sexta-feira, 17 de junho de 2016

Conto: Um certo barbudo

Era quase noite, a criançada tomava as ruas para brincar despreocupadamente, os vizinhos sentados em suas cadeiras jogavam conversa fora, outros desciam rumo ao colégio. O vento frio do mês de junho descia das serras e deixava aquela pequena cidade com um clima agradável, totalmente ao contrario do calor infernal que fizera durante o dia.

Quando aquela figura passou por ali, chamou a atenção de todos. Em uma cidade onde todo mundo conhece todo mundo, não seria difícil perceber que aquela figura não era dali. Ainda mais um sujeito tão diferente – era de altura mediana, tinha a pele morena, um olhar triste, seguia com a cabeça baixa, usava uma calça jeans azul desbotada, e uma camiseta verde, tinha um chapéu preto na cabeça e uma grande mochila nas costas, a tira colo trazia um embornal de crochê e um violão na mão, era possível ver varias tatuagens em seu braço - em destaque uns lagartos e um nome de uma mulher, além das tattos chamava muito atenção a sua longa barba.

Sem falar ou cumprimentar ninguém ele seguiu o seu caminho. Deixando todos ali intrigados – quem seria tal figura? De onde vinha? O que queria ali aquele barbudo?

O tal barbudo instalou-se em uma casa a muito abandonada, mas que ainda se encontrava bem conservada. Ficava próximo a uma praça, um pouco afastada do centro da cidade, mas com uma vista maravilhosa para a cordilheira de serras que cercavam o local.

Como a cidade não era grande bem como o numero de habitantes logo a novidade da chegada de figura tão diferente naquele local tornou-se de conhecimento de todos. As crianças encantaram-se por aquele barbudo, os jovens o admiravam, algumas mocinhas até suspiravam ao vê-lo, mesmo ele não sendo bonito. Os adultos achavam que ele seria um vagabundo, outros, em especial os mais idosos tinham medo dele.

Ele seguia a sua vida por ali, não tinha contato e nem amizade com ninguém dali. Passava grande parte do seu tempo em casa fazendo seu artesanato – sim ele era um artesão. Quando terminava de fazer seu trabalho jogava tudo na mochila seguia até a beira da rodovia para pegar um carro até a capital ou mesmo outras grandes cidades do interior do estado onde vendia seus trampos. As vezes passava até uma semana ou mais sem voltar para casa. Todos na pequena cidade já começavam a imaginar que fim teria tido o barbudo – era assim que ele era conhecido por ali, já que ninguém sabia o seu nome. Mas de repente ele aparecia de novo por ali, passava mais algum tempo fazendo mais artesanato com material que ele recolhia nas serras do local e depois desaparecia novamente.

Ele chegava em sua casa sempre na boca da noite. Ligava o som, gostava de ouvir uma musica diferente da que o pessoal dali ouvia. Diziam que era rock clássico – Janis Joplin, Bob Dilan, The Doors. Um que todos conheciam era Raul Seixas. Da janela podia vê-lo preparando um mate quente para tomar. Mas as vezes ele acendia um cachimbo e sentava em uma cadeira de balanço olhando para o céu, ou então tomava um conhaque e tocava seu violão cantarolando aquela musica diferente que ele tanto gostava.

Dificilmente o viam sorrindo, conversando com alguém – era um solitário. Tinha um olhar triste, o que teria acontecido para que ele vivesse daquela forma tão melancólica? Muitos tinham vontade de aproximar-se dele, de conversar, de fazer amizade, no entanto tinham receio de serem repelidos já que ele aparentava ser tão fechado.

Quem seria responsável por tamanha tristeza. Ele tinha o nome de uma mulher tatuado no braço – Maria Lucia seria ela a responsável por tamanha tristeza? Quem sabe.

Era manhã cedo, no horizonte surgiam os primeiros raios de sol. Eu seguia para o colégio e como sempre passei em frente à casa do barbudo para quem sabe vê-lo por ali, mesmo de longe. Mas eu bem sabia que ele não era de levantar muito cedo.

 Eu era muito jovem, uma criança ainda, mas era apaixonado por aquela figura incrível, eu o admirava muito, ele fora com certeza a minha primeira paixão. Mesmo que ele não falasse comigo, que se quer me desse um sorriso, mas eu estava lá todos os dias a tarde brincando na rua em frente a sua casa para vê-lo com sua guapa de tereré.

Eu era uma criança ainda, mas era apaixonada por ele, como queria ser eu a mulher que tinha o nome tatuado no braço dele. Mas ele se quer notava que eu existia, também eu era apenas uma criança. Porém eu tinha a esperança de me tornar um dia a sua companheira e juntos, andaríamos por esse mundo afora embelezando as pessoas com nosso artesanato.

Naquela manhã que eu passava em frente a sua casa indo para o colégio aconteceu algo incrível. Para minha surpresa quando eu me aproximo da casa dele me deparo com ele. Estava trajado tal como no dia que chegara ali. A minha surpresa maior ainda foi quando pela primeira vez desde que ali chegara ele me cumprimentou, olhou para mim e sorriu. Eu retribuí o gesto radiante de felicidade.

- Bom dia.

- Bom dia. Tudo bom contigo meu!?

- Sim. E com o senhor?

- Eu estou bem. Você esta indo para a escola?

- Sim.

- Posso ti dar um presente?


Eu era ainda muito jovem, ainda uma criança, mas aquele seria o dia mais feliz da minha vida e também o mais triste. Feliz por que ele falou comigo e me deu um presente que ainda guardo até hoje – um símbolo da paz. Mas triste por que aquela foi a ultima vez que o vi, pois ele nunca mais voltou ali. Ninguém dali soube que fim ele levou, mas eu espero que ele tenha reencontrado a sua Maria Lucia.

Pedro Ferreira Nunes - Poeta e escritor popular tocantinense.

Estado mínimo para quem?

Por Pedro Ferreira Nunes

Em resposta a crise mundial que estourou nos EUA em 2008 a burguesia volta a pautar a necessidade de aprofundamento de politicas neoliberais através de reformas que buscam simplesmente a retirada de direitos trabalhistas e sociais. Como sempre a classe dominante quer jogar nas costas dos trabalhadores os ônus por uma crise que não foi criada por eles. Diante disso acompanhamos novamente a palavra de ordem da burguesa neoliberal pelo Estado mínimo. No entanto nos cabe questionar, Estado mínimo para quem? Para burguesia não é, pois essa mesma burguesia que reivindica a necessidade do Estado mínimo utiliza-se deste para explorar o trabalhador e oprimi-lo quando se mobilizam pelos seus direitos. 

A palavra de ordem pelo Estado mínimo mostra bem a hipocrisia e cinismo de uma burguesia que omite o fato de que o Estado mínimo é apenas para os trabalhadores e para as politicas sociais, já para as classes dominantes o Estado tem que ser máximo para preservar a espoliação da mais valia. Tal fato nos leva a questionar sobre a ética do discurso. De acordo Habermas a ética do discurso deve ser fundamentada tal como uma norma jurídica e a sua validade deve ser para todos para que então seja justa. Não é o que percebemos na discussão a cerca do estado mínimo. Pelo contrario, percebe-se nitidamente uma grande contradição neste discurso – que busca favorecer a classe dominante e manter as classes subalternas sob o seu controle. 

Nesse sentido não dá para falar em justiça onde uma pequena elite é favorecida e a grande maioria continua sendo explorada. Diante desse fato é importante salientar o papel da ética tal como defendida por Reese-Schäfer que é o de impulsionar reflexões racionais sobre quais regras morais predominantes são validas. Esse papel da ética torna-se ainda mais fundamental no momento histórico em que vivemos. Onde a mediocridade tomou conta do debate politico e uma onda conservadora avança na sociedade revivendo velhas certezas e tradições. Como por exemplo, o forte crescimento da influencia de igrejas neo pentecostais no Estado. 

Ainda segundo Reese-Schäfer uma discussão racional é necessária, sobretudo pelo fato de que os indivíduos veem a moral como coercitiva. O que não deixa de ser verdade. No entanto aqueles que atualmente acusam o Estado de moralista e que, portanto deve ser enfraquecido ao máximo, são os verdadeiros moralistas – pretendem substituir a ética normativa pela moral religiosa. Tal discurso não nos espanta já que segundo Habermas quem “age estrategicamente, quem quer enganar, precisa agir na situação de discurso como se reconhecesse o parceiro de discussão”. Isto é, precisa saber para quem está falando e o que deve dizer para convencer tal individuo. 

Tal estratégia pode ser percebida claramente no discurso neoliberal, na retirada dos direitos dos trabalhadores, na privatização do patrimônio público, redução de politicas sociais, em suma no Estado mínimo. O discurso é que tais politicas devem ser implementadas para o desenvolvimento da economia e a melhoria de vida da população. Mas na prática o que se vê é o favorecimento de uma minoria em detrimento da grande maioria. Já que no final das contas é sempre o trabalhador que paga a conta.


*Artigo para a disciplina de ética e cidadania do Curso de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins.

Referencia bibliográficaReese-Schäfer, Walter. Compreender Habermas. 4- A ética do discurso. 2008. Págs.; 68. 75 e 76.

quinta-feira, 2 de junho de 2016

10 questões sobre “O capital no século XXI” de ThomasPiketty

Confesso que quando recebi um exemplar de “O capital no século XXI” de presente, não me animei muito a lê-lo. Sobretudo após ver alguns comentários na sua contra capa recomendando-o como se fosse um clássico. Se figuras como Bill Gates, Paul Krugman, ElioGaspari e órgãos de imprensa burguesa como o The Gardian e o The Economist estavam elogiando essa obra, muito provavelmente não sairia boa coisa dali para os trabalhadores.

No entanto sabia que não era correto ignorar aquele livro só pelo fato de discordar de alguns comentários. Mesmo que por aqueles comentários já dava para prever qual a tese o autor defendia. Porém para fazer uma critica consciente de qualquer coisa é necessário conhecer. E a partir dai refutar e combater se necessário for.Diante dessas reflexões iniciei a leitura de “O Capital no Século XXI” do Piketty. E não me arrependi, pelo contrario, recomendo-o. Porém o que me leva a recomendar a sua leitura não são os mesmos motivos do The Economist. E são estes motivos que destaco nestas dez questões.

1-      Os dados levantados por Piketty e seus colaboradores são extremamente importantes para mostrar o aumento da concentração de renda e da desigualdade na sociedade capitalista. Tal fato mostra ao contrario do que tenta fazer o autor, a genialidade de Karl Marx. Que mesmo sem todos os instrumentos tecnológicos dos quais possuímos hoje, conseguiu mostrar que isso ocorreria;

2-      O autor afirma que o cenário catastrófico previsto por Marx não se realizou, mas ao mesmo tempo quando propõem que aja um maior controle do capital reconhece que essa questão não está superada;

3-      Os dados mostram claramente que o período onde houve uma diminuição da concentração de renda e da desigualdade coincide com a Revolução Russa e o crescimento da URSS. No entanto isso é completamente ignorado pelo autor que foca nas guerras mundiais;

4-      Aliás, o autor parece defender uma terceira guerra mundial para que aja uma maior diminuição da concentração de renda e da desigualdade. O que não deixa de ser bastante catastrófico;

5-      Nesse sentido, ao analisar a obra de Piketty percebemos que ele não apresenta nada de novo. Pelo contrário, o que vemos é uma proposta de retomada de politicas econômicas do tipo kenesyanas;

6-      Sua conclusão é um alerta para a classe dominante – ou superamos as politicas neoliberais que propiciam o maior aumento da concentração de renda e desigualdade. Substituindo-a por uma espécie de novo Estado de bem estar social. Ou o poder da burguesia está em cheque;

7-      Piketty clama por uma espécie de humanização do capitalismo para se evitar a previsão catastrófica de Marx. Experiências recentes, como por exemplo, os governos de Lula e Dilma do PT mostram que isso é impossível;

8-      O autor também defende que não existe mais luta de classes. Mas sim a luta dos 99% contra os 1% mais ricos. O que não se sustenta, pois tal divisão não dá conta de toda a complexidade e subdivisões que temos na sociedade;

9-      Apesar dos limites é preciso reconhecer a importância dessa obra, sobretudo no sentido de pautar na ordem do dia a questão do aumento da concentração da riqueza e, por conseguinte das desigualdades sociais;

10-   Por fim, que os trabalhadores não se iludam com as propostas reformistas de Piketty. Pois dai não sairá nada de diferente do que os trabalhadores já experimentaram. De reformas capitalistas só sairá mais capitalismo.

A leitura do “O Capital no Século XXI” do jovem economista Frances Thomas Piketty. Me deu mais convicção de é em Marx que temos os apontamentos teóricos para superação das desigualdades e do capitalismo. Pois as respostas de Piketty são completamente insuficientes para que os trabalhadores consigam superar a exploração e as desigualdades econômicas e sociais. Pelo contrario, Piketty reafirma a necessidade desse sistema nefasto que é o capitalismo. É uma velha receita embrulhada num pacote novo.


Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e militante do Coletivo José Porfírio.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Eleições municipais em Lajeado 2016

Os pré-candidatos a prefeito

Lajeado tem uma situação privilegiada em relação à maioria dos pequenos municípios tocantinenses. Seja por causa dos recursos relativos aos royalties da UHE Luiz Eduardo Magalhães, da sua riqueza natural ou mesmo da sua localização próxima a capital. Diante disso não é de se admirar que a disputa para ver quem irá gerir o município se torne mais acirrada a cada ano.

É por isso que as articulações para as eleições municipais em Lajeado já estão a todo vapor. Por enquanto há três pré-candidaturas que se colocam com toda força para disputar o pleito eleitoral para administrar a prefeitura municipal. São elas: A pré-candidatura do Drº Tércio pelo Partido Social Democrata (PSD), a do empresário Jaime pelo Partido da Mobilização Democrítica Brasileiro (PMDB) e a do advogado e ex-prefeito Junior Bandeira pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB).

Drº Tércio é ligado a atual gestão da prefeita Márcia Reis (PSD). E defenderá a permanência de um grupo politico que há 8 anos esta a frente do executivo municipal. Período marcado por denuncias de corrupção – que levou inclusive o ministério público pedir o afastamento da prefeita e de altos membros do seu secretariado. Como também de um alto índice de rejeição pela população da atual gestão.

Aliás, uma das denuncias de corrupção dava conta de um contrato superfaturado de exames entre a prefeitura municipal de Lajeado e a clinica de propriedade do Drº Tércio e de seu pai. Denuncia que levou a quebra desse contrato como também da demissão do Drº Tércio do serviço público municipal de saúde.

O outro pré-candidato a prefeito de Lajeado é o empresário Jaime (PMDB), que entre 2009 e 2012 foi vice-prefeito na primeira gestão da prefeita Márcia Reis. Após o rompimento, Jaime tem tentado se colocar como oposição a atual gestão no município. E com o fracasso dessa gestão seu nome ganhou força, sobretudo após a eleição de Marcelo Miranda para o governo (candidatura que ele apoiou), no entanto seu nome tem perdido força no ultimo período.

Por fim, temos a pré-candidatura do ex-prefeito Junior Bandeira (PSB), que já administrou o município entre 2000 e 2008. Um período marcado por dois momentos bastante distinto – o primeiro de desenvolvimento, quando ainda estava em curso à construção da usina hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães e o segundo de muita estagnação e retrocessos. Tal fato pode ser observado na forma com que a população enxerga o legado deixado pela administração de Junior Bandeira – enquanto têm alguns que o considera o melhor prefeito da história do município, existe outros que o criticam duramente.

Não é a primeira vez que Junior Bandeira tenta voltar a administrar a cidade de Lajeado, por exemplo, em 2012 foi derrotado pela atual prefeita. E bem antes, em 2008, não conseguiu eleger o seu sucessor. Reflexo da alta rejeição de seu nome no município.

Mais do mesmo

Como se vê por enquanto o quadro eleitoral de Lajeado se apresenta sem nenhuma novidade. Pois os três pré-candidatos a prefeito do município podem ser considerados mais do mesmo. Pois todos já estiveram ou estão de forma direta ou indiretamente ligados a gestão municipal. O projeto politico que eles representam bem como o grupo politico do qual fazem parte conhecemos muito bem.

Junior Bandeira é um representante das velhas oligarquias lajeadense, siqueirista de carteirinha. Já tanto o Drº Tércio como Jaime mudaram-se para Lajeado recentemente. Especialmente após a formação de um novo grupo politico com a eleição da prefeita Márcia Reis – composto, sobretudo por pessoas de outros municípios. Enquanto o primeiro está aliado à família Abreu, o segundo é próximo de Marcelo Miranda.

Por tanto independente de qual desses for eleito, conhecemos muito bem qual será o projeto politico que irá desenvolver no município– de quem favorecerá e o que priorizará. Nada muito diferente do que temos hoje.

É possível que até o início do pleito eleitoral surja uma nova candidatura, ou que algum desses desista da disputa. Mas o fato é que não haverá grandes novidades nas eleições municipais de Lajeado. A disputa principal será entre estes três pré-candidatos.Cabe à população se conscientizar para eleger e fiscalizar aqueles que irão administrar a cidade para o bem comum e não apenas para seus interesses pessoais.


Pedro Ferreira Nunes é educador popular e militante do Coletivo José Porfírio.

Crônicas da UFT: Roda de conversa sobre “Homossexualidade e a questão do óbvio”

Participantes da roda de conversa
A turma do 2º período do curso de Filosofia e Teatro e o Centro Acadêmico de Filosofia realizaram a roda de conversa sobre homossexualidade e a questão do óbvio no ultimo dia 12 de maio no campus da UFT em Palmas. O evento fez parte das atividades de formação da disciplina de Filosofia da Educação ministrada pelo professor José Soares.
A questão da homossexualidade e a homofobia tem sido um tema recorrente no nosso cotidiano. Especialmente a partir da discussão sobre o projeto da “cura gay” e do Estatuto da família no congresso nacional. E a nível regional com a polêmica em torno da questão de gênero no plano municipal de educação vetado pelo prefeito Carlos Amastha (PSB) e pela câmara de vereadores de Palmas.
A discussão em torno dessa questão está permeada de tabus e preconceitos. Sobretudo pela forma distorcida e dogmática com que o problema é tratado e a interferência por parte das igrejas neopentecostais.  Nesse sentido é fundamental a desconstrução desses tabus e preconceitos em torno da homossexualidade para combatermos a homofobia. Sendo que a educação tem um papel fundamental neste processo.
Nesse sentido foi extremamente positivo o dialogo com o militante da causa LGBTT Alexandre Araripe sobre homossexualidade e a questão da homofobia. Sua militância na área da saúde, especialmente ligada aos setores mais marginalizados desse segmento, mostrou os grandes desafios que temos pela frente. Sobretudo no campo da formação para descontruirmos a visão conservadora que tem avançado no último período na nossa sociedade.
Por exemplo, é necessário descontruirmos o falso debate em torno da tão falada “ideologia de gênero”. Que não existe na realidade. Como também da “cura gay”, já que não se pode curar quem não está doente. Tal desconstrução tem que se dá a partir de uma visão laica da sociedade e não moralista como da igreja. Pois é a visão moralista da igreja que leva a naturalização do machismo, do sexíssimo, do racismo e da homofobia.
Aliás, o combate à homofobia é um dos grandes desafios que temos na atualidade. Por mais que se tente negar os números de assassinatos de homossexuais falam por si só. Em 2014 foram 326, um aumento de 4,1% em relação a 2013. O que mostra bem como a homofobia vai de uma forma velada a o ódio extremo. A naturalização desses crimes por parte da sociedade bem como a impunidade contribuem para esse aumento significativo.
Diante dessa dura realidade Alexandre Araripe nos deixou um questionamento – Como construir um aluno/educador mais tolerante com as diferenças? Eis ai o grande desafio do momento, não só na sala de aula, mas na sociedade em geral. Sem tolerância não há dialogo, não há aprendizado, só o ódio pelo ódio. Atividades de formação como essa roda de conversa é uma iniciativa importante. No entanto é preciso massificar tais processos de formação. Como também lutar por politicas públicas que garanta direitos aos LGBTT´s. Bem como punir exemplarmente aqueles que cometem crimes de ódio como é o caso da homofobia.
Por fim ressaltamos a importância da Universidade Federal do Tocantins realizar esse tipo de debate. Especialmente numa sociedade tão conservadora como é a tocantinense. Com isso esta cumprindo a sua verdadeira função social. Nós estudantes do curso de Filosofia compromissados com as causas sociais não abriremos mãos de lutar por uma universidade verdadeiramente pública e que esteja aberta para os movimentos sociais e suas lutas.

Pedro Ferreira Nunes é estudante de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins.


quinta-feira, 19 de maio de 2016

A história de meu pai Zé Ferreira e seu amor pelos livros.

Meu pai Zé Ferreira estudou formalmente apenas três meses de sua vida, o suficiente para que aprendesse a ler e escrever. Amava os estudos, no entanto teve que abandona-los para ajudar seu pai na dura lida no roçado nas terras de um coronel que mandava naquela região. Era a primeira metade do século XX no interior do Piauí – lugar onde ele, filho único de Romualdo Ferreira nasceu. Sua mãe morreu quando ele tinha apenas 5 anos de idade. Ele então foi criado pela madrasta – dona Elvira.

Apesar de ter sido obrigado a abandonar os estudos formais, meu pai nunca deixou de estudar. Tinha um grande amor pelos livros – no entanto naquela época não era fácil adquiri-los. Mesmo assim não perdia tempo quando encontrava alguma coisa que pudesse ler para que desenvolvesse a sua capacidade de leitura.
Aos 18 anos de idade recebeu a noticia de seu pai Romualdo Ferreira, de que iriam deixar aquelas terras e seguiriam para outras paragens. Meu pai não entendeu muito o porquê da mudança já que lá tinham uma vida relativamente prospera. E mais ainda pelo fato do que ao contrario de muitos nordestinos que naqueles idos deixavam sua terra rumo ao sudeste do país – São Paulo e Rio de Janeiro. Vovô Romualdo optou por adentrar mais ainda rumo ao sertão – seguiu para o Maranhão e depois de uma curta temporada ali seguiu para o norte de Goiás, hoje Tocantins.
Estabeleceram-se na região de Miracema do Norte, onde vovô Romualdo foi trabalhar de caseiro numa pequena chácara às margens esquerda do rio Tocantins. Nessa mesma época meu pai casou-se pela primeira vez e deste casamento teve o primeiro filho – uma menina batizada de Rosa. Depois de três anos de casado sua esposa morreu.
Tempos depois se casou pela segunda vez com a senhorita Corina, com ela teve cinco filhos – Leila, Luzimar, Cleide, Kátia e Katiane. Viveram treze anos de muita felicidade. Ele trabalhava na roça dos outros, ela cuidava da casa. Decidiram morar por um tempo em Colinas – um centro urbano mais desenvolvido do que Miracema do Norte. Mas não ficaram muito tempo por ali, logo retornaram para Miracema.
Quando casou-se com Corina descobriu que ela não era alfabetizada. Ele então alfabetizou-a e depois incentivou-a entrar numa escola e continuar os estudos. Mas como as coisas ficaram difíceis para eles na cidade e tiveram que voltar a morar na roça, ela teve que largar os estudos. E lá ela morreu em decorrência de complicações no parto.
Com o tempo meu pai casou-se pela terceira vez, agora com uma jovem de nome Maria Lucia, mãe solteira de um menino de nome Joedson e que morava com os pais em uma chácara vizinha a de vovô Romualdo. Com ela viveu 15 anos e teve cinco filhos – José filho, Paulo, João, Vera Lucia e Pedro. Sim, eu mesmo, essa criatura que vos escreve.
Com minha mãe Maria Lucia, papai formou uma grande família – o filho dela, as filhas dele, e os filhos que os dois fizeram juntos. A vida não era fácil para quem tinha apenas a força de trabalho para tirar o sustento da família das terras dos outros. Mesmo assim eles iam sobrevivendo. E quando as forças já não suportavam o duro trabalho no roçado eles decidiram se mudar para o bairro correntinho em Miracema.
No inicio da década de 90 as coisas começaram a desandar no casamento e meu pai decidiu por um ponto final no seu relacionamento com minha mãe. E depois de um tempo meu pai decidiu casa-se pela quarta vez. E com sua atual esposa Raimunda – com quem teve duas filhas –Juceli e Deuzeli. Já vive há 22 anos.
Durante todo esse tempo, mesmo quando sua rotina era o duro trabalho no roçado não abandonou o amor pelos livros. Lembro-me quando pequeno, quando ia passar os finais de semana com ele, de encontra-lo sentado em uma cadeira lendo algum livro. Além dos vários livros que ele tinha em uma mesinha. Aliás, uma das coisas que me empolgava quando ia para casa do meu pai era o fato de saber que iria encontrar livro para ler. Já que desde pequeno eu era apaixonado por livros, mas não tinha acesso a muitos.E lá em meu pai era certo que teria acesso a muitos livros, já que parte da sua curta aposentadoria era e é até hoje destinada para aquisição de livros. Ele tem tantos, que dá para montar uma grande biblioteca. E apesar da idade, hoje em dia quem vai visita-lo em sua casa, provavelmente o encontrará lendo.
E eu acabei herdando dele este amor pelos livros como também a paixão pelos estudos. Apesar de que o tipo de literatura que eu aprecio hoje, é bem diferente da que ele gosta. Mas não tenho duvida que é dele que herdei tamanho amor pelos livros. Uma herança que não tem preço e que carregarei comigo para sempre.
Pedro Ferreira Nunes
19 de Maio de 2016.

Outono, lua crescente.Casa da Maria Lucia, Lajeado-TO. 

PSOL-TO: O triste retrato de um partido de “esquerda” no Tocantins

“...Se não pode se vestir com nossos sonhos,
não fale em nosso nome...”.
Mauro Iasi
Enquanto ás organizações populares e sindicais, além é claro de partidos de esquerda realizavam em vários cantos do país manifestações no dia 1º de maio – contra o ajuste fiscal de Dilma/Temer e em defesa dos direitos dos trabalhadores. Em Palmas o Partido Socialismo e Liberdade estava realizando um encontro para definir as pré-candidaturas da legenda para as eleições municipais na capital tocantinense.

Tal fato mostra de forma latente a logica de funcionamento do PSOL no Tocantins. Um partido de esquerda que se move pela logica eleitoral. Tanto é verdade que desde as eleições de 2014 o partido estava completamente sumido do cenário politico tocantinense. Nesse meio tempo não vimos uma nota se quer do partido ou de membros de sua direção a cerca dos ataques do governo Marcelo Miranda (PMDB) e do prefeito Amastha (PSB) contra os trabalhadores.

A omissão tem sido a principal característica do PSOL frente às diversas manifestações e mobilizações da classe trabalhadora no Tocantins. Um partido que é referencia a nível nacional na defesa intransigente dos direitos dos trabalhadores e no combate a corrupção. No Tocantins não tem a capacidade se quer de fazer uma notinha em apoio aos que estão nas trincheiras da luta de classes.

E olha que não foram poucas as lutas que tivemos no ultimo período no Tocantins, por exemplo, a greve na educação na rede estadual e na rede municipal de Palmas. Dos servidores da saúde, na segurança pública, no quadro geral de servidores públicos estaduais, na UFT, contra o aumento da passagem do transporte coletivo, contra o auxilio moradia para deputados e o poder judiciário, contra a PEC 215 nos jogos mundiais indígenas, contra o MATOPIBA, contra o ajuste fiscal do governo Marcelo Miranda e dos ataques à educação pelo prefeito Amastha. Além é claro da luta continua do movimento sem terra e dos trabalhadores sem teto.

Não dá para negar o papel importante que o PSOL desempenha a nível nacional articulando e participando ativamente nas principais lutas em defesa do povo trabalhador. Com uma militância aguerrida e figuras públicas de referencia como Chico Alencar, Glauber Braga, Marcelo Freixo, Renato Roseno entre outros. Mas no Tocantins, graças a uma direção degenerada, o partido nada se diferencia dos demais. Aparece apenas no período eleitoral para depois desaparecer do mapa. Aliás, podemos dizer o mesmo do PCB e do PSTU.

Diante disso não é de se admirar que no dia do trabalhador, que deveria ser um dia de luta. O PSOL-TO estivesse fazendo uma espécie de convenção eleitoral. Não precisa de argumento maior para provar que por essas bandas o partido das lutas e da rua foi convertido em partido das urnas. Como também a indicação de Cassius Assunção (presidente regional da legenda, antes era a sua esposa) como pré-candidato do partido a prefeitura municipal de Palmas mostra que não existe democracia no interior do PSOL-TO, mas sim uma espécie de ditadura do clã Assunção.

Esse é infelizmente o triste retrato de um partido de esquerda no Tocantins. Ou melhor dizendo dos partidos de esquerda. E como reflexo disso vemos a pífia votação que o partido teve nas últimas eleições. O numero de votos nulo foi bem superior aos votos dos candidatos do PSOL e PCB juntos. Um fato que se repetirá nas eleições municipais desse ano.

E a responsabilidade maior por esse quadro catastrófico é da direção nacional do PSOL que entregou o partido a nível regional nas mãos de figuras oportunistas. Se essa direção não for sacada o quanto antes o PSOL-TO continuará na lata de lixo – servindo apenas para barganhas politicas daqueles que o dirigem regionalmente.

Pedro Ferreira Nunes é educador popular e militante do Coletivo José Porfírio