assim aonde vamos parar? 

A partir daí nunca perdi meu interesse na música popular feita no Tocantins – apesar da dificuldade de acesso a rica produção desses artistas diante da falta de espaço, especialmente no interior, para que eles possam divulgar os seus trabalhos. 

Se hoje as coisas ainda são difíceis imagine antes da popularização da internet. Antes a divulgação era restrita a algumas rádios (isso não mudou muito) e a clipes divulgados nos intervalos da programação da TV Anhanguera – e foi assim que eu particularmente tive acesso aos trabalhos desses artistas e de outros como Orley Massoli – autor de canções como Imensidão e Terraguarés (não sei se é assim que se escreve) e da bela Meninos da Candelária: “se tudo jaz, eu canto um jazz, a vida é um jasmim”. 

Outra bela canção de sua autoria é Menino de Paraiso que canta os encantos e a liberdade da infância: “O menino voou no balão, com seus dragões, aviões... Minha branca de neve me leve, sou criança pare com isso. Me abrace e me beije de leve, sou menino de Paraíso”. 

Se tratando de música tocantinense um artista que não pode ficar de fora é Juraides da Cruz – com um pé em Goiás e outro no Tocantins – ouso dizer que ele é um dos grandes compositores da música popular brasileira. Eu particularmente gosto de Meninos: “Não sou tanajura, mas eu crio asas, com os vagalumes eu quero voar... O céu estrelado hoje é minha casa, fica mais bonita quando tem luar... Quero acordar com os passarinhos, cantar uma canção com o sabiá”. Só os amantes da vida interiorana compreendem o quanto isso é prazeroso. 

Outra canção dele bastante conhecida que eu também aprecio é “Ei flor. Cadê o cheiro que ocê prometeu. Ei, flor. Não venha dizer que se esqueceu.... Amor, não lembra mais do seu dodói, eu era o lírio dos teus olhos, nós banhava no riacho, diacho, valha-me Deus”. Além de Memórias de carreiro, não tão conhecida como as duas anteriores e o seu grande sucesso (nois é jeca mas é joiá), mas de uma beleza impar: “Hoje tenho as mãos calejadas, de um trabalho duro e cruel. Só me restou uma sorte marvada: Boi-de-canga de Coronel”. Em outro trecho ele canta “Faço parte dessa manada, na cidade tonta e perdida. Me vem na garganta um nó de laçada, e no peito uma saudade doida...”. E o refrão: “Êh, tempo que se foi, te guardo no coração. Êh, carro de boi, sumiste no estradão”. Eis a sina de tantos que foram expulso do campo diante do avanço do agronegócio devastador.

Outro artista que não poderia deixar de falar é o Braguinha Barroso que trás na sua música toda a força da cultura negra. Um exemplo é a canção Catirandê: “Venha vestida de roda, morena, espante esse mal, solidão. Venha que a roda catira, morena, lhe chama”. Apesar dos pesares é preciso resistir e ninguém melhor que o povo negro sabe resistir com alegria. “Meu bem querer, quando eu for não chore, que eu volto antes do dia nascer, meu bem querer”.

Bem, além desses artistas e dessas canções, existem outros tantos artistas e outras tantas canções que poderiam serem apresentados nessas breves linhas. Mas fiquemos por aqui. Creio que essa pequena amostra cumpre o objetivo de apresentar de forma breve a riqueza da música popular tocantinense. 

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”.

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Hostilidade as universidades públicas e aos Cursos de Humanas

“Essa luta é reflexo da luta entre uma classe social que não quer perder seus privilégios e uma nova classe ou conjunto de classes sociais que estão tentando adquirir seus direitos à cultura”. 
Ernesto Che Guevara

Que não se iludam camaradas. A atitude hostil do governo Bolsonaro contra as universidades públicas conta com um importante respaldo popular sobretudo diante do preconceito do que de fato é a realidade nos campus universitários desse país. E em grande medida temos a nossa cota de responsabilidade por esse desconhecimento, quando ao invés de derrubar o muro que isola a Universidade Pública do resto da sociedade, contribuímos para sua manutenção.

Senti essa hostilidade na pele quando ingressei no curso de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins por parte dos colegas do transporte universitário que serve aos estudantes do município de Lajeado que estudam em Palmas (cerca de 90% em instituições privadas de ensino). No inicio não entendi muito bem o porquê da hostilidade, já que estudar numa instituição federal (onde a qualidade de ensino é inegavelmente superior) deveria ser algo a ser almejado por todos. 

Cheguei a pensar que fosse algo pessoal comigo ou inveja por não conseguirem ingressar numa universidade pública. Mas depois percebi que não era só comigo, mas com todos os estudantes da Universidade Federal do Tocantins. E claro, sendo do curso de Filosofia ou Teatro essa hostilidade aumentava significativamente. Foi o que percebi em conversa com outros colegas que me relatavam o que ouviam quando diziam que cursavam Filosofia ou Teatro na UFT.

E tal atitude se fundamenta na crença de que os cursos têm uma orientação marxista, que os professores são todos comunistas e ateus (fazendo doutrinação ideológica), que o consumo de drogas (especialmente maconha) acontece em plena aula e que as festas sempre acabam em orgias. Em suma um ambiente, totalmente contrario ao que prega a moral e os bons costumes da sagrada família tocantinense. Inclusive essa crença é alimentanda por egressos que distorcem os fatos, transformando exceções em regras.

E esse fato por si só é uma mostra de que não há doutrinação ideológica nas Universidades. Pois se houvesse uma doutrinação ideológica (comunista) não teríamos estudantes alimentando esse tipo de discurso contra valores que em sua grande maioria estão longe de serem comunistas, mas sim liberais. Ainda nesse sentido é importante destacar que um número significativo de estudantes da UFT, inclusive dos cursos de humanas (como o de Filosofia), votaram no Bolsonaro. O que mostra que se há uma doutrinação por parte do colegiado de Filosofia da UFT, essa doutrinação não está sendo tão eficaz assim.

Quem não frequenta o curso de Filosofia pode achar que esse se reduz a Marx e aos marxistas. Mas o fato é que a realidade é bem diferente. Nos meus 08 períodos de curso pude perceber que se fala muito de Marx mas estuda-lo propriamente se faz muito pouco. Tanto, que pelo menos na minha graduação, não lemos nenhuma obra completa desse filósofo, nem se quer o “Manifesto do Partido Comunista” que é uma obra pequena e bastante acessível. Apenas no 7º e 8º período vimos muito superficialmente o seu pensamento e lemos pequenos trechos da “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel”.

Aliás no colegiado de Filosofia da UFT não tem nenhum professor especialista na obra de Karl Marx. A leitura que eles têm da obra desse filósofo é a partir de autores marxistas como Marcuse, Adorno, Gramsci, Paulo Freire entre outros. E mesmo esses autores, durante a minha formação, não se trabalhou uma obra completa de suas autorias. Ao contrário das obras de filósofos como Platão, Aristóteles, Spinoza, Nietsche, Rousseau e Freud.

A partir dai poderia se dizer que o curso de Filosofia da UFT é, portanto, uma exceção. Mas não é bem assim. O filósofo Vladimir Safatle relata em um artigo intitulado “Marx, esse desconhecido” que na sua graduação na USP ele também não estudou Marx. Mas um exemplo melhor é se analisar os trabalhos apresentados nos encontros de Filosofia que acontece em todo o Brasil (especialmente o ENEFIL) e a partir daí se perceberá a pluralidade de perspectivas filosóficas e temas filosóficos que são trabalhado nos cursos. 

Aliás é importante também fazer essa análise dos trabalhos apresentado nos eventos promovido pelo Colegiado de Filosofia da UFT e pelo Centro Acadêmico e garanto que se confirmará o que já disse aqui – o estudo do pensamento de Marx e os dos marxistas é uma exceção e não a regra.

E sendo exceção por que incomoda tanto? Por que faz a diferença! Combate a mediocridade e é uma trincheira de resistência ao projeto de mercantilização da educação pública – um projeto que está em curso no Brasil desde o início da década de 1990 e que agora tende a se aprofundar (se não houver resistência) transvertido do discurso de cassa “aos comunistas” nas universidades. Mas no fundo o que está se cassando é a democracia.

E quem afirma isso não é um filósofo marxista, e sim liberal – Marta C. Nussbaum – filósofa estadunidense autora do livro Sem fins lucrativos: por que a democracia precisa das humanidades. Ela chama atenção para uma crise silenciosa que coloca em risco o futuro dos governos democráticos – uma crise mundial da educação – com a retirada das humanidades da grade curricular de ensino. Pois “os países preferem correr atrás do lucro de curto prazo por meio do aperfeiçoamento das competências lucrativas e extremamente práticas adequadas à geração de lucro”. 

Ainda de acordo com essa filósofa “o incentivo ao lucro sugere a muitos lideres ansiosos que a ciência e a tecnologia têm uma importância decisiva para o futuro bem-estar de seus países” o problema é que “outras competências, igualmente decisivas, correm o risco de se perder no alvoroço competitivo”. Portanto faz-se necessário resistir a esse projeto, que até mesmo para uma liberal verdadeira é inaceitável. 

Já nós, revolucionários, precisamos ir além, precisamos lutar para aprofundar as mudanças que ocorreram nas últimas décadas com o ingresso maior das classes populares nas Universidades Públicas – ingresso que deve vir junto com a permanência e em todos os cursos. E por fim, a tarefa fundamental – derrubar os muros que isolam a universidade do resto da sociedade.

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”.

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Em defesa da Educação Pública – Todo apoio a Greve Nacional da Educação.

É necessário romper com a lógica do capital se quisermos contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente diferente.

István Mészáros

Diante da conjuntura política atual no Brasil de aprofundamento do processo de sucateamento e mercantilização da educação pública – nós do Coletivo de Educação Popular José Porfírio não poderíamos deixar de declarar nosso apoio incondicional e de reforçar a convocação para a Greve Nacional da Educação convocada para o dia 15 de Maio pelas organizações representativas de Estudantes, técnicos e professores.

É inaceitável a chantagem do  Governo Bolsonaro que condiciona a liberação de recursos para educação com a aprovação da reforma da previdência. Trata-se claramente de uma ação autoritária que busca neutralizar as críticas por parte do setor educacional, especialmente as universidades, a um projeto previdenciário nefasto aos trabalhadores. Também é inaceitável o fechamento de cursos da área de humanidades e de escolas no campo. Tudo isso serve claramente a um projeto autoritário de poder que busca eliminar a oposição e enfiar goela abaixo da população uma concepção unidimensional de sociedade. 

No Tocantins essa paralização se torna ainda mais fundamental, sobretudo diante de um contexto de fechamento de escolas, professores trabalhando sem contrato ou com contrato precarizado e da falta de transporte escolar no interior prejudicando o deslocamento de estudantes. Sem falar no projeto de lei de militarização das escolas que está tramitando na assembleia legislativa do Tocantins.

É importante ressaltar que esse descaso e retrocessos ocorre não só por parte do Governo Federal e Estadual, mas abrange os três níveis de ensino como aponta as greves dos trabalhadores da educação de Guaraí e Riachinho. Por isso é importante que a Greve Nacional no dia 15 Maio tenha a adesão das trabalhadoras e trabalhadores das redes Municipais, Estaduais e Federal de ensino. Mas também da sociedade em geral, especialmente os setores progressistas, já que a defesa de uma educação pública, gratuita e de qualidade não se reduz aos estudantes e trabalhadores da educação.

Diante disso fazemos um chamado para que nos mobilizemos e contribuamos na construção da Greve Nacional da Educação em todas as cidades desse país. No Tocantins especialmente, teremos um grande ato com concentração em frente a Assembleia Legislativa a partir das 09h da manhã – traga sua força, seu entusiasmo e seu cartaz em defesa da educação pública e contra a reforma da previdência. Pois só através da nossa organização, mobilização e luta poderemos derrotar as ações de desmonte dos nossos direitos por parte dos governos de plantão.

Pedro Ferreira Nunes
Pelo Coletivo José Porfírio

Lajeado – TO, 09 de Maio de 2019.

terça-feira, 7 de maio de 2019

Freud “Psicologia das Massas e Análise do EU”

“Não há tempo há perder
as engrenagens não podem parar.
Não há tempo pra pensar
não há tempo pra sofrer...”.
Inocentes

Por Pedro Ferreira Nunes

Para tratar da Psicologia das Massas Sigmund Freud (1856-1939) partirá da contribuição de dois autores: Le Bon – especialmente a descrição que esse autor faz da alma coletiva. E McDougall que trabalha a organização da massa. Freud, no entanto, vai além, ao enfatizar que mais do que compreender o que é uma massa, é preciso entender como ela adquire a capacidade de influenciar de modo decisivo a vida psíquica do indivíduo.

Freud concorda com a descrição que Le Bon faz da alma coletiva, sobretudo de que “a massa é impulsiva, volúvel, e excitável” – ainda que apontando algumas críticas, por exemplo, quando Le Bon descreve as novas características que o indivíduo adquire ao entrar numa massa, a saber: um sentimento de poder invencível, o contagio mental, e a sugestionabilidade. Para Freud é evidente que a segunda e a terceira não são do mesmo tipo. Porém Le Bon não deixa isso bem claro. 

Mas a principal crítica de Freud a Le Bon é acerca do papel do líder e a importância do prestigio – para Le Bon o prestigio pode ser adquirido de forma artificial ou pessoal. Para Freud isso não “se harmonizar com a sua brilhante descrição da alma coletiva”. É por isso que mais adiante ele trará a questão libidinal como um fato importante para compreender a relação entre o líder e a massa. Uma relação que vai além do prestigio.

Freud chama atenção para “outras abordagens da vida anímica coletiva”. Segundo ele apesar de autores como Le Bon terem feito uma boa descrição da alma coletiva, é preciso “reconhecer outras manifestações da formação de massas, atuando em sentido contrário, e que devem conduzir a uma bem mais alta avaliação da alma coletiva”. É então que ele analisará a contribuição de McDougall – que se desenvolve, sobretudo em torno do processo de organização da massa. Essa organização é que difere a massa de uma multidão, por exemplo. 

Para Freud esse esforço de organização da massa é a busca em prove-la “daquelas mesmas qualidades que eram características do indivíduo e que nele foram extintas pela formação da massa”, por exemplo, uma identidade particular que a diferencia de outras massas. A partir dai surge uma questão que também carece de analise que é a afetividade.

Num interior de uma massa o indivíduo sofre uma intensa transformação. Por um lado, a sua afetividade é intensificada, por outro a sua capacidade intelectual diminui. De modo que é impossível compreende-lo a partir unicamente da perspectiva racional. Freud defende que não é possível compreender o indivíduo na massa sem a questão do libido – da afetividade. Ele defende que as relações de amor também constituem a alma coletiva. “Se o indivíduo abandona sua peculiaridade na massa e permite que os outros o sugestionem, que ele o faz por que existe nele uma necessidade de estar de acordo e não em oposição a eles, talvez, então, por amor a eles”.

Outro ponto importante abordado por Freud é acerca dos diferentes tipos de massa, por exemplo: Passageiras e duradouras, homogêneas e não homogêneas, naturais e artificiais, primitivas e diferenciadas. Ele, porém, se desdobrará na análise de duas massas artificiais – igreja e exército. Que também podem ser definidas como duradouras, não homogêneas e diferenciadas. Em suma, massas que não são organizações simples. E o ponto fundamental para essa análise é o fator libidinal que existe no interior dessas organizações (tanto exército como a igreja) mantendo a massa coesa.

Para mostrar como a essência da massa reside nas ligações libidinais, Freud trás o exemplo do pânico, que pode ser notado sobretudo no exército. “o pânico surge quando uma massa desse tipo se desintegra. É caracterizado pelo fato de as ordens do superior não serem mais ouvidas e cada um cuidar apenas de si, sem consideração pelo demais. As ligações mútuas cessaram, e uma angústia enorme e sem sentido é liberada”.

Nas massas os instintos amorosos estão desviados de suas metas originais, o que não significa que aja menos energia. Segundo Freud: “Já notamos, no quadro do habitual investimento sexual de objeto, fenômenos que correspondem a um desvio do instinto em relação a seus fins sexuais. Nós os descrevemos como graus de enamoramento, e reconhecemos que envolvem certa diminuição do Eu”.

Além dessas questões apresentadas brevemente acima, Freud também abordará a questão da identificação – a mais antiga manifestação de uma ligação afetiva a uma outra pessoa. E o instinto gregário – a compreensão do homem como um animal de horda, membro individual de uma horda conduzida por um chefe. Entre outros pontos.

Trata-se de uma obra bastante rica, cuja leitura, contribui sobremaneira para compreendermos um pouco melhor não só a conjuntura política do nosso país (o fenômeno Bolsonaro) como também o que vem ocorrendo em outras partes do globo como a crise na Venezuela e a ascensão da extrema direita na Europa e nos Estados unidos da América.

REFERÊNCIAS

FREUD, Sigmund. Psicologia das Massas e Análise do EU. Volume Autônomo. Editora Psicanalítica internacional: Viena, 1921.

segunda-feira, 29 de abril de 2019

Bolsonaro e a anti-filosofia

Ao camarada Fernando 

O discurso do presidente Jair Bolsonaro e do seu ministro da Educação –  Abrahan Weintrab contra os cursos de humanos, especificamente Filosofia e Sociologia, bem como a afirmação de que os jovens devem ter uma formação mais técnica e não se envolver com política revela o seu caráter anti-filosófico (ainda que um dos principais influenciadores do seu governo se autodenomina de filósofo e o seu ex-ministro da Educação também é oriundo dessa área). Para entender por que o presidente e seus seguidores tem um discurso anti-filosófico compreendamos no que consiste a anti-filosofia.

Continue acreditando que está pensando com a sua cabeça;

Eis uma das características da anti-filosofia – achar que está pensando pela própria cabeça quando na verdade está reproduzindo o pensamento do outro. Marx há muito tempo atrás já chamava atenção para esse problema ao falar da alienação – um processo onde o individuo perde o centro de si mesmo. Marcuse ao retomar essa temática na segunda metade do século XX, chama atenção para o domínio de uma racionalidade tecnológica que busca suprimir os antagonismos de classes, introjetando valores e criando falsas necessidades. Diante disso é importante salientar o que Kant dizia sobre a necessidade dos indivíduos saírem da minoridade. Para tanto é necessário pensar por si mesmo – o que segundo ele – muita gente não o faz, por entre outras coisas: comodismo, covardia, preguiça e medo.

Por nenhum motivo pare para pensar: o país precisa de técnicos e não de filósofos;

Eis ai mais um ponto que caracteriza a anti-filosofia – o discurso que busca convencer os cidadãos a acreditar que a filosofia é algo desnecessário ou coisa de esquerdista buscando doutrinar os jovens e destruir os valores da família. Sendo assim, ela deve sumir da grade curricular de ensino e ser substituída pela educação profissional técnica. Pois afinal de contas por que perder tempo com uma disciplina que promove o pensamento ao invés de focar na formação de mão de obra barata para o mercado? Pensar significa a possibilidade de se libertar da alienação, se libertar da alienação significa pensar com a sua cabeça e pensar com a sua cabeça é muito perigoso para a classe dominante. Daí que essa classe dominante não mede esforços para fazer da filosofia e dos filósofos (os dignos desse nome), inimigos.

Nunca questione: viva a sua vida em paz e não se meta em nada;

Para anti-filosofia questionar é um ato de desordem, de subversão. Desse modo aqueles que ousarem merecem ser reprimidos, presos, torturados e até eliminado – como Sócrates. A anti-filosofia não precisa de indivíduos autônomos, mas seguidores. Pois seguidores não questionam apenas seguem ordens. É a partir dessa lógica que compreendemos a divisão entre cidadão de bem e o que seria um mau cidadão – cidadão de bem é o que não questiona, vive a vida em paz não se metendo nos problemas políticos, já o mau cidadão é aquele que questiona, que cobra, que incomoda aqueles que querem manter as coisas tal como estão.

Nunca pergunte, nunca duvide: basta guiar-se pelo bom senso;

O bom senso para anti-filosofia é aceitar a opressão e a exploração sem questionar. Se você se rebela, protesta, luta pelos seus direitos é considerado um vândalo – um criador de problemas. E como tal será tratado pelo status quo. Portanto seja um “cidadão de bem”, aja com bom senso, fecha os olhos para ás injustiças cometida contra quem quer que seja. Não se meta em conflitos e não deixe de agradecer e rezar que a sua recompensa virá quando você morrer.

Para vencer na vida, vale mais a prática do que a teoria;

É esse tipo de discurso que fundamenta a defesa de uma educação tecnicista ao invés de uma educação humanista. A idéia consiste em afirmar que a prática é mais importante que a teoria, colocando-as em pólos opostos. Para Lênin esse é um dos traços mais repugnantes da moral burguesa – a separação entre teoria e prática. Tal separação contribui para manutenção da dominação da classe hegemônica. Sobretudo ao limitar o acesso ao conhecimento das classes subalternas. Esse discurso de que “para vencer na vida, vale mais a prática do que a teoria” esconde no fundo a idéia de que o conhecimento é para alguns poucos privilegiados.

Não exija uma educação problematizadora; seja um arquivo de conhecimento a serviço da técnica e em vista de seu futuro profissional;

Sendo assim o melhor modelo de educação é a bancaria, que segundo Paulo Freire, é aquela em que “a educação se torna um ato de depositar”. E sendo um ato de depositar os educandos são meros depositários e o educador o depositante. Ainda de acordo com Freire “na visão bancária da educação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão”. Logo se vê que se trata de uma educação autoritária ou unidimensional como diria Marcuse. O educador não pode problematizar o conteúdo que está sendo trabalhado e o educando muito menos deve questionar.

É muito importante que se convença que você nada pode fazer;

Por tanto seja um individuo acomodado. Afinal de contas as coisas são assim, sempre foram assim e sempre serão assim. Ora, o que pode você, uma gota d água num imenso oceano, fazer? Nada, não é mesmo?! E se você ousar pode ser perseguido, pode perder algum privilegio e ainda assim nada mudará. Pelo contrário, pode até piorar pra ti. Não percebe o infeliz, que é exatamente esse tipo de postura que faz com que as coisas pareçam impossíveis de mudar.

Diante da injustiça, da violação dos direitos humanos, diante dos problemas e desafios do mundo e de sua região, você nada sabe, nada viu, nada ouviu;

O que importa se camponeses pobres são assassinados nos rincões do Brasil na luta por reforma agrária? Que índios são expulsos de suas terras? Que jovens negros estejam sendo exterminados nas periferias das grandes cidades pelas mãos da polícia?  O que tenho haver com assassinatos de LGBTT´s? Com o avanço do agro e do hidronegócio destruindo os biomas naturais? Com pessoas submetidas a regime de trabalho análogo a escravidão? Com o governo retirando direitos dos trabalhadores? Com verbas da saúde, educação e cultura sendo desviadas para o ralo da corrupção? Diante de tudo isso, você nada sabe, nem viu e muito menos ouviu, não é mesmo?!

A partir dessa caracterização do que seria a anti-filosofia, analisem vocês mesmos por que dizemos que o discurso de Jair Bolsonaro e seus seguidores é anti-filosófico, e tirem a suas próprias conclusões da lógica e da conseqüência desse tipo de discurso.

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”.

*Referência: Introdução à Filosofia – A anti-filosofia. Universidade Católica de Pernambuco. Subsídios didáticos – fascículo I. Recife – 1984, p. 9.

segunda-feira, 22 de abril de 2019

Greve dos Trabalhadores da ADAPEC-TO: É preciso resistir aos ataques do governo Carlesse.

Após completar os 100 primeiros dias á frente do Governo do Tocantins, Mauro Carlesse (PHS) enfrenta o primeiro movimento grevista no serviço público estadual. Trata-se da greve dos trabalhadores da Agência de Defesa Agropecuária (ADAPEC) que reivindicam melhores condições de trabalho bem como o pagamento de despesas. Qual a postura do Governo diante da Greve? Qual a sua importância para outros movimentos grevistas que virão? São questões importante que merecem nossa atenção. 

A deflagração da greve dos trabalhadores da ADAPEC foi decidida em assembleia geral da categoria realizada no dia 20 de Março. Mas só a partir do dia 16 de abril é que os trabalhadores cruzaram os braços nos 139 municípios tocantinenses por tempo indeterminado – o que só se deu por que não houve abertura de diálogo por parte do governo. Os trabalhadores até que tentaram, mas diante da intransigência do governo Mauro Carlesse, em pelo menos ouvir as demandas da categoria, os trabalhadores não tiveram alternativa se não cruzar os braços. 

Só então é que o governo decidiu soltar uma nota afirmando que os serviços prestados pela ADAPEC ao público não serão afetados e que as reivindicações da categoria serão atendidas ou melhor, já estão sendo atendidas. Como por exemplo o pagamento das despesas, que esta em atraso, meses de janeiro e fevereiro. A nota afirma que “a quitação do primeiro mês já foi autorizado pelo grupo executivo e será pago na próxima semana” e o mês de fevereiro também será quitado em breve. 

Já em relação a melhoria das condições de trabalho, a nota afirma que vários equipamentos como cadeiras, impressoras e computadores já foram adquiridos e logo, logo chegaram as sedes no interior. E também destaca que a Secretária de Infraestrutura está fazendo um levantamento a partir da demanda da Agência de Defesa Agropecuária para fazer melhorias nos locais de trabalho. 

Em suma, a nota do governo comprova a denúncia feita pelos trabalhadores acerca da falta de condições de trabalho bem como o atraso no pagamento das despesas. E também é uma prova de que não houve diálogo com a categoria. Pois se tivesse tido diálogo a greve não seria necessária. A não ser que o diálogo não apontasse para resolução dos problemas denunciado pelos trabalhadores.  Mas pelo que diz o Governo, não é para isso que se está caminhando. Basta saber se o que foi dito de fato será cumprido ou é apenas uma tentativa de desmobilizar o movimento diante da repercussão negativa para o Governo. 

Afinal de contas não está se falando de qualquer categoria, mas de fiscais agropecuários, que em um Estado que tem como base da sua economia o agronegócio, desempenham um papel fundamental, como por exemplo, fortalecer barreiras sanitárias para que animais infectados com alguma doença não adentre no Tocantins – se isso acontecesse imagine o estrago para uma economia que exporta carne para outros países. Pior ainda é para nós consumidores que já comemos tanto veneno devido ao uso abusivo de agrotóxico nas lavouras.

O Governo através da ADAPEC insiste que mesmo com a greve a população não sofrerá prejuízos pois o atendimento de suas demandas está garantido. Não duvidamos disse. Mas não podemos deixar de perguntar como isso é possível? Se o próprio governo reconhece que a infraestrutura não é das melhores e se os trabalhadores estão em greve. 

É claro que essa afirmação do governo não passa de um engodo. É óbvio que com a greve os serviços são afetados, pois se com todo o efetivo trabalhando os serviços não são dos melhores imagine com uma categoria importante em greve.

Dito isso, a partir da greve dos trabalhadores da ADAPEC podemos vislumbrar qual é a postura do Governo Carlesse diante dos movimentos grevistas. O primeiro ponto é a indisposição para o diálogo, o segundo é a tentativa de desmobilizar o movimento prometendo atender as reivindicações por meio de nota a impressa (e não dialogando com a categoria). Se isso não alcançar êxito não é difícil prever o terceiro ponto, a criminalização através de um processo de judicialização, reivindicando a ilegalidade da greve. Isso no entanto não pode servir para nos desmobilizar, pelo contrário, reafirma a necessidade da luta para garantir direitos, melhores condições de trabalho bem como a oferta de serviços de qualidade a população como um todo. 

Ainda que a pauta da greve é em cima de demandas da categoria, o movimento grevista ganha importância para a classe trabalhadora tocantinense como um todo, especialmente os servidores públicos, pois aponta para a necessidade de resistir aos ataques do governo Carlesse aos direitos dessas categorias bem como ao sucateamento dos órgãos governamentais e a prestação de serviços públicos sem qualidade. Pois como já estamos alertando há algum tempo a agenda neoliberal do governo se aprofundada fará muito mais estragos do que temos acompanhado até agora, nesses quase quatro meses de gestão.

Por fim, cabe ressaltar que numa conjuntura um tanto difícil para a classe trabalhadora – que reivindicar parece um crime, os trabalhadores da ADAPEC dão um ótimo exemplo, mostrando que diante da intransigência dos governos em não querer dialogar, a greve contínua sendo uma importante ferramenta, da qual não podemos abrir mão. Ou depois da aprovação pela Assembleia Legislativa do Tocantins da Medida Provisória 02 que retira direitos dos Servidores, alguém ainda tem alguma ilusão sobre quais interesses os deputados estaduais do Tocantins defende?

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior “.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Cidade Solidão: Inocentes e o papel da arte

O filósofo franckfurtiano Herbert Marcuse no final da década de 1960 chamava atenção para a importância da arte como a única linguagem capaz de resistir ao projeto autoritário de dominação de uma sociedade unidimensional, através da introjeção de uma racionalidade tecnológica. Ele dizia que “em um mundo em que o sentido e a ordem, o “positivo”, têm que ser impostos por todos os meios possíveis de repressão, as artes por si mesmas assumem uma posição política: a posição do protesto, da repulsa e da recusa”.

A banda de Punk Rock Paulista Inocentes que tem na sua trajetória clássicos como “Pátria Amada”, “Garotos do subúrbio”, “Miséria e Fome”, “Intolerância”, “Rotina” entre outras. Seguem essa linha nos seus trabalhos – do protesto, da repulsa e da recusa. E agora no seu mais novo material – o EP Cidade Solidão – não é diferente. Um trabalho que assume uma posição de protesto como fica evidente nas letras das canções “Donos das ruas” e “Fortalece”. Como também de repulsa e recusa ao establishment como em “Cidade Solidão”, “Escombros” e “Terceira guerra” cover de outra lenda do punk brasileiro, a banda Fogo Cruzado.

Desse modo, Cidade Solidão segue a pegada dos trabalhos anteriores da banda, mas com uma sintonia cada vez maior entre os quatro integrantes: Clemente  (voz e guitarra), Ronaldo (Guitarra), Anselmo (Baixo) e Nonô  (Bateria). Essa é considerada a formação clássica da banda que está tocando junta há quase 30 anos. 

Nesse novo trabalho a banda Inocentes reafirma a sua verve subversiva com refrãos como “Os donos das ruas! Os donos das ruas! Querem mais que diversão! Os donos das ruas! Os donos das ruas! Tem o futuro em suas mãos”. Diante disso poderiamos questionar: quem são os donos das ruas? As ruas tem dono? Bem, se as ruas tem um dono, esse dono é o povo. E mais ainda a juventude que é a sua vanguarda – que tem nas mãos o poder de resistir ao avanço da agenda conservadora tanto no Brasil como em outras partes do mundo. Mas para tanto precisa sair da bolha virtual em que se encontra e tomar as ruas para se fazer ouvir e poder dizer – “as ruas são nossas outra vez!!!”.

Em “Fortalece” temos uma bela mostra da capacidade poética do Clemente em compor letras belas. Já nas primeiras frases ele manda o recado: “Tudo aquilo que me faz chorar. Tudo aquilo que me faz sofrer. Fortalece”. Adiante a letra diz “o mundo vai girar, e tudo vai mudar. E nada mais será, como está.  Sua hora vai chegar “. Filosofando um pouco podemos dizer que ai esta um bom exemplo de como fazer uma leitura da realidade a partir do método dialético – que vê as coisas em movimento e não como algo estático. Ora se hoje estamos por baixo, não significa que não podemos mudar essa realidade.

A faixa que dá título ao EP “cidade solidão” não segue a mesma vibe das outras duas canções inéditas do disco. O recado da letra é um tanto pessimista: “Eu vejo o futuro, pelo retrovisor. Nosso tempo já se foi, ele acabou”. Aqui não há dialética, mas um grito de desespero diante de um mundo que parece está caminhando para um grande precipício – com os interesses individuais se sobrepondo aos interesses coletivos.  É compreensivo o tom pessimista, ainda mais quando analisamos a realidade que nos cerca. Por outro lado podemos dizer que essa canção nos alerta para condição de isolamento que nos encontramos nas cidades, sobretudo num contexto de domínio das redes sociais, condição essa que levará ao nosso fim, se não formos capazes de romper com essa solidão, que nos isola e nos enfraquece.

“Escombros” segue a linha pessimista da faixa anterior. “A Cidade perturbada. Fria, morta e fálica. Com seu véu de pó e fumaça. A felicidade nunca chega. Sempre está por vir. Persegui-se a vida, a vida inteira “. Essa é uma releitura de uma canção de autoria da própria banda, gravada em 1996, que saiu no álbum Ruas. E comparando com a canção anterior (cidade solidão) percebemos que a vida na cidade, sobretudo nos grandes centros, não mudou tanto assim, talvez para pior. “A fé louca e cega, da multidão desgovernada. Mas há quem não crê em nada. Nas carcaças de concreto. O passado deixa marcas. Há coisas que nem o tempo apaga”. A partir desse trecho da canção se compreende o por que a banda Inocentes decidiu regrava-lá. Ela descreve de forma inconteste o período que estamos vivendo no Brasil. 

Por fim os Inocentes nos brinda com um cover da banda Fogo Cruzado, “Terceira guerra “. Uma canção com um refrão que no fundo é um alerta: “o mundo vai acabar, o mundo vai acabar”. A canção composta na década de 1980, mostra-se atual, sobretudo quando vemos figuras da estirpe de um Donald Trump na presidência dos EUA e a ascensão da extra direita mundo afora, inclusive no Brasil com Bolsonaro.  Desse modo, se essa trupe continuar dando as cartas não é nenhum exagero falar que o mundo vai acabar. Ainda que para nós, a plebe.

Em Cidade Solidão os Inocentes seguem fiéis a sua trajetória de  não fazer concessão ao mercado – produzindo músicas descartáveis que são consumidas e rapidamente esquecidas. Musicas que servem para a imposição de uma visão positiva da sociedade, onde não cabe questionar e nem criticar, mas aceitar o domínio do status quo.  A banda Inocentes vai na contramão, chamando atenção para os aspectos negativos dessa sociedade e apontando para necessidade de resistência ao domínio do status quo. E com isso eles reafirmam a visão Marcuseana acerca do papel da arte como uma linguagem revolucionária com um imenso poder libertador das potencialidades dos indivíduos de resistirem ao domínio dessa sociedade unidimensional. 

Ainda em relação ao papel da arte, Marcuse defendia que esta poderia contribuir sobretudo no desenvolvido da consciência e da inconsciência para podermos ver as coisas que não víamos ou que não nos permitiam ver, falar e ouvir uma linguagem que não ouvíamos e não falamos ou que não são permitidas de ouvir e de falar. Podemos dizer portanto que Cidade Solidão, da banda punk paulista Inocentes, cumpre esse papel. Como deve ser todo trabalho artístico que não se rende ao domínio do capital e a racionalidade tecnológica. 

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no Banco, sem parentes importantes e vindo do interior “.