quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Sistema CUBO: Tecnologia a serviço da Burocracia.

“A racionalidade tecnológica revela o seu caráter político ao se tornar o grande veiculo de melhor dominação...”.
Herbert Marcuse

Se não era fácil à vida de quem buscava junto a Pró-reitoria de Assuntos Estudantes (PROEST) alguma bolsa ou auxilio. Essa tarefa se tornou ainda mais burocrática com a implementação do Sistema Cubo (Cadastro Unificado de Bolsas e Auxílios). E assim o que tinha como objetivo agilizar os processos tornando-os menos burocráticos, culminou num processo nebuloso justificado na racionalidade tecnológica.

Quando da implantação do sistema Cubo não houve nenhuma resistência por parte dos estudantes até por que era unanime entre estes a critica pela morosidade do processo de distribuição de bolsas e auxílios. Morosidade justificada pela falta de técnicos da área de assistencial social para analisar os processos de forma mais célere, sobretudo diante da grande demanda. Mas ao invés de reforçar o quadro da assistência social na UFT, preferiu-se desenvolver um programa tecnológico. De modo que a analise Socioeconômica dos acadêmicos passou a ser feito eletronicamente.

Ainda no inicio da implantação do sistema Cubo os problemas começaram a surgir, no entanto compreendeu-se que tais problemas eram naturais para algo que estava sendo implantado. A perspectiva era que com o tempo esses problemas seriam superados - inclusive a Proest não poupando esforços no sentido de ofertar formação para que as dificuldades dos estudantes em acessar o sistema cubo fossem superadas. Com o tempo os estudantes começaram a perceber que o problema não era ter acesso ao sistema, mas atender todas as etapas exigidas através da apresentação de documentação. Aliás, a esse respeito às coisas continuavam tão burocrática como antes.

Além de toda a dificuldade de conseguir providenciar a documentação exigida, sobretudo para quem é de outras cidades. Soma-se a isso a necessidade de organizar tudo num único arquivo e enviar pelo sistema Cubo (tudo via internet). A questão é que nem todos tem acesso a um computador com internet. Uma alternativa seria os laboratórios de informática nos campus. Mas pelo menos em Palmas o acesso é restrito há alguns cursos. 

Como não é possível ter acesso a nenhum dos programas coordenados pela PROEST sem estar cadastrados no Cubo muitos estudantes estão abrindo mão dos seus direitos por não suportar toda a burocracia exigida para se ter acesso a uma bolsa permanência, auxilio alimentação, auxilio moradia ou auxilio viagem. Dessa forma o sistema Cubo tem servido para fazer uma peneira. E mesmo assim nem todos que conseguem passar por essa peneira têm acesso aos programas e auxílios da assistência estudantil.

É importante destacar a importância da política de assistência estudantil para garantir que os estudantes, que estão em situação de vulnerabilidade social, não abandonem o curso. Tal importância é comprovada por pesquisas realizadas na própria UFT. De modo que a política de assistência estudantil não pode ser restrita, mas sim atender a todos que dela precisam. 

É de se esperar o discurso por parte da gestão de que faltam recursos. O problema é quando a representação estudantil compra esse discurso. É o que se percebe nos fóruns de assistência estudantil. Aliás, a Proest tem utilizado os fóruns de assistência estudantil para aprisionar os representantes discentes – fazendo com que estes comprem o discurso de cortes orçamentário – tendo que estabelecer prioridades. E se tornam refém dessas prioridades. Pois quando se vai na Proest reivindicar algo importante mas que não foi estabelecido como prioridade. Justificam: - o fórum estudantil estabeleceu isso.

Os estudantes e suas entidades representativas não podem se submeter a isso. Não é nosso papel. O nosso papel é cobrar que seja feito o que for necessário para que os interesses de todas e todos os estudantes sejam atendidos – de todos os cursos, de todos os campi. Nós não somos um braço da Proest, uma correia de transmissão dos interesses de quem esta na gestão. De modo que quando necessário, devemos partir para o enfrentamento. Ou se não nos tornamos cúmplices de determinadas políticas.

Determinadas políticas que são lançadas como um avanço, mas que acaba sendo uma armadilha. Mas pelo fato de estarmos numa sociedade cada vez mais dominada pela tecnologia, essa armadilha acaba sendo imperceptível. É ai por tanto que o filósofo alemão Herbert Marcuse nos trás uma importante reflexão sobre essa questão. De acordo com ele “a tecnologia serve para instituir formas novas, mais eficazes e mais agradáveis de controle social e coesão social.” É a partir dai que podemos compreender a lógica do sistema Cubo.

Pedro Ferreira Nunes - Cordenação Geral do CAFIL Professor José Manoel Miranda - UFT

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Eleições no Tocantins: Oportunismo e as Três faces de um mesmo projeto.

Tem ocorrido um fato interessante no processo eleitoral em curso no Tocantins – o apoio de prefeitos e lideranças políticas não a uma coligação, mas a candidatos, inclusive de coligações diferentes. Tal fenômeno é bastante revelador do que representa as três principais coligações que disputam a hegemonia política no Tocantins. No fundo são três faces de um mesmo projeto.

Ainda que não seja garantia de vitória, ter na base de apoio uma gestão municipal na disputa eleitoral é um peso inquestionável. É por isso que os candidatos fazem questão de divulgar na imprensa o apoio de prefeitos e outras lideranças políticas. Tal peso se torna relevante ainda mais no interior onde se sabe o peso da máquina pública é decisivo. Mas o que se vê no processo eleitoral em curso é que a maioria dos prefeitos e lideranças políticas não estão fechando com uma coligação, mas com candidatos individualmente. 

É o caso, por exemplo, do prefeito da segunda maior cidade do Tocantins (Ronaldo Dimas de Araguaína) que apoia tanto candidatos da Coligação encabeçada por Mauro Carlesse (PHS), o próprio Mauro Carlesse ao governo, como também que estão na chapa comandada por Marlon Reis (Rede), que é o caso de Irajá Abreu para o senado. Moisés Avelino (MDB) prefeito de Paraiso também apoia à candidatura a reeleição de Mauro Carlesse, já para o senado um dos seus candidatos é Vicentinho (PR) da coligação liderada por Carlos Amastha (PSB). Já o prefeito de Lajeado – Tercio Neto (PSD) apoia candidatos de três coligações diferentes: Mauro Carlesse ao governo; Irajá Abreu (PSD) e Vicentinho (PR) ao senado; Vicentinho Jr (PR) para a câmara dos deputados e Toinho Andrade (PHS) para a assembleia legislativa.

Esses são apenas alguns exemplos do que está ocorrendo de norte a sul do Estado. Inclusive há relatos de que em alguns municípios esta ocorrendo dobradinha entre candidatos a deputado estadual e federal de coligações diferentes. 

Teoricamente isso seria um contrassenso partindo do pressuposto que essas três coligações representam projetos diferentes. De modo que seria inviabilizar o governo elegendo candidatos adversários, não é mesmo?! O ideal para um governo forte e estável não é ter uma boa base de sustentação? Isso não obrigará o governo a ter que comprar o apoio destes que forem eleitos e que não são da sua base?

O fato é que na prática as três principais coligações (“A verdadeira mudança” encabeçada por Carlos Amastha; “Frente alternativa” encabeçada por Marlon Reis e “Governo de atitude” encabeçada por Mauro Carlesse) representam o mesmo projeto de desenvolvimento. E no final das contas independentemente de quem for eleito os interesses das elites estão garantido.

Se hoje estão em palanques opostos trata-se de uma questão circunstancial. Nada impedirá que amanhã estejam juntos, como já estiveram no passado. Tudo dependerá das negociatas por um carguinho aqui, outro acolá. E não precisa ir muito longe para confirmar essa tese, é só analisar o que ocorreu após as eleições suplementares – quem antes estava de um lado e agora esta do outro. 

Ora o que justifica essa mudança de galho se não interesses em obter mais vantagens para si e para seu grupo político?! Sobretudo quando se pula para um galho que antes se criticava. O que fez com que de uma hora para outra o que era ruim passa a ser bom? Na vida ser uma metamorfose ambulante pode até ser algo belo, mas em política isso se chama oportunismo. E em política, o oportunismo é visto como uma atividade parasitária. E está presente tanto no campo da direita como na esquerda. Catarina Casanova (2016) afirma que “o oportunismo pode ser visto como uma espécie de prática política que se define pela acomodação às circunstancias, que busca retirar proveito destas não respeitando, normas, regras ou estatutos”.

É assim que têm agido os candidatos dessas três coligações. E é assim que têm agido aqueles que os apoiam.

O que fica evidente é que a briga entre essas três coligações é única e exclusivamente pelo poder. Chegando ao poder não se iludam quanto ao projeto que estes senhores irão implementar – é o velho projeto de governo que aprofundará o modelo hegemônico de desenvolvimento tão nefasto para os trabalhadores e o campesinato pobre. 

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio. Cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente cursa Filosofia na Universidade Federal do Tocantins.

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

O que não se deve fazer no ensino de Filosofia: Algumas questões sobre o papel da avaliação.

“[... avaliar... é uma atividade que põe em questão a nossa própria concepção de educação...]”. 
Savian Filho

Planejamento, diálogo e processo avaliativo;

Em uma disciplina do curso de licenciatura em Filosofia da Universidade Federal do Tocantins tive uma experiência bastante significativa que me fez querer refletir sobre o papel da avaliação no ensino de Filosofia. Uma experiência que vale a pena ser refletida não no sentido do que se deva fazer, mas sim do que se deva evitar.

No primeiro dia de aula o professor apresentou o plano de disciplina e neste estava contido como seria o processo avaliativo – que teria uma parte teórica e outra prática. Sendo que o peso de cada uma dessas partes na somatória da nota seriam iguais, isto é, 50% teoria e 50% prática. Até ai tudo bem. Quando se faz um planejamento colocamos no papel a nossa intencionalidade. No entanto é preciso ter sensibilidade (ainda mais quando se diz ser um educador progressista) para flexibilizar o planejamento a partir do contato com a realidade da sala de aula e as especificidades que ali surgiram. O que significa que se o planejamento pode e deve se modificar o processo avaliativo também tem que se modificar como reflexo dessa mudança.

Nessa linha é importante o que diz Gallo (2010) de que “[... cada professor, no contexto de seu trabalho, precisa criar os mecanismos próprios que lhe permitam perceber o desenvolvimento dos estudantes, podendo intervir para seu aprimoramento, uma vez que este é o único sentido aceitável para um processo avaliativo...]”. Ora, não levar em consideração o desenvolvimento do estudante no processo avaliativo, mas apenas buscar a nota pela nota, não há de fato nenhum sentido. Gallo é enfático ao dizer que podemos e devemos intervir para que esse processo de aprendizagem se aprimore. O que não é possível num processo avaliativo fechado.

Não foi isso que aconteceu com o nosso professor. Mesmo ele reconhecendo que no decorrer da disciplina havia priorizado mais a parte teórica do que a parte prática. Ainda assim, insistiu no mesmo método avaliativo, não modificando nada do que fora apresentado no primeiro dia de aula. Mesmo que visivelmente o que fora planejado não foi o executado na sua totalidade. 

E mesmo que cerca de 80% da disciplina tenha sido focada na parte teórica ele manteve o peso igual das avaliações. Ignorando totalmente o questionamento dos estudantes. E pior, numa postura totalmente autoritária negou-se ao diálogo – impondo o que ele acreditava que era o correto. Uma postura bastante reveladora da sua opção pedagógica. É o que nos diz, por exemplo, Savian Filho (2016) que “[... avaliar... é uma atividade que põe em questão a nossa própria concepção de educação...]”. 

Não se engane com discursos progressistas e práticas conservadoras como a do nosso nobre professor que se diz aliado à tradição marxista na educação e tem Paulo Freire como referência. Mas na prática se esquece de um ensinamento vital em Freire que é o diálogo. “[... E o que é o diálogo? É uma relação horizontal de A com B. Nasce de uma matriz crítica e gera criticidade (Jaspers)... só o diálogo comunica...]”. Já o antidiálogo que foi praticado pelo nosso professor e que encontramos em muitas salas de aula “[... implica numa relação vertical de A sobre B... É acrítico que não gera criticidade... por tudo isso, o antidiálogo não comunica, faz comunicados...]”. E é justamente no processo avaliativo que estas questões ficam mais claras. É no processo avaliativo que se revela uma opção que muitas vezes se tenta camuflar.

Há aqueles que buscam justificar a opção por tais processos avaliativos através do discurso de que o sistema de ensino nos limita bastante. E de fato há uma pressão muito grande do Estado no sentido de processos avaliativos que correspondam a interesses de organismos internacionais que avaliam a qualidade da educação através do resultado dos estudantes em provinhas e provões. Sobretudo no ensino médio. No entanto não devemos nos acomodar nesse discurso. Temos sim certa autonomia para subverter determinadas imposições. Na academia então (onde aconteceu o exemplo trabalhado aqui) essa possibilidade é ainda maior.

A questão da avaliação no ensino de Filosofia;

A primeira questão que se deve ter claro em relação à avaliação no ensino de Filosofia é que não há um receituário pronto e acabado que devemos seguir. Dai que devemos ter em mente o que diz Silvio Gallo (2010) sobre a necessidade de elaborarmos um processo avaliativo a partir do contexto que estamos inseridos. Um processo avaliativo que leva em consideração o desenvolvimento do estudante, e que podemos e devemos intervir para aprimora-lo.

Ainda de acordo com Gallo (2010) “[... devemos nos ater menos àquilo que o estudante eventualmente assimilou dos conteúdos que foram transmitidos, mas precisamos nos preocupar em avaliar em que medida ele foi ou não capaz de aproximar-se da experiência do pensamento conceitual...]”. Tal afirmação vai na linha do que foi colocado anteriormente de que não há um modelo de avaliação no ensino de Filosofia. No entanto aponta para necessidade de uma avaliação que prioriza o “saber como” mais do que o “saber que”. Por que isso se dá? Por que a filosofia tem um caráter diferente das outras disciplinas. 

Para Murcho (2008) a filosofia se distingue de outras disciplinas por apresentar poucos resultados consensuais, dando-lhe um caráter em aberto. Porém, “[... defender que a filosofia é fundamentalmente uma disciplina em aberto não é necessariamente o prelúdio de um elogio ao permanente “questionamento” sem rumo...]”. Fazer isso seria cair no equivoco que o filósofo Mario Ariel Gonzalez Porta (2017) diz que muitos fazem por não compreender que “[... o núcleo essencial da filosofia não é constituído de meras convicções, mas de problemas e soluções...]”. Dai que ele estabelece o “problema como base de estudo da filosofia”. 

Seguindo essa linha, defendemos que a avaliação em Filosofia também tenha esse caráter em aberto. E aos que criticam essa perspectiva, recorremos mais uma vez a Murcho (2008) ao afirmar que “[... o caráter aberto da filosofia em nada diminui o seu valor cognitivo e social, a sua seriedade acadêmica ou escolar, ou a sua importância existencial...]”. Outro aspecto importante em relação à avaliação no ensino de Filosofia é o que trás Savian Filho (2016) de que “[... os estudantes não podem ser avaliados pelo tipo de engajamento ético-politico que adotam... mas pelos recursos que conseguem acionar para justificar suas posições...]”.

Savian Filho (2016) também chama atenção para o fato de que não devemos avaliar o desempenho dos estudantes apenas com base nos objetivos e expectativas que estipulamos. Foi o que ocorreu com o exemplo do professor que descrevemos acima. Caminhar nesse sentido é ter uma boa probabilidade de se frustrar. 

Ainda de acordo com Savian Filho (2016):

Não se trata aqui de pensar que avaliar é atribuir notas; nem de insinuar que nossa atividade de docência consiste em apresentar conteúdos complexos, para, depois “fechar os olhos” e aceitar resultados que não correspondem à complexidade dos assuntos. Pelo contrário, trata-se de desenvolvermos uma atenção especifica a cada estudante ou a cada grupo de estudantes, sem adotar um padrão avaliativo definido apenas pelas expectativas, ainda que sejam sempre as melhores. (2016; 417).

Savian Filho (2016) aborda dois tipos de avaliação. A avaliação diagnóstica e a avaliação classificatória. Sendo que é mais comum no ensino de filosofia a primeira - que permite ao educador o reconhecimento do desenvolvimento cognoscitivo do estudante “apresentado na sua capacidade discursivo-filosófica”. Já a avaliação classificatória tem como finalidade averiguar o desempenho. Na perspectiva de Savian Filho (2016): 

não deixa de ser importante expor os estudantes a esse tipo de avaliação... no entanto, justamente tendo em vista o desenvolvimento de competências cívicas, exige-se de nós, professores, um cuidado pedagógico redobrado, a fim de não associarmos à avaliação classificatória um sentido de incentivo à concorrência ou à afirmação narcisista de si.

Diante do exposto voltamos a nossa questão inicial: O que não se deve fazer no ensino de Filosofia, especificamente em relação ao papel da avaliação? Não se deve fazer um processo avaliativo fechado, calcado nas nossas expectativas. Também não se deve fazer um processo avaliativo que não leve em consideração a realidade da sala de aula e a especificidade de cada estudante. Ainda, não se deve fazer um processo avaliativo autoritário e antidiálogico. Por fim, não se deve fazer, pois é inaceitável, um processo avaliativo incoerente, onde prática e teoria estão em campos opostos.

*Pedro Ferreira Nunes – É graduando do Curso de Licenciatura em Filosofia da Universidade Federal do Tocantins – UFT.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS  

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 27ª ed. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

GALLO, S. Ensino de Filosofia: Avaliação e Materiais Didáticos. In Gabriele Cornelli; Marcelo Carvalho; Marcio Danelon (Org.). Coleção Explorando o Ensino – Vol. 14: Filosofia. 1ª ed. Brasília. Ministério da Educação, 2010, v. 14, p. 159-170.

MURCHO, Desidério. A Natureza da Filosofia e o seu Ensino. Edu. e Filos., Uberlândia, v 22, n 44, p. 79-99, jul/dez, 2008.

PORTO, MARIO ARIEL GONZALEZ. A filosofia a partir de seus problemas - Os momentos essenciais do “modo filosófico de pensar”.   São Paulo: Ed. Loyola, 2002.

SAVIAN FILHO, Juvenal. Filosofia e filosofias: existência e sentidos. 1. ed. – Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016.

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Um poema para fechar Agosto

O enterro do cachaceiro

O defunto foi enterrado,
pobre coitado,
não deixou um tostão furado.
- O defunto foi enterrado.

Ninguém foi ao seu velório,
poucos viram ele ser enterrado.
Morreu como viveu,
sozinho e abandonado.

Já teve família,
amou e foi amado.
Mas pela cachaça
jogou tudo para o alto.

Seus companheiros
não foram ao enterro.
Preferiram beber cachaça
e lembrar o amigo vivo.

No pobre cemitério,
o coitado foi enterrado.
Ninguém derramou uma lagrima
ninguém sentirá sua falta.

Ninguém foi ao seu velório,
poucos viram ele ser enterrado.
Morreu como viveu
sozinho e abandonado.

Pedro Ferreira Nunes
Casa da Maria Lucia. Lajeado -TO. Verão de 2018.

terça-feira, 28 de agosto de 2018

A Reforma Administrativa do governo Carlesse: Mudar para não mudar.

“a desqualificação do Estado tem sido, como é notório, a pedra-de-toque do privatismo da ideologia neoliberal: a defesa do “Estado mínimo” pretende, fundamentalmente, “o Estado máximo para o capital””.
José Paulo Netto

A reforma administrativa do governador Mauro Carlesse (PHS) mostra que ele está seguindo a mesma linha dos seus antecessores. Até o discurso utilizado para justificar as mudanças na estrutura governamental é quase uma copia da justificativa da Reforma Administrativa do governo Siqueira Campos em 2013 e a do governo Marcelo Miranda em 2016 – reduzir os gastos com a máquina pública e melhorar a prestação de serviços a população.

Quando da última reforma administrativa do governo Marcelo Miranda (2016) o discurso era que o governo do Tocantins precisava se ajustar a um novo momento. Essas medidas deveriam racionalizar os gastos públicos, mas também garantir que os serviços prestados pelo Estado, fossem ainda, de melhor qualidade. No seu último mandato Siqueira Campos também fez uma reforma administrativa. O discurso era que “a reforma visa eficiência em primeiro lugar. Em segundo, a redução dos custos. Com essas mudanças, a meta é fortalecer as secretarias e torna-las eficientes para que desenvolvam um bom serviço ao cidadão tocantinense”. (2013)

Na prática as reformas administrativas dos governos Siqueira e Marcelo Miranda foram completamente ineficazes em cumprir o que prometiam. Tanto que logo foram necessárias outras reformas. Mostrando que não eram modelos de gestão tão eficazes assim, como se vendia. Com Carlesse não será diferente. E nem com outro que por ventura for eleito e que proporá a sua reforma administrativa.

É importante ressaltar que a reforma administrativa do Governo Miranda serviu como cortina de fumaça para aprovação do “pacotão de impostos”. A tática era simples, com a reforma administrativa o governo estava dizendo: - vejam, estamos cortando na própria carne. Vocês também precisam se sacrificar um pouco mais pagando mais impostos.

Com a atual reforma administrativa o governo Carlesse promete uma economia de 2 milhões ao ano. Além de melhorar a eficiência, qualidade dos serviços prestados a população e reduzir os gastos públicos. Por fim, ainda afirma que “não dá mais para população pagar tantos impostos e não ver o benefício retornar”. Bonito isso não?! No entanto não seria mais eficaz fazer uma reforma tributária em vez de reduzir algumas secretarias? Ou então começar revogando o ajuste fiscal do então governador Marcelo Miranda, que aumentou impostos sobre a população, quando Carlesse presidia a Assembleia Legislativa?

Não camaradas, não se iluda com o belo discurso liberal. Eficiência, melhoria na qualidade dos serviços prestados e redução dos gastos públicos? Isso é apenas discurso. Na prática essa reforma administrativa serve apenas para maquiar a realidade. Si diz que esta mudando, mas é uma mudança aparente. É um mudar para não mudar. É um mudar para continuar como está. Isto é, alguns poucos usufruindo das benesses do poder enquanto a maioria paga a conta.

Eis ai o que os neoliberais defensores do Estado mínimo não falam. Não falam por que não dá voto. É melhor dizer que irá tornar a máquina pública mais eficiente, melhorar a qualidade dos serviços prestados e reduzir gastos públicos. E de fato é o que faram, tornaram a máquina pública mais eficiente na exploração dos trabalhadores, melhoraram a qualidade dos serviços prestados a um determinado setor da sociedade e reduziram os gastos públicos, mas das áreas sociais.

José Paulo Netto (2010) chama atenção para o fato que “a desqualificação do Estado tem sido, como é notório, a pedra-de-toque do privatismo da ideologia neoliberal: a defesa do “Estado mínimo” pretende, fundamentalmente, “o Estado máximo para o capital””. 

Nesse contexto “o grande capital, implementam a erosão das regulações estatais visando claramente à liquidação de direitos sociais, ao assalto ao patrimônio e ao fundo públicos, com a “desregulamentação” sendo apresentada como“modernização” que valoriza a “sociedade civil”, liberando-a da tutela do “Estado protetor” – e há lugar, nessa construção ideológica, para a defesa da “liberdade”, da “cidadania” e da “democracia”. (Netto, 2010. p. 20-21)

É o caminho que o governador Mauro  Carlesse tem trilhado. E a atual reforma administrativa do seu governo mostra isso de maneira incontestável. De modo que se vencer a eleição em outubro, permanecendo quatro anos a frente do executivo estadual, o que veremos é o aprofundamento desse modelo nefasto para classe trabalhadora.

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio.

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Algumas palavras sobre Siqueira Campos e as eleições no Tocantins

Após se lançar como candidato a senador da república aos 90 anos de idade, Siqueira Campos recuou, mantendo-se, no entanto, como suplente de Senador. A justificativa para tal decisão “é a saúde debilitada”. O que ficou evidente na convenção de Mauro Carlesse (PHS) realizada na Assembleia Legislativa. Quando ele chegou com o braço engessado sendo carregado por auxiliares (por não conseguir caminhar sozinho). 

Diante disso imagine qual a condição que o velho Siqueira teria para rodar todo o Estado do Tocantins fazendo campanha numa disputa que nos parece que será uma das mais acirradas – até mais do que a própria disputa pelo governo. Pois teremos vários candidatos competitivos – Vicentinho (PR), Halum (PRB), Ataídes (PSDB), Irajá (PSD) e Paulo Mourão (PT).

E imagine também se por ventura fosse eleito, terminaria o mandato com quase cem anos de idade. Isso se ele não se encontrasse antes com “o único mal irremediável” como diria Suassuna no seu belo “O auto da Compadecida”.  Não, não estou agoirando o velho Siqueira. O fato é que isso está nos “cálculos lógicos das probabilidades” como escreveu certa vez Ernesto Guevara. Sobretudo para quem já completou 90 anos de idade. 

Apesar de todo esse contexto não se pode negar que a candidatura de Siqueira Campos teria competitividade e também uma votação expressiva – ainda que não signifique que seria eleito. E é justamente por isso que ele permanece como suplente. Pois seu nome em si, trás um peso político inegável. Siqueira Campos já foi eleito governador do Tocantins quatro vezes e é tido por muitos como “o criador” do Estado – uma espécie de semideus. Mas esse peso político é ambíguo.

Se há aqueles que por um lado o colocam num altar como uma espécie de santo, por outro tem aqueles que não esquecem as perseguições políticas sofridas quando ele governava o Estado com uma chibata na mão. A questão é saber qual a narrativa se sobreporá. Nesse terreno de disputa que é a construção da memória coletiva e individual, darei a minha contribuição rememorando algumas questões sobre as quais a mídia oficial se silencia.

Comecemos, portanto, lembrando o superfaturamento na construção de pontes, que ganhou repercussão nacional. De acordo com o MPE os contratos superfaturados para construção de pontes teve inicio nos governos Siqueira Campos e tiveram continuidade nas gestões de Marcelo Miranda. Ainda de acordo com o MPE (2015) “as investigações envolve no total mais de 100 obras de construção de pontes, que apresentaram superfaturamento de preços, serviços pagos em duplicidade, entre diversas outras irregularidades que redundaram em lesão ao patrimônio público...”. (G1 Tocantins)

É bom lembrar também do escândalo de corrupção na Secretaria de Cultura que veio a tona no seu ultimo mandato de governador. De acordo com denúncias veiculadas na imprensa regional recursos públicos eram desviados para financiar eventos privados. Essas denúncias levaram a saída da então Secretária de Cultura – Katia Rocha. E depois a extinção da pasta.

Não custa lembrar também a forma que terminou ultimo mandato de governador do velho Siqueira, com ele renunciando o cargo numa manobra política para tentar viabilizar a eleição de um aliado. O que não ocorreu já que sua popularidade não era das melhores. Inclusive, o seu candidato (Sandoval Cardoso) fez de um tudo para descolar sua imagem da dele. 

Isso só para citar fatos recentes. Mas Siqueira Campos também tem no currículo a entrega dos bens públicos do povo tocantinense para iniciativa privada através de privatização. Aliás, o Tocantins, sob o seu governo, foi o primeiro Estado a privatizar a companhia de Energia Elétrica (CELTINS) – como saldo temos um serviço de péssima qualidade e uma das tarifas das mais caras do Brasil. Mesmo sendo um Estado produtor de energia elétrica.

Siqueira Campos não será mais candidato, menos mal. No entanto não estará ausente da disputa. Sua imagem será usada amplamente por aliados e ele aparecerá com o discurso demagógico de amor ao Tocantins. E infelizmente muita gente cairá nesse engodo. Como superar isso? Com certeza não será do dia para noite. Porém podemos iniciar fazendo uma contracampanha, não só contra Siqueira Campos, mas também contra todas as candidaturas que representam os interesses do modelo hegemônico de desenvolvimento no Tocantins.

Pedro Ferreira Nunes – Educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio.

sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Tocantins: Virando uma pagina de sua história?!

O Tocantins celebrará em outubro próximo 30 anos de sua criação. Justamente no mês em que a população irá às urnas eleger um novo governador para comandar o Estado nos próximos quatro anos. E essa será uma eleição histórica já que não teremos nem Siqueira Campos ou Marcelo Miranda como candidatos a governador. 

De modo que independente de quem será eleito em outubro, ainda que seja um candidato que tenha o apoio dessas duas figuras, será um marco histórico que colocará fim a um longo ciclo da história política do Tocantins – um ciclo marcado pela hegemonia política de duas famílias. Um ciclo que perdura há seis eleições regulares consecutivas.

Exatamente, nas ultimas seis eleições para o governo do Tocantins tivemos a presença ou de Siqueira Campos ou de Marcelo Miranda (quando se não dos dois) como candidatos a governador. Sendo que em 1994 e 1998 ocorreu a eleição e reeleição de Siqueira Campos. Já em 2002 e 2006 foi à eleição e reeleição de Marcelo Miranda. Em 2010 tivemos a eleição de Siqueira Campos. E em 2014, Marcelo Miranda foi o eleito. 

Como se vê nesses 30 anos de história, em grande parte deles, o Estado do Tocantins se revezou na mão de duas famílias e seus lacaios. Hora tendo á frente do governo estadual a oligarquia dos Siqueiras, hora a oligarquia dos Mirandas. E qualquer um que vislumbrasse uma maior sorte no cenário político eleitoral precisava da benção de um desses dois. 

Isso foi sendo minado aos poucos, tendo como marco inicial a eleição de Raul Filho (então no PT) como prefeito de Palmas em 2004. Até chegar ao nível atual em que o apoio tanto de Siqueira Campos ou Marcelo Miranda já não é fundamental para uma eleição. É obvio que não se pode descartar o peso político dessas duas figuras, ainda mais quando estamos falando de um estado oligarca. Mas o fato é que é possível sim, se eleger sem a benção ou de Marcelo Miranda ou de Siqueira Campos. 

O que não nos parece ser possível é ser eleito ao governo do Estado sem o apoio de uma oligarquia. Foi o que perceberam Carlos Amastha (PSB) e Márlon Reis (REDE) que tanto criticavam, mas acabaram se aliando a essas oligarquias. De modo que não há muito que se comemorar, sobretudo por que o que se vislumbra no processo eleitoral vigente é a eleição de um governo populista.

E assim o Tocantins caminha para repetir o que ocorre no Brasil a nível nacional, isto é, funcionar como um pêndulo que hora pende para a oligarquia, hora para o populismo. De acordo com o filósofo Vladimir Safatle (2016) “esse pêndulo consegue puxar todos os atores políticos para um de seus polos, transformando-os em repetições de atores passados”.

De modo que se a população quiser verdadeiramente virar uma pagina na história política do Tocantins é preciso avançar para além desse pêndulo. Criando de acordo com as palavras de Safatle, “uma história que, até agora, não existiu”. 

Pedro Ferreira Nunes – É educador Popular e Militante do Coletivo José Porfírio. Cursou a faculdade de Serviço Social e atualmente é graduando de Filosofia da Universidade Federal do Tocantins.