Cena da série 2° Chamada |
Essa situação é ainda mais crítica quando pensamos no público da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Pois estamos falando de pessoas que por algum motivo não conseguiram concluir a educação básica na idade adequada e perderam o vínculo com o ambiente escolar. Família e trabalho também são fatores que pesa, pois a necessidade de sobrevivência se sobrepõem aos estudos. Desse modo as ações de acesso e permanência para esse público deve ser pensadas a partir da sua especificidade.
Para compreender um pouco melhor a realidade da EJA, a série 2° chamada produzida pela Rede Globo de Televisão, dá uma boa idéia. Ainda que a realidade retratada é bem específica. Ou seja, a periferia de uma grande metrópole. No entanto, os afetos que circulam naquele ambiente são os mesmos que circulam em qualquer sala de EJA (seja numa grande cidade ou no interior), a saber, a esperança e o medo.
Para Espinoza não existe esperança sem medo e nem medo sem esperança. Pois estamos falando de dois afetos ligados a incerteza. Nós não temos certeza do que aquilo que esperamos aconteça, daí vem o medo. Por outro lado não temos certeza de que não possa acontecer daí vem a esperança.
O estudante da EJA transita entre a esperança e o medo, buscando uma segunda chance para realizar um caminho interrompido no passado. A escola é essa segunda chance, pois através dela se pode vislumbrar uma mudança de vida. Para tanto é preciso perserverar. Enfrentar dia a dia todo o tipo de obstáculos que aparece no caminho. São poucos os que conseguem vencer esses obstáculos, sobretudo por que não encontram apoio. Pelo contrário. Há mais desestímulo do estímulo.
Busca Ativa Escolar
Uma política criada para enfrentar a questão da evasão é o programa da busca ativa escolar – que teve suas ações intensificadas sobretudo durante e no pós-pandemia de COVID-19, onde se observa um aumento significativo do número de crianças, jovens e adultos fora da escola.
Na modalidade EJA essa situação tem um complicador maior por que o estudante (maior de idade) não é obrigado a se matricular. E no contexto de crise que vivemos muitos optam pelo trabalho. Ainda que essa oposição entre trabalhar ou estudar seja falsa. A busca deve ser conciliar os dois, por mais difícil que isso seja, sobretudo para alguns chefes de família. Para isso que a grade curricular da EJA é organizada de forma diferente do Ensino regular. Justamente por compreender que o estudante da EJA tem um perfil diferente do estudante das turmas regulares.
EJA em Lajeado
Se no geral a Educação de Jovens e Adultos (EJA) econtra-se numa situação preocupante. Na cidade de Lajeado o problema se agrava. Atualmente temos apenas uma turma ativa, no Colégio Estadual Nossa Senhora da Providência (CENSP Lajeado), de estudantes concluintes. Com isso a perspectiva é não haver turmas ativas na cidade. A questão mais grave é em relação aos 1° e 2° períodos (estudantes de ensino fundamental), que deveriam ser atendidos pela Rede Municipal da Educação. Ora, sem turmas dos 1° e 2° Segmentos, obviamente o número de matrículas no 3° Segmento diminuirá ao ponto de não haver mais matriculas. E é justamente o que está acontecendo.
Atualmente fala-se muito em busca ativa escolar em Lajeado, mas efetivamente o que tem sido feito? Sobretudo para esse público que não conseguiu concluir a educação básica na idade certa. Ou seja, o público da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Uma coisa é fato, há pessoas na cidade nessa situação. Por que elas não estão sendo buscadas? Por que o direito a educação dessas pessoas não estão sendo garantido?
Será uma perda muito grande para cidade do Lajeado não ter oferta de turmas da EJA de 1°, 2° e 3° Segmento. Se com a existência dessas turmas já é difícil. Sem turmas estaremos afastando mais ainda essas pessoas da escola. Pois dificilmente terão condição de frequentar as turmas regulares ou se deslocar para outro município.
Ferreira, Oliveira e Silva (2015) ao analisar a gestão e qualidade na educação municipal, chama atenção para dificuldade que as pequenas cidades tem de ofertar uma educação básica de qualidade devido a falta de recursos financeiros para garantia das condições de oferta de ensino-aprendizagem. Além disso apontam como complicador a falta de recursos humanos com formação e experiência na área.
Nos parece que, apesar de ser um município pequeno, não é essa a situação do Lajeado. Desse modo o problema está mais para uma questão de gestão.
Ainda de acordo com esses autores (2015), quando se fala em qualidade da educação percebe-se a disputa entre duas visões distintas. A primeira construída a partir de uma perspectiva empresarial e econômica da educação. Já a outra, na qual nos inserimos, parte da visão da educação como um direito social.
A primeira está preocupada com índices e formação de mão de obra para o mercado de trabalho. Já a outra tem como finalidade a formação para cidadania crítica e para emancipação social. Para tanto se faz necessário “a ampliação do direito à educação por meio do alargamento de sua obrigatoriedade, gratuidade, laicidade, escola de tempo integral, gestão democrática, formação e valorização dos profissionais da educação e custo-aluno-qualidade, que implica na definição de adequadas condições para o acesso, permanência e qualidade social da educação pública” (2015, p. 64). Ou seja, requer ações efetivas mais do que discursos vazios, deslocados da realidade.
Atuando como docente na Educação de Jovens e Adultos (EJA) em Lajeado há pouco mais de três anos. Percebemos a importância dessa modalidade de ensino na garantia do direito a educação a pessoas que há muito tempo tinha deixado a escola e tiveram a oportunidade de concluir a educação básica e a partir daí vislumbrar uma mudança de vida. Não nos falta exemplos, inclusive de pessoas que depois de muitos anos conseguiram concluir o ensino médio e partiram para um curso técnico ou superior. Imagine tantos outros que estaremos negando essa oportunidade se permitirmos que não aja mais salas ativas de Educação de Jovens e Adultos (EJA) em Lajeado.
Desse modo, mais do que uma crítica, esperamos com essas linhas sensibilizar tanto as autoridades públicas municipais da cidade do Lajeado como a comunidade em geral para a importância de nos mobilizarmos para evitar que isso ocorra.
Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular, Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. E Professor da Educação Básica no CENSP Lajeado.