segunda-feira, 3 de junho de 2019

Nietzsche e a Filosofia da Vida (Anotações das aulas sobre o pensamento Nietzschiano).

“o rinoceronte é mais decente,
do que essa gente demente,
do ocidente tão cristão...”.
Belchior

Por Pedro Ferreira Nunes

Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844-1900) escreveu diversas obras, entre elas: “Assim falava Zaratustra”, “Humano, demasiado humano”, “A Gaia Ciência”, “A origem da Tragédia” entre outros. Na sua extensa produção filosófica surge um conceito fundamental “ubermensch” que traduzindo para o português significa: além-do-homem ou super-homem como é comumente utilizado em suas obras traduzidas no Brasil. A filosofia de Nietszche é um grito em defesa da vida – de uma vida plena sem as amarras do moralismo cristão. Para compreende-la há seis chaves fundamentais: O niilismo, Morte de Deus, A vontade de Potência, Super-homem, transvalorização e o eterno retorno. 

O niilismo é dividido em duas vertentes – o passivo e o ativo. O niilismo passivo é o que nega a vida e está representado pelo cristianismo e pelo platonismo. Já o ativo afirma a vida – e a afirmação da vida se dá pela “morte de Deus”. A “morte de Deus” nos possibilita sair do niilismo passivo para o ativo e nos libertar dos valores cristãos (como ordem, prudência e obediência) e criar novos valores – esses novos valores são criados a partir da vontade de potência que nos levará ao super-homem. Já em relação a questão da transvaloração se dá no momento que a gente supera os antigos valores, por exemplo, a questão do bem e do mal, e na busca pela construção de uma vida expansiva, agressiva e afirmativa. É assim que chegamos ao eterno retorno – que é quando alcançamos uma vida que não teríamos nenhum problema em vivê-la eternamente. Mas só o super-homem chega a esse ponto.

Essas questões não estão numa obra especifica de Nietzsche. Elas perpassam por todo o seu trabalho, caracterizando assim a sua filosofia. Mas para termos uma ideia melhor de como o filósofo trabalha essa problemática analisemos alguns trechos de uma obra especifica sua, a saber, “O anticristo” – que ao contrário do que o título pode sugerir, o foco da contundente critica nietzschiana não é a figura do cristo, mas seus seguidores – os cristãos. Aliás, para Nietzsche só existiu um cristão e esse morreu na cruz, os seus seguidores o que fazem é desvirtuar o seu exemplo. 

Cristo foi um super-homem já os seus seguidores caminham na contramão ao negar a vida e cultivar valores medíocres que diminui nossa potência de agir. Devemos buscar o que aumenta a nossa vontade de potência – o que é bom. E o que é bom segundo Nietzsche é aquilo que “eleva o sentimento de poder, a vontade de poder, o próprio poder no homem”. E não a sua submissão.

Para Nietzsche a compaixão ativada pelo cristianismo é mais nocivo que qualquer vício. Portanto deve ser evitado. O cristão é um homem doente que nega a vida e o cristianismo é aquilo que tomou partido pelos mais fracos. E foi além, nas palavras do filósofo – “transformou em ideal aquilo que contraria os instintos de conservação da vida forte”. Isso é, transformou valores fracos em algo bom, quando na verdade é mau. Transformou aquilo que diminui a nossa potência em algo a ser almejado. “Meu argumento é que todos os valores que agora resumem o desiderato supremo da humanidade são valores de décadence”.

E Nietzsche continua descarregando sua metralhadora de crítica ao cristianismo. Pontuando o culto que estes fazem de valores e afetos que deveriam ser evitados, pois ao invés de afirmar a vida, nega-a. É o caso da compaixão. A compaixão é o afeto que caracteriza o cristianismo – um afeto que deveria ser evitado, pois tem um efeito depressivo. “O indivíduo perde força ao compadecer-se”. E para Nietzsche o que não nos fortalece deve ser destruído. Os cristãos transformaram a compaixão numa virtude e para nosso filósofo isso é inaceitável, pois “através da compaixão a vida é negada”.

Diante desse contexto Nietzsche deixa claro quem é a antítese da sua filosofia – os teólogos. “a esse instinto de teólogo eu faço guerra: encontrei sua pista em toda parte. Quem possui sangue de teólogo no corpo, já tem ante todas as coisas uma atitude enviesada e desonesta”. São estes senhores que estabelecem os conceitos de “verdadeiro” e “não verdadeiro”. Isso deve ser superado pelos espíritos livres, que já são o exemplo da tresvaloração de todos os valores. 

Para Nietzsche é preciso fazer uma declaração de guerra e vitória em relação a todos os velhos conceitos de “verdadeiro” e “não verdadeiro”. Superando assim essa visão distorcida defendida pelo cristianismo e que tem nos teólogos os seus porta-vozes.

REFERÊNCIA

NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. O Anticristo. Tradução: Paulo César de Souza. Editora Companhia das Letras. São Paulo, 2007.

quinta-feira, 30 de maio de 2019

Educação: Estudantes da Zona Rural de Lajeado prejudicados com a falta de transporte escolar.

Não vou sair do campo,
Pra poder ir pra escola.
Educação do campo,
É direito e não esmola.

Gilvan Santos

A denúncia é dos Vereadores Edilson Mascarenhas (Nego Dilson) e Walber Pajeú que entraram com requerimento de solicitação de providências para regularização do transporte na zona rural do município de Lajeado junto ao Ministério Público do Tocantins. De acordo com os parlamentares a solicitação ao MPE se deu motivada pela falta de uma ação por parte do poder executivo em resolver o problema.

Nesse sentido os parlamentares solicitam ao Ministério Público Estadual – que possa intervir junto a Secretária Municipal de Educação de Lajeado – para fazer valer o que estabelece a lei nº 10.880, de 09 de junho de 2004 (retificada em 2011) – que institui entre outros pontos o Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar – PNATE. “Com o objetivo de oferecer transporte escolar aos alunos da educação básica pública, residentes em área rural, por meio de assistência financeira, em caráter suplementar, aos Estados, Distrito Federal e aos Municípios”. 

Os parlamentares ressaltam o prejuízo que os estudantes da zona rural estão tendo com a falta de transporte – um problema que não é de agora. Pois segundo eles, em 2018, o calendário escolar “não foi cumprindo por falta de transporte escolar, e em 2019, desde o início do ano letivo, o munícipio não vem cumprindo com a presente lei, comprometendo assim o calendário escolar e consequentemente o aprendizado dos alunos”. 

O mais intrigante na solicitação levada ao Ministério Público pelos Vereadores Edilson Mascarenhas e Walber Pajeú é que o problema com o transporte escolar parece não ser de ordem financeira, mas sim de gestão pois “houve licitação para transporte escolar na zona rural de aproximadamente meio milhão de reais, que está em vigência, e vem sendo pago regulamente para essa finalidade”. Sendo assim, por que o serviço não está sendo prestado? O fato é que quem tem tido que arcar com o prejuízo devido a essa situação são os estudantes e suas famílias. Diante disso os parlamentares solicitam “urgência urgentíssima” por parte do MPE para que o prejuízo não seja maior.

Infelizmente o descaso com o transporte escolar (especialmente na zona rural) não é uma exclusividade do munícipio de Lajeado. Somente esse ano, os veículos de comunicação regional noticiaram vários episódios nesse sentido. A diferença no caso é que ao contrario da maioria dos pequenos munícipios tocantinenses, não falta recursos nos cofres públicos de Lajeado – o que pode faltar é planejamento, gestão, preocupação com o bem comum, com a coisa pública e etc. Desse modo não dá para aceitar que essa situação esteja ocorrendo no munícipio.

Cabe, portanto, a toda população se mobilizar para exigir que a prefeitura, através da Secretária Municipal de Educação, não faça nada mais do que aquilo que é sua obrigação nesse caso – garantir transporte escolar para que os estudantes possam estudar. Isso mesmo, estudar. É isso, apenas isso, que esses jovens e suas famílias querem. E é isso que a prefeitura de Lajeado os tem negado.

Com isso não está apenas prejudicando o aprendizado desses estudantes ou com o aumento dos índices de abandono das salas de aula. Está também contribuindo para que estes estudantes juntamente com suas famílias, abandonem a zona rural rumo aos centros urbanos (para poder estudar), e sem trabalho nos centros urbanos acabam engrossando as filas do desemprego e contribuindo para o aumento de outras expressões da questão social – como a violência, o consumo de drogas e a gravidez na adolescência.

É diante disso que afirmamos a necessidade da população lajeadense como um todo, se mobilizar e exigir da Secretária Municipal de Educação que resolva esse problema. Que não tem consequência apenas para esses estudantes e suas famílias, mas para a cidade como um todo. Ora, se quisermos ter uma sociedade diferente mesmo, a educação (tanto a nível municipal, estadual e federal) não pode ser prioridade apenas no discurso, como infelizmente tem sido no Brasil – nos diferentes governos.

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Tocantins.

terça-feira, 28 de maio de 2019

Manifesto do Partido Comunista: O primeiro material punk da história.

“São faces marcadas que temem a revolução...”
Ratos de Porão

Por Pedro Ferreira Nunes

“Um espectro ronda a Europa: o espectro do comunismo”. Assim começa o Manifesto do Partido Comunista escrito por Marx e Engels entre o final de 1847 e o início de 1848 (com a importante contribuição de Jenny – esposa de Marx) chamando atenção para a campanha de difamação que o movimento comunista sofre por parte das elites dominantes da época. Diante dessa campanha o que fazer? Ficar na defensiva? Pegar a bandeira e dá no pé? Como diz uma certa canção. Não para Marx e Engels. Para os dois, os comunistas devem expor abertamente – sua visão de mundo, seus objetivos e suas tendências. E é justamente essa divisão que segue o manifesto. Começando, portanto, apresentando a visão de mundo dos comunistas. 

E qual seria essa visão? De que “a história de todas as sociedades até agora tem sido a história das lutas de classes”. Marx e Engels defendem a ideia de que as diferentes sociedades são frutos da luta entre as diferentes classes que as compõem. E nesse contexto a sociedade burguesa não é diferente, a não ser pela tendência de simplificar os antagonismos de classes em dois campos: a burguesia e o proletariado. A partir dai os autores apresentaram esses dois campos e o porquê que estão em oposição um ao outro.

Marx e Engels nos diz que a burguesia moderna é “o produto de um longo processo, moldado por uma série de transformações nas formas de produção e circulação” (desenvolvimento da indústria, ampliação do comercio e criação do mercado mundial). Essa transformação econômica levou também a uma mudança tanto do ponto de vista político como social da sociedade. Do ponto de vista político o poder do Estado moderno foi transformado num “comitê que administra os negócios comuns da classe burguesa como um todo”. Já no aspecto social se “dissolveu a dignidade pessoal no valor de troca e substituiu as muitas liberdades, conquistadas e decretadas, por uma determinada liberdade, a de comércio”. E ainda “rasgou o véu comovente e sentimental do relacionamento familiar e o reduziu a uma relação puramente monetária”.

E o proletariado? São os trabalhadores modernos que assim como a burguesia se desenvolveu a partir do desenvolvimento do Capital. “Esses trabalhadores, que são forçados a se vender diariamente, constituem uma mercadoria como outra qualquer, por isso exposta a todas as vicissitudes da concorrência, a todas as turbulências do mercado”. Para não serem reduzidos a uma mera mercadoria os operários precisam se organizar e se mobilizar contra a burguesia – uma luta que no primeiro momento é pela sua própria sobrevivência. Mas que não pode se esgotar aí.

“Os proletários só podem se apoderar das forças produtivas sociais se abolirem o modo de apropriação típico destas e, por conseguinte, todo o modo de apropriação em vigor até hoje. Os proletários nada têm de seu para salvaguardar; eles têm que destruir todas as seguranças e todas as garantias da propriedade privada até aqui existentes”. Para tanto o movimento proletário (que se constitui da maioria da sociedade) precisa destruir as classes dominantes. E é essa própria classe dominante, a burguesia, que cria as condições para o desenvolvimento e a tomada de consciência dos proletários. Com isso ela produz os seus próprios coveiros.

Em suma, a burguesia e o proletariado estão em campos opostos nesse tabuleiro, pois possuem interesses antagônicos. A burguesia para manter a sua dominação sobre o proletariado deve reduzi-lo a condição de mercadoria – sujeito as leis do mercado. Isso significa retirar direitos, reduzir salários e etc. Já o proletariado precisa se organizar enquanto classe e lutar não apenas por sua sobrevivência, mas também pela supressão do modo de produção burguês e da própria burguesia.

Diante disso surge a seguinte questão: Qual o papel dos Comunistas diante da luta entre burguesia e proletários? Para responde-la Marx e Engels faram uma caracterização do que é o Comunismo e de quais são seus objetivos. 

Para Marx e Engels os Comunistas não são diferentes dos demais partidos proletários, e nem tem objetivos diferentes destes. “O objetivo imediato dos Comunistas é o mesmo dos demais partidos proletários: a constituição do proletariado em classe, a derrubada do domínio da burguesia, a conquista do poder político pelo proletariado”.  No entanto os Comunistas se colocam como a vanguarda desse movimento sobretudo pela compreensão teórica que se dá a partir da análise do movimento histórico da sociedade. 

Dito isso, “o que caracteriza o Comunismo não é a supressão da propriedade em si, mas a supressão da propriedade burguesa”. Pois essa propriedade é o principal instrumento de dominação e exploração de uma classe por outra. Portanto se se quiser superar essa dominação e exploração é necessário a supressão da propriedade privada.  E é a partir dai que temos a primeira acusação contra os Comunistas.

“Vocês horrorizam com o fato de que queremos abolir a propriedade privada. No entanto, a propriedade privada foi abolida para nove décimos dos integrantes de sua sociedade; ela existe para vocês exatamente por que para nove décimos ela não existe. Vocês nos acusam de querer suprimir a propriedade cuja premissa é privar de propriedade a imensa maioria da sociedade”. Por tanto, o que pretende os Comunistas, e eles não omitem suas intenções, é acabar sim com essa propriedade privada que para existir para uma pequena minoria, priva a grande maioria de possui-la.

Outra acusação contra os Comunistas que Marx e Engels respondem é a de que estes querem acabar com a individualidade a partir do momento que o trabalho não puder mais ser transformado em Capital ou “a partir do momento em que a propriedade individual não possa mais se tornar burguesa”. Tal ideia parte da concepção, portanto, de que apenas o burguês pode ter direito a individualidade. Nesse sentido, Marx e Engels não vacilam ao dizer que o individuo que os Comunistas pretendem abolir é o burguês. Eles esclarecem que “o Comunismo não retira de ninguém o poder de apropriar-se de produtos sociais; apenas suprime o poder de, através dessa apropriação, subjugar trabalho alheio”.

Marx e Engels também respondem a acusação de que “com a abolição da propriedade privada, toda atividade seria paralisada e a preguiça se disseminaria”. Ressaltando que nessa lógica a sociedade burguesa já teria se autodestruída pois nela quem trabalha não lucra e quem lucra não trabalha. O fato é que as críticas da burguesia ao modo de produção Comunista é uma reação contra a perda dos seus privilégios. “Vocês tomam como padrão para a abolição da propriedade burguesa a sua concepção burguesa de liberdade, educação, direito etc. Suas ideias são produto das relações burguesas de produção e de propriedade”. Desse modo é compreensível que rechacem mesmo a perspectiva Comunista (o problema é quando isso parte do proletariado e outras classes subalternas).

Nossos filósofos, também respondem a acusação de que os Comunistas querem acabar com a família (qualquer semelhança com o contexto atual não é mera coincidência). “Em que se baseia a família atual, burguesa? No capital, no lucro privado”. E na medida que se muda o modo de produção a tendência é que esse modelo de família seja abolido. Já em relação a acusação de que os Comunistas querem abolir a exploração das crianças pelos pais, Marx e Engels respondem: - “Nós confessamos esse crime”.

Outra questão importante é acerca da educação. Sobretudo em relação a acusação de que os Comunistas querem substituir a educação domestica pela social. Para nossos filósofos a educação burguesa também é determinada pela sociedade. Desse modo “os Comunistas não inventaram a interferência da sociedade na educação; eles apenas modificam seu caráter e tiram a educação da influência da classe dominante”. Marx e Engels ressaltam que o discurso acerca da família e da educação por parte da burguesia não passa de um engodo, pois na sociedade burguesa tanto a família como a educação são transformados em artigos de comércio e instrumentos de trabalho.

Em relação a acusação de que os Comunistas pretendem introduzir a comunidade das mulheres, Marx e Engels respondem: “o burguês vê sua mulher como mero instrumento de produção” e o que pretende os Comunistas é – “abolir o papel da mulher como simples instrumento de produção”. Já a acusação de que os Comunistas pretendem abolir a pátria, a nacionalidade. Nossos filósofos dizem: - “os trabalhadores não têm pátria. Não se lhes pode tomar uma coisa que não possuem”. O ponto fundamental é abolir a exploração de um individuo por outro, e na medida que isso ocorra, também será abolido a exploração de uma nação por outra. Eles também defendem que com o desaparecimento dos antagonismos de classe dentro das nações favorecerá para o desaparecimento da hostilidade entre nações.

Ainda em relação as acusações contra os Comunistas está a de que estes pretendem abolir as verdades eternas e suprimir a religião e a moral – desse modo caminha-se para uma negação de toda evolução histórica anterior. Marx e Engels defendem que a mudança proposta pelos Comunistas é mais radical que as mudanças que ocorreram anteriormente. Desse modo “não é de se espantar que, em seu desenvolvimento, rompa-se de modo mais radical com as ideias do passado”.

Nesse sentido a primeira tarefa do proletariado é se tornar a classe dominante através da conquista do poder político. A partir daí o objetivo é retirar todo “o capital da burguesia e concentrar todos os instrumentos de produção nas mãos do Estado”. Ainda de acordo com nossos filósofos: “uma vez que, no processo, desapareçam as diferenças de classe e toda a produção esteja concentrada nas mãos dos indivíduos associados, o poder público perderá o seu caráter político”. Pois o poder político só tem sentido numa sociedade dividida em classes, onde esse se configura num instrumento de dominação. Quando, portanto, através de uma revolução o proletariado abole os antagonismos de classes, o poder político perde o seu sentido.

Com isso “no lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e seus antagonismos de classe, surge uma associação em que o livre desenvolvimento de cada um é pressuposto para o livre desenvolvimento de todos”. Em suma, uma sociedade sem desigualdades, sem exploração, sem dominação, sem opressão – em que uma minoria privilegiada não mantenha seus privilégios às custas da miséria da grande maioria.

Seria uma espécie de paraíso na terra? Nossos filósofos estavam a sonhar em demasia com coisas impossíveis? Olhando para nossa realidade é o que nos parece – sobretudo por que o domínio do Capital hoje é bem mais perverso do que há 171 anos, quando Marx e Engels escreveram o “Manifesto do Partido Comunista”. De modo que vislumbrar outro modelo de produção, especialmente baseado numa concepção Comunista, parece algo por demais utópico.

Mas ainda que seja difícil vislumbrar esse processo revolucionário de transformação do modo de produção dominante. Para nós que pertencemos as classes dominadas, abrir mão dessa perspectiva significa abrir mão da nossa libertação – Significa aceitar o estado de coisas tal como está – estado de coisas que não é nem um pouco diferente do que descreve Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista.

Na última parte do “Manifesto...”, Marx e Engels apresentam e caracterizam as diferentes tendências socialistas e comunistas, não poupando crítica as linhas reformistas e oportunistas. Entre essas tendências está o socialismo feudal, o socialismo burguês e o Socialismo e Comunismo utópico. Segundo nossos filósofos, o socialismo feudal tem um caráter reacionário e na prática “participam de todas as medidas violentas contra a classe operária”. Já os socialistas burgueses seriam reformistas – “querem as condições de vida moderna, sem os conflitos e os perigos que dela necessariamente decorrem”. Buscam afastar o proletariado do movimento revolucionário defendendo que o foco da luta deve ser econômico (na melhoria das condições de vida) e não na domada do poder político. E os socialistas e comunistas utópicos fazem uma analise fantasiosa da sociedade e se colocam a cima da luta de classes – “rejeitam toda ação política, quer dizer, revolucionária; querem atingir seu objetivo por meios pacíficos e tentam abrir caminho para o novo evangelho social pela força do exemplo, por meio de experimentos inexpressivos que, naturalmente, sempre fracassam”.

Diante disso qual deve ser a posição dos Comunistas diante dos partidos de oposição? É respondendo essa questão que Marx e Engels encerram o Manifesto do Partido Comunista. Eles salientam que “os Comunistas lutam pelos objetivos e interesses mais imediatos da classe operária, mas, ao mesmo tempo, representam no movimento atual o futuro do movimento”. Desse modo eles defendem a aliança dos Comunistas com os diversos partidos de oposição que estão na luta pela melhoria das condições de vida do proletariado, mas sem perder de vista a relação antagônica entre burguesia e proletariado.

Marx e Engels ressaltam que “os Comunistas apoiam em toda parte todo movimento revolucionário contra as condições sociais e políticas atuais”. Sempre pautando nesses movimentos a questão da propriedade. Os Comunistas também devem lutar pela união dos diversos partidos progressistas e pela construção de frentes democráticas, sem, no entanto, abrir mão dos seus princípios. E concluem afirmando que as classes dominantes devem tremer diante de uma revolução Comunista. Já os proletários “não têm nada a perder, além de seus grilhões. Têm um mundo a conquistar”. E por tanto nossos filósofos conclamam: - “Proletários de todos os países, uni-vos!”.

Por fim, para mim, ler o “Manifesto do Partido Comunista” é como ouvir um bom disco de Punk Rock. Você ouve sempre e não se cansa. O estilo duro e direto dos autores – como um soco no estômago – também lembra as letras de canções punks.  Marx e Engels distribui socos e ponta pés para todos os lados, do início ao fim da obra. Seria, portanto, o “Manifesto...” o primeiro material punk da história? 

Li-o pela primeira vez lá pelos idos de 2005-2006 se não me engano. Justamente no mesmo período em que descobri o punk através de bandas como Sex Pistols, Ramones e Ratos de Porão. Desde então a leitura desta obra tornou-se um hábito para mim. Sobretudo por que apesar de ter sido escrita já há mais de 170 anos (quando o estágio de desenvolvimento do capitalismo era ainda embrionário) a crítica desses revolucionários permanece bastante atual – ainda mais num contexto em que se fala tanto em comunismo, mas sem consciência do que isso seja de fato.

Falar em comunismo, seja a favor ou contra, sem ter lido o Manifesto do Partido Comunista é inaceitável. Quem o faz não merece o mínimo de credibilidade, pois nada mais está fazendo do que repetir ideias de terceiro. É óbvio que não dá para reduzir a compreensão do movimento comunista a esse livro unicamente, mas tão pouco é possível compreende-lo sem a leitura dessa obra que inspirou e inspira a luta anticapitalista mundo afora – incluindo o Movimento Punk.

Referência Bibliográfica

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. 1º ed. São Paulo: Expressão Popular, 2008.

sexta-feira, 24 de maio de 2019

Música popular tocantinense: Canções tocantinas.

“Venha vestida de roda, morena, espante esse mal, solidão. 
Venha que a roda catira, morena, lhe chama”.
Braguinha Barroso

Ainda criança aprendi a apreciar a música popular feita no Tocantins, especialmente as canções do Dorivan, Genésio Tocantins, Braguinha Barroso, Chico Chokolate, Juraides da Cruz e Orley Massoli. E na ausência de uma literatura regional acessível foram os versos desses artistas através de suas canções que contribuíram com a formação da minha identidade tocantinense e me influenciaram no oficio de escrever poesias, contos e crônicas.

Na minha infância destacaria três canções: Frutos da Terra do Genésio Tocantins, Senhor do Bonfim do Dorivan e Atômico do Chico Chokolate: A primeira é uma linda homenagem ao nosso cerrado e as suas riquezas: “Tem guapeva lá no mato, no brejinho tem ingá, no campo tem curriola, murici, araçá. Tem uns pés de marmelada, depois que passa a pinguela, subindo pro cerradinho, mangaba e mama-cadela”. Essa canção que na infância nos afetava de alegria, hoje nos afeta de tristeza, sobretudo por que com o avanço do agronegócio a diversidade de frutos que o cerrado tinha, já não tem. O que tem é soja, cana de açúcar e pasto pra gado. 

A segunda é um belo retrato da alma religiosa do povo tocantinense que todos os anos segue em Romaria para pedir e agradecer as bênçãos recebidas durante o ano: “Senhor do Bonfim, esse ano eu vou a pé, vou pagar minhas promessas, elevar a minha fé...”. Um povo sofrido que faz enormes sacrifício para sobreviver, mas que não perde a esperança e a fé. 

Já a terceira (uma parceria do Chico Chokolate com o Ronaldo Teixeira) é um primor – uma letra brilhante interpretada numa pegada rock in roll – que rompe com a barreira do regionalismo: “Baby, o Armagedom já aconteceu dentro do meu coração, e eu tive a sensação de ver tudo ruir. Errei ao imaginar, uma metrópole perfeita e segura do nosso amor. O Alicerce era fraco e eu não sabia, que a explosão da bomba eu não suportaria.” A canção que fala de uma história de amor que chega ao fim, e como toda história de amor que chega ao fim deixa seus estragos, é poesia da melhor qualidade: “Baby, esse brilho de mil sois pode nos cegar, Baby, feridos assim aonde vamos parar? 

A partir daí nunca perdi meu interesse na música popular feita no Tocantins – apesar da dificuldade de acesso a rica produção desses artistas diante da falta de espaço, especialmente no interior, para que eles possam divulgar os seus trabalhos. 

Se hoje as coisas ainda são difíceis imagine antes da popularização da internet. Antes a divulgação era restrita a algumas rádios (isso não mudou muito) e a clipes divulgados nos intervalos da programação da TV Anhanguera – e foi assim que eu particularmente tive acesso aos trabalhos desses artistas e de outros como Orley Massoli – autor de canções como Imensidão e Terraguarés (não sei se é assim que se escreve) e da bela Meninos da Candelária: “se tudo jaz, eu canto um jazz, a vida é um jasmim”. 

Outra bela canção de sua autoria é Menino de Paraiso que canta os encantos e a liberdade da infância: “O menino voou no balão, com seus dragões, aviões... Minha branca de neve me leve, sou criança pare com isso. Me abrace e me beije de leve, sou menino de Paraíso”. 

Se tratando de música tocantinense um artista que não pode ficar de fora é Juraides da Cruz – com um pé em Goiás e outro no Tocantins – ouso dizer que ele é um dos grandes compositores da música popular brasileira. Eu particularmente gosto de Meninos: “Não sou tanajura, mas eu crio asas, com os vagalumes eu quero voar... O céu estrelado hoje é minha casa, fica mais bonita quando tem luar... Quero acordar com os passarinhos, cantar uma canção com o sabiá”. Só os amantes da vida interiorana compreendem o quanto isso é prazeroso. 

Outra canção dele bastante conhecida que eu também aprecio é “Ei flor. Cadê o cheiro que ocê prometeu. Ei, flor. Não venha dizer que se esqueceu.... Amor, não lembra mais do seu dodói, eu era o lírio dos teus olhos, nós banhava no riacho, diacho, valha-me Deus”. Além de Memórias de carreiro, não tão conhecida como as duas anteriores e o seu grande sucesso (nois é jeca mas é joiá), mas de uma beleza impar: “Hoje tenho as mãos calejadas, de um trabalho duro e cruel. Só me restou uma sorte marvada: Boi-de-canga de Coronel”. Em outro trecho ele canta “Faço parte dessa manada, na cidade tonta e perdida. Me vem na garganta um nó de laçada, e no peito uma saudade doida...”. E o refrão: “Êh, tempo que se foi, te guardo no coração. Êh, carro de boi, sumiste no estradão”. Eis a sina de tantos que foram expulso do campo diante do avanço do agronegócio devastador.

Outro artista que não poderia deixar de falar é o Braguinha Barroso que trás na sua música toda a força da cultura negra. Um exemplo é a canção Catirandê: “Venha vestida de roda, morena, espante esse mal, solidão. Venha que a roda catira, morena, lhe chama”. Apesar dos pesares é preciso resistir e ninguém melhor que o povo negro sabe resistir com alegria. “Meu bem querer, quando eu for não chore, que eu volto antes do dia nascer, meu bem querer”.

Bem, além desses artistas e dessas canções, existem outros tantos artistas e outras tantas canções que poderiam serem apresentados nessas breves linhas. Mas fiquemos por aqui. Creio que essa pequena amostra cumpre o objetivo de apresentar de forma breve a riqueza da música popular tocantinense. 

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”.

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Hostilidade as universidades públicas e aos Cursos de Humanas

“Essa luta é reflexo da luta entre uma classe social que não quer perder seus privilégios e uma nova classe ou conjunto de classes sociais que estão tentando adquirir seus direitos à cultura”. 
Ernesto Che Guevara

Que não se iludam camaradas. A atitude hostil do governo Bolsonaro contra as universidades públicas conta com um importante respaldo popular sobretudo diante do preconceito do que de fato é a realidade nos campus universitários desse país. E em grande medida temos a nossa cota de responsabilidade por esse desconhecimento, quando ao invés de derrubar o muro que isola a Universidade Pública do resto da sociedade, contribuímos para sua manutenção.

Senti essa hostilidade na pele quando ingressei no curso de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins por parte dos colegas do transporte universitário que serve aos estudantes do município de Lajeado que estudam em Palmas (cerca de 90% em instituições privadas de ensino). No inicio não entendi muito bem o porquê da hostilidade, já que estudar numa instituição federal (onde a qualidade de ensino é inegavelmente superior) deveria ser algo a ser almejado por todos. 

Cheguei a pensar que fosse algo pessoal comigo ou inveja por não conseguirem ingressar numa universidade pública. Mas depois percebi que não era só comigo, mas com todos os estudantes da Universidade Federal do Tocantins. E claro, sendo do curso de Filosofia ou Teatro essa hostilidade aumentava significativamente. Foi o que percebi em conversa com outros colegas que me relatavam o que ouviam quando diziam que cursavam Filosofia ou Teatro na UFT.

E tal atitude se fundamenta na crença de que os cursos têm uma orientação marxista, que os professores são todos comunistas e ateus (fazendo doutrinação ideológica), que o consumo de drogas (especialmente maconha) acontece em plena aula e que as festas sempre acabam em orgias. Em suma um ambiente, totalmente contrario ao que prega a moral e os bons costumes da sagrada família tocantinense. Inclusive essa crença é alimentanda por egressos que distorcem os fatos, transformando exceções em regras.

E esse fato por si só é uma mostra de que não há doutrinação ideológica nas Universidades. Pois se houvesse uma doutrinação ideológica (comunista) não teríamos estudantes alimentando esse tipo de discurso contra valores que em sua grande maioria estão longe de serem comunistas, mas sim liberais. Ainda nesse sentido é importante destacar que um número significativo de estudantes da UFT, inclusive dos cursos de humanas (como o de Filosofia), votaram no Bolsonaro. O que mostra que se há uma doutrinação por parte do colegiado de Filosofia da UFT, essa doutrinação não está sendo tão eficaz assim.

Quem não frequenta o curso de Filosofia pode achar que esse se reduz a Marx e aos marxistas. Mas o fato é que a realidade é bem diferente. Nos meus 08 períodos de curso pude perceber que se fala muito de Marx mas estuda-lo propriamente se faz muito pouco. Tanto, que pelo menos na minha graduação, não lemos nenhuma obra completa desse filósofo, nem se quer o “Manifesto do Partido Comunista” que é uma obra pequena e bastante acessível. Apenas no 7º e 8º período vimos muito superficialmente o seu pensamento e lemos pequenos trechos da “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel”.

Aliás no colegiado de Filosofia da UFT não tem nenhum professor especialista na obra de Karl Marx. A leitura que eles têm da obra desse filósofo é a partir de autores marxistas como Marcuse, Adorno, Gramsci, Paulo Freire entre outros. E mesmo esses autores, durante a minha formação, não se trabalhou uma obra completa de suas autorias. Ao contrário das obras de filósofos como Platão, Aristóteles, Spinoza, Nietsche, Rousseau e Freud.

A partir dai poderia se dizer que o curso de Filosofia da UFT é, portanto, uma exceção. Mas não é bem assim. O filósofo Vladimir Safatle relata em um artigo intitulado “Marx, esse desconhecido” que na sua graduação na USP ele também não estudou Marx. Mas um exemplo melhor é se analisar os trabalhos apresentados nos encontros de Filosofia que acontece em todo o Brasil (especialmente o ENEFIL) e a partir daí se perceberá a pluralidade de perspectivas filosóficas e temas filosóficos que são trabalhado nos cursos. 

Aliás é importante também fazer essa análise dos trabalhos apresentado nos eventos promovido pelo Colegiado de Filosofia da UFT e pelo Centro Acadêmico e garanto que se confirmará o que já disse aqui – o estudo do pensamento de Marx e os dos marxistas é uma exceção e não a regra.

E sendo exceção por que incomoda tanto? Por que faz a diferença! Combate a mediocridade e é uma trincheira de resistência ao projeto de mercantilização da educação pública – um projeto que está em curso no Brasil desde o início da década de 1990 e que agora tende a se aprofundar (se não houver resistência) transvertido do discurso de cassa “aos comunistas” nas universidades. Mas no fundo o que está se cassando é a democracia.

E quem afirma isso não é um filósofo marxista, e sim liberal – Marta C. Nussbaum – filósofa estadunidense autora do livro Sem fins lucrativos: por que a democracia precisa das humanidades. Ela chama atenção para uma crise silenciosa que coloca em risco o futuro dos governos democráticos – uma crise mundial da educação – com a retirada das humanidades da grade curricular de ensino. Pois “os países preferem correr atrás do lucro de curto prazo por meio do aperfeiçoamento das competências lucrativas e extremamente práticas adequadas à geração de lucro”. 

Ainda de acordo com essa filósofa “o incentivo ao lucro sugere a muitos lideres ansiosos que a ciência e a tecnologia têm uma importância decisiva para o futuro bem-estar de seus países” o problema é que “outras competências, igualmente decisivas, correm o risco de se perder no alvoroço competitivo”. Portanto faz-se necessário resistir a esse projeto, que até mesmo para uma liberal verdadeira é inaceitável. 

Já nós, revolucionários, precisamos ir além, precisamos lutar para aprofundar as mudanças que ocorreram nas últimas décadas com o ingresso maior das classes populares nas Universidades Públicas – ingresso que deve vir junto com a permanência e em todos os cursos. E por fim, a tarefa fundamental – derrubar os muros que isolam a universidade do resto da sociedade.

Pedro Ferreira Nunes – é “apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”.

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Em defesa da Educação Pública – Todo apoio a Greve Nacional da Educação.

É necessário romper com a lógica do capital se quisermos contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente diferente.

István Mészáros

Diante da conjuntura política atual no Brasil de aprofundamento do processo de sucateamento e mercantilização da educação pública – nós do Coletivo de Educação Popular José Porfírio não poderíamos deixar de declarar nosso apoio incondicional e de reforçar a convocação para a Greve Nacional da Educação convocada para o dia 15 de Maio pelas organizações representativas de Estudantes, técnicos e professores.

É inaceitável a chantagem do  Governo Bolsonaro que condiciona a liberação de recursos para educação com a aprovação da reforma da previdência. Trata-se claramente de uma ação autoritária que busca neutralizar as críticas por parte do setor educacional, especialmente as universidades, a um projeto previdenciário nefasto aos trabalhadores. Também é inaceitável o fechamento de cursos da área de humanidades e de escolas no campo. Tudo isso serve claramente a um projeto autoritário de poder que busca eliminar a oposição e enfiar goela abaixo da população uma concepção unidimensional de sociedade. 

No Tocantins essa paralização se torna ainda mais fundamental, sobretudo diante de um contexto de fechamento de escolas, professores trabalhando sem contrato ou com contrato precarizado e da falta de transporte escolar no interior prejudicando o deslocamento de estudantes. Sem falar no projeto de lei de militarização das escolas que está tramitando na assembleia legislativa do Tocantins.

É importante ressaltar que esse descaso e retrocessos ocorre não só por parte do Governo Federal e Estadual, mas abrange os três níveis de ensino como aponta as greves dos trabalhadores da educação de Guaraí e Riachinho. Por isso é importante que a Greve Nacional no dia 15 Maio tenha a adesão das trabalhadoras e trabalhadores das redes Municipais, Estaduais e Federal de ensino. Mas também da sociedade em geral, especialmente os setores progressistas, já que a defesa de uma educação pública, gratuita e de qualidade não se reduz aos estudantes e trabalhadores da educação.

Diante disso fazemos um chamado para que nos mobilizemos e contribuamos na construção da Greve Nacional da Educação em todas as cidades desse país. No Tocantins especialmente, teremos um grande ato com concentração em frente a Assembleia Legislativa a partir das 09h da manhã – traga sua força, seu entusiasmo e seu cartaz em defesa da educação pública e contra a reforma da previdência. Pois só através da nossa organização, mobilização e luta poderemos derrotar as ações de desmonte dos nossos direitos por parte dos governos de plantão.

Pedro Ferreira Nunes
Pelo Coletivo José Porfírio

Lajeado – TO, 09 de Maio de 2019.

terça-feira, 7 de maio de 2019

Freud “Psicologia das Massas e Análise do EU”

“Não há tempo há perder
as engrenagens não podem parar.
Não há tempo pra pensar
não há tempo pra sofrer...”.
Inocentes

Por Pedro Ferreira Nunes

Para tratar da Psicologia das Massas Sigmund Freud (1856-1939) partirá da contribuição de dois autores: Le Bon – especialmente a descrição que esse autor faz da alma coletiva. E McDougall que trabalha a organização da massa. Freud, no entanto, vai além, ao enfatizar que mais do que compreender o que é uma massa, é preciso entender como ela adquire a capacidade de influenciar de modo decisivo a vida psíquica do indivíduo.

Freud concorda com a descrição que Le Bon faz da alma coletiva, sobretudo de que “a massa é impulsiva, volúvel, e excitável” – ainda que apontando algumas críticas, por exemplo, quando Le Bon descreve as novas características que o indivíduo adquire ao entrar numa massa, a saber: um sentimento de poder invencível, o contagio mental, e a sugestionabilidade. Para Freud é evidente que a segunda e a terceira não são do mesmo tipo. Porém Le Bon não deixa isso bem claro. 

Mas a principal crítica de Freud a Le Bon é acerca do papel do líder e a importância do prestigio – para Le Bon o prestigio pode ser adquirido de forma artificial ou pessoal. Para Freud isso não “se harmonizar com a sua brilhante descrição da alma coletiva”. É por isso que mais adiante ele trará a questão libidinal como um fato importante para compreender a relação entre o líder e a massa. Uma relação que vai além do prestigio.

Freud chama atenção para “outras abordagens da vida anímica coletiva”. Segundo ele apesar de autores como Le Bon terem feito uma boa descrição da alma coletiva, é preciso “reconhecer outras manifestações da formação de massas, atuando em sentido contrário, e que devem conduzir a uma bem mais alta avaliação da alma coletiva”. É então que ele analisará a contribuição de McDougall – que se desenvolve, sobretudo em torno do processo de organização da massa. Essa organização é que difere a massa de uma multidão, por exemplo. 

Para Freud esse esforço de organização da massa é a busca em prove-la “daquelas mesmas qualidades que eram características do indivíduo e que nele foram extintas pela formação da massa”, por exemplo, uma identidade particular que a diferencia de outras massas. A partir dai surge uma questão que também carece de analise que é a afetividade.

Num interior de uma massa o indivíduo sofre uma intensa transformação. Por um lado, a sua afetividade é intensificada, por outro a sua capacidade intelectual diminui. De modo que é impossível compreende-lo a partir unicamente da perspectiva racional. Freud defende que não é possível compreender o indivíduo na massa sem a questão do libido – da afetividade. Ele defende que as relações de amor também constituem a alma coletiva. “Se o indivíduo abandona sua peculiaridade na massa e permite que os outros o sugestionem, que ele o faz por que existe nele uma necessidade de estar de acordo e não em oposição a eles, talvez, então, por amor a eles”.

Outro ponto importante abordado por Freud é acerca dos diferentes tipos de massa, por exemplo: Passageiras e duradouras, homogêneas e não homogêneas, naturais e artificiais, primitivas e diferenciadas. Ele, porém, se desdobrará na análise de duas massas artificiais – igreja e exército. Que também podem ser definidas como duradouras, não homogêneas e diferenciadas. Em suma, massas que não são organizações simples. E o ponto fundamental para essa análise é o fator libidinal que existe no interior dessas organizações (tanto exército como a igreja) mantendo a massa coesa.

Para mostrar como a essência da massa reside nas ligações libidinais, Freud trás o exemplo do pânico, que pode ser notado sobretudo no exército. “o pânico surge quando uma massa desse tipo se desintegra. É caracterizado pelo fato de as ordens do superior não serem mais ouvidas e cada um cuidar apenas de si, sem consideração pelo demais. As ligações mútuas cessaram, e uma angústia enorme e sem sentido é liberada”.

Nas massas os instintos amorosos estão desviados de suas metas originais, o que não significa que aja menos energia. Segundo Freud: “Já notamos, no quadro do habitual investimento sexual de objeto, fenômenos que correspondem a um desvio do instinto em relação a seus fins sexuais. Nós os descrevemos como graus de enamoramento, e reconhecemos que envolvem certa diminuição do Eu”.

Além dessas questões apresentadas brevemente acima, Freud também abordará a questão da identificação – a mais antiga manifestação de uma ligação afetiva a uma outra pessoa. E o instinto gregário – a compreensão do homem como um animal de horda, membro individual de uma horda conduzida por um chefe. Entre outros pontos.

Trata-se de uma obra bastante rica, cuja leitura, contribui sobremaneira para compreendermos um pouco melhor não só a conjuntura política do nosso país (o fenômeno Bolsonaro) como também o que vem ocorrendo em outras partes do globo como a crise na Venezuela e a ascensão da extrema direita na Europa e nos Estados unidos da América.

REFERÊNCIAS

FREUD, Sigmund. Psicologia das Massas e Análise do EU. Volume Autônomo. Editora Psicanalítica internacional: Viena, 1921.