sábado, 5 de fevereiro de 2022

Lajeado, o selo UNICEF e o Protagonismo Juvenil na elaboração e execução das Políticas Públicas para Juventude

A luta por políticas públicas para juventude conseguiu importantes conquistas ao longo da história. Sobretudo nas últimas décadas onde percebemos um maior protagonismo da juventude na elaboração e execução dessas políticas. Nessa linha, um organismo que reconhece, e fortalece, iniciativas nesse sentido é o selo Unicef. Ao assumir esse desafio a cidade de Lajeado se compromete com uma mudança de paradigma em relação as políticas de juventude até então desenvolvidas no município. 

Para quem não conhece,  o selo Unicef é uma iniciativa do Fundo das Nações Unidas  (ONU) para Infância. Seu objetivo, entre outros, é fomentar ações que garantam os direitos das crianças e dos adolescentes. Nesse sentido, os municípios que aderem ao selo se comprometem com um conjunto de medidas de melhoraria da qualidade de vida do público alvo através da efetivação de políticas públicas. Essas ações devem ser pensadas e desenvolvidas com a participação efetiva da juventude e da Sociedade Civil Organizada – através de dois importantes organismo – o Núcleo de Cidadania de Adolescentes (NUCA) e o Fórum Comunitário.

Para ser constituído o Núcleo de Cidadania de Adolescentes (NUCA) precisa de, no mínimo, 16 integrantes. Sendo 8 meninas e 8 meninos (ou outros gêneros) na faixa etária entre 12 e 18 anos de idade. Não há um limite máximo de integrantes do NUCA, desse modo quanto mais jovens forem mobilizados, melhor. Nessa linha, essa mobilização deve ser feita sempre com um olhar para diversidade e para os direitos humanos. Aliás, um dos aspectos fundamentais do selo Unicef é o respeito e a garantia dos Direitos Humanos. 

O Fórum Comunitário segue a mesma linha do respeito a diversidade e dos Direitos Humanos. Sendo que um dos aspectos importante desse organismo é a parceria entre Poder Público e Sociedade Civil Organizada – tal parceria tem como objetivo mobilizar e comprometer toda a sociedade com a garantia dos Diretos das Crianças e dos Adolescentes. Pois afinal de contas, as expressões da questão social decorrente da negligência a esses direitos afeta toda a sociedade.

No entanto essa questão não pode fazer com que as políticas sejam elaboradas a partir da perspectiva da juventude como um problema. Daí a importância da participação dos jovens. Logo, não basta apenas criar o NUCA, é preciso criar condições efetivas para que os jovens possam participar – uma participação sem tutela.

Nesse sentido é fundamental se atentar para o que diz um trecho do Guia de Participação Cidadã de Adolescentes (Selo UNICEF 2021-2024): 

“É importante manter a atenção para evitar que a participação de adolescentes seja figurativa, ou seja, que meninas e meninos apenas apareçam em eventos públicos sem que, de fato, expressem sua opinião ou sentimentos. Sua perspectiva é uma fonte preciosa de informação para qualificar políticas públicas, uma vez que dependem da qualidade de serviços e de programas para seu desenvolvimento integral. Por outro lado, também é fundamental estar alerta para não sobrecarregar adolescentes com um excesso de responsabilidades que seriam da gestão pública municipal para certificação do município”.

Em Lajeado é mais do que necessário a participação da juventude na elaboração das Políticas Públicas de seu interesse. Até então as políticas voltadas para juventude são elaboradas “para” e não “com” os jovens. Para nós, trata-se de uma opção política que não pode ser justificada na falta de interesse ou falta de capacidade dos nossos jovens. O que falta é um trabalho que desenvolva essa capacidade e desperte o interesse deles – a nossa experiência na educação básica mostra que isso é possível. 

Com o selo Unicef, Lajeado tem a oportunidade de mudar a história das Políticas Públicas para Juventude em âmbito municipal. Claro, isso dependerá da forma com que o projeto será desenvolvido – da capacidade de mobilização da Juventude e da Sociedade Civil Organizada. Os desafios não são poucos – déficit de aprendizagem, evasão escolar, qualificação profissional, acesso ao mercado de trabalho, acesso ao lazer e a cultura, prostituição, gravidez na adolescência, tráfico e consumo de drogas, alcoolismo, violência – são questões que precisaram serem enfrentadas se a Comunidade pretende obter o selo Unicef – ressaltando que o importante não é o selo em em si. Mas o que ele representa, isto é,  que a cidade de Lajeado respeita e promove os Direitos das Crianças e dos Adolescentes propiciando uma melhor qualidade de vida para toda a comunidade.

“Eles dizem que você é doente
E que isso é fase adolescente
Mas não, não vá se entregar.
Dê uma outra chance pra você,
Não se isole por que você,
Você é ALGUÉM!
CÓLERA 


Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atua como Professor da Educação Básica no CENSP-Lajeado.







domingo, 30 de janeiro de 2022

Conto: “E quem um dia irá dizer...”

Enquanto colocavam o papo em dia, ele não deixava de observar a sua volta. Era a primeira vez que ia aquele local. E isso era certamente um dos motivos por que chamava atenção de todos ali. Mesmo incomodado por ser o centro das atenções, ele tentava relaxar.

Ela chegou acompanhada do marido. Tinha ido buscar um lanche. Ele não pode deixar de nota-lá. Ela fora a sua grande paixão da juventude. Ele pensava consigo: - Nossa, eu amei tanto essa mulher. E hoje não sinto nada. Como pode? Estranho, não?! E então, ele começou a lembrar da sua juventude – de quando encontrar com ela era a melhor parte do dia. Mas aquelas lembranças não o faziam sofrer. Pelo contrário, era engraçado lembrar daquele amor da adolescência – um tanto exagerado – indo na contra mão do seu perfil discreto – conservador. 

Eles se conheciam há algum tempo, mas foi no Colegial que se tornaram mais íntimos. Ela que não era muito sociável acabou encontrando nele uma das poucas pessoas naquela escola por quem se simpatizasse e conversava. E foi a partir daí que de uma hora para outra ele se viu perdidamente apaixonado por ela. 

Ir para escola tornou-se a melhor parte do dia, pois era quando se encontravam. Ele podia está de mau humor, era só vê-la, trocar uma ideia com ela que o seu sorriso abria. Ela igualmente. Quando chegava sexta-feira era uma tristeza só, pois significava que só iriam se encontrar novamente na segunda-feira. E ficar dois dias sem vê-la, sem falar com ela, era uma tortura. No último ano do Colegial, quando chegou então o mês de férias, ele achou que enlouqueceria.

Era perceptível que ela gostava dele. Mas será se era o mesmo sentimento que ele tinha por ela? Ou era só amizade? Os amigos deles acreditavam que havia algo entre os dois. Mas a verdade que eles nunca conversaram sobre coisas nesse sentido. Se ela nutria algum sentimento por ele, além de amizade, nunca lhe disse. Ele por sua vez nunca teve coragem de se declarar.

Quando retornaram das férias escolares, uma guria que acabara de chegar na cidade se aproximou dele e acabaram ficando. E aquela paixão que ele sentia por ela foi se extinguindo.

Chegou ao final o ensino médio. E cada um seguiu o seu rumo. Ela se casou, formou uma família, teve filhos. Já ele decidiu focar nos estudos, não casou e nem teve filhos. Nunca mais haviam se visto, até aquele dia. E depois de tanto tempo ele percebeu que não sentia mais nada por ela. E da forma indiferente que ela o olhou, o sentimento era recíproco. 

Ele pensava consigo: - as vezes a gente alimenta a ilusão de encontrar um amor do passado e reviver agora o que não foi possível lá atrás. Que besteira?! Isso é reflexo do tanto de romance de novela que você engoliu a vida inteira. A vida real é diferente meu caro.

Enquanto isso sua amiga continuava falando. Ele mostrava todo interesse naquela conversa. E assim nem percebeu quando ela foi embora. Pensava consigo: - tenho que escrever sobre essa experiência. É muito estranho esse negócio de sentimento – é estranho ver que alguém que já fora tão importante para gente já não é mais. Mas como diz a canção: “Quem um dia irá dizer que não existe razão/Nas coisas feitas pelo coração/E quem me irá dizer que não existe razão...”.

Por Pedro Ferreira Nunes – Um rapaz latino americano que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in roll.

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Trilhas de Cantigas – Toninho Borges

Desde que ouvi “Trilhas de cantigas”, “Gestação da terra”, mas sobretudo a bela “Origens e lembranças”. Vi que não estava diante de um artista qualquer. Toninho Borges me lembrou Elomar – que na minha visão é o maior representante da música Sertânica desse país. As letras das cantigas desse Mineiro que há muitos anos vive no Tocantins nos remete a infância daqueles que cresceram no interior.

“No corte do facão/no "taio" da enxada/maroto furando meu pé/e minha mâo calejada/é que preparo a terra/pra quando o céu chover/engravidar a semente/e a vida florescer...”

Nesses versos da canção “Gestão da Terra” o artista nos mostra a luta do camponês no preparo da terra para plantação. Uma rotina dura mas necessária para sobrevivência de muitas famílias. Hoje essa realidade mudou bastante com a mecanização da produção agrícola. Por isso os versos nos remete a um passado.

“Nas encontas e vazantes/e nas beiras de rio/quando vem chegando as águas/tudo aqui entra no cio/o verde espalha feito manto/e cobre a vegetação/renasce no ventre da terra/o milagre da reprodução...”

Ainda em Gestão da Terra, temos outro verso qua nos remete a algo que não existe mais. Com o avanço da construção das Usinas Hidrelétricas no leito do Rio Tocantins, já não há mais vazantes. Muitos tiveram que deixar suas terras e dá lugar a empreendimentos turísticos. 

No título da canção “Origens e Lembranças”, temos a temática que será desenvolvida. Toninho Borges nos apresenta um belo poema. Pois eis o que é a letra dessa canção – um belo poema – que desperta em nós a saudade de algo que se perdeu. Mas que sobrevive no nosso pensamento. 

“Tão distante do meu lugar/Como folhas nas asas do vento/Pé de serra caminhos de casa/Nunca saem do meu pensamento...”.

Nesses versos percebemos um elemento que o filósofo Adolfo Sánchez Vásquez destaca ao falar da verdadeira arte popular – O contato com a vida humana, com o povo. E assim ela se torna a arte universal por expressar os anseios do povo. Nesse caso daqueles que precisam deixar a sua terra natal e que acalentam na memória o desejo de um dia retornor. Mas ao mesmo tempo sabe que isso não é mais possível. Resta por tanto a saudadede de um tempo que se foi.

“Eu sou um menino moleque/Colhendo versos maduros no chão/A saudade invadiu minha terra/Fez morada no meu coração...”.

Em “trilhas de cantiga” temos mais uma canção onde a saudade de um tempo que se foi dá o tom. E mais uma vez percebemos os elementos que Vásquez fala sobre a arte popular. A saudade é um sentimento universal, por mais que o artista esteja falando da sua vivência. Essa vivência nos remete a vida de muitos que deixam a casa paterna na busca por seus sonhos. 

“Nas curvas de um rio plantei a saudade/E o meu destino nas veias do violão/Um trem que me leva pra outras cantigas/Eu parto asssim sem rumo sem direção...”.

Que privilégio o nosso que esse cantador, filho de Vaqueiro, lá do Jequitinhonha teve como rumo o Norte e como direção o Tocantins. Em 2021, ele foi um dos muitos artistas que produz arte no Tocantins contemplado com recursos da lei de emergência cultural Aldir Blanc – É daí que nasceu o show Trilhas de Cantigas em formato de live (disponível no youtube – https://www.youtube.com/watch?v=03d-4H24DEI). Nesse projeto temos a oportunidade de apreciar um pouco da obra desse talento da música sertanica. Se ainda não conhece a obra do Toninho Borges, eis aí uma boa oportunidade.

Por Pedro Ferreira Nunes – Poeta, Escritor e Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente é Professor da Educação Básica no CENSP-Lajeado. 

quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Crônica: O perigo mora ao lado

Domingo á noite. Por volta das 22h ouço tocar o meu telefone celular. Quem estaria me ligando naquele horário? Não é comum alguém me ligar á noite. Aliás, com o whatsapp as ligações tornaram-se coisa rara. Levanto e vou até o aparelho que está carregando. – ah, é minha mãe. Nesse horário? Ela que gosta de dormir com as galinhas. O que seria?

- Pedro. Me diz uma coisa. Eu comprei a passagem para depois de amanhã. Mas dependendo das coisas eu não vou não. Tá chovendo muito, aqui em Goiânia não parou de chover desde que cheguei. Ai também tá do mesmo jeito. Me mandaram os vídeos que ai tá tudo cheio. Essa barragem não tem perigo de estourar não?  E eu vou só morrer?! É melhor vocês virem para cá e deixar tudo aí. 

Eu sorri. E ela disse: - Você faz é sorrir? A verdade é que eu não sabia o que dizer. De fato estava chovendo muito. Não me recordo de um inverno com tanta chuva desde que moro em Lajeado. Ainda mais em Dezembro. E como seria Janeiro que é o mês das águas? Mas até então não havia parado para pensar na barragem. Os tais vídeos que circulavam no whatsapp ainda não tinha  chegado a mim. E como quase não saio de casa não vi a cheia do rio e nem me liguei no som da água passando pelas comportas. 

Busquei então acalma-lá. Falar que era natural as comportas abertas devido o volume de chuva. Falei também que não era novidade a cheia a baixo da usina – sendo perigoso para quem ali vive. Mas quanto a possibilidade da barragem estourar, não. De todo modo, se fosse para ela ficar nervosa, tudo bem cancelar o retorno para Lajeado. Ela, no entanto, parecia ter ficado mais tranquila e disse: - Não. Eu vou. Se for o nosso destino morrer aí, que seja. Nos despedimos e voltei a assistir a TV. Mas aquele assunto não saiu da minha cabeça. 

- Será se o rio tá tão cheio assim? Estão todas as comportas abertas 100%? De fato tem chovido muito. A pouco tinha visto que na Bahia, duas barragens tinham rompido. Mas será se são barragens do porte da daqui? Levantei, fui até o quintal para ver se ouvia o som da água passando pelas comportas. Era possível ouvir, mas me pareceu que não estava tão forte. Sorri da situação – esse povo se desespera por qualquer coisa e faz a gente entrar na onda – Voltei a fazer o que estava fazendo antes. E dormi tranquilamente. 

No dia seguinte o medo era geral em Lajeado, Miracema e Tocantinia. Os vídeos começaram a circular, áudios e notícias (falsas) alarmantes . Começara uma peregrinação até as barrancas do rio para observar a fúria das suas águas. Tudo aquilo me pareceu cômico. – não é para tanto. Fiquei pensando numas coisas loucas do tipo: como seria se na virada do ano as sirenes tocassem por acidente. Seria um caos, não?!

Mas esse medo que o povo tem da barragem tem lá a sua razão. Além das notícias falsas, durante esse ano tivemos que conviver hora e outra, com os testes da sirene de alerta. Ainda que sejam testes vai se criando uma paranóia na população. Sem falar nas placas indicando a rota de fuga e do treinamento de evacuação que ocorreu. Se Ariano Suassuna estivesse vivo e nos visitasse diria que é uma coisa por demais agourenta. 

Mais cedo eu havia saído para correr para as bandas da praia do segredo. E observando o lago me pareceu que estava no volume controlado. Mas por alguns minutos pensei na possibilidade de toda aquela água invadir a cidade. Como seria acordar com a água tomando tudo? Teria força para nadar e me salvar? Seria impossível alguém se salvar. Pensei no quanto devia ser angustiante morrer afogado. Não me parece ser uma morte muito atrativa. Me assustei com aqueles pensamentos. 

– Se a gente for pensar nisso, entra em pânico, enlouquece, vai embora da cidade. E assim, logo tratei de pensar em outras coisas. Sorrir da situação. Pensei em fazer uma provocação nos grupos do whatsapp do tipo: - pessoal não vamos confiar no que os técnicos da Ivestico (empresa responsável pela UHE) estão dizendo. Vamos todos subir para o Morro do Segredo e só vamos descer quando as águas baixarem. Em tempos de negacionismo era bem provável que me levassem a sério, não é mesmo?!

Por Pedro Ferreira Nunes – um rapaz latino americano que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in roll. 

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Enquanto isso fumo meu cachimbo e tomo mais uma dose de Conhaque


Ele é um dos milhares de tocantinenses,

que se recusa a tomar a vacina contra a COVID-19. 

Acredita que a mesma irá no espaço de 10 anos

ceifar a vida daqueles que a tomaram. 


Penso em dizer para ele:

- a morte é o nosso destino certo,

Independente de vacina.

Ela caminha ao nosso lado 

e a qualquer momento 

pode nos abraçar. 


Certamente no decorrer de 10 anos

Muitos morreram

Pois esse é o destino

De todo ser vivente

Como filosofou Chicó

No auto da Compadecida.


Mas não falo nada. 

Prefiro fumar o meu cachimbo 

e tomar uma dose de Conhaque. 


Se fosse inteligente 

Utilizaria minha fala

Para justificar 

A sua negativa 

Em tomar vacina 

A partir de outra perspectiva. 


Eu responderia:

- Pobre diabo, 

enquanto se recusa a vacinar

acreditando em teorias conspiratórias, 

não deixa de consumir

sua dose diária de veneno 

através dos alimentos contaminado 

com agrotóxico. 


Se de fato fosse inteligente evitaria come-los. 

Penso em dizer, mas para quê?  

Ele não quer ouvir. 

Que morra na ignorância. 


Dou mais uma cachimbada, 

tomo mais uma dose de Conhaque.


As vezes penso se tenho agido de forma correta

Ao não partir para o conflito

Não fazer o debate.

Mas como debater com quem não sabe ouvir?

Agir com coerência 

É  melhor do que perder tempo em discussões 

Com deficientes auditivos.


Há outros deles por aqui

Alguns mais jovens.

Esses me entristecem  mais ainda.

Outros inclusive com diploma

Do ensino superior. 

É camarada, 

Há muito analfabeto 

Com diploma de Doutor. 


Todos em comum 

O discurso arrogante.

Sentem-se a bala que matou o Che.

Quanta mediocridade, 

Quanta mediocridade.

Não precisaria de muito para ridiculariza-los

Mas para que? 

Eles fazem isso sozinho.


É melhor  fumar o meu cachimbo,

Tomar mais uma dose de Conhaque. 


Antigamente três doses de Conhaque 

Me nocateuva.

Hoje em diante nem uma garrafa me derruba.

É, quem disse que seria fácil ser professor? 

Mas tem suas alegrias.

Ao meu lado companheiros valorosos.

Juntos temos feito coisas incríveis. 


Ela foi embora,

Falta? Sinto sim.

Mas ficar lamentando 

Não é o meu perfil.

Sigo fumando o meu cachimbo 

E tomando Conhaque.


Foi um ano produtivo.

Pessimista na análise 

Otimista na ação. 

Eu sigo assim

Se alguém perguntar por mim?

Diga que continuo firme 

Juntos aos que não escolheram 

O lado fácil da História. 


Não, isto não é um poema

Ou pode ser.

Será o que você leitor 

Quiser que seja.

É incrível, 

Mas há quem lê o que escrevo.


Em breve tem mais,

Por esse ano

Deu.

Por Pedro Ferreira Nunes – Um rapaz latino americano que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in Roll.

domingo, 5 de dezembro de 2021

Relato de Experiência: Projeto Dialogicidade

"Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção."

Paulo Freire


A ideia do Projeto Dialogicidade surgiu quando estava fazendo a devolutiva do portfólio do Estudante feito pela SEDUC-TO para o início do período letivo de 2021. Percebi através daquele instrumental que era possível estabelecer um processo dialógico por meio dos Roteiros de Estudo. Sobretudo a partir da metodologia Freireana. Com isso aproveitariamos também para celebrar o Centenário de Paulo Freire.

Daí vem o nome “Dialogicidade” – o que explícita a intencionalidade do Projeto. Mas como funcionária na prática? A partir da devolutiva dos Roteiros de Estudo pelos Estudantes, eu levantava falas significativas (explicitas ou implicitas) que seriam problematizadas e aprofundadas através de temáticas relacionadas com as falas. Como o estudante tinha acesso a isso? Por meio de um podcast – com episódios quinzenais compartilhados nas Salas Virtuais e Grupos do WhatsApp das turmas do Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos – EJA Terceiro Segmento (que era o público alvo do Projeto). 

Podcast 

O Podcast (que no fundo é um programa de rádio) é a moda da vez quando falamos em mídia – você encontra todo tipo de podcast – notícias, esporte, entretenimento e inclusive educativo. Este último ganhou força sobretudo com as limitações impostas pela pandemia de Covid-19. E isso se dá tanto pela facilidade de produzir um podcast (Você só precisa de um aparelho celular – e nem precisa ser dos melhores). Como também pelo acesso, sobretudo se você utiliza meios alternativos como Google Drive e WhatsApp. Além de que você pode baixar o episódio e ouvir quando e quantas vezes quiser, sem a necessidade de uma internet tão potente.

A produção 

Não é a minha primeira experiência produzindo um podcast com fins educativos. No ano letivo de 2020 produzi o “Aufklärung” – que tinha uma perspetiva diferente do Dialogicidade. Naquela oportunidade o objetivo era trabalhar os objetos de conhecimento trabalhado nos Roteiros de Estudo.  Com  isso a temática era definida antes. Já o Dialogicidade os episódios foram surgindo no decorrer do período letivo de 2021, a partir da Devolutiva dos estudantes. De todo modo, a experiência com o “Aufklärung”, foi um aprendizado para que eu produzisse melhor, creio, o Dialogicidade.

A partir da experiência produzindo Podcast o que posso dizer é que a dificuldade não é o acesso e domínio das ferramentas necessárias para sua produção.  O que não falta são aplicativos e plataformas que nos auxilia nessa tarefa. A dificuldade é ter conteúdo para alimentar o projeto. Para tanto é necessário dedicar um tempo para estudo, pesquisa, organizar um cronograma e ter um planejamento de execução das ações necessárias. Além de pensar como tornar os episódios mais atrativos – como introduzir músicas durante a fala, para não ficar algo massante (ouvir outros podcast para se inspirar na criação do seu, é uma boa dica). Enfim, é algo que requer tempo, organização e planejamento. 

Os episódios 

Com o Projeto Dialogicidade foram 12 episódios produzidos ao longo do período letivo de 2021 – que iniciou em Maio. 

  • Primeiro Episódio: Os quatro pilares da Educação – este foi o nosso ponto de partida. Também aproveitamos para apresentar o projeto e falar do seu objetivo, além da homenagem ao Paulo Freire. Aprender a ser, Aprender a conviver, Aprender a conhecer e Aprender a fazer – qual a importância desses pilares na nossa formação? Por que devemos conhecê-los? Foram questões que buscamos refletir;
  • Segundo episódio: Um olhar para pandemia de Covid-19 a partir da Arte, da Filosofia e da História (Ciências) – entender a perspectiva das diferentes áreas do conhecimento é importante para compreender como cada uma dessas áreas abordam determinados problemas. Trouxemos como exemplo a pandemia de Covid-19, por ser algo vivenviado por todos nos, e que portanto, facilita o etendimento;
  • Terceiro episódio: Pandemia, Ansiedade e desempenho escolar – refletir como a pandemia acelerou um problema que já existia antes – ansiedade. E como essa tem interferido no desempenho escolar, foi o nosso desafio. Buscamos mostrar que com alguns hábitos é possível controlar a ansiedade e a partir daí conseguir melhorar tanto na Escola como em outras áreas da vida social;
  • Quarto episódio: Educação e Biossegurança – aqui buscamos refletir sobre a importância da Educação na necessária mudança de hábito no espaço escolar quanto aos cuidados com a Biossegurança. Mas o que é a biossegurança? Quando surgiu esse conceito? Qual a sua importância? A partir de exemplos relacionados com o que estamos vivendo, buscamos responder essas questões; 
  • Quinto episódio: Bioética e Meio Ambiente – entender que a relação que estabelecemos com o Meio Ambiente interfere na nossa qualidade de vida foi o nosso objetivo nesse episódio. O nosso ponto de partida foi compreender o que é o Meio Ambiente, salientando que a nossa relação com ele se dá a partir dessa compreensão. Em seguida trabalhamos o conceitos de bioética; 
  • Sexto episódio: A relação entre a leitura,  escrita e Saúde Mental – Como a leitura e a escrita pode contribuir para controlarmos a ansiedade e evitar uma depressão? Eis ai o que buscamos responder nesse episódio. Para tanto trabalhamos o Diário de Anne Franck – uma obra que nos ajuda na reflexão proposta. Antes buscamos também trabalhar a compreensão acerca da diferença entre ansiedade e depressão;
  • Sétimo episódio: Educação como prática da liberdade – que educação é essa? Qual a sua importância? Por que devemos lutar para que essa perspetiva educacional possa de fato ser trabalhada? Foram questões que buscamos trabalhar. E ninguém melhor do que Paulo Freire para nos ajudar a responde-las. Com esse episódio buscamos enfatizar tanto a importância de Paulo Freire para educação como o fato de que construir uma educação como prática da liberdade é tarefa de todos que nela acredita;
  • Oitavo episódio: Arte Popular Tocantinense – Rica e diversa. Essa é a característica da Arte Popular feita no Tocantins. Com uma forte influência da cultura Indígena e Negra,  é uma arte engajada na luta pela construção da identidade Cultural do Tocantins. Buscamos ressaltar que para compreender a Arte Popular Tocantinense é necessário entender a característica multicultural do Tocantins, mesmo antes da sua criação em 1988;
  • Nono episódio: Leitura e Produção de Texto: Níveis de leitura –Entendendo a importância da leitura. E observando, pela Devolutiva das atividades, que a sua prática é bastante deficitária pelos Estudantes. Propomos abordar essa temática da Leitura e Produção de Texto em três episódios. Aqui focamos na importância da leitura e falamos dos seus três níveis: leitura exploratória, leitura analítica e leitura crítica. Ora, se se pretende escrever bem é preciso ler muito;
  • Décimo episódio: Leitura e Produção de Texto: Interpretação – continuando com a temática do episódio anterior, mas agora focando na interpretação. Antes demos uma recapitulada no que vimos sobre os níveis de leitura e em seguida entramos na questão da interpretação. Aqui ressaltamos a ideia de círculo hermenêutico – isto é para compreender um texto como um todo, preciso compreender as partes. E vice-versa. Saber por quem e em qual contexto foi escrito é outro aspecto importante;
  • Décimo primeiro episódio: Leitura e Produção de Texto: Como organizar as ideias – fechando os episódios dedicados a essa temática, trabalhamos a questão da escrita propriamente. Para tanto mostramos como organizar as ideias a partir da escrita. Como construir uma introdução, um desenvolvimento e uma conclusão. Diferentes tipos de textos, citações entre outras questões; 
  • Décimo segundo episódio: Projeto de Vida: para quê? – para finalizar o Projeto Dialogicidade retornamos ao início – ao portfólio do Estudante onde propomos uma reflexão acerca do período letivo de 2021. O que tínhamos projetado conseguimos alcançar? Quais os aspectos positivos? Quais os aspectos negativos. No que avançamos? No que precisamos melhorar? Todas essas questões sendo dirigidas para uma reflexão maior acerca do Projeto de Vida. 

Algumas considerações 

O objetivo de aprofundar, a partir de uma perspetiva crítica, questões surgidas nas aulas de Arte, Filosofia e História – nas turmas do Ensino Médio e EJA – Terceiro Segmento. Foi alcançado. Utilizando a metodologia Freireana que tem o diálogo como fator central, conseguimos problematizar questões importantes que contribua na formação de Cidadãos Críticos. 

Do ponto de vista dos estudantes considero que não houve um grande engajamento. O que já era esperado tendo em vista que o perfil dos nossos educandos não é muito de exercitar o pensamento crítico. E nisso temos a nossa cota de responsabilidade. Poderiamos colocar a falta de engajamento na tecnologia, no entanto creio que esse não foi um grande limitador já que a grande maioria possuí aparelho celular e acesso a internet, mesmo que limitada. Por tanto creio que o motivo de não ter havido um maior engajamento foi por fatores culturais. 

Diante desse contexto, o Projeto Dialogicidade, mostrou-se mais válido ainda, por estimular o exercício do pensamento crítico. E com isso contribuindo para que essa cultura da preguiça de pensar criticamente possa ser modificada. Outro ponto importante do Projeto foi mostrar que uma escola pública periférica tem sim condição de produzir conhecimento, a partir da sua realidade, e não só reproduzir o que tentam nos enfiar goela-abaixo. 

Por Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente atua como Professor da Educação Básica no CENSP-LAJEADO. 

terça-feira, 30 de novembro de 2021

Algumas ideias sobre o pensamento de Nietzsche a partir do prólogo do Zaratustra

De que adianta o saber se não passarmos ele adiante? De que vale o conhecimento se ele não pode ser compartilhado? Com quem e por que compartilhar esse conhecimento? Esse nos parece ser o problema central do prólogo de Zaratustra. E ao abordar estes problemas ele bate de frente com duas grandes correntes do pensamento ocidental – o grego, mais precisamente de matriz platônica e o cristianismo. Podemos perceber esse fato quando Zaratustra decide abandonar a caverna e não voltar, mas sim descer o vale – é claramente uma alusão ao mito da caverna de Platão. Pelo caminho ele encontra com um santo que o desaconselha a viver com os homens e dedicar sua vida a Deus. Zaratustra então afirma: Será possível que esse santo ancião ainda não ouvisse no seu bosque que Deus já morreu? Ainda no diálogo com o santo percebemos uma critica a moral cristã. Por exemplo, quando Zaratustra afirma que não dá esmolas pelo fato de não ser tão pobre. Diante disso podemos afirmar que Zaratustra buscará construir um novo caminho – um caminho que rompa tanto com o pensamento cristão como com o pensamento de Platão.

E ao chegar à cidade, como um pregador solitário no meio da multidão, Zaratustra começa a proclamar suas verdades. Ele então anuncia o super-homem. E o que seria o super-homem? Um estágio superior do homem. Para Zaratustra a forma homem deve ser superada, pois se não corremos o risco de nos tornamos animais novamente. É de certa forma a defesa da tese evolucionista de Charles Darwin. Por exemplo, quando Zaratustra afirma: Percorrestes o caminho que medeia do verme ao homem... Está de certa forma corroborando com a concepção darwiniana da evolução das espécies. Logo podemos afirmar que Zaratustra passa a assumir um discurso cientifico se contrapondo a visão cristã. Por exemplo, quando afirma: Exorto-vos, meus irmãos, a permanecer fiéis à terra e a não acreditar naqueles que vos falam de esperanças supra-terrestres. Com isso percebemos claramente uma aproximação com o pensamento de Spinoza – só existe uma substância, e tudo é guiado pela razão. Aliás, percebemos que Zaratustra defende a razão como o caminho para alcançarmos o super-homem.

Essa aproximação com o pensamento de Spinoza fica mais claro quando Zaratustra fala de Deus e da Terra, da alma e do corpo. Ele tal como Spinoza critica essa visão dualista. É dessa dualidade que advém nossa fraqueza. Zaratustra criticará fortemente o fato de agirmos não pelo nosso próprio bem, mas sim em clamor do céu. Ou pelo menos agimos a partir dessa crença. Para Zaratustra não agimos assim por que pecamos, mas por parcimônia – é a nossa mesquinhez característica. Ele defende a necessidade de se superar esse comportamento e só o super-homem pode supera-lo. E o que vem em seguida? O que vem em seguida é uma enxurrada de criticas. Zaratustra não poupa ninguém – Da filosofia antiga á filosofia moderna, é obvio, passando pela filosofia cristã. Ele então faz uma ode ao racionalismo e ao materialismo. E não tem como novamente fazer um paralelo com o pensamento de Spinoza, por exemplo, quando Zaratustra diz: o grande do homem é ele ser uma ponte, e não uma meta: o que se pode amar no homem é ele ser uma passagem e um acabamento. Mas ao mesmo tempo em que se aproxima de Spinoza, ele também afasta, como por exemplo, quando fala: amo o que tem o espírito e o coração livres, porque assim a sua cabeça apenas serve de entranhas ao seu coração, mas o seu coração, o leva a sucumbir.

Além de uma critica ferrenha ao cristianismo e a Platão, percebemos fortemente uma critica de Nietzsche através do seu Zaratustra ao pensamento dominante de sua época. Por exemplo, ao positivismo e ao socialismo cientifico que polarizavam o debate de ideias no século XIX. Zaratustra exalta o individuo e não o social. Seguindo uma linha contrária a Conte, Durkheim, Marx e Engels. Para se chegar ao super-homem o homem tem que se superar. Não é o desenvolvimento da sociedade que trará o super-homem. Seguindo essa linha ele não só critica a dita civilização como o homem fruto dessa civilização. Ai fica mais claro a critica ao positivismo. Zaratustra afirma que esse modelo esta fadado ao fracasso, por isso afirma: eu vo-lo digo: é preciso ter um caos dentro de si... E continuando sua critica tanto ao positivismo como aos revolucionários questiona: Trabalha-se ainda porque o trabalho é uma distração; mas faz-se de modo que a distração não debilite. Já uma pessoa se não torna nem pobre nem rica; são duas coisa demasiado difíceis. Quem quererá ainda governar? Quem quererá ainda obedecer? São duas coisas demasiado custosas. No entanto, ao contrário do que esperava Zaratustra, o seu super-homem não tinha espaço naquele contexto, talvez quem sabe no futuro? E não foi sem tristeza que ele percebeu tal fato.

E agora o que fazer? Continuar a trilhar aquele caminho ou construir um novo? Voltar para caverna? Se isolar no bosque longe dos homens e servindo a Deus? Abrir mão do super-homem? Ao contrário de Sócrates, Zaratustra preferiu a prudência. Resolveu não continuar no meio dos homens, não era aos homens que deveria falar e nem muito menos aos mortos. O morto ali, poderíamos afirmar que simboliza todos os filósofos mortos – Cristo, Platão, Kant entre outros. Para Zaratustra o super-homem devia ser apresentado a um grupo restrito, um grupo de criadores, estes teriam a tarefa na mão de levar adiante a bandeira do super-homem. Zaratustra percebeu que o caminho era mais longo – que as suas ideias não era para o homem do século XIX – mas para os séculos vindouros. No entanto era preciso o quanto antes começar a construir as bases para que o seu pensamento ressoasse no futuro.

Por fim podemos concluir que nesse prólogo de Zaratustra percebemos uma declaração de guerra de Nietzsche contra tudo e todos. Tanto ao pensamento da sua época como ao pensamento clássico. Por outro lado não deixou de beber e ser influenciado por esse pensamento. Outra marca de Nietzsche é a contradição, é dizer e desdizer, é negar e desnegar. Isso fica claro, quando ao mesmo tempo em que critica o pensamento de Platão e o cristianismo – acaba reproduzindo muito das ideias e das concepções destas correntes do pensamento ocidental. Por exemplo, no inicio do prólogo Zaratustra busca um caminho diferente de Platão, no seu mito da caverna e de Cristo que deixa os homens para viver no bosque contemplando Deus. Ao final Zaratustra faz o mesmo movimento retorna ao bosque e decide se afastar dos homens e conviver entre criadores. Com isso o que faz é uma síntese do pensamento de Platão e Cristo. Logo, continua dialogando, ao contrario do que diz, com defuntos.

Por Pedro Ferreira Nunes - Educador Popular e Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atualmente atua como Professor da Educação Básica no CENSP-Lajeado.