terça-feira, 30 de abril de 2024

Comentários sobre o ato do SINTET na semana em defesa e promoção da educação pública em Palmas

Quando vi o horário e o local da convocação do ato organizado pelo SINTET, realizado no dia 26 de abril, dentro da programação da 25° semana nacional em defesa e promoção da educação pública. Confesso que fiquei um pouco sem entender. Sobretudo por que eu esperava um outro tipo de manifestação. A minha verve subversiva de outros tempos vislumbrava uma marcha até um órgão público – quem sabe uma ocupaçãozinha simbólica ou pelo menos parar o trânsito – chamar atenção da opinião pública. 

O estranhamento não foi só meu. Numa conversa com um colega ele disse que também não tinha entendido. Mas já tínhamos nos articulado e conseguido aderir a paralização. Ou seja, independente de como seria estaríamos no ato. E Inclusive comentei com ele que o fato de conseguirmos nos articular para que não houvesse aula no dia já era de um grande simbolismo.

Talvez tenha sido daí que veio uma certa decepção nossa com o movimento. Os professores da nossa escola aderiram praticamente de forma unânime a paralisação. Garantindo a direção da escola que não haverá prejuízo a comunidade escolar quanto aos dias letivos determinados em lei. O problema é que temos a visão só da nossa escola. Já os camaradas que estão na direção do Sindicato conseguem ter um olhar abrangente. E a partir desse olhar fizeram uma leitura de que era o que podia ser feito no contexto atual.

O ato em si, dialogando com uma colega, foi voltado mais para dentro. – a ideia aqui é apresentar o sindicato. Foi a leitura dela com a qual concordei. Os discursos no microfone giraram em torno do óbvio. Ou seja, de falar o que todos sabem. Mas não condenamos a estratégia dos camaradas da direção do Sindicato. Pois eles tem razão de que é preciso fortalecer a base – fazendo trabalho de base – para que o sindicato tenha condições de fazer um enfrentamento maior. 

Não é uma tarefa fácil no contexto de polarização política que vivemos. Marcado pela persistência de uma narrativa de criminalização do movimento sindical e uma crença na utopia liberal.

Não tenhamos ilusão camaradas. Nenhuma conquista do povo trabalhador cai do céu. É necessário muita luta para que nossos direitos sejam garantidos. E essa luta é coletiva. E sendo uma luta coletiva precisamos de um instrumento que articula e organiza a categoria. E esse instrumento é o sindicato. No nosso caso, o SINTET. Por tanto precisamos fortalecer esse instrumento fazendo parte dele.

E fazer parte é inclusive lutar por mudanças na sua direção e linha política. Sobretudo no que se refere a direção estadual e algumas regionais. Por outro lado é preciso reconhecer o trabalho da regional de Palmas com um grupo bem combativo.

Um exemplo da linha combativa dessa regional é as conquistas para os profissionais da rede Municipal da educação de Palmas. Todo mundo fala da diferença salarial entre Estado e Município na Capital, mas esquecem de falar que essa conquista é fruto da luta coletiva dos trabalhadores da educação da rede municipal organizados e liderados pelo SINTET.

Enfim, de todo modo o ato aconteceu. Se não foi o que esperávamos, pelo menos foi um momento prazeroso de reencontrar velhos camaradas e enxergar possibilidades. Digo isso sobretudo pelo discurso de dois professores recém-empossados no concurso da rede estadual da educação – uma paraense e um pernambucano – que ressaltaram a necessidade da luta coletiva. E para melhorar, o diário oficial daquele dia trouxe o anúncio da banca do concurso da educação da rede municipal de Palmas e os respectivos números de vagas que serão ofertados.

Pedro Ferreira Nunes – Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atua como Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Ensino do Tocantins. 

quinta-feira, 25 de abril de 2024

Crônicas aurenianas – sobre relacionamentos

“Se a gente já não sabe mais,
rir um do outro, meu bem
Então o que resta é chorar e, talvez
Se tem que durar
Vem renascido o amor
Bento de lágrimas...”.

Los Hermanos



Não raramente vejo situações que me lembram que está sozinho é a melhor escolha possível. E honestamente não sinto nenhuma necessidade de estar com alguém. Olha que já não sou tão jovem. Estou mais próximo dos 40 do que dos 30. Apesar da minha aparência de 22 – segundo alguns dos meus alunos, rs.

A situação que me motivou a escrever essas linhas ocorreu esses dias quando estava fazendo um planejamento e não pude deixar de ouvir a conversa entre minha vizinha de kit net com sua mãe a respeito do seu namorido. Ela estava acabando com o pobre diabo. E a forma que ela dizia trata-lo me pareceu um relacionamento abusivo por parte dela. – não aceito que fume e que beba na minha casa. E ela fez uma ênfase bem  grande na frase “minha casa”. Não aceito isso. Não aceito aquilo. Não quero isso, não quero aquilo.

Não pude deixar de pensar comigo. Oh mulherzinha. Já mais me relacionaria com um tipo desses. Pois se tem uma coisa que não aceito de forma alguma é alguém que acha que pode dizer o que tenho que fazer – onde e quando. Nem mesmo meus pais, sobretudo minha mãe – que foi com quem mais convivi, descobriram ainda na minha adolescência que eu era uma espécie de um espírito livre. Ou seja, que teriam que respeitar as minhas escolhas, ainda que essas nem sempre fossem as melhores.

Enquanto a conversa continuava me deu vontade de fumar um palheiro. E assim fiz. Eles provavelmente perceberam. Lembrei da cerveja na geladeira. Só não abri uma naquele momento por que estava tomando tereré. Mas ela provavelmente sabia que eu bebia umas, por que toda noite pelos menos umas três vão pro saco.

Outra aspecto que observei na criatura é que ela acredita em misticismo. Pensei comigo, tão jovem e tão alienada. Só falta ser bolsonarista. Coisa que não é muito raro por essas bandas da capital.

– Mãe, ele anda carregado. Mas também os lugares que ele frequenta. As amizades. Vive dizendo que não tem dinheiro. Mas chama ele para ir pro buteco beber para ver se ele não dá um jeito.

Lembrei de uma canção da banda Saco de Ratos: “Ela me propôs não ter amigo chato. Isso é quase impossível, vai pra casa do caralho...”. Oh meu caro, aguentar uma mulher daqueles tem que ser alcoolizado mesmo.

Assumidamente barraqueira, o tom de voz dela não me agradou nem um pouco. Se numa conversa aparentemente normal ela falava quase gritando. Imagina numa discussão. Se tem uma coisa que me incomoda por demais num relacionamento é a incapacidade das pessoas em conversar, como diz Rubens Alves, mansamente.

Não acredito num relacionamento em que um tenha que fazer a vontade do outro. Isso vale tanto para o homem quanto para mulher. Compreendo que as vezes precisamos ceder. Mas quando isso é apenas de uma parte vira escravidão. Outro fator importante é o diálogo. Ora se a pessoa com quem você está, está agindo de uma forma que lhe incomoda só há duas possibilidades,  pelo menos na minha visão. Conversar para tentar resolver ou terminar. Pois afinal de contas ninguém precisa ficar se torturando num relacionamento abusivo.

O que vai resolver você ficar falando para terceiros um problema que é seu com o seu parceiro? 

A minha vizinha aparentemente não tem  mais que 20 anos. Espero que a vida lhe ensine. Quem sabe o que ela não passou na infância para ter se tornado aquele tipo de pessoa. Não julgo. Mas quero distante de mim. Por enquanto estou muito bem sozinho.

Pedro Ferreira Nunes –  É apenas um rapaz latino americano, que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in roll. 

sábado, 20 de abril de 2024

Origem da Comunidade e o Papel de Dona Aureny Siqueira Campos

A aula teve início com o nosso questionamento aos estudantes acerca de quem teria sido Aureny - a mulher que dava nome a quatro bairros que compunham aquela região. Ninguém sabia. Seria pelo fato de serem jovens que nasceram já há um bom tempo da criação dos bairros? Pela falta de interesse pela história local? Ou seria reflexo da importância que se dá a figura feminina na nossa sociedade? Desafiei-os a conversar com pessoas mais velhas do bairro para ver se sabiam ou quem sabe até conheceram aquela figura e por que havia sido escolhido para dar nome a quatro bairros (Areny I, II, III e IV). 

Salvo algumas exceções, o resultado foi decepcionante. Novamente seria falta de interesse ou apagamento histórico do papel feminino? O fato é que quando pesquisamos acerca dessa figura na internet só aparece a notícia do seu falecimento com 96 anos em Brasília, em 2020. Quando ligamos Dona Aureny ao sobrenome Siqueira Campos, a coisa mudou de figura. Os estudantes logo ligaram ela ao histórico político tocantinense, responsável pela elaboração da emenda que criou o Estado do Tocantins e que o governou por vários mandatos. De modo que logo deduziram que era uma homenagem à mulher de um político. 

Mas não é isso que dizem alguns relatos, inclusive trazido pelos estudantes, de que a homenagem partiu das próprias pessoas que iniciaram os loteamentos que deu início aos bairros, e teve na figura de Dona Aureny um apoio solidário fundamental. Ou seja, a homenagem não foi de cima para baixo, mas de baixo para cima. Um reconhecimento da comunidade a sua contribuição às famílias que ali chegavam, na sua grande maioria vindo de Estados do Nordeste (Maranhão, Piauí, Bahia), pudessem sobreviver num lugar afastado do plano diretor e sem nenhuma infraestrutura por parte do Estado. 

Mas o fato é que essa região prosperou e tornou-se um dos territórios mais populares da capital. Nas entrevistas realizadas pelos estudantes há esse reconhecimento. Todos falam do carinho pelo lugar, mas não deixam de apontar os problemas como por exemplo a criminalidade e insegurança. As entrevistas também mostram pessoas de diversas origens, que chegaram aqui já depois dos anos 2000. Ou seja, já chegaram num lugar um pouco mais desenvolvido do que aquele encontrado pelos pioneiros. 

Enfim, acredito que conseguimos alcançar o objetivo da atividade proposta. Refletimos sobre a origem da comunidade - que está ligada à origem da capital do Tocantins (Palmas). Digamos que é o berço daqueles que não tinham condições de se estabelecer no plano piloto. A peãozada, os retirantes - que vinham dos interiores em busca de uma vida melhor. E que encontraram numa figura feminina o apoio para que superassem os momentos mais difíceis - que todos aqueles que se dispõem a ser pioneiros passam. Sua condição privilegiada como mulher de um político de nome como José Wilson Siqueira Campos e mãe de uma figura não menos relevante como Eduardo Siqueira Campos. Certamente lhe abria portas para que fizesse esse trabalho. E a partir daí construísse o seu próprio legado. Não ficando na sombra das figuras masculinas da família.

Pedro Ferreira Nunes, in Revista A mulher, a comunidade local e a luta por igualdade de gênero. Cemil Santa Rita de Cássia, 2024.

segunda-feira, 15 de abril de 2024

Revista: A mulher, a comunidade local e a luta por igualdade de gênero

Nos últimos anos o calendário escolar da rede estadual de educação do Tocantins tem indicado a realização da semana de combate a violência contra a mulher, na semana em que é celebrado o dia internacional da mulher (8 de março). Com isso observamos uma orientação de que o 8 de março não pode ser reduzido à homenagem às mulheres com flores e bombons, mas também como um momento de reflexão e discussão sobre a condição feminina na sociedade.

É nesse contexto que se insere esse projeto, que buscou trazer a discussão para o território em que a escola está inserida - território que inclusive é formado por alguns bairros batizados com nomes de mulheres. Até que ponto a comunidade conhece quem foram essas mulheres? Por que elas foram homenageadas dando nomes a bairros? Quem fez essa homenagem? Esse foi apenas o ponto de partida para discutirmos outras questões como violência e igualdade de gênero. 

Pelo discurso de alguns estudantes, a importância dessa discussão no ambiente escolar é mais do que justificável. Discurso que reproduz a violência e o machismo estrutural da nossa sociedade. Discursos que inclusive vão contra os direitos humanos. Por outro lado percebemos a sensibilidade daqueles que reconhecem o problema e percebem a necessidade de uma mudança de paradigma. Em consonância com o que propõe a Organização das Nações Unidas (ONU) nos seus desafios para o desenvolvimento sustentável, que entre eles está a igualdade de gênero.

Para que isso se efetive acreditamos que a educação cumpre um papel importante. Sobretudo contribuindo com a construção de uma cultura de respeito e reconhecimento dos direitos do outro. 

Enfim. O material que segue nesta publicação foi elaborado pelos estudantes e mostra um pouco da nossa estratégia pedagógica para trabalhar a temática. Foram muitas atividades, mas tivemos que optar por aquelas, que na nossa visão, tiveram uma melhor elaboração. Como o desenho da capa feito pelas estudantes da 1ª série do Ensino Médio (13.06) - Mariahthe, Anny e Millena. 

Baixe a versão digital da Revista acessando o link:https://drive.google.com/file/d/1auiJUwMZCksBMPdseVs2lurC3YyXwhRK/view?usp=sharing

Pedro Ferreira Nunes - Professor da Educação Básica no CEMIL Santa Rita de Cássia.

quarta-feira, 10 de abril de 2024

Sobre os afetos e a importância da sua compreensão

O que faz com que os indivíduos ajam de uma determinada forma, em situações e contextos determinados? Eis um problema que diversos pensadores buscaram responder ao longo da história. A partir dessas reflexões uma questão chama atenção: O poder dos afetos – uma questão que se tornou um ponto central nas diferentes teorias no campo da ética. 

Antes de falarmos do poder dos afetos, precisamos defini-los. Salientando que em Filosofia nem sempre há uma única compreensão de determinados conceitos. Desse modo optaremos de início pela definição dada pelo filósofo holandês Baruch Espinoza, que compreende afetos como (2014, p. 38) “afecções do corpo que aumentam ou diminuem, ajudam ou limitam, a potência de agir deste corpo e ao mesmo tempo as ideias destas afecções”.

A partir dessa definição percebemos que existem afetos que nos fazem bem, e outros que nos fazem o contrário. Desse modo devemos agir buscando conservar os afetos que aumentam ou ajudam a nossa potência de agir e destruir aqueles que limitam ou diminuem a nossa potência de agir. Que afetos seriam esses? 

De acordo com o nosso filósofo existem três afetos primários, a saber: Alegria, Tristeza e Desejo. Sendo que é a partir deles que se originam os demais, como por exemplo, o amor, o ódio, a esperança, o medo entre outros. 

As afecções que derivam da tristeza seriam aquelas que diminuem ou limitam a nossa potência de agir, já as que se originam da alegria ajudam ou aumentam a nossa potência de agir. E as afecções originadas do desejo também são da mesma natureza, por exemplo, a audácia é apontada pelo nosso filósofo como (2014, p. 68) “o desejo que leva alguém a fazer algo correndo um perigo que seus iguais teriam medo de suportar”. O contrário da covardia, “que se diz de alguém cujo desejo é limitado pelo temor de um perigo que seus iguais ousam suportar”. Desse modo percebemos que o primeiro seria um desejo que ajuda ou aumenta a nossa potência de agir, e a covardia seria o contrário. 

É importante ressaltar que para Espinoza mente e corpo não são substâncias separadas. Pelo contrário, pois segundo o nosso filósofo (2014, p. 41) “a primeira coisa que constitui a essência da mente é a ideia de um corpo existente em ato”. Desse modo mente e corpo são unos. Uma compreensão que o afastará não só do racionalismo do filósofo francês Descartes, como também da ética cristã - que defendiam uma visão dualista em que mente e corpo eram substâncias separadas, sendo que a mente deveria comandar o corpo. Chamamos atenção para esse ponto pelo fato de que a compreensão que o nosso filósofo tem acerca de determinados afetos, é diferente da compreensão que a cultura ocidental, fortemente influenciada pelo cristianismo, tem. Um exemplo é a respeito da Esperança, que veremos mais à frente.

Antes de Baruch Espinoza, Aristóteles no período clássico, também buscou compreender os afetos e apresentou uma definição dos mesmos. Para o filósofo grego afetos são sentimentos acompanhados de prazer ou dor. Logo podem provocar bons ou maus encontros.

Aparentemente pode se pensar que a compreensão acerca dos afetos Aristotélica vai na mesma linha da Espinozana. Mas não é bem assim. Para Aristóteles a classificação de uma paixão entre boa ou má não se dá a priori como em Espinoza. Mas sim a partir dá forma que a sentimos. O que significa dizer que o problema não é o afeto, mas o modo como somos afetados. Por exemplo, em relação a cólera, para Aristóteles (1991, p. 33) seria considerado mal “se a sentimos de modo violento ou demasiado fraco, e boa se a sentimos moderadamente”.

Um aspecto importante na compreensão do Aristóteles acerca dos afetos é que estes fariam parte da nossa natureza. E sendo parte da nossa natureza não tem como nega-los. Pois (1991, p. 34) “sentimos cólera e medo sem nenhuma escolha da nossa parte”. Mas se não temos esse poder de escolher se seremos afetados ou não, e por quais afetos, temos condição de modera-los. E é nesse ponto que tanto a perspectiva Ética de Aristóteles como do Baruch Espinoza entra em concordância, isto é, ambos defendem que é possível moderar – agindo racionalmente – as afecções. Aristóteles dirá (1991, p. 36),


Tanto o medo como a confiança, o apetite, a ira, a compaixão, e em geral o prazer e a dor, podem ser sentidos em excesso ou em grau insuficiente; e, num caso como no outro, isso é um mal. Mas senti-los na ocasião apropriada, com referência aos objetos apropriados, para com as pessoas apropriadas, pelo motivo e da maneira conveniente, nisso consiste o meio-termo e a excelência característica da virtude (ARISTÓTELES, 1991, p. 36).


Baruch Espinoza por sua vez salienta que sem conhecer a origem e natureza dos afetos será impossível agir de forma racional. Para o filósofo holandês antes de jugarmos as ações dos homens a partir das suas afecções, devemos sim buscar compreendê-los. 


Nada há que possa ser atribuído a um vício da natureza, pois a natureza é sempre a mesma e sua virtude e potência de agir são sempre em qualquer lugar as mesmas, isto é, as leis e regras da natureza, segundo as quais tudo acontece e passa de uma forma a outra, são as mesmas sempre e em qualquer lugar (ESPINOZA, 2014, p. 38).  


A partir da análise do que Aristóteles e Baruch Espinoza falam sobre os afetos podemos fazer algumas conclusões: Primeiro, que estamos falando de algo que faz parte da natureza. E como parte da natureza que somos não podemos escolher ser afetados ou não por eles. Segundo, o modo como somos afetados pelos afetos determinam as nossas ações. Isto é, se serão ações virtuosas ou viciosas. Terceiro, é possível agir evitando, ou moderando, os afetos que nos proporcionam maus encontros. Ou seja, que limita ou diminuem a nossa potência de agir. Quarto, controlar os afetos, racionalmente, é agir eticamente. 

Dito isso, temos então a visão do filósofo brasileiro Vladimir Safatle, que digamos, não está preocupado em apresentar uma nova teoria sobre a origem e natureza dos afetos. Também não está preocupado em saber como os afetos determinam as ações dos indivíduos na sociedade. Mas sim com o problema de que os afetos que circulam numa determinada sociedade definem o modo de vida nessa sociedade. Tal compreensão é importante, sobretudo se se pretende buscar uma mudança. Dessa forma a leitura do filósofo se afasta um pouco da questão ética e se aproxima da política. Cabe, no entanto, ressaltar que em Filosofia ética e política estão intrinsicamente ligadas.

Para Safatle (2015, p. 15-16) normalmente a sociedade é compreendida como “um sistema de normas, valores e regras que estruturam formas de comportamento e interação em múltiplas esferas da vida”. Tal compreensão não é equivocada. No entanto ele salienta que além de normas explicitas existem as implícitas - que estão sempre em conflitos. Desse modo se faz necessário compreender a sociedade a partir da sua subjetividade, dos afetos que circulam no seu seio. Nosso filósofo salienta que (2015, p. 16) “há uma adesão social construída através das afecções. Nesse sentido, quando sociedades se transformam, abrindo-se à produção de formas singulares de vida, os afetos começam a circular de outra forma”. 

Percebemos que assim como em Aristóteles e Espinoza, em Safatle há uma defesa da necessidade de se compreender os afetos a partir de uma perspectiva racional. E ainda mais, utilizar o seu poder para transformar uma determinada realidade...

Pedro Ferreira Nunes. In. OS AFETOS QUE CIRCULAM ENTRE OS MUROS DA ESCOLA: A Importância da Ética para Promoção dos Direitos Humanos, 2021. Trecho do artigo apresentado como requisito para conclusão da Especialização em Filosofia e Direitos Humanos. 

sexta-feira, 5 de abril de 2024

As eleições municipais e a força do discurso conservador em Palmas

Os levantamentos acerca da intenção de votos para eleição do novo gestor ou gestora á frente da Prefeitura Municipal de Palmas apontam até agora a força da deputada Estadual Janad Valcari do Partido Liberal (PL). De onde vem essa força? Sobretudo pensando no fato de que estamos falando de uma personalidade que não tem uma tradição na política tocantinense.

Valcari está apenas no seu primeiro mandato como Deputada Estadual na Assembléia Legislativa. E anteriormente havia sido eleita para um primeiro mandato na Câmara de Vereadores da Capital – onde fora alçada para presidência da casa de leis e ganhou destaque se opondo a gestão da Prefeita Cíntia Ribeiro. Mas muito pouco se compararmos há alguns nomes com uma tradição maior na política palmense – como o Eduardo Siqueira Campos, Júnior Geo ou Carlos Amastha.

É óbvio que ainda há muito jogo até o dia da votação. Poderíamos dizer que, comparando com o futebol, os atletas ainda estão no aquecimento. Muitos nem sabe se vão jogar. Mas esse não é o caso de Janad Valcari que já se coloca como à favorita. 

Se é fato que favoristimo não ganha eleição, assim como não ganha jogo, tem lá a suas vantagens. Como por exemplo, articular mais apoio e uma maior estrutura para fazer a campanha. Óbvio,  que estamos falando de uma capital e eleitor da capital muitas vezes nos surpreende. Palmas mesmo tem na sua história momentos assim. No entanto, a cidade parece ter dado uma guinada conservadora pelo competente trabalho de base das igrejas neopentecostais nas periferias. E creio que é ai que se explica a força de Janad Valcari.

À relação entre religião e política não é uma novidade no cenário político da capital. Mas isso acabou ganhando contornos extremos a partir do fenômeno Bolsonaro. As igrejas neopentecostais foram transformadas em comitês de campanha e o reflexo desse movimento foi a votação do Bolsonaro (enquanto Lula obteve 39,68% dos votos do eleitor palmense no 2° turno, Bolsonaro alcançou 60,32%) e de candidatos aliados a sua figura, entre eles Valcari que foi a deputada mais bem votada com mais de 4 mil votos de diferença para o 2° colocado. Para Câmara dos deputados os dois candidato mais votados também foram do PL e ligados a igrejas neopentecostais – Filipe Martins e Eli Borges.

Confesso que me surpreendi com os números das eleições de 2022 em Palmas. Por ser uma capital esperava uma postura mais progressista da parte do eleitorado. Mas agora, vivendo na periferia da cidade, compreendo totalmente esses números. E quem decide a eleição em Palmas é a periferia. Assim como, no Estado quem decide é o interior.

Janad Valcari compreendeu esse movimento e é daí que vem sua força política. Ainda que do ponto de vista ideológico ela tenha uma linha mais liberal do que conservadora, ao contrário dos seus correligionários, Filipe e Eli. Isso a torna uma figura palatável para outros setores. Ou seja, é um nome com maior capacidade de atrair diferentes grupos políticos. No entanto, não há dúvida que ela vai buscar surfar na força que o bolsonarismo tem na capital.

Conscientes desse cenário, há não ser que tivéssemos um candidato da esquerda revolucionária, seus adversários também não irão se comportar de forma diferente. Ou seja, vão flertar com o conservadorismo para atrair o voto dos evangélicos. Nesse sentido um aspecto preocupante é a imposição de um pensamento único - e se há um pensamento único não se vislumbra mudanças qualitativas.

O discurso conservador tem se caracterizado pela disseminação do ódio e consequemente de negação dos direitos humanos para determinados setores da sociedade. E no caso que tenho observado na periferia de Palmas é que esse discurso está sendo assimilado pelas maiores vítimas dessa lógica. E infelizmente não há perspectiva de mudança a curto e médio prazo. Sobretudo, dependendo de quem será eleito nas eleições municipais.

Pedro Ferreira Nunes – Especialista em Filosofia e Direitos Humanos. Atua como Professor da Educação Básica na Rede Estadual de Educação.


sábado, 30 de março de 2024

Poema: Para menina que vi no supermercado e provavelmente nunca mais verei


Eu não conseguia parar de olhar para ti.
Mesmo tentando ser discreto,
creio que você tenha percebido.

Algo no seu jeito,
me transmitia uma energia diferente.
Não, não era uma mulher qualquer. 

Esse não é o tipo de criatura,
que você encontra em qualquer lugar.
E não está ao alcance de um reles plebeu como eu.

Você estava acompanhada,
e muito bem acompanhada,
de outra mulher.

Seria uma amiga,
namorada?
Me pareceu que sim.

Quando eu ia saindo,
você magicamente surgiu na minha frente
empurrando um carrinho.

Sorriu para mim,
e moveu a cabeça 
num cumprimento terno.

Eu correspondi 
e segui
um pouco sem acreditar.

Me deu uma vontade de voltar
e falar:
- Meu, você é muito linda.

Mas....

Escrevo essas linhas para não esquecer,
da menina que vi no supermercado 
e provavelmente nunca mais irei ver.

Foi numa quarta á tarde, 
por volta das 18h, 
véspera de feriado.

Não tinha mais que 1,60 de altura
pele branca,
ruiva.

Usava óculos, 
não mais que 30 anos,
uma mancha no queixo.

Aparentava delicadeza, 
sem tatuagens á vista,
brilho de estrela. 

Enfim...

Que realize teus sonhos, 
que tenha sempre motivos pra sorrir. 
que seja feliz.

Pedro Ferreira Nunes – um rapaz latino americano que gosta de ler, escrever, correr e ouvir Rock in roll.