Recebi a missão dos companheiros
da coordenação dos movimentos que ocuparam a superintendência regional do INCRA
em Goiás de ficar responsável pela assessoria de comunicação dessa ação. Com
isso o camarada Zelito do Movimento Terra Livre, organização da qual eu também
fazia parte – Deu a ideia de fazermos o diário da ocupação para divulgarmos o
dia a dia na ocupação e as ações que iriamos realizar, pois com o passar dos
dias a ação tenderia a cair no esquecimento, sobretudo pelos veículos oficiais
de comunicação, com o diário manteríamos a ocupação em pauta.
A ideia inicial era que
fizéssemos os relatos coletivamente, mas já nos dois primeiros houve grande
dificuldade para reunir todo mundo, sobretudo por que sempre havia outras
atividades e problemas que surgiam que o núcleo dirigente precisava resolver.
Por tanto acabou ficando para mim a responsabilidade de fazer os relatos que
sempre quando era possível eu submetia ao crivo de alguns camaradas.
O diário foi uma ação muito
importante para divulgar a nossa luta e para que também conseguíssemos apoio de
diversas organizações da classe trabalhadora. Os relatos foram reproduzidos em
diversos sites e blogs de norte a sul do país, assim como chegou a nossas mãos
diversas manifestações de apoio graças às informações que passávamos através do
diário, o que com certeza contribuiu para que fizéssemos a maior ocupação do
INCRA-GO. E mesmo com o boicote da
grande mídia na maior parte do tempo que ficamos acampados no INCRA,
conseguimos manter o Brasil informado do que se estava passando em Goiânia.
Quando comecei escrever era
como estivesse fazendo uma nota à imprensa, mas ao longo dos dias o mesmo foi
ganhando um caráter mais eloquente e emotivo, sobretudo por que a imprensa
estava se lixando pelo que nós estávamos fazendo lá dentro. A não ser se
fizéssemos como defendia um companheiro da direção – Tocássemos fogo em umas
caminhonetes do governo, dai a imprensa apareceria para nos chamar de vândalos
e com eles a policia para nos reprimir.
Por fim o caráter do diário
foi mudando, já não era um informativo meramente, queríamos trazer o leitor
para dentro da ocupação com a gente, para que ele se sentisse parte dela, para
que ele pudesse sentir o clima em que vivíamos – Nossas angustias, tristezas,
esperanças e alegrias.
Lembro-me de uma ligação que
recebi de uma senhora que morava em um assentamento no vale do Araguaia – Ela
disse que havia lido o diário e tinha se emocionado com o nosso exemplo de
força e resistência. Lamentava por não poder esta conosco na ocupação, pois não
tinha como largar seu lote. E pediu para que eu agradecesse a todos, pois sabia
que estávamos lutando por todos os acampados e assentados de Goiás independente
do movimento que faziam parte; Que eu desse um grande abraço e falasse que ela
estaria rezando por nós, pela nossa vitória.
Esse telefonema foi uma grande
injeção de animo para que eu continuasse escrevendo o diário, pois não era
simples achar um tempo para escrevê-lo, já que eu tinha outras tarefas na
ocupação bastante cansativas.
Alguns companheiros chegaram a
dizer que não era bom escrever o diário, pois dávamos muita informação a cerca
do que iriamos fazer e assim os nossos inimigos sempre sabiam do nosso próximo
passo. Já outros elogiavam, pois o nosso exemplo de luta e resistência
inspirava muita gente e por outro lado conseguíamos furar o bloqueio da mídia,
conseguir apoio do Brasil todo e nos blindarmos contra qualquer ação truculenta
por parte das autoridades.
Reorganizar esses relatos é
resgatar a memoria e o exemplo dessa importante luta do movimento campesino por
reforma agrária em Goiás, sobretudo em um período em que os que bravamente
continuam resistindo e persistindo na luta por reforma agrária não tem o que
comemorar. Assim espero que esse relato possa inspirar, sobretudo a juventude
camponesa a continuar a tão importante e necessária luta por reforma agrária em
Goiás e em todo o Brasil.
Baixar livro no link: "A nossa luta é pra vencer..."